Grafismo e cosmologia na cerâmica Marajoara
DOI:
https://doi.org/10.5216/hawo.v5.81134Palavras-chave:
Cosmologia indígena, Arqueologia amazônica, Perspectivismo ameríndio, Cerâmica marajoara, Ilha do MarajoResumo
Centenas de artefatos cerâmicos provenientes da Ilha de Marajó, Brasil, compõem coleções museológicas em todo o mundo, encantando olhares de variados públicos. A elaborada cerâmica polícroma, combinando as pinturas preta, vermelha e branca, exibe uma diversidade de elementos gráficos executados em incisões e excisões, e que aludem a cobras, lagartos, jacarés, escorpiões, corujas e outros seres, formando figuras híbridas. Esta cerâmica é atribuída às sociedades marajoara que habitaram a ilha entre os séculos V e XIV, organizando-se em sistemas políticos regionais e que manejavam a paisagem e reproduziam na cerâmica uma linguagem iconográfica – um modo de comunicação visual da sua cosmopolítica. Estes grafismos são entendidos como elementos de diálogo com os universos ontológicos ameríndios, importantes na constituição das identidades sociais e na construção dos corpos marajoara. Este ensaio revisa alguns dos estudos voltados à iconografia e estilo da cerâmica marajoara, para explorar como tem sido estabelecida a relação entre os grafismos e a cosmopolítica dessas sociedades.
Referências
ALVES, Daiana T.; SCHAAN, Denise P.. Os bancos de cerâmica marajoara: seus contextos e possíveis significados simbólicos. Amazônica-Revista de Antropologia, v. 3, no. 1, p. 108-141, 2011.
BARCELOS NETO, Aristóteles. Apapaatai: rituais de máscaras no alto Xingu. São Paulo: Edusp, 2008.
BARRETO, Cristiana. Meios místicos de reprodução social: arte e estilo na cerâmica funerária da Amazônia antiga. 2009. Tese (Doutorado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2009.
BARRETO, Cristiana. Modos de figurar o corpo na Amazônia pré-colonial. In: Stéphen Rostain. (Org.). Antes de orellana. Actas ... Encuentro Internacional de Arqueología Amazónica, 3. Quito: Instituto Francés de Estudios Andinos, 2014. p. 123-132.
BARRETO, Cristiana. O que a cerâmica Marajoara nos ensina sobre fluxo estilístico na Amazônia. In: BARRETO, Cristiana; LIMA, Helena P.; BETANCOURT, Carla J. (eds.). Cerâmicas arqueológicas da Amazônia: rumo a uma nova síntese. Belém: IPHAN/MPEG, 2016. p. 115-124.
BARRETO, Cristiana. Do teso marajoara ao sambódromo: agência e resistência de objetos arqueológicos da Amazônia. Boletim do
Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 15, n. 3, e20190106, 2020. Disponível em: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2019-0106. Acesso em: 25 nov. 2024.
BEZERRA, Marcia. A urna bordada: artesanato e arqueologia na Amazônia contemporânea. Boletim do Museu Paraense EmílioGoeldi. Ciências Humanas, v. 15, n. 3, e20190124, 2020. Disponível em: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2019-0124, 2020. Acesso em: 24 nov. 2024.
BOAS, Franz. Primitive art. London, Dover Publications, 1955(1928).
CARNEIRO DA CUNHA, Manuela L. C. Os mortos e os outros: uma análise do sistema funerário e da noção de pessoa entre os índios Krahó. Tese (Doutorado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 1975.
DIAS, Adriana S. Novas perguntas para um velho problema: escolhas tecnológicas como índices para o estudo de fronteiras e
identidades sociais no registro arqueológico. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v.2, n. 1, p. 59-76, 2007.
DIAS, Jamille P. et al. Uma ciência triste é aquela em que não se dança. Conversações com Isabelle Stengers. Revista de Antropologia, v. 59, n. 2, p. 155–186, 2016.
DEMARCHI, André. Armadilhas, quimeras e caminhos: três abordagens da arte na antropologia contemporânea. Espaço Ameríndio, v.3, n. 2, p. 177-199, 2009.
DERBY, Orville. The artificial mounds of the Island of Marajo. The American Naturalist, v. 13, p. 224-229, 1879.
FARABEE, William C. Explorations at the mouth of the Amazon. Mus. J. Uni. Penn. Philadelphia, vol. 12, p. 142-161, 1921.
FERREIRA PENNA, Domingos S. Apontamentos sobre os Cerâmios do Pará. Archivos do Museu Nacional do Rio de Janeiro, 2 , 47-67, 1877.
GELL, Alfred. The technology of enchantment and the enchantment of technology. In: COOTE, J.; SHELTON, A. (eds.), Anthropology, art and aesthetics. Oxford: Oxford University Press, 1992. p. 40-63.
GELL, Alfred. Art and agency, an anthropological theory. Oxford: Oxford University Press, 1998.
HARTT, Charles. F. The ancient indian pottery of Marajo, Brazil. American Naturalist, v. 5, n. 5, 259-27, 1871.
HILBERT, Peter P. Contribuição à Arqueologia da ilha de Marajó: os “tesos” marajoaras do alto Camutins e a atual situação da ilha do Pacoval, no Arari. Publ. Int. Antropo. Etnol. Pará. Belém, v. 5, p. 1-32, 1952.
HUGH-JONES, Stephen. The Fabricated body: objects and ancestors in northwest Amazonia. In: Santos-Granero, Fernando (ed.).
The occult life of things: native Amazonian theories of materiality and personhood. Tucson: University of Arizona Press, 2009. p. 33-59.
LAGROU, Els. A fluidez da forma: arte, alteridade e agência em uma sociedade amazônica (Kaxinawa, Acre). Rio de Janeiro: Topbooks, 2007.
LAGROU, Els. Existiria uma arte das sociedades contra o Estado? Revista de Antropologia, v. 54, n. 2, p. 747-779, 2011.
LAGROU, Els. Podem os grafismos ameríndios ser considerados quimeras abstratas? Uma reflexão sobre uma arte perspectivista. In: SEVERI, Carlo; LAGROU, Els (Orgs.), Quimeras em diálogo: grafismo e figuração nas artes indígenas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2013. p. 67-109.
LANGE, Algot. The lower Amazon. New York: G.P. Putnam’s Sons,The Knickerbocker Press, 1914.
LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro. 1975.
LIMA, Helena P. ET AL. Relatório de vistoria técnica. Belém: IPHAN. 2024.
LIMA, Helena P.; BARRETO, Cristiana; BETANCOURT, Carla J. Novos olhares sobre as cerâmicas arqueológicas da Amazônia.
In: BARRETO, Cristiana; LIMA, Helena P. ; BETANCOURT, Carla J. (eds.). Cerâmicas arqueológicas da Amazônia: rumo a uma nova síntese 1. Belém: IPHAN/MPEG, 2016. p. 19-31.
LINHARES, Anna M. A. O simbolismo marajoara nos cuidados com o corpo. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v.15, n. 3, e20190127, 2020. Disponível em:10.1590/2178-2547-BGOELDI-2019-0127. Acesso em: 24 nov.
MCEWAN, Colin. 2001. Seats of Power. Axiality and Access to Invisible Worlds. In: Unknown Amazon: Nature and Culture in Ancient Brazil. MCEWAN, Colin; BARRETO, Cristiana, NEVES, Eduardo (eds.). London: British Museum Press, 2001. p. 176-95.
MEGGERS, Betty; EVANS, Clifford. Archaeological Investigations at the Mouth of the Amazon. Bureau of American Ethnology, Bulletin, v. 167. Smithsonian Institution Press, 1957.
MORDINI, Antonio. Contributo Allo Studio dell’Archeologia dell’Isola di Marajo. Il Nazionale, Revista di Studi Americani, Ano XIV, 479, 1936.
MORDINI, Antonio. L’ile de Marajó (bas Amazon): un probleme archeologique à resoudre. Actes ... Congrés International des Américanistes, 28e. Paris, 1947.
NETTO, Ladislau. Investigações sobre a arqueologia brasileira. Arquivos do Museu Nacional, v. 6, p. 257-554, 1885.
NEVES, Eduardo G. Sob os tempos do equinócio: oito mil anos de história na Amazônia Central. Ubu Editora, 2022.
NOBRE, Emerson. Objetos e imagens no Marajó antigo: agência e transformação na iconografia das tangas cerâmicas. Dissertação (Mestrado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2017.
NOBRE, Emerson. A sintaxe dos corpos compósitos: agência e transformação na iconografia das tangas cerâmicas marajoara.
Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 15, n. 3, e20190109, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2178-2547-BGOELDI-2019-0109. Acesso em: 24 nov. 2024.
OLIVEIRA, Erêndira. Potes que encantam: estilo e agência na cerâmica polícroma da Amazônia central. Dissertação (Mestrado em Arqueologia). Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2016.
OLIVEIRA, Erêndira. Estéticas da transformação: iconografia e estilo da cerâmica polícroma da Amazônia. Tese (Doutorado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2022.
OLIVEIRA, Erendira; NOBRE, Emerson; BARRETO, Cristiana. Arte, arqueologia e agência na Amazônia. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 15, n. 3, e20200111, 2020. Disponivel em: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2020-0111. Acesso em: 24 nov. 2024.
PALMATARY, H. C. The Pottery of Marajo Island, Brazil. In: Transactions of the American Philosophical Society, v. 39, n. 3, 1949.
PROUS, André. Tangas of the Marajó (Brazil): ornamental pubic covers, their typology and meaning. Antiquity, v. 87, n.. 337, p. 815-828, 2013.
PROUS, André; LIMA, A. Pessoa. De cobras e lagartos: as tangas marajoaras. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, Brasil, n. 21, p. 231–263, 2011. DOI: 10.11606/ issn.2448-1750.revmae.2011.89975. Disponível em: https://revistas.usp.br/revmae/article/view/89975. Acesso em: 26 nov. 2024.
ROOSEVELT, Anna C. Arqueologia amazônica. In: CARNEIRO DA CUNHA, Manuela (org.). História dos índios no Brasil . São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 53-86.
ROOSEVELT, Anna C. Moundbuilders of the Amazon: geophysical archaeology on Marajo Island, Brazil. San Diego: Academic Press, 1991.
ROOSEVELT, Anna C. Interpreting Certain Female Images inPrehistoric Art. In: Miller, V. (org). The role of gender in precolumbian art and architecture. Harvard: University Press, p.1-34, 1988.
SANTOS-GRANERO, F. (ed.), La vida oculta de las cosas: teorías indígenas de la materialidade y de la personeidad. Quito: Ediciones Abya-Yala, 2009a.
SANTOS-GRANERO, Fernando. Introduction: Amerindian Constructional Views of the World. In: SANTOS-GRANERO, Fernando (ed.). The occult life of things: native Amazonian theories ofmateriality and personhood. Tucson: University of Arizona Press, p. 1-29, 2009b.
SCHAAN, Denise P. A linguagem iconográfica da cerâmica marajoara. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1997.
SCHAAN, Denise P. Into the labyrinths of Marajoara pottery. Unknown Amazon: Nature and Culture in Ancient Brazil. MCEWAN, Colin; BARRETO, Cristiana, NEVES, Eduardo (Eds.). London: British Museum Press, 2001. p. 108-133.
SCHAAN, Denise P. A ceramista, seu pote e sua tanga: identidade e papéis sociais em um cacicado marajoara. Revista de Arqueologia, v. 16, p. 31-45, 2003.
SCHAAN, Denise P. The camutins chiefdom: rise and development of social complexity on Marajó Island, Brazilian Amazon. Tese (Doutorado) - Universidade de Pittsburgh, Pittsburgh, 2004.
SCHAAN, Denise P. A arte da cerâmica marajoara: encontros entre o passado e o presente. Revista Habitus - Revista do Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia, Goiânia, Brasil, v. 5, n. 1, p. 99–117, 2008. DOI: 10.18224/hab.
v5.1.2007.99-117. Disponível em: https://seer.pucgoias.edu.br/index.php/habitus/article/view/380. Acesso em: 25 nov. 2024.
SCHAAN, Denise P. Cultura marajoara. São Paulo: Ed. Senac e Fecomércio/PA, 2009.
SEVERI, Carlo; LAGROU, Els. Quimeras em diálogo: grafismo e figuração nas artes indígenas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2013.
SOARES, Dé L. Trabajando con huacos: curanderismo, huaque e cerâmica arqueológica na Costa Norte peruana. Tese (Doutorado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2022.
STEERE, Joseph B. The Archaeology of the Amazon. University of Michigan Official publications, V. 29, n. 2, p. 20-26, 1927.
TROUFFLARD, Joanna. Testemunhos funerários da ilha do Marajó no Museu Dr. Santos Rocha e no Museu Nacional de Etnologia - Interpretação arqueológica. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Nova de Lisboa, Portugal, 2010.
Troufflard, Joanna. Abordagem da prática colecionista através de um conjunto de peças Marajoara do Museu Nacional de Etnologia em Lisboa (Portugal). Amazônica-Revista de Antropologia, v. 3, n. 1, p. 142-168, 2011.
URBINA, Fernando. El Hombre Sentado: Mitos, Ritos Y Petroglifos En El Río Caquetá. Boletim Museo Del Oro, v. 36, p. 66-111, 1994.
VAN VELTHEM, Lúcia. H. A pele de Tuluperê: uma etnografia dos trançados Wayana. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi. 1998.
VAN VELTHEM, Lúcia. H.. Mulheres de cera, argila e arumã: princípios criativos e fabricação material entre os Wayana. Mana, v.15, n. 1, p. 213-236, 2009.
VILAÇA, Aparecida. Comendo como gente: formas do canibalismo wari. Ed. UFRJ, Rio de Janeiro, 1992.
VILAÇA, Aparecida. Paletó e eu: memórias de meu pai indígena. 1. ed. São Paulo: Todavia, 2018.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Araweté: os deuses canibais. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 1986.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac & Naify 5, 2002.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Categorias
Licença
Copyright (c) 2025 Daiana Travassos Alves, Erêndira Oliveira

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Os(as) autor(es/as) que publicam na Revista Hawò são os responsáveis pelo conteúdo dos artigos assinados e detém os direitos autorais. Concedem à revista, o direito de primeira publicação com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial (Open Archives Iniciative - OAI). Esse recurso, utilizado para periódicos de acesso aberto, permite o compartilhamento do trabalho para fins não comerciais com reconhecimento da autoria. Caso o texto venha a ser publicado posteriormente em outro veículo, o autor deverá informar que o mesmo foi originalmente publicado como artigo na revista Hawò. Assim sendo, ainda que a revista seja detentora da primeira publicação, é reservado aos autores o direito de publicar seus trabalhos em repositórios institucionais ou em suas páginas pessoais, mesmo que o processo editorial não tenha sido finalizado.
É reservado à revista, o direito de realizar alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical visando manter o padrão de língua, respeitando-se, porém, o estilo dos autores.



