Cheikh Anta Diop e Raymond Mauny

Fronteiras Intelectuais e Disputa Epistêmica na Gênese dos Estudos Africanos (1940-1960)

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5216/rth.v27i2.80086

Palavras-chave:

Estudos africanos, historiografia africana, eurocentrismo, afrocentrismo, disputa epistêmica

Resumo

Na constituição do campo disciplinar dos estudos africanos de língua francesa na Europa e na África, os nomes de Cheikh Anta Diop (1923-1986) e Raymond Mauny (1912-1994) são referenciais de duas distintas tendências interpretativas, embora suas trajetórias tenham se desenvolvido em um mesmo cenário intelectual. No primeiro caso, encontramos um acadêmico com formação especializada e experiência de campo na África Ocidental, cujo trabalho foi amplamente reconhecido por seus pares, tendo exercido autoridade e influência na criação de linhas de investigação tanto no Senegal quanto na França. No segundo caso, encontramos um pesquisador com sólida formação teórica, que adotou uma perspectiva contestatória em relação aos cânones acadêmicos e foi fundador de alternativas afrocentradas de interpretação científica. O presente artigo busca demonstrar, em perspectiva comparada, a evolução das respectivas carreiras acadêmicas desses dois intelectuais de referência que, embora ocupassem posições sociais, intelectuais e políticas diversas, circularam pelos mesmos cenários urbanos, culturais e intelectuais em Dakar e em Paris durante os anos de 1940 a 1960, e transitaram pelos mesmos espaços e instituições de pesquisa, como o I.F.A.N. e a  Universidade de Sorbonne. Contudo, essas trajetórias se deram em condições e posições desiguais e divergentes: um, como intelectual europeu branco na África, e o outro, como intelectual africano negro na Europa. A hipótese norteadora deste estudo é que ambos, cada um a seu modo, carregaram consigo as marcas do colonialismo e do racismo.

Biografia do Autor

José Rivair Macedo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil, joserivairmacedo@gmail.com

CV: http://lattes.cnpq.br/7747731188919060

Referências

AGAI, Jock Matthew. Samuel Johnson on the egyptian origin of the yoruba. Thesis (Doctor of Philosophy). University of Kwazulu-Natal, Durban, 2016.

ASANTE, Molefi Kete. Cheikh Anta Diop. In: AKYEAMPONG, Emmanuel K.; GATES JR., Henry Louis (Orgs.). Dictionary of African biography. Oxford: Oxford University Press, 2012, v. 2, p. 214-217.

BAH, Thierno Moctar. Historiographie africaine – Afrique de l’Ouest, Afrique centrale. Dakar: CODESRIA, 2015.

BALANDIER, Georges. A situação colonial: uma abordagem teórica (1951). In: SANCHES, Manuela Ribeiro (Org.). Malhas que os impérios tecem: textos anti-coloniais, contextos pós-coloniais. Lisboa: Edições 70, 2011, p. 219-252.

BARBOSA, Muryatan Santana. A África por ela mesma: a perspectiva africana na História Geral da África (UNESCO). Tese (Doutorado em História), FFLCH-USP, São Paulo, 2012.

BIANCHINI, Pascal. École et politique en Afrique Noire. Paris: Karthala, 2004.

BIYOGO, Grégoire. Aux sources egyptiennes du savoir. v. 2 – Système et anti-système: Cheikh Anta Diop et la destruction du logos Classique. S/local: Éditions Menaibuc, 2002,

BOCOUM, hamady; BECKER, Charles. L’Afrique Occidentale Française et la recherche archéologique. In: Colloque L’AOF: esquisse d’une integration africaine (Dakar, 16-23 juin 1995). Dakar: Direction des Archives du Senegal, 1995, p. 1-24.

BOULEGUE, Jean. Raymond Mauny (necrologie). Revue Française d’Histoire d’Autre Mer, Paris, t. 81 n. 305, p. 501-502, 1994.

BRASSEUR, Gérard. Raymond Mauny. In: DEVISSE, Jean; BRASSEUR, Gérard (Orgs.). Le sol, la parole et l’écrit: mélanges em hommage a Raymond Mauny. t. I. Paris: Société Française d’Histoire d’Autre Mer, 1981, p. 01-03.

BRITO, Alan Alves et alii. História (in)visíveis nas ciências. I. cheikh Anta Diop: um corpo negro na física. Revista da ABPN, v. 12, n. 31, 2020. Disponível em http://abpnrevista.org.br/revista/index.php/revistaabpn1/article/view/791 Acesso em 03/03/2020.

BRITO, Mário Eugênio Evangelista Silva. Por uma descolonização da história: a historiografia africana da década de 1950, Kenneth Onwuka Dike e Cheikh Anta Diop. Dissertação (Mestrado em História). PPG em História – UFG, Goiânia, 2015.

CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre o colonialismo. Lisboa: Livraria Sá da Costa, 1978.

CHEZNEAUX, Jean. Devemos fazer tábula rasa do passado? A propósito da história e dos historiadores. São Paulo: Editora Ática, 1995.

CRESSENT, Armelle. Cheikh Anta Diop vu de France: épistemologie d’une police de frontiéres intellectuelles. In: MANDÉ, Issiaka; STENFENSON, Blandine (éds). Les historiens africains et la mondialisation (Actes du III Congrès International des Historiens Africains, Bamako, 2001). Paris; Bamako: AHA-Karthala-ASHIMA, 2005, p. 329-342.

DELAFOSSE, Maurice. Sur les traces problables de civilisation egyptienne et d’hommes de race blanche à la côte d’Ivoire. Paris: Masson & Cie. Editeurs, 1901.

DIENG, Amady Aly. Hommage a Cheikh Anta Diop. Un bilan critique de l’Oeuvre de Cheikh Anta Diop. Canadian Journal of African Studies/Revue Canadienne des Études Africaines, Ottawa, v. 23 n. 1, p. 151-157, 1989.

DIOP, Cheikh Anta. L’Afrique noire précoloniale. Étude compare des systèmes politiques et sociaux de l’Europe et d’Afrique Noire, de l’Antiquité a la formation des Etats modernes. 2ª édition. Paris: Présence Africaine, 1987 (or. 1960).

DIOP, Cheikh Anta. Origens dos antigos egípcios. In: MOKHTAR, Gamal (coord.). A África antiga. Brasília: UNESCO; SECADI-MEC; UFSCAAR, 2011, p. 1-37 (Coleção - História Geral da África, v. 2).

DIOP, Cheikh Anta. Anteriorité des civilisations africaines: mythe ou verité historique?. Paris: Presence Africaine, 1967.

DIOP, Cheikh Anta. Le laboratoire du radiocarbone de l'I.F.A.N.. Dakar: I.F.A.N., 1968.

DIOP, Cheikh Anta. Nations nègres et culture: de l’Antiquité nègre egyptienne aux problèmes culturels de l’Afrique Noire d’aujourd’hui. Paris: Presence Africaine, 1979 (or. 1954).

DIOP, Cheikh M’Backe. Cheikh Anta Diop: o homem e a obra. In: DIOP, Boubacar Mbaye; DIENG, Doudou (Orgs.). A consciência histórica africana. Mangualde: Edições Pedagô; Luanda: Edições Mulemba, 2012, p. 87-110.

DULUQ, Sophie. Écrire l’histoire de l’Afrique à l’époque coloniale. Paris: Karthala, 2009.

ELA, Jean-Marc. Cheikh Anta Diop ou a honra do pensar. Mangualde; Luanda: Edições Pedagô; Edições Mulemba, 2012.

FAUVELLE, François-Xavier. Cheikh Anta Diop, l’Egypt et l’identité africaine. Politique Africaine, Paris, nº 62, p. 103-109, 1996.

FAUVELLE-AYMAR, François-Xavier. La correspondance entre Raymond Mauny et Wladislaw Filipowiack au sujet de la fouille de Niani (Guinée), capitale supposé de l’empire medieval du Mali. In: IDEM; HIRSCH, Bertrand (Dirs.). Les ruses de l’historien. Essais d’Afrique et d’ailleurs en hommage a Jean Boulegue. Paris: Karthala, 2013, p. 331-355.

FOGOU, Anatole. Histoire, conscience historique et devenir de l’Afrique: revisiter l’historiographie diopienne. Fondation Maison des Sciences de l’Homme, n. 60, 2013. Disponível online: https://wpfmsh.hypotheses.org/445 (acesso em 12/12/2019).

FONKOUÉ, Jean. Cheikh Anta Diop au carrefour des historiographies. Paris: L’Hamattan, 2004.

FONKOUÉ, Jean. Remarques sur le comparatisme dans l’oeuvre de Cheikh Anta Diop. Presence Africaine, Paris, n. 171, 2005, p. 111-118.

FRANKENBERG, Ruth. A miragem de uma branquidade não marcada. In: WARE, Ron (org). Branquidade: identidade branca e multiculturalismo. Rio de Janeiro: Editora Garamond, 2004, p. 307-338.

FROMENT, Alain. Origine et évolution de l’homme dans la pensée de Cheikh Anta Diop: une analyse critique. Cahiers d’Études Africaines, Paris, v. 31 n. 121-122, p. 29-64, 1991.

GALITZINE-LOUMPET, Alexandra. “Le passé indefini: du precolonial en Afrique subsaharienne”. Les Nouvelles de l’Archéologie, Paris, n. 126, p. 18-23, 2011.

GNONSEA, Doue. Cheikh Anta Diop et Théophile Obenga: combats pour la renaissance africaine. Paris: L’Harmattan, 2003.

HEUSCH, Luc de. Le rayonnement de l’Egypt antique dans l’Art et la mythologie de l’Afrique occidentale. Journal de la Société des Africanistes, Paris, t. 28, p. 91-109, 1958.

LAM, Aboubacar Moussa. Les migrations entre le Nil et le Senegal: les jalons de Yoro Dyâo. Annales de la Faculté des Lettres et Sciences Humaines (Université Cheikh Anta Diop), Dakar, n. 21, p. 117-139, 1991.

LAMY, Jêrome. Savoirs militants: essai de définition historique et sociologique. Cahiers d’Histoire: revue d’histoire critique, Paris, n. 138, p. 15-39, 2018.

MAUNY, Raymond. Archéologie du pays yoruba et du Bas-Niger. Notes Africaines: Bulletin d’Information et de Correspondence de l’Intitut Français d’Afrique Noire , Dakar, n. 56, p. 97-115, 952.

MAUNY, Raymond. Du nouveau sur la prehistoire et l’Archeologie de l’Aouker et du Hodh (Mauritanie). Bulletin de la Société Prehistorique de France, Paris, t. 48, n. 1-2, p. 78-83, 1951.

MAUNY, Raymond. Eustache Delafosse – Voyage à la Côte de Guinée, au Portugal et à Espagne. Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Bissau, n. 14, p. 181-195, 1949.

MAUNY, Raymond. La contribution de l’I.F.A.N. pour l’histoire de la decouverte portugaise. In: VVAA. Congresso Internacional de História dos descobrimentos (Actas). Lisboa: Comissão Executiva das Comemorações do V Centenário da morte do Infante Dom Henrique, 1961, p. 415-420.

MAUNY, Raymond. Le Centre de Recherches Africaines de la Sorbonne. Bulletin de l’I.F.A.N. , Dakar, t. XXVI, n. 1-2, p. 271-273, 1964.

MAUNY, Raymond. Nations nègres et culture; Les intellectuels doivent étudier le passé non pour s’y complaire mais pour y puiser des leçons; Afrique Noire precoloniale. Bulletin de l’I.F.A.N., Dakar, t. XXII, n. 3-4, p. 544-555, 1960.

MAUNY, Raymond. Notes on the Sofala-Zimbabwe problem. The South-African Archaeological Bulletin, Cape Town, v. 14, n. 53, p. 18-20, 1959.

MAUNY, Raymond. Les navigations médiévales sur les côtes sahariens antèrieures à la découverte portugaise. Lisboa: Centro de Estudos Ultramarinos, 1960.

MAUREL, Chloé. L’Histoire Générale de l’Afrique de l’UNESCO: un project de cooperation intellectuelle transnationale d’esprit afro-centré (1964-1999). Cahiers d’Études Africaines, Paris, n. 215, p. 715-737, 2014.

MICHEL, Marc. Défense et illustration de l’historiographie française de l’Afrique Noire (c. 1960-1995). Revue Française d’Histoire d’Autre Mer , Paris, t. 84, p. 83-92, 1997.

MONIOT, Henri. L’Afrique de Cheikh Anta Diop. Histoire et ideologie (François-Xavier Fauvelle). Revue Française d’Histoire d’Autre Mer, Paris, t. 86, p. 361-365, 1999.

MONIOT, Henri. Tableau Geographique de l’Ouest Africain au Moyen Age d’après les sources écrites, la tradition et l’Archéologie (Raymond Mauny). Annales E.S.C., Paris, ano 17, n. 6, p. 1231-1235, 1962.

MUDIMBE, V. Y. A invenção da África: filosofia, gnose e a ordem do conhecimento. Mangualde: Edições Pedagô; Luanda: Edições Mulemba, 2013.

NDIAYE, Saliou. Lapport de Cheikh Anta Diop à l’historiographie africaine. Africa: Rivista trimestral di studi e documentazione dell’Istituto Italiano per l’Africa e l’Oriente, Roma, v. 54 n. 2, p. 231-243, 1999.

NZIEM, Ndaywel. La quete des antiquités et l’avenir de l’Afrique. Une nouvelle lecture de Cheikh Anta Diop et Theophile Obenga. Africa: Rivista trimestral di studi e documentazione dell’Istituto Italiano per l’Africa e l’Oriente, Roma, v. 50 n. 2, p. 249-264, 1995.

OBENGA, Theophile. O sentido da luta contra o africanismo eurocentrista. Mangualde; Luanda: Edições Pedagô; Edições Mulemba, 2013.

PÉHAUT, Yves. L’Ouest africain au Moyen Age. Cahiers d’Autre Mer, Paris, n. 60, p. 407-414, 1962.

SAGREDO, Raisa. Miradas afrocentristas em torno da africanização do Egito antigo: entre racialização e identidades. Faces da história, Assis, v. 4 n. 2, p. 06-27, 2017.

SANDERS, Edith. The hamitic hyphotesis: its origins and functions in time perspective. Journal of African History, Cambridge, v. 10 n. 4, p. 521-532, 1969.

SANOGO, Kléna; COULIBALY, Nafogo. La problematique des ‘tumuli pierriers’ au Mali. Afrique: Archéologie & Arts, Paris, v. 9, p. 107-112, 2013.

SECK, Ibrahima. Esclavage et traite des esclaves dans les manuels de l’enseignement secondaire du Sénégal. Afrika Zamani, Dakar, n. 15-16, p. 99-124, 2007-2008.

SHAW, Turstan. Ife and Raymond Mauny. In: DEVISSE, Jean; BRASSEUR, Gérard (Orgs.). Le sol, la parole et l’écrit: mélanges em hommage a Raymond Mauny. Paris: Société Française d’Histoire d’Autre Mer, 1981, t. I, p. 109-135.

STOKES, Eric. The Dakar Seminar on ethno-history. Journal of African History, Cambridge, v. 6 n 2, p. 233-235, 1965.

THOMAS, Louis-Vincent. De quelques atitudes africaines em matière d’histoire locale (Introduction à une psycho-sociologie de la connaissane historique). In: VANSINA, Jan; MAUNY, Raymond; THOMAS, Louis-Vincent (Eds.). The historian and tropical Africa (Studies presented and discussed at the fourth international African Seminar at the University of Dakar, Senegal, 1961). London: New York: Routledge, 2018 (or. 1964), p. 358-374.

TINE, Antoine. Leopold Senghor et Cheikh Anta Diop face au panafricanisme: deux intellectuels, memes combats mais conflicts d’ideologies? In: BAH, Thierno (Org.). Intellectuels, nationalisme et ideal panafricain. Dakar: CODESRIA, 2005.

VANSINA, Jan; MAUNY, Raymond; THOMAS, Louis-Vincent (eds.). The historian and tropical Africa (Studies presented and discussed at the fourth international African Seminar at the University of Dakar, Senegal, 1961). London: New York: Routledge, 2018 (or. 1964).

Downloads

Publicado

2025-02-02

Como Citar

MACEDO, J. R. Cheikh Anta Diop e Raymond Mauny: Fronteiras Intelectuais e Disputa Epistêmica na Gênese dos Estudos Africanos (1940-1960). Revista de Teoria da História, Goiânia, v. 27, n. 2, p. 23–40, 2025. DOI: 10.5216/rth.v27i2.80086. Disponível em: https://revistas.ufg.br/teoria/article/view/80086. Acesso em: 15 abr. 2025.