MEMÓRIA E VERDADE NA TRANSIÇÃO DEMOCRÁTICA BRASILEIRA: O EMBLEMÁTICO FILME A FREIRA E A TORTURA (1983), DE OZUALDO CANDEIAS - DOI: http://dx.doi.org/10.5216/rfd.v41i3.47160
DOI:
https://doi.org/10.5216/rfd.v41i3.47160Palavras-chave:
justiça de transição, memória, religiosas, cinemaResumo
Resumo: Este artigo parte do conceito Justiça de transição, especificamente de seu pilar Memória e Verdade, no contexto de transição democrática no Brasil, para destacar a relevância do cinema nacional quanto à problematização da memória sobre o passado de ditadura civil-militar no país (1964-1985). Analisa-se o filme A freira e a tortura, de Ozualdo Candeias, lançado em 1983, que, ambientado nos anos 1970, mostra a repressão às religiosas em instâncias do Estado de exceção – em que direitos foram suspensos e outros violados. Considera-se que esse longa-metragem, de ficção, integra a produção conflitiva de memórias que se realiza no país, desde o início da abertura política (1974), para enfrentar o passado de ditadura – marcado pela violência perpetrada pelo Estado. Observa-se que a despeito de suas ambiguidades e contradições, o artefato cultural estabelece uma visão menos conciliadora sobre aquele processo político, desvelando, isto sim, o autoritarismo e a violência política do período, inclusive a violência de gênero.
Abstract: This article is based on the concept of Transitional Justice, specifically its pillar Memory and Truth, in the context of democratic transition in Brazil, in order to highlight the relevance of national cinema to the problematization of memory about the past of civil-military dictatorship in Brazil (1964-1985). In particular, we analyze the film A Freira e a tortura by Ozualdo Candeias, released in 1983, which, set in the 1970s, shows the repression of women religious in the instances of the State of exception, where rights have been suspended and others violated. It is considered that this film, fiction, integrates the conflictive production of memories that takes place in the country, from the beginning of the political opening (1974), to face the past of dictatorship - marked by the violence perpetrated by the State. It is observed that, despite its ambiguities and contradictions, the cultural artifact establishes a less conciliatory vision about that process of dictatorship, revealing, rather, authoritarianism and political violence of the period, including gender violence.
Downloads
Referências
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. São Paulo: Boitempo, 2004.
ANDRADE, Jorge. Milagre na Cela. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
ARANTES, Luis Humberto Martins. Entre o texto e a tela: apontamentos acerca de Milagre na cela de Jorge Andrade e A freira e a tortura de Ozualdo Candeias. Revista Ouvirouver, n º 5, pp. 77-83, 2009.
ARAÚJO, Maria Paula. Comissões de verdade: um debate ético-político na contemporaneidade. In: FICO, Calos; ARAUJO, Maria Paula; GRIN, Monica (orgs). Violência na História: memória, trauma e reparação. Rio de Janeiro: Ponteio, 2012, pp. 145-162.
ASSIS, Denise. Imaculada. Rio de Janeiro: Topbooks, 2013.
BARBOSA, Marco Antonio R.; VANNUCHI, Paulo. Resgate da memória e da verdade: um direito de todos. In: SOARES, Inês Virginia; KISHI, Sandra. Memória e verdade: a justiça de transição no Estado democrático brasileiro. Belo Horizonte: Forum, 2009.
BERNARDET, JEAN-CLAUDE. Cinema marginal? In: PUPPO, Eugênio (org.) Cinema marginal brasileiro: filmes produzidos nos anos 60 e 70. s/L: Heco produções, 2004, pp. 12- 16.
BRITO, Alexandra Barahona de; FERNANDEZ, Paloma Aguilar; ENRIQUEZ, Carmen Gonzalez (eds). Introducción. In: ___________. Las políticas hacia el pasado: juicios, depuraciones, perdón y olvido en las nuevas democracias. Madrid: Ediciones Istmo, 2002. pp. 29-70.
______. “Justiça transicional” em câmera lenta: o caso do Brasil. In: PINTO, António; MARTINHO, Francisco Carlos Palomanes (orgs). O pasado que não passa: a sombra das ditaduras na Europa do Sul e na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013, pp. 235-260.
CAVALCANTE, Alcilene. A representação do passado nas telas: os discursos históricos em filmes de Bemberg e Yamasaki. In: AMANCIO, Tonico (org.). Argentina-Brasil no cinema: diálogos. Niterói: Editora da UFF, 2014, pp. 57-77.
CALVEIRO, Pilar. Poder e desaparecimento: os campos de concentração na Argentina. São Paulo: Boitempo, 2013.
CUBAS, Caroline. Freiras em movimentos de resistência às ditaduras militares na América Latina. Revista Eletrônica da ANPHLAC, nº. 18, p. 139-161, jan./jul. 2015.
______. Do hábito ao ato: vida religiosa feminina ativa no Brasil (1960-1985). Tese de doutorado apresentada ao PPG em História da UFSC, 2014.
CUEVA, Eduardo González. Perspectivas teóricas sobre la justicia transicional. In: Seminario “Peru 1980-2000: El reto de la verdad y la justicia” Lima: Asociación Pro Derechos Humanos y la Coordinadora Nacional de Derechos Humanos, 2001.
DELGADO, Lucília Neves. Catolicismo: direitos sociais e direitos humanos (1960-1970). In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília (orgs). O tempo da ditadura: regime militar e movimentos sociais em fins do século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, pp. 93-132 (O Brasil Republicano 4).
FICO, Carlos. Prezada Censura: cartas ao regime militar. TOPOI - Revista de História, Rio de Janeiro, v. 5, p. 251-286, 2002.
______. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. In: Revista Brasileira de História. São Paulo, v.24, n.47, p.29-60, 2004.
______; ARAUJO, Maria Paula; GRIN, Monica (orgs). Violência na História: memória, trauma e reparação. Rio de Janeiro: Ponteio, 2012. pp. 25-38.
FILMER LE PASSE: Les traces et la mémoire; No pasaran! Albulll souvenir. Paris, L' Harmattan, 2003.
FOUCAULT, Michel. Estética: literature e pintura, música e cinema. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006 (Ditos e escritos: III).
GAGNEBIN, Jeanne Marie. O preço de uma reconciliação extorquida. In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs). O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010, pp. 177-186.
JOFFILY, Mariana. A diferença na igualdade: gênero e repressão política nas ditaduras militares do Brasil e da Argentina. Dossiê gênero, feminismo e ditaduras, Ano X, n. 21, pp. 78-88, 2º. Semestre 2009.
LEONE, Matilde. Sombras da repressão: o outono de Maurina Borges. Petrópolis: Ed Vozes, 1998.
MEZAROBBA, Glenda. O processo de acerto de contas e a lógica do arbítrio. In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs). O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010, pp. 109-122.
NAPOLITANO, Marcos. Recordar é vencer: as dinâmicas e vicissitudes da construção da memória sobre o regime militar brasileiro. Antíteses, Londrina, v. 8, n. 15esp., p. 09-44, nov. 2015.
PADRÓS, Enrique Serra. Usos da Memória e do Esquecimento na História. Letras, Santa Maria, n° 22, jan/jun., pp.79-85, 2001.
PIOVESAN, Flávia. Direito internacional dos direitos humanos e lei de anistia. In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs). O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010, pp. 91-108.
POLLACK, Michael. Memória, esquecimento e silencio. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol 2. nº 3, pp. 3-15, 1989.
QUINALHA, Renan. Justiça de transição: contornos do conceito. São Paulo: Expressão popular, 2013.
PEDRO, Joana Maria; VEIGA, Ana. Gênero. In: COLLING, Ana; TEDESCHI, Losandro. Dicionário crítico de gênero. Dourados, MS: Ed. UFGD, 2015, pp. 304-308.
REIS FILHO, Daniel Aarão. Ditadura e democracia no Brasil: do golpe de 1964 à Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
ROUSSO, Henry. Face au passé: essais sur la mémoire contemporaine. Paris, Belin, 2016a.
______. A última catástrofe: a história, o presente, o contemporâneo. Trad. Fernando Coelho, Fabrício Coelho. Rio de Janeiro: FGV Editorial, 2016b.
RUIZ, Castor Bartomé. Introdução. In: ___(org.) Justiça e memória: para uma crítica ética da violência. São Leopoldo/RS: Editora da Unisinos, 2009, pp. 7-16.
SECRETARIA ESPECIAL DE DIREITOS HUMANOS. Presidência da República. Direito à Memória e à Verdade. Disponível em http://www1.direitoshumanos.gov.br/mortosedesap/id_livro. Acessado em: 21 Dez. 2011.
SAFFIOTI, Heleieth. Gênero, patriarcado, violência. São Paulo: Editora da Fund. Perseu Abramo, 2004.
SILVA, Alexandre G.; VIEIRA, José Ribas. Justiça transicional, direitos humanos e a seletividade do ativismo judicial no Brasil. Revista Anistia Política e Justiça de Transição/Ministério da Justiça, nº 2, jul/dez, pp. 234-267, Brasília: Ministério da Justiça, 2009.
SILVA FILHO, José Carlos Moreira. O anjo da história e a memória das vítimas: o caso da ditadura militar no Brasil. In: RUIZ, Castor Bartomé (org). Justiça e memória: para uma crítica ética da violência. São Leopoldo/RS: Editora da Unisinos, 2009, pp. 121-158.
TOSI, Giuseppe; SILVA, Jair Pessoa de Albuquerque. A justiça de transição no Brasil e o processo de democratização in: ___. Justiça de transição: direito à justiça, à memória e à verdade. João Pessoa: Editora da UFPB, 2014, pp. 41-62.
TEITEL, Ruti. Transitional Justice Genealogy. Harvard Human Rights Journal, Cambridge, MA, vol. 16, pp. 69-94, 2003.
TELES, Angela. Ozualdo Candeias na boca do lixo: a estética da precariedade no cinema paulista. São Carlos: Educ: FAPESP, 2012.
UCHOA, Fábio. Perambulação, silêncio e erotismo nos filmes de Ozualdo Candeias (1967-1983). Tese de doutorado apresentada ao PPG em Ciências da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes da USP, 2013.
WORNAT, Olga; LEWIN, Mirian. Putas y guerrilleras. Buenos Aires: Planeta, 2014.
A Freira e a tortura (1983), de Ozualdo Candeia.
Portier de nuit (1974), de Liliana Cavani.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Os Autores que publicam nesta revista concedem à Revista da Faculdade de Direito da UFG uma licença mundial, sem royalties, sujeita aos termos e condições da Licença Jurídica Creative Commons Atribuição 3.0 Brasil Creative Commons Attribution License
Os autores concedem à RFD UFG todos os direitos autorais sobre os artigos nela publicados, que os mantêm com exclusividade até o advento de domínio público sobre os mesmos.