Resumo
O objetivo com esse trabalho foi avaliar, durante o período de diferimento, o crescimento e a senescência dos capins marandu, mavuno, ipyporã e mulato II. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com quatro repetições. O experimento foi repetido por dois anos (2020 e 2021). A taxa de aparecimento (TApF) e alongamento foliar (TAIF), a taxa de alongamento do colmo, a densidade populacional de perfilhos, as taxas de crescimento em nível de dossel, assim como a taxa de senescência foliar do dossel, foram superiores no início do que no fim do diferimento. A duração de vida da folha apresentou padrão de resposta inverso. Dentre as cultivares, o capim-mavuno apresentou maiores TApF e taxa de crescimento total do dossel, em relação aos demais. A TAIF e a taxa de crescimento foliar do dossel foram maiores nos capins mavuno e marandu, em relação aos capins mulato II e ipyporã. A taxa de alongamento do colmo foi maior nos capins mavuno e ipyporã, em comparação aos capins mulato II e marandu. De modo geral, a taxa de crescimento dos perfilhos individuais e do dossel durante o período de diferimento decresce na seguinte sequência: capim-mavuno > capim-marandu > capim-ipyporã > capim-mulato II.
Abstract
The objective of this study was to evaluate, during the stockpiling period, the growth and senescence of marandu, mavuno, ipyporã and mulato II grasses. The experimental design was completely randomized, with four replications. The experiment was repeated in 2 years (2020 and 2021). The leaf appearance (LApR) and elongation rate (LElR), stem elongation rate, tiller population density, growth rates at canopy level, as well as canopy leaf senescence rate showed higher values at the beginning in relation to the end of the stockpiling period. The leaf life span showed an inverse response pattern. Among the cultivars, mavuno grass presented the highest LApR and total canopy growth rate. The LElR and canopy leaf growth rate were higher in mavuno and marandu grasses than in mulato II and ipyporã grasses. The stem elongation rate was higher in mavuno and ipyporã grasses compared to mulatto II and marandu grasses. In general, the growth rate of individual tillers and canopy during the stockpiling period decreased in the following sequence: mavuno grass > marandu grass > ipyporã grass > mulatto II grass.
Keywords:
leaf growth; morphogenesis; stem elongation; tiller;
Urochloa
1. Introdução
Nos últimos anos, empresas públicas e privadas passaram a investir de forma mais significativa no melhoramento e liberação de novas cultivares de gramíneas forrageiras. No entanto, existe pouca ou nenhuma informação sobre o desenvolvimento dessas cultivares recentes em condições de pastagem de diferida. Essa estratégia consiste em retardar o uso da pastagem no final do período chuvoso, para obter um estoque de massa de forragem a ser utilizada, sob pastejo, no período seco do ano (1). Em geral, as gramíneas do gênero Urochloa são adequadas para o uso sob diferimento da pastagem, especialmente devido à sua menor altura natural e boa produção de forragem das gramíneas desse gênero no outono (2). Nesse sentido, o capim-marandu já foi devidamente avaliado em condições de diferimento (3). Os híbridos do gênero Urochloa podem ser gramíneas promissoras para o diferimento. No entanto, os híbridos liberados carecem de investigação sobre sua adequação para diferimento de pastagens.
O estudo comparativo de híbridos lançados no mercado nacional, como os capins ipyporã, mavuno e mulato II, com gramíneas forrageiras amplamente estudadas, como o capim marandu, permite compreender as possíveis aptidões das plantas forrageiras para uso em diferimento. Nesse contexto, a avaliação da morfogênese permite entender a geração e expansão dos órgãos aéreos da planta no espaço (4) ao longo do período de diferimento. A partir desses estudos de morfogênese, associados a avaliações da densidade populacional de perfilhos e da geração de fatores de conversão para colmo e lâminas foliares, objetivamos compreender a dinâmica de crescimento e senescência de folhas e colmos de gramíneas forrageiras sob diferimento (5,6).
Assim, nossa hipótese foi a de que existem diferenças no crescimento e senescência das gramíneas marandu, ipyporã, mavuno e mulato II quando diferidas. Portanto, este trabalho foi realizado com o objetivo de comparar os padrões de crescimento e senescência das gramíneas durante o período de diferimento e, assim, inferir sobre a adequação dessas gramíneas para uso em pastagem de diferidas.
2. Materiais e métodos
O trabalho de pesquisa foi realizado de outubro de 2019 a junho de 2021, período em que o mesmo experimento se repetiu por dois anos consecutivos (Ano 1, 2020; e Ano 2, 2021). O primeiro ano experimental correspondeu de outubro (2019) a junho (2020), e o segundo ano experimental de outubro (2020) a junho (2021). O experimento foi realizado na Fazenda Experimental Capim Branco, da Universidade Federal de Uberlândia, em Uberlândia, MG, Brasil (18°30' S; 47°50' W; 863 m de altitude). O clima da região é Aw, savana tropical, com inverno seco e verão quente e úmido (7). As informações referentes às condições climáticas durante o período experimental foram monitoradas na estação meteorológica localizada a aproximadamente 200 m da área experimental (Figura 1).
Temperaturas médias mensais e precipitação pluviométrica durante o período experimental de janeiro a junho de 2020 (A) e 2021 (B).
A temperatura e a precipitação pluviométrica mensal foram utilizadas para calcular o balanço hídrico do solo (8), considerando uma capacidade de armazenamento de água no solo de 50 mm (Figura 2).
A área experimental possui um terreno plano e o solo é classificado como Latossolo Vermelho Escuro (9). Em setembro de 2019 e 2020, amostras de solo foram coletadas da camada de 0 a 20 cm usando uma sonda para análise de fertilidade. Os resultados em 2019 foram: pH em (H2O): 6,1; P: 4,6 mg dm-3 (Mehlich-1); P rem: 10,1 mg dm-3; K: 100 mg dm-3; Ca2+: 5,1 cmolc dm-3; Mg2+: 2,1 cmolc dm-3; Al3+: 0 cmolc dm-3 (KCl 1 mol L-1); H + Al: 2,9 cmolc dm-3 e V: 72%. Em 2020, os resultados foram: pH em (H2O): 6,2; P: 23,2 mg dm-3 (Mehlich-1); P rem: 6,9 mg dm-3; K: 165 mg dm-3; Ca2+: 3,53 cmolc dm-3; Mg2+: 1,39 cmolc dm-3; Al3+: 0 cmolc dm-3 (KCl 1 mol L-1); H + Al: 1,74 cmolc dm-3 e V: 75%. Com base nos resultados dessas análises de solo, bem como das gramíneas forrageiras, não houve necessidade de calagem ou adubação potássica (10).
A adubação nitrogenada foi dividida em duas aplicações em cada um dos dois anos experimentais, em 21 de outubro e 19 de fevereiro, aplicando-se 50 kg ha-1 de N na forma de uréia de cada vez. A adubação fosfatada foi realizada em 21 de outubro de ambos os anos, com aplicação única de 50 kg ha-1 de P2O5 na forma de super-simples. Todas as adubações foram feitas no final da tarde e em cobertura.
A área experimental foi composta por 16 parcelas (unidades experimentais) de 12,25 m2 cada. O estabelecimento das gramíneas foi feito em 2018, com taxa de semeadura de 6,0 kg ha-1 de sementes com valor cultural de 64%. A profundidade de semeadura foi de 3 cm, e a semeadura foi feita com espaçamento de 30 cm entre linhas. Os tratamentos experimentais consistiram de quatro gramíneas forrageiras: Urochloa brizantha cv. Marandu e os híbridos de Urochloa Mulato II, Mavuno e Ipyporã. O experimento foi conduzido em delineamento inteiramente casualizado, com medidas repetidas ao longo do tempo e quatro repetições.
Tanto em outubro de 2019 quanto em setembro de 2020 (Ano 1 e 2, respectivamente), foi realizado um corte de uniformidade em todas as gramíneas forrageiras a uma altura de 5 cm, com todo o material cortado removido das parcelas. Posteriormente, as plantas continuaram a crescer até atingirem a altura de 30 cm. Essa altura foi mantida até março em ambos os anos, por meio de cortes semanais com tesouras de poda, para mimetizar uma condição de estado sob lotação contínua.
Em ambos os anos, o período de diferimento teve início em 9 de março e terminou em 9 de junho, totalizando 92 dias. Durante o período de diferimento, as plantas permaneceram em crescimento livre, sem cortes. Ao longo do período de diferimento, a morfogênese foi avaliada em dois ciclos de 45 dias, sendo o primeiro ciclo de avaliação (início do diferimento) de 9 de março a 23 de abril e o segundo ciclo (final do diferimento) de 24 de abril a 9 de junho. Em cada ciclo de avaliação, foram marcados seis perfilhos diferentes por parcela, espaçados aproximadamente 10 cm. Foram escolhidos novos perfilhos com pelo menos duas folhas expandidas e uma folha em expansão. Os perfilhos foram identificados com clipes plásticos numerados. No Ano 1, as medições para cada perfilho foram feitas a cada 15 dias devido à pandemia, para minimizar o contato entre os avaliadores durante esse período de isolamento, enquanto no Ano 2, as medições foram feitas semanalmente.
Usando uma régua graduada, foram feitas medições do comprimento das lâminas das folhas e do colmo dos perfilhos marcados. O comprimento das folhas expandidas foi medido da ponta da folha até sua lígula. No caso das folhas em expansão, o mesmo procedimento foi adotado, mas a lígula da última folha expandida foi considerada como referência para mensuração. Para folhas em senescência, o comprimento foi medido a partir da lígula da folha até onde o processo de senescência havia avançado. O tamanho do colmo foi medido como a distância da superfície do solo até a lígula da folha mais jovem totalmente expandida.
Com base na metodologia, foram calculadas as seguintes variáveis: taxa de aparecimento de folhas, taxa de alongamento do colmo, taxa de alongamento foliar e taxa de senescência foliar (soma a senescência da lâmina foliar dividida pelo período de avaliação de cada perfilho). Os valores dessas características foram apresentados como médias dos grupos de perfilhos e separadamente para cada ciclo de avaliação. O primeiro ciclo correspondeu ao início e o segundo ciclo ao final do período de diferimento (11). Para a avaliação da densidade populacional de perfilhos (DPP), os perfilhos basais e vivos foram contados dentro de um retângulo de 0,125 m2 em dois pontos de cada parcela no início, meio e final do período de diferimento. Os retângulos foram alocados em posição paralela às linhas de plantio.
Para expressar as taxas de crescimento e senescência das lâminas foliares e colmo no nível do dossel da forragem, no último dia de cada ciclo de avaliação morfogênica, 30 perfilhos por parcela foram colhidos no nível da superfície do solo. O comprimento das lâminas das foliares e colmos dos perfilhos foi medido de maneira semelhante ao feito no campo. Posteriormente, todas as lâminas foliares e bainhas das folhas foram separados e levados ao forno a 65°C por 72 horas. Após a secagem, os componentes morfológicos foram pesados e suas massas foram divididas por seus respectivos comprimentos totais. Dessa forma, foram obtidos fatores de conversão de lâminas foliares vivas (em mg.cm-1), que foram utilizados para transformar os valores obtidos a partir das leituras em campo (em cm.perfilho-1.dia-1) na unidade de mg.perfilho-1.dia-1. Este último valor foi multiplicado pela densidade populacional média de perfilhos vivos (perfilho.ha-1) para obter as taxas (em kg.ha-1.dia-1) de crescimento da lâmina foliar, do colmo e do total, bem como a taxa de senescência da lâmina foliar (5). É importante notar que a DPP utilizado na fase inicial de diferimento foi a média do DPP no início e no meio do período de diferimento, enquanto DPP para o período final de diferimento foi a média do DPP no meio e no final do período de diferimento.
Para a análise estatística, foram utilizados os dados médios dos dois ciclos de avaliação, utilizando-se o programa SAS 9.0 e o PROC ANOVA, com o valor das médias estimado pelo MEANS. As variáveis foram analisadas quanto aos pressupostos para distribuição normal. Dentre as variáveis resposta analisadas, três (comprimentos finais do colmo e lâmina foliar e número de folhas mortas por perfilho) precisaram ser transformadas para atender aos pressupostos da análise de variância. Para a comparação das médias, considerou-se um erro tipo I de 5%, e o teste de Tukey foi utilizado.
3. Resultados
Das dez variáveis respostas, 80% foram influenciadas pelas gramíneas forrageiras avaliadas; 60% apresentaram diferença entre os anos de avaliação e 90% foram influenciados pelo período de diferimento. A taxa de senescência foliar (TSeF) e a densidade populacional de perfilhos (DPP) foram influenciadas pela interação entre ano e período de diferimento. Além disso, as taxas de alongamento da folha (TAIF) e do colmo (TAIC) mostraram uma interação entre o período de diferimento e a gramínea forrageira. Com exceção da DPP, as demais características avaliadas no nível do dossel da forragem não foram influenciadas pelas interações entre os fatores avaliados (Tabela 1).
A duração de vida das folhas (DVF) e a taxa de senescência foliar (TSF) não variaram entre as gramíneas forrageiras (Tabela 2). No entanto, a taxa de aparecimento de folhas (TApF) foi maior no capim mavuno, em comparação com as demais gramíneas. Os capins Marandu e Mavuno apresentaram maiores taxas de alongamento foliar (TAIF), quando comparados aos capins mulato II e ipyporã. As taxas de alongamento do colmo (TAIC) dos capins mavuno e ipyporã foram superiores às dos capins marandu e mulato II. Para a taxa de senescência foliar (TSeF), o capim marandu apresentou maior valor em relação ao capim ipyporã, sendo que as demais gramíneas apresentaram valores semelhantes às demais gramíneas (Tabela 2). A densidade populacional de perfilhos (DPP) foi maior para o capim mulato II em comparação com o capim mavuno (Tabela 2).
Características morfogênicas de perfilhos individuais e taxas de crescimento e senescência dos dosséis das gramíneas marandu, mavuno, ipyporã e mulato II durante os dois anos de avaliação em dois períodos distintos, início e fim do diferimento
Em relação às características avaliadas em nível de dossel forrageiro, a taxa de acúmulo foliar (TAcF) foi maior nos capins mavuno e marandu, intermediária no capim mulato II e menor no capim ipyporã. A taxa de acúmulo de colmo (TAcC) foi maior no capim mavuno, intermediária no capim ipyporã e menor no capim mulato II, com o capim marandu apresentando valores semelhantes aos capins ipyporã e mulato II. Por fim, a taxa de acúmulo total (TAcT) foi maior no capim mavuno, intermediária no capim marandu e menor nos capins ipyporã e mulato II (Tabela 2).
As variáveis TAIC, TSeF e DVF não foram influenciadas pelo ano de avaliação (Tabela 2). No entanto, TApF, TAIF, DPP, TAcF, TAcC, TAcT e TSF apresentaram valores mais elevados no primeiro ano (2020) em comparação com o segundo (2021) (Tabela 2). Ao comparar os períodos inicial e final do diferimento, apenas o TSeF não foi influenciado por esse fator (Tabela 2). A DVF apresentou valores mais elevados ao final do período de diferimento, enquanto as demais variáveis apresentaram o padrão de resposta oposto (Tabela 2). TAIF e TAIC apresentaram interação entre período de diferimento e gramíneas forrageiras. A TAIF foi maior no início em relação ao final do diferimento, independentemente da gramínea forrageira. No entanto, apenas no período inicial os capins mavuno e marandu apresentaram valores superiores aos capins mulato II e ipyporã (Tabela 3).
Taxas de alongamento foliar e colmo no início e no final do período de diferimento, nos dois anos de avaliação das gramíneas Mavuno, Ipyporã, Marandu e Mulato II
ATAIC durante o início do período de diferimento foi superior para o capim Mavuno, em detrimento das demais gramíneas, sem diferença entre as gramíneas no período final do diferimento. Apenas o capim Mavuno apresentou maiorTAIC no início, em comparação com o final do diferimento (Tabela 3). A TSeF e o DPP foram influenciados pela interação entre o ano de avaliação e o período do diferimento. A TSeF foi maior no início, em comparação com o final do diferimento apenas no segundo ano (2021). Esse mesmo padrão de resposta ocorreu com a DPP no primeiro ano de avaliação (Tabela 4). Além disso, a DPP foi mais elevada em 2020 do que em 2021, independentemente do período de diferimento (Tabela 4).
Taxa de senescência foliar e densidade populacional de perfilhos de gramíneas forrageiras no início e no final do período de diferimento ao longo de dois anos experimentais
4. Discussão
A TApF (Taxa de Aparecimento de Folhas) foi superior no capim Mavuno, em relação às demais cultivares (Tabela 2). Esse resultado, associado à TAIF (Taxa de Alongamento Foliar) superior das gramíneas Mavuno e Marandu no início do período de diferimento (Tabela 3), enfatiza o alto potencial de crescimento dessas cultivares durante o outono, pois a TAIF é responsável pela formação do índice de área foliar (12) e tem alta correlação com a produção de forragem. Além disso, a TAIC (Taxa de Alongamento de Colmo) é superior no início do diferimento apenas para o capim Mavuno (Tabela 3), demonstra o maior potencial de crescimento dessa gramínea. De fato, quando avaliado no nível do dossel forrageiro, o capim-Mavuno apresentou TAcF, TAcT e TAcT superiores (Tabela 2).
Deve-se ressaltar que a magnitude dos valores de TAcF, TAcC e TAcT (Tabela 2) pode ter sido superestimada, devido à escolha de perfilhos mais jovens para a avaliação morfogênica. Sabe-se que os perfilhos mais jovens têm uma taxa de crescimento mais alta do que os perfilhos mais velhos (13). Nesse sentido, uma vez que a estimativa do crescimento dos dosséis forrageiros ocorreu com base nos valores de crescimento de perfilhos individuais a partir da avaliação morfogênica, pode ter ocorrido uma superestimação dos valores de TAcF,TAcC e TAcT. Como consequência da maior TAIF, os maiores valores de TAcC ocorreram nas gramíneas Mavuno e Marandu em 2020 (Tabela 3). De fato, o maior alongamento celular nos órgãos vegetais, principalmente no ano com clima mais predisponente ao crescimento da pastagem (2020), contribui para aumentar a produção desses órgãos (14). O alto TAcT do capim Mavuno pode ter aumentado o sombreamento dentro do dossel. Nessa condição, há uma TAIC maior, a fim de expor as folhas mais jovens na parte superior do dossel, onde a disponibilidade de luz é maior. Como resultado, a TAcC maior no capim Mavuno é natural (Tabela 2). No entanto, a TAcC do capim Ipyporã é a maior, depois do capim Mavuno, embora o capim Ipyporã tenha apresentado menor TAcF (Tabela 2). Esse fato ocorreu porque, durante o diferimento, grande parte dos perfilhos do capim-lpyporã floresceu, devido à sua época de floração (abril) coincidir com o período de diferimento. Com a floração, há a emissão gradual de folhas menores e também há maior alongamento do colmo para expor as sementes no extrato superior da pastagem, aumentando a probabilidade de sua dispersão (15).
O colmo é uma importante característica estrutural do dossel, pois interfere nos processos de competição pela luz(16) e no comportamento ingestivo dos animais em pastejo. Em geral, plantas maiores e mais produtivas têm colmos mais pesados e longos. Nesse sentido, a maior TAcC do capim Mavuno é consistente com seu alto potencial de crescimento, caracterizado por seus altos valores de TApF, TAIF e TAIC (Tabela 2).
A densidade populacional de perfilhos (DPP) foi 23,4% maior no capim Mulato II do que no capim Mavuno e os capins Ipyporã e Marandu apresentaram valores semelhantes aos demais (Tabela 2). A baixa TAcT do capim Mulato II (Tabela 2) resultou em menor altura no fim do diferimento. Como resultado, pode ter havido uma maior incidência de luz na base da planta, estimulando as gemas basais a se desenvolverem em novos perfilhos (17). Por outro lado, as maiores taxas de crescimento do capim Mavuno (Tabela 2) tendem a aumentar a altura e, consequentemente, o sombreamento dentro do dossel. Nessa condição, uma maior quantidade de assimilados é alocada para o crescimento dos perfilhos existentes, em detrimento do desenvolvimento de novos perfilhos em situação de sombreamento. Esse padrão também foi descrito,como um mecanismo de compensação de tamanho/densidade populacional para perfilhos, em que densidades populacionais mais altas estão associadas a perfilhos menores (16).
A menor TSeF (Taxa de Senescência Foliar) do capim-lpyporã, quando comparado ao capim Marandu, (Tabela 2), possivelmente se deve ao fato de o capim Ipyporã apresentar colmo mais fino e folhas mais estreitas (15), o que pode ter minimizado a competição por luz no interior do dossel, favorecendo que as folhas mais velhas e com menor nível de inserção no perfilho recebessem fotoassimilados suficientes para postergar a senescência foliar.
Com exceção da duração de vida das folhas (DVF), todas as outras variáveis apresentaram valores mais elevados no início em comparação com o final do período de diferimento. A maior TApF ocorreu no início do diferimento, devido à adubação realizada antes do diferimento. A adubação antes do diferimento aumenta a densidade populacional (DPP) e a participação relativa de perfilhos jovens no dossel, que apresentam maior TApF, em comparação com perfilhos velhos (18). Além disso, no início do diferimento, as condições ambientais eram favoráveis para o crescimento das plantas forrageiras (Figuras 1 2). Essas condições climáticas e de manejo favoráveis fizeram com que, no início do diferimento, houvesse maiores taxas de crescimento ao nível do dossel forrageiro (Tabela 2). Além disso, no início do período de diferimento, possivelmente os dosséis foram constituídos por uma maior porcentagem de perfilhos jovens, que apresentam maior taxa de crescimento (13,3). O crescimento mais ativo das gramíneas também desencadeia maior auto sombreamento dentro dos dosséis, o que justifica o maior TSF no início do período de diferimento (Tabela 2).
Além disso, de acordo com Alves et al. (18) e Brito et al. (3), a TAIF responde imediatamente às mudanças na temperatura do ambiente, de forma que a produção de tecidos acompanhe suas variações sazonais. Assim, à medida que as condições climáticas se tornaram mais limitantes do início ao final do período de diferimento, a TAIF (Tabela 3) e as taxas de crescimento avaliadas no nível do dossel da forragem (Tabela 2) foram menores.
A maior TAIF também ocorreu no período inicial de diferimento, concomitante com a maior TApF e TAIF, devido às melhores condições ambientais nesse período (Figura 1). Esse mesmo padrão de resposta foi encontrado (18) em pastagem de capim Marandu diferida. O aumento da densidade populacional de perfilhos no início do diferimento também pode aumentar a competição intraespecífica por luz e, como resultado, aumentar o alongamento do colmo. Além disso, como resultado da maior TAIC, maiores valores de TAcC foram encontrados no início do período de diferimento (Tabela 2).
A maior DVF ocorreu no final do diferimento, em resposta à intensificação da deficiência hídrica nesta época do ano (Figura 2), o que limita a absorção de nutrientes pela planta. Nessa condição, a maior DVF permite reter nutrientes na planta por mais tempo, aumentando sua conservação em uma situação de escassez de recursos nutricionais (16). A maior DVF em épocas com limitação de fatores de crescimento, como no final do período de diferimento e em 2021 (Figuras 1 2) justifica as menores taxas de senescência foliar, tanto no nível de perfilhos (TSeF), quanto no nível de dossel (TSF), no final do período de diferimento, em comparação ao período inicial em 2021 (Tabela 2).
Os maiores valores de taxa de aparecimento de folhas (TApF), taxa de alongamento foliar (TAIF), densidade populacional de perfilhos (DPP) e taxas de crescimento no nível do dossel da forragem (TAcF, TAcC e TAcT) ocorreram em 2020, em comparação com 2021, devido às condições climáticas mais limitantes no segundo ano, em comparação com o primeiro (Figura 3). De fato, a precipitação de março a junho (período de diferimento) foi 45,4% menor em 2021, em comparação com 2020, resultando em valores mais baixos para as características relacionadas ao crescimento das plantas. Nesse contexto, o déficit hídrico reduz o crescimento das plantas, pois depende, entre outros fatores, da ação física da água que entra nas células, resultando na expansão das estruturas das plantas (19).
O clima mais favorável para o crescimento das plantas justifica a maior DPP em 2020 do que em 2021, bem como os maiores valores de DPP no início em comparação com o final do período de diferimento em 2020, cerca de 31,3% maiores. Mas, em 2021, as condições climáticas foram mais limitantes ao crescimento das plantas desde o início do diferimento, razão pela qual não houve diferença na DPP entre os períodos de diferimento (Tabela 4). Os resultados deste trabalho indicam que o capim-Mavuno apresenta alto potencial para produção de forragem durante o período de diferimento (outono). No entanto, sua alta taxa de alongamento de colmo pode comprometer a estrutura da pastagem diferida, com efeito negativo no pastejo. Portanto, a redução do período de diferimento ou da altura da pastagem no início do diferimento pode ser realizada para mitigar o alongamento do colmo (20).
Depois do capim Mavuno, o capim Marandu também tem um alto potencial para a produção de folhas durante o período de diferimento. No caso do capim Ipyporã, sua intensa floração durante o diferimento resultou em alto crescimento do colmo e baixo crescimento foliar, razões pelas quais essa gramínea apresenta aparentes limitações para uso sob diferimento. Em geral, o capim Mulato II é uma opção adequada para diferimento, embora com menor potencial de crescimento, em comparação com os capins Mavuno e Marandu. Os resultados deste trabalho também demonstram que as magnitudes das respostas de crescimento dos perfilhos e dos dosséis forrageiras são fortemente dependentes das condições ambientais, que podem variar entre os anos e também ao longo do período de diferimento.
5. Conclusão
As gramíneas marandu, mavuno, ipyporã e mulato II apresentam aptidão para uso em diferimento, porém, quando diferidas, o capim mavuno apresenta maior taxa de crescimento de perfilhos e dossel forrageiro, seguido pelo capim marandu, em comparação com as gramíneas ipyporã e mulato II. O capim-ipyporã apresenta aparente limitação para uso sob diferimento, pois seus perfilhos apresentam maior crescimento de colmo e menor crescimento foliar durante o período de diferimento.
Declaração de disponibilidade de dados
Os dados serão fornecidos mediante solicitação ao autor correspondente.
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