DOI: 10.1590/1089-6891v18e-40460
ZOOTECNIA
CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA EM PASTOS DE CAPIM-MARANDU SUBMETIDOS A FREQUÊNCIAS DE DESFOLHAÇÃO E NÍVEIS DE ADUBAÇÃO
MORFOLOGIC CHARACTERIZATION ON MARANDU GRASS PASTURES SUBMITTED TO DEFOLIATION FREQUENCIES AND FERTILIZATION LEVELS
Jéssica Abreu de Sá Medica1*
Natani Silva Reis1
Manoel Eduardo Rozalino Santos1
1Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil.
*Autora para correspondência - jessicah.abreu@hotmail.com
Resumo
Os perfilhos são as unidades básicas de crescimento das gramíneas
forrageiras e o perfilhamento é responsável pela adaptação e
reestabelecimento da gramínea após a desfolhação. Portanto, é importante
conhecer as modificações morfológicas dos perfilhos em função do ambiente de
desfolhação e da adubação, duas importantes estratégias de manejo das
pastagens. Assim, objetivou-se com este trabalho caracterizar as respostas
morfológicas dos perfilhos do capim-marandu, em resposta à adubação e à
frequência de desfolhação, para melhor compreensão da plasticidade
fenotípica dessa planta. O trabalho foi realizado em dois anos
experimentais, em que foram avaliados distintos intervalos de corte (sete,
14, 28, 56 e 112 dias), utilizando-se o delineamento em blocos casualizados,
com quatro repetições. No segundo ano, além dos mesmos intervalos de corte
avaliados no primeiro ano, também foram estudadas duas condições de
adubação, sendo uma baixa (21,5 kg.ha-1 de P e 75 kg.ha-1
de N) e outra alta (43 kg.ha-1 de P e 300 kg.ha-1 de
N). No segundo ano, utilizou-se o esquema fatorial. Em ambos os anos, as
respostas para comprimento de colmo, comprimento da lâmina foliar, espaço
entre as lâminas foliares e área foliar e peso do perfilho foram crescentes
com o intervalo de corte. No segundo ano, a alta dose de adubos proporcionou
maior número de perfilhos vegetativos, espaço entre lâminas foliares, área
foliar, peso de perfilhos, folhas e colmos mais compridos, em comparação à
baixa dose de adubos. No segundo ano, houve maior densidade populacional de
perfilho reprodutivo com o maior intervalo de corte. A desfolhação e a
adubação nitrogenada e fosfatada causam modificações morfológicas nos
perfilhos do capim-marandu, indicando a ampla plasticidade fenotípica desta
gramínea.
Palavras-chave: fósforo; intervalo de corte; nitrogênio;
Urochloa brizantha.
Abstract
Tillers are the basic units of growth in forage grasses and tillering is
responsible for the adaptation and reestablishment of grass after
defoliation. Therefore, it is important to understand the morphological
changes of tillers due to defoliation environment and fertilization, which
are two important pasture management strategies. In this study, we aimed to
characterize the morfologic response of marandu grass tillers before
nitrogen fertilization and frequency of defoliation for a better
understanding of the phenotypic plasticity of this plant. This study was
carried out in two experimental years. The treatments in the first year
consisted of different cutting intervals (7, 14, 28, 56, and 112 days). In
the second year, besides the same cutting intervals, two fertilization
conditions were studied: a low level (21.5 kg.ha-1 P and 75 kg.ha-1
N) and a high level (43 kg.ha-1 P and 300 kg.ha-1 N).
A randomized block design was adopted and in experiment two a factorial
scheme with four repetitions was used. In both experiments the responses to
stem length, leaf blade length, space between leaf blade and leaf area, and
weight of tiller increased with cutting intervals. In experiment two, high
doses of fertilization provided larger number of vegetative tillers, space
between leaf blades, tiller weight, longer leaves and stems, and higher
population densities of reproductive tillers with longer cutting intervals.
In conclusion, the defoliation and the nitrogen and phosphorous
fertilization produced morphologic modifications in marandu grass tillers
suggesting the phenotypic plasticity of this grass.
Keywords: cutting interval; nitrogen; phosphorous;
Urochloa brizantha.
Recebido em: 28 março 2016
Aceito em: 17 outubro 2016
Introdução
O capim-marandu adapta-se à precipitação pluvial anual ao redor de 700 mm e
cerca de cinco meses de seca no inverno. Ele não suporta solos encharcados e
é recomendado para áreas de média a boa fertilidade de solo, embora tolere
acidez no solo(1). Quando adequadamente manejado, o capim-marandu
apresenta alta resposta à adubação e elevado potencial de produção de
forragem, de até 36 t/ha.ano de MS(2). Devido às suas
características, no Brasil, existem 60 milhões de hectares de pastagens
formadas com Urochloa brizantha cv. Marandu (capim-marandu), o que
representa 65% da área de pastagem cultivada na região Norte e 50% na região
Centro-Oeste(3).
O pasto é formado por uma população de perfilhos(4), considerados
unidades básicas de crescimento das gramíneas e constituídos de uma série de
fitômeros (lâmina foliar, bainha, lígula, nó, entrenó e gema axilar), os
quais se diferenciam a partir de um único meristema(5). Com o
pastejo ou o corte, a gramínea forrageira modifica a morfologia de seus
perfilhos. Nesse sentido, sob desfolhação severa, os perfilhos passam a ser
menores, mais leves e com órgãos (folhas e colmo) mais curtos(6).
Com essas modificações morfológicas, as lâminas foliares podem continuar se
desenvolvendo e realizar fotossíntese, sem que sejam acentuadamente
removidas pelo animal em pastejo. Desse modo, o perfilhamento e a
caracterização morfológica dos perfilhos individuais são essenciais para
compreender os fatores que interferem na produção de forragem e na estrutura
do dossel forrageiro(7).
A adubação, como a nitrogenada e a fosfatada, aumenta o crescimento dos
perfilhos, bem como o seu número, quando o pasto é mantido baixo(6).
Na presença do nitrogênio, ocorre maior taxa de aparecimento foliar(8)
e, com efeito, maior número de gemas axilares será produzida, podendo
originar novos perfilhos, caso a quantidade e a qualidade da luz incidente
sobre as mesmas sejam satisfatórias. Esses fatores fazem com que o pasto
aumente sua produção de forragem e alcance mais rapidamente a condição
adequada de desfolhação.
Diante do exposto, as modificações na frequência de desfolhação e na
disponibilidade de nutrientes no solo geram respostas adaptativas nas
plantas forrageiras que ocorrem por meio de modificações no seu
desenvolvimento, alterando sua morfologia. Dessa forma, objetivou-se neste
trabalho descrever algumas alterações morfológicas dos perfilhos do
capim-marandu sob diferentes níveis de adubação e frequências de
desfolhação, para melhor compreensão da plasticidade fenotípica dessa
importante gramínea forrageira.
Material e Métodos
Este trabalho foi conduzido em dois períodos: de outubro de 2013 até
fevereiro de 2014 e de novembro de 2014 até março de 2015. Em cada período,
experimentos independentes porém com natureza semelhante foram realizados.
Os dois experimentos, denominados de Experimento 1 e Experimento 2,
ocorreram em áreas experimentais distintas de 100 m² cada, porém na mesma
pastagem, que foi estabelecida no ano de 2000 com Urochloa brizantha
Stapf. cv. Marandu (capim-marandu). A pastagem localizava-se na Fazenda
Experimental Capim-branco, pertencente à Universidade Federal de Uberlândia,
em Uberlândia, Minas Gerais. As coordenadas geográficas do local do
experimento são 18°30’ de latitude sul e 47°50’ de longitude oeste de
Greenwich com altitude de 863 m. O clima da região é tropical de altitude,
com inverno ameno e seco e estação seca e chuvosa bem definida. A
temperatura e precipitação média anual são de 22,3 °C e 1584 mm,
respectivamente. As informações referentes às condições climáticas durante o
período experimental foram monitoradas na estação meteorológica localizada
aproximadamente a 200 m da área experimental (Tabela 1).
O solo da área experimental é classificado como Latossolo Vermelho Escuro
Distrófico, com textura argilosa(9). Antes da implantação dos
experimentos foram retiradas amostras de solo na camada 0-10 cm para análise
do nível de fertilidade. No Experimento 1, os resultados foram: pH em H2O
= 5,5; P = 1,3 (Mehlich-1); K = 75 mg dm-3; Ca2+ =
1,7; Mg2+ = 1,1 e Al3+ = 0,0 cmolc/dm³ (KCl 1 mol.L-1).
No Experimento 2, os resultados foram: pH em H2O = 6,0; P = 5,2
(Mehlich-1); K = 156 mg dm-3; Ca2+ = 5,4; Mg2+
= 2,0 e Al3+ = 0,0 cmolc dm-3 (KCl 1 mol.L-1).
Com base nesses resultados e de acordo com as recomendações de Cantarutti et
al.(10) para uma pastagem sob médio nível tecnológico, não foi
necessário efetuar a calagem e nem a adubação potássica.
No Experimento 1, as adubações fosfatada e nitrogenada foram realizadas após
corte de uniformização do dossel forrageiro a 5 cm de altura, em 15 de
novembro de 2013, com a aplicação de 70 kg.ha-1 de N e 21,5 kg.ha-1
de P, utilizando como fontes a ureia e o superfosfato simples. As adubações
foram realizadas com única aplicação ao fim da tarde e em cobertura.
Nos dois experimentos, foram avaliados cinco intervalos de cortes (7, 14,
28, 56 e 112 dias), que caracterizaram as distintas frequências de
desfolhação a que o capim-marandu foi submetido. Como o período de avaliação
foi de 112 dias, o número de eventos de desfolhação foi variável durante o
período experimental, de modo que ocorreram 16, oito, quatro, duas e uma
desfolhações para os intervalos de cortes de 7, 14, 28, 56 e 112 dias,
respectivamente. Cada intervalo de corte foi implementado em quatro unidades
experimentais. No segundo período experimental (Experimento 2), além dos
intervalos de cortes, também foram avaliadas duas condições de adubação
(baixa e alta). A condição de baixa adubação correspondeu à aplicação de
21,5 kg.ha-1 de P e de 75 kg.ha-1 de N após o corte de
uniformização do dossel forrageiro em 10 cm no dia 10/11/2014. A condição de
alta adubação correspondeu à aplicação de 43 kg.ha-1 de P e 300 kg.ha-1 de
N, em que o adubo fosfatado foi aplicado após o corte de uniformização,
enquanto que o adubo nitrogenado foi aplicado em quatro parcelas de 75 kg.ha-1
de N nos dias 10/11/2014, 08/12/2014, 05/01/2015 e 02/02/2015. Como fontes
de adubos, foram usados o superfosfato simples e a ureia.
Em ambos os experimentos, devido ao relevo levemente inclinado da área
experimental, foi adotado o delineamento em blocos casualizados. Os blocos
foram dispostos perpendicularmente à declividade do terreno. A unidade
experimental correspondeu a uma área demarcada com 1,0 m² que,
descontando-se 0,25 m de bordadura, teve área útil de 0,25 m². No
Experimento 2, adotou-se o esquema fatorial, com quatro repetições. Nas
datas dos cortes, removeu-se com tesoura de poda todos os componentes da
parte aérea da planta que estavam acima de 5 cm ou de 10 cm da superfície do
solo nos Experimentos 1 e 2, respectivamente. Após a constatação no Ano 1 de
que a altura pós-corte de 5 cm foi muito drástica, trabalhou-se com 10 cm no
Ano 2. Todas as avaliações ocorreram antes do último corte de cada intervalo
avaliado, isto é, em 28/02/2014 para o Experimento 1 e em 02/03/2015 para o
Experimento 2.
Os números de perfilhos vegetativos e reprodutivos em cada unidade
experimental foram quantificados, pela contagem das categorias de perfilhos
no campo, de modo não destrutivo. O perfilho vivo com inflorescência visível
foi classificado como reprodutivo; enquanto que aquele vivo e sem
inflorescência, foi denominado de vegetativo.
A caracterização morfológica de perfilhos individuais foi realizada em dez
perfilhos vegetativos no Experimento 1 e em cinco perfilhos vegetativos no
Experimento 2 por unidade experimental. Nestes, foram quantificados os
comprimentos do colmo e da lâmina foliar, bem como a largura da lâmina
foliar e os números de folhas vivas, cortadas e mortas. O comprimento do
colmo foi mensurado desde o nível do solo até a lígula da folha mais jovem
completamente expandida no último dia do experimento. As dimensões da lâmina
foliar foram medidas na folha viva localizada no nível de inserção
intermediário no perfilho. O comprimento da lâmina foliar foi medido desde o
ápice até a lígula da folha. A largura da lâmina foliar foi mensurada no
meio deste órgão. As folhas vivas consistiram de folhas em expansão e
expandidas. As folhas vivas com remoção parcial de sua lâmina foliar foram
consideradas como cortadas. Apenas as folhas que possuíam mais de 50% da
lâmina foliar senescente foram classificadas como mortas. Pela divisão entre
o comprimento do colmo e o número de folhas vivas expandidas mais mortas,
estimou-se a distância entre folhas no perfilho.
O peso do perfilho foi estimado pela divisão da massa de forragem pelo
número de perfilhos vivos. A massa de forragem foi obtida pelo corte, rente
ao solo, de todos os perfilhos contidos na unidade experimental. Essa
amostra foi pesada e dividida em duas subamostras. Uma das subamostras
também foi colocada para secar por 72 horas em estufa de ventilação forçada
a 65 °C efoi pesada ao término desse período. A outra subamostra teve suas
lâminas foliares separadas, pesadas, secas em estufa e pesadas novamente.
Com esses dados, calculou-se a massa de lâmina foliar do capim-marandu. Pela
multiplicação da massa de lâmina foliar pela área foliar específica (AFE),
descrita no próximo parágrafo, obteve-se o índice de área foliar (IAF) do
dossel. Por sua vez, com a divisão do IAF pelo número de perfilhos vivos,
estimou-se a área foliar média do perfilho.
Para a determinação da AFE, fez-se a colheita de 40 lâminas foliares em cada
parcela. Estas foram colocadas em sacos plásticos identificados e levados
para o laboratório onde foi feito o corte das extremidades de cada lâmina
foliar, de forma que elas ficassem em formato retangular. Posteriormente,
mediu-se o comprimento e a largura de cada uma delas, a fim de se estimar a
área de cada segmento de lâmina foliar. Com isso, foi possível obter a área
total dos 40 segmentos de lâmina foliar. As lâminas foliares foram, então,
acondicionadas em sacos de papel identificados e levadas à estufa de
ventilação forçada a 65 ºC por 72 horas, sendo pesadas após esse período.
Por meio desses resultados de área e peso dos segmentos foliares, foi
calculada a AFE em cm².mg-1. Os dados obtidos foram submetidos à
análise de variância, em delineamento de blocos casualizados. No Experimento
2, no qual foram avaliados dois fatores (intervalo de corte e condição de
adubação), a análise dos dados seguiu o esquema fatorial e, quando a
interação entre os fatores não foi significativa, realizou-se a comparação
entre as médias marginais dos níveis de cada fator. Quando a interação entre
os fatores foi significativa, realizou-se a comparação dos níveis de um
fator em separado para cada nível do outro fator. Todas as análises foram
feitas com o teste de Tukey, admitindo-se uma probabilidade de ocorrência do
erro tipo I de 5%.
Resultados
Foram avaliadas nove características do capim-marandu. Destas, no
Experimento 1, cinco foram influenciadas pelo intervalo de corte, enquanto
que no Experimento 2 seis foram influenciadas pelo intervalo de corte. No
Experimento 2, sete características foram modificadas pela condição de
adubação e nenhuma foi influenciada pela interação entre o intervalo de
corte e a condição de adubação (Tabela 2). No Experimento 1, não houve
ocorrência de perfilhos reprodutivos e o número de perfilhos vegetativos não
foi influenciado pelo intervalo de corte, apresentando valor médio de 895
perfilhos m-2.
Já no Experimento 2, os números de perfilhos vegetativos e reprodutivos
foram influenciados pela adubação e o número de perfilhos reprodutivos
também foi modificado pelo intervalo de corte. O capim-marandu submetido à
dose de adubo mais alta apresentou maior número de perfilhos vegetativos e
reprodutivos, em comparação àquele sob baixa dose de adubo (Figura 1A). No
segundo ano experimental, as maiores densidades populacionais de perfilhos
reprodutivos foram encontradas quando o intervalo de corte foi maior, sendo
nula nos dois intervalos menores (Figura 1B).
O número de folhas vivas por perfilho não variou entre os intervalos de
corte e as condições de adubação e apresentou valores de 4,8 e 3,6 no
Experimento 1 e 2, respectivamente. Em ambos os anos experimentais, a
redução do intervalo de corte ocasionou diminuição do comprimento do colmo
(Figura 2A). Quanto à condição de adubação, no Experimento 2 observou-se que
o capim-marandu sob alta dose de adubo obteve maior comprimento de colmo do
que quando adubado com dose menor (Figura 2B).
No primeiro experimento, o comprimento da lâmina foliar foi maior que os
demais quando a planta foi submetida ao maior intervalo de corte. De modo
semelhante, no Experimento 2, em geral, a redução do intervalo de corte
resultou em menores tamanhos de folha (Figura 3A). Em relação à condição de
adubação, no Experimento 2 foi constatado que o capim-marandu sob alta dose
de adubo apresentou folhas mais compridas, comparado às menores doses
(Figura 3B).
A largura da lâmina foliar não variou entre os intervalos de corte e as
condições de adubação, e apresentou valores de 1,3 e 1,5 cm no Experimento 1
e 2, respectivamente. Quanto ao espaço entre as lâminas foliares no
perfilho, o mesmo padrão de resposta foi obtido para os dois experimentos,
isto é, o dossel cortado com 112 dias de rebrotação apresentou maior espaço
entre as lâminas foliares do que os demais (Figura 4A). Quando a maior dose
de adubos foi utilizada, no Experimento 2, o espaço entre as lâminas
foliares também aumentou, em comparação ao uso de menor dose de adubo
(Figura 4B).
Referente ao Experimento 1, a área foliar do perfilho foi maior com o
intervalo de corte de 112 dias em relação aos demais avaliados. O mesmo
ocorreu no Experimento 2; entretanto, com o menor intervalo de corte (7
dias), a área foliar do perfilho foi menor em comparação àqueles submetidos
ao corte a cada 28 e 56 dias (Figura 5A). A maior condição de adubação
realizada no Experimento 2 proporcionou maior área foliar do perfilho do
capim-marandu, quando comparada ao uso de uma quantia baixa de adubos
(Figura 5B).
As respostas do peso do perfilho do capim-marandu foram crescentes com o
intervalo de corte, em ambos os experimentos (Figura 6A). No Experimento 2,
a maior dose de adubos foi responsável pelo maior peso do perfilho do
capim-marandu, em comparação à dose baixa (Figura 6B).
Discussão
A condição experimental vigente no Experimento 1, caracterizada por baixas
altura de corte (5 cm) e nível de adubação (70 kg ha-1 de N e
21,5 kg ha-1 de P), pode ser considerada muito severa, razão pela
qual, no Experimento 2, a altura de corte foi aumentada para 10 cm. Nesse
contexto, em condições de campo, caso seja adotada reduzida altura de corte,
recomenda-se a adoção de maior intervalo de corte e, ou maior nível de
adubação.
Os perfilhos reprodutivos não foram encontrados no Experimento 1 devido,
provavelmente, à época do florescimento do capim-marandu, que é concentrada
a partir de março, no outono(11), mês em que o fotoperíodo se
encurta, promovendo o florescimento da planta. Como no Ano 1 o experimento
terminou em fevereiro, a planta não emitiu as inflorescências. Isso não
ocorreu no Experimento 2, que apresentou tais perfilhos pois o trabalho em
campo terminou no mês de março. A ausência de perfilhos reprodutivos no
Experimento 1 também pode ter sido resultado da menor altura de corte (5 cm)
adotada neste experimento. Com esse manejo, é possível que muitos perfilhos
tenham tido o seu meristema apical eliminado, quando iniciaram a transição
do estádio vegetativo pra o reprodutivo, o que impediu a ocorrência desta
última classe de perfilho no dossel forrageiro. Por outro lado, o aumento do
intervalo de corte propiciou a emissão dos perfilhos reprodutivos, porque a
planta não teve seu crescimento interrompido e completou seu desenvolvimento
fenológico (Figura 1B).
A adubação nitrogenada interfere na morfogênese da planta forrageira de
várias maneiras. O nitrogênio (N) aumenta a taxa de aparecimento foliar(12)
e, com efeito, o número de gemas aptas para se desenvolver em perfilhos, o
que pode justificar, no segundo experimento, o aumento do número de
perfilhos vegetativos e reprodutivos com a adubação nitrogenada (Figura 1A).
Morais et al.(13) avaliaram o perfilhamento da B. decumbens cv.
Basilisk adubada com 75, 150, 225 e 300 kg.ha-1 de N e a última
dose resultou em maior número de perfilho no pasto.
A adubação nitrogenada aumenta a eficiência fotossintética e atua nas zonas
meristemáticas da folha, estimulando o alongamento de colmo e a taxa de
alongamento foliar(14,15), o que provavelmente ocorreu no
Experimento 2, justificando os maiores comprimentos de colmo e de lâmina
foliar nos perfilhos de capim-marandu com a maior dose do fertilizante
(Figuras 2B e 3B).
O comprimento do colmo também foi maior quando o intervalo de corte aumentou
(Figura 2A), porque a planta permaneceu por mais tempo em livre crescimento.
Outro fator que pode explicar o maior comprimento do colmo com o maior
intervalo de desfolhação é que a planta mais velha precisa sustentar seu
maior peso para evitar o acamamento e o colmo é a estrutura de sustentação
da planta forrageira(7). Ademais, quando a planta fica mais alta,
há maior competição intraespecífica por luz entre os perfilhos, o que faz
com que o colmo se alongue. Segundo Carnevalli et al.(16),
durante a rebrotação do pasto, quando o dossel passa a interceptar 95% da
luz incidente (índice de área foliar crítico), os perfilhos competem por luz
e, como estratégia, ocorre o alongamento do colmo para expor as folhas em um
estrato mais alto do dossel. Como o colmo possui menor teor protéico e maior
percentagem de fibra indigestível em comparação à folha viva(17)
e também é rejeitado pelo animal em pastejo(18), não seria
recomendado o descanso do pasto por períodos longos (56 ou 112 dias) durante
a época das águas. Sob essas condições, a quantidade de colmo ofertada seria
grande, contrariamente ao observado quando se trabalha com intervalos de
corte menores (28 dias). Nesse sentido, a redução do intervalo de corte é
estratégia eficiente para se controlar o alongamento o colmo do
capim-marandu, principalmente em pastos adubados, que expressam maior taxa
de crescimento(19).
O comprimento da lâmina foliar também aumentou com o maior intervalo de
corte, em ambos os experimentos (Figura 3A). Para que as folhas sejam
expostas, elas devem percorrer um trajeto, desde o meristema apical,
localizado no interior do pseudocolmo, até a ponta do perfilho. Quando o
tempo de corte é maior, o tamanho do pseudocolmo aumenta e a distância que
as novas folhas percorrem para serem expostas é maior. Com isso, a folha
jovem fica se alongando por maior período, resultando em maior comprimento
de sua lâmina foliar(20). O contrário ocorreu com o menor
intervalo de corte, em que o colmo ficou mais curto e o percurso que a folha
nova teve que percorrer para a exposição no ápice do perfilho foi menor,
resultando em folhas mais curtas.
Com o alongamento do colmo causado pela adubação (Figura 2B) e a
estabilidade do número de folha por perfilho(21), o espaço entre
a inserção de duas folhas consecutivas no colmo também aumentou com a
adubação (Figura 4B). Por outro lado, o menor intervalo de corte resultou em
colmo mais curto e, assim, as folhas ficaram mais próximas (Figura 4A). A
redução do intervalo de corte também resultou em lâminas foliares mais
curtas (Figura 3A). Esses resultados demonstram a capacidade do
capim-marandu de se adaptar à desfolhação, alterando sua morfologia para
manter seus órgãos fotossintéticos íntegros(22). Dessa forma, ao
invés de a planta reduzir a quantidade de folhas por ter colmo mais curto,
ela mantém a mesma quantidade de folhas, porém estas ficam mais próximas
umas das outras. Essa resposta morfológica pode otimizar o aproveitamento da
luz pelo dossel forrageiro e, com efeito, contribuir para a persistência da
planta em condições de desfolhações mais severas.
A distância entre as lâminas foliares foi menor no Experimento 1 do que no
Experimento 2 (Figura 4A), provavelmente porque no primeiro experimento a
altura de corte foi demasiadamente baixa (5 cm), o que pode ter reduzido o
alongamento dos entrenós do perfilho e, consequentemente, diminuído a
distância entre as lâminas foliares. A menor precipitação pluvial no
Experimento 1 em relação ao Experimento 2 (Tabela 1) também pode ter
contribuído para esse resultado.
Altas doses de nitrogênio (N) promovem o crescimento da planta e,
consequentemente, a expansão do comprimento da folha(23), o que
foi comprovado neste experimento. Dessa forma, com lâminas foliares maiores,
tem-se também maior área foliar do perfilho (Figura 5B). Esta variável
também aumenta com o maior intervalo de corte, pois é natural que folhas com
maior tamanho resultem em uma área foliar do perfilho maior (Figura 5A). A
maior área foliar do perfilho somada aos seus colmos mais longos também
resultou em perfilhos maiores e mais pesados na presença de N.
O colmo é o componente mais pesado da planta forrageira e por ter se
mostrado mais comprido na presença de mais nitrogênio e fósforo no solo, é
natural que o peso do perfilho seja superior. Além disso, a maior quantidade
de nitrogênio e de fósforo no solo interfere nas respostas morfofisiológicas
da planta forrageira, como atividade fotossintética, mobilização de reservas
após a desfolhação e taxa de expansão da área foliar(12). Assim, a aplicação
da maior dose de nitrogênio e de fósforo resultou em maior peso do perfilho
(Figura 6B). Naturalmente, com o aumento do intervalo de corte, os
componentes morfológicos ficam mais velhos, maiores e mais pesados, o que
causou maior peso do perfilho nos dois experimentos (Figura 6A). Nesse
sentido, Santos et al.(24), em estudo de correlação entre o peso do perfilho
e o comprimento do colmo da Urochloa decumbens cv. Basilisk, verificaram
associação significativa (P<0,01) e positiva (0,82) entre essas
características. Esse resultado foi atribuído ao fato de os perfilhos mais
pesados geralmente possuírem maior estádio de desenvolvimento e, por
conseguinte, seus colmos atingem maiores comprimentos. Além disso, plantas
sob sombreamento, situação comum nos dosséis com perfilhos mais pesados,
também apresentam, como resposta morfológica, incremento do comprimento do
colmo para favorecer a localização das folhas jovens e mais
fotossinteticamente ativa da planta na região superior do dossel, onde a
luminosidade é maior.
Os resultados deste trabalho demonstram que, em geral, a condição de
adubação e o intervalo de desfolhação foram efetivos para alterar alterar a
morfologia dos perfilhos do capim-marandu, não sendo possível discernir
sobre a maior importância de um fator em comparação ao outro. De fato, no
Ano 2, 67% das variáveis respostas foram influenciadas pelo intervalo de
corte e 78% pela condição de adubação (Tabela 2). Além disso, esses
resultados indicam que os efeitos da adubação e da intensidade de
desfolhação são de natureza contrária. Essa compensação de efeitos pode
justificar, em parte, o fato de o pasto sob alta dose de adubado se adaptar
melhor à maior severidade de desfolhação.
Conclusões
O capim-marandu adapta sua morfologia em resposta à desfolhação e à adubação. Exceto para a densidade populacional de perfilhos, as demais modificações morfológicas nos perfilhos do capim-marandu causadas pela desfolhação e pela adubação são de natureza contrária. Enquanto a maior dose de adubo aumenta o tamanho dos órgãos, o espaço entre lâminas foliares, a área foliar e o peso de perfilho, a severidade de desfolhação tem efeitos contrários.
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