DOI: 10.1590/1089-6891v18e-37834
ZOOTECNIA
QUALIDADE DA CARNE DE AVES DA RAÇA RODHE ISLAND RED CRIADAS EM SISTEMA ALTERNATIVO
MEAT QUALITY OF RODHE ISLAND RED POULTRY REARED IN ALTERNATIVE SYSTEM
Fábio Loures Cruz1*
Marcelo Espósito1
Nicole Batelli de Souza Nardelli1
Édison José Fassani1
Peter Bitencourt Faria1
Claudiana Esteves1
1Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG, Brasil.
*Autor para correspondência - fabiolourescruz@gmail.com
Resumo
Objetivou-se caracterizar a qualidade da carne de aves da raça Rodhe Island Red em função da diferença do tipo de corte e sexo. Foram utilizadas 30 aves em delineamento inteiramente casualizado em esquema fatorial (2 x 2), sendo dois cortes (peito e coxa) e dois sexos, com cinco repetições por tratamento. As aves foram abatidas aos 105 dias para realização das análises físico-químicas, composição centesimal e perfil lipídico do peito e coxa. A coxa apresentou maior média de pH final, teor de vermelho (a*) e força de cisalhamento (FC). Para luminosidade (L*), o peito obteve a maior média e as fêmeas maior média de FC. A coxa apresentou maior teor de extrato etéreo (EE) e umidade. O peito apresentou maior média de ácidos graxos saturados. As fêmeas obtiveram maior quantidade de ω3 e menor relação ω6/ω3. Foi observado maior índice de trombogenicidade no peito. A coxa mostrou menor conteúdo de ácidos graxos saturados e menor índice de trombogenicidade. As fêmeas apresentaram maior teor de ω3. O tipo de corte demonstrou maior influência que o sexo sobre os parâmetros estudados e a coxa apresentou melhores aspectos físico-químicos e de perfil lipídico para carne de aves neste sistema de produção relacionados à qualidade de carne desejável pelos consumidores.
Palavras-chave: ácido graxo; aterogenicidade; cor; força de cisalhamento; trombogenicidade.
Abstract
This study aimed to characterize the quality of the meat from Rodhe Island Red poultry, considering the type of cut and sex. We used 30 birds in a completely randomized design in a factorial arrangement (2 x 2), two cuts (breast and thigh) and both sexes, with five replicates per treatment. The birds were slaughtered at 105 days to carry out the physical and chemical analysis, chemical composition and lipid profile of breast and thigh. The thigh showed the highest mean final pH, redness (a*) and shear force (SF). For brightness (L*), the breast had the highest average as well as females presented the highest SF average. The thigh presented the highest amount of ether extract (EE) and humidity. The breast presented the highest amount of saturated fatty acids. Females showed the highest amount of ω3 and the lowest ω6 / ω3 relation. There was a higher thrombogenicity index in breast meat. The thigh showed the lowest content of saturated fatty acids and a lower thrombogenicity index. Females had higher content of ω3. The cut showed greater influence then sex on the studied parameters and the thigh showed better physical and chemical aspects and lipid profile for poultry meat in such production system regarding the meat quality as desirable by the consumers.
Keywords: atherogenicity; color; fatty acids; shear force; thrombogenicity.
Recebido em: 30 setembro de 2015
Aceito em 05 junho de 2017
Introdução
Devido à demanda do consumidor moderno por produtos mais naturais e com sabores mais acentuados, nos últimos anos houve uma evolução significativa do sistema alternativo para a criação de frangos tipo caipira. As principais características desejáveis neste sistema são a produção de carne mais saudável para o consumo, com menores teores de gordura saturada e colesterol, além das características organolépticas específicas, como o sabor mais acentuado e a textura mais firme.
No entanto, para tornar a atividade rentável é necessário conhecer os principais fatores que afetam os parâmetros de qualidade, bem como o perfil lipídico da carne. O sexo está entre os principais fatores de controle relacionados às características organolépticas(1) e o perfil de ácidos graxos da carne(2,3) de aves de corte criadas em sistema extensivo ou semi-intensivo. Segundo Souza et al.(4), o sexo, juntamente com outros fatores, contribui para as diferenças de textura, sabor, quantidade de gordura abdominal, pH final, capacidade de retenção de água e cor. Deste modo, o conhecimento deste fator é essencial para que o produtor possa exercer um controle da qualidade final da carne, de acordo com as exigências do mercado, objetivando um maior lucro da atividade.
Em aves, pode haver diferenças das características físico-químicas e de perfil lipídico entre os diferentes cortes da carcaça. O peito e a coxa possuem funções locomotoras diferentes nas aves e, por isso, metabolismo distintos, o que faz com que apresentem diferenças nos valores de pH final, na cor, na textura da carne e no conteúdo total de lipídeos no interior dos músculos(5-7). Contudo, há poucas informações na literatura sobre os tipos de corte e suas características de qualidade e perfil lipídico da carne de frangos criados em sistema alternativo.
Objetivou-se com este estudo avaliar a influência do tipo de corte (peito e coxa) e do sexo sobre os parâmetros de qualidade (características físico-químicas, composição centesimal e o perfil lipídico) da carne de aves da raça Rodhe Island Red criadas em sistema alternativo.
Material e Métodos
O experimento foi conduzido no Setor de Avicultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras (UFLA), em Lavras, Minas Gerais. Todos os procedimentos descritos foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Universidade Federal de Lavras (Nº Protocolo 017/14). Os estudos de qualidade de carne e de perfil lipídico foram realizados no Laboratório de Inspeção de Produtos de Origem Animal, do Departamento de Medicina Veterinária da UFLA e no Departamento de Química da mesma universidade.
Foram utilizados um total de 30 aves da raça Rodhe Island Red (RIR), sendo 15 machos e 15 fêmeas, vacinadas previamente contra Marek, Bouba Aviária e Doença de Newcastle. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado (DIC), disposto em esquema fatorial (2 x 2), sendo dois cortes (peito e coxa) e dois sexos (macho e fêmea). Cada tratamento foi composto por cinco repetições, sendo cada repetição representada por três aves.
A dieta das aves foi composta de três formulações de rações sem o uso de promotores de crescimento e coccidiostáticos (Tabela 1), de acordo com a fase de criação, que foi estabelecida conforme a idade das aves em dias. Estas foram criadas em três fases: inicial (1 a 30 dias) criadas em galpão de alvenaria com ração e água ad libitum, sem acesso à área de pastejo, recebendo aquecimento com campânula a gás até 14 dias de idade e iluminação artificial 24 horas por dia durante toda essa fase; fase de crescimento (31 a 55 dias) e final (56 a 105 dias) em área experimental de criação de aves caipira com acesso ao pastejo formada com capim quicuio (Pennisetum clandestinum) e coast cross (Cynodon dactylon) e ração e água ad libitum, sendo que em cada unidade experimental de 90 m² de área foram alojadas 30 aves do mesmo genótipo, sendo 15 de cada sexo, obtendo, dessa forma uma densidade de uma ave para cada 3 m² de área. Aos 105 dias de idade, as aves foram pesadas, identificadas, mantidas em jejum por 8 horas e abatidas por deslocamento cervical seguido de sangria, respeitando o método humanitário de abate.
Para a realização das análises físico-químicas (pH final, cor, perda de peso por cozimento e força de cisalhamento) e composição centesimal (umidade, proteína, extrato etéreo e cinzas) da carne de frango, foram coletadas amostras do peito e da coxa, isentas de pele. As análises de pH final, cor (CIE L*, a* e b*), perda de peso por cozimento, foram realizadas após o período de refrigeração em temperatura de 5±2 °C por 24 horas. A leitura do pH foi realizada com phmetro digital da marca Hanna Instruments e Modelo HI 99163, sendo obtida a leitura de cada corte na porção central da musculatura às 24 horas após o abate.
A cor foi determinada de acordo com sistema de cor CIELAB (1976), em que L* representa luminosidade, a* representa teor de vermelho e b* representa teor de amarelo em três pontos distintos de cada corte. As leituras dos parâmetros (L*, a*, b*) foram feitas com colorímetro (Minolta Chroma Meter-200b), de iluminante D65, calibrado em padrão branco ladrilho, sendo obtidas as médias de L*, a* e b* de cada repetição. Com esses valores, calculou-se o valor de croma (C*):
[C=(a*2+b*2) 1/2]
e o ângulo de tonalidade (h*):
[h=tan-1(b*/a*)](8).
As amostras de peito e coxa utilizadas nas leituras de cor foram pesadas e envolvidas em papel alumínio e, em seguida, submetidas a cozimento em chapa elétrica previamente aquecida à temperatura de 150º C, permanecendo até atingirem a temperatura interna de 72°C. Após o cozimento, as amostras foram resfriadas em geladeira e em seguida foi retirado o papel alumínio para a realização das pesagens e determinação da perda de peso por cozimento (PPC). Para os valores de PPC, foram utilizadas as médias das diferenças entre os pesos antes e após o cozimento das amostras de peito e coxa de cada repetição, depois de convertidas em porcentagem.
As amostras cozidas para determinação da PPC foram refrigeradas em geladeira comercial e cortadas em pedaços com dimensões de 2,0 x 1,0 x 1,0 cm, para a realização das análises da força de cisalhamento, com o maior comprimento no sentido longitudinal das fibras musculares, conforme metodologia de Fronning e Uijttenboogarte(9). Posteriormente, as amostras foram seccionadas no sentido transversal às fibras musculares, utilizando-se texturômetro da marca Extralab e modelo TA.XT Plus, que apresentou os valores em kgf para cada amostra.
As análises de umidade, proteína, extrato etéreo e cinzas também foram realizadas a partir dos músculos do peito e da coxa, isentos de pele. As determinações de composição centesimal da carne foram realizadas em duplicata e de acordo com a Association of Official Analytical Chemists - AOAC(10).
As amostras para a determinação da composição lipídica foram extraídas das partes musculares dos cortes de peito e da coxa, isentos de pele, de acordo com metodologia de Folch et al.(11) e, em seguida, procedeu-se a esterificação das amostras segundo metodologia de Hartman e Lago(12). Posteriormente, as amostras esterificadas foram submetidas à cromatografia gasosa para a determinação do perfil dos ácidos graxos, utilizando-se coluna capilar de sílica fundida de 100 m de comprimento, diâmetro de 0,25 mm e 0,2 µm de espessura do filme Supelco (SP-2560, Bellefonte, PA, US). A identificação e quantificação dos ácidos graxos foram realizadas de acordo com o padrão Supelco 37® (Fame Mix). Após as leituras obtidas no perfil lipídico pela cromatografia, foram calculadas as somas dos ácidos graxos saturados (SAT), monoinsaturados (MON), poli-insaturados (POL), ômega 6 (Σ ω-6), ômega 3 (Σ ω-3) e suas relações.
Foi calculado o índice de atividade das enzimas ∆9-dessaturaseC16 e ∆9-dessaturaseC18 através das seguintes equações: 100 [(C16:1 cis-9)/(C16:1 cis-9 + C16:0)] e 100 [(C18:1 cis-9)/(C18:1 cis-9 + C18:0)], respectivamente. O índice de ElongaseC16-C18 foi calculado de acordo com a equação: 100 [(C18:0 + C18:1 cis-9)/(C16:0 + C16:1 cis-9 + C18:0 + C18:1 cis-9)] e esta relacionado às transformações no perfil lipídico da carne, principalmente no aumento dos teores de ácido esteárico (C18:0) e oleico (C18: 1ω9c)(13). O índice de TioesteraseC16-14 foi calculado de acordo com a equação: 100 [(C16:0)/(C16:0 + C14:0)] e esta relacionado ao aumento nos teores do ácido graxo C14:0.
Foram determinados os índices de aterogenicidade e de trombogenicidade que são considerados como indicadores de saúde, relacionados com o risco de doença cardiovascular(14). Os índices de aterogenicidade e de trombogenicidade foram calculados de acordo com as equações:
[4 (C14: 0) + C16: 0] / (ΣSAT + ΣPOL)] e
(C14: 0 + C16: 0 + C18: 0) / [(0,5 xΣMON) + (0,5 xΣ ω6) + (3xΣ ω-3) + (Σω -3/Σω -6 )], respectivamente.
A determinação do colesterol foi realizada por metodologia colorimétrica de acordo com Bohac et al.(15), com adaptações de Bragagnolo e Rodriguez-Amaya(16). A quantificação do colesterol foi feita por relação com a curva padrão elaborada com colesterol p.a. As alíquotas de colesterol da curva padrão receberam o mesmo tratamento para formação da cor das amostras, antes de se submeterem às leituras no espectrofotômetro. Os resultados foram expressos em mg de colesterol/100g de carne.
Os dados foram analisados com apoio do programa estatístico SISVAR®. As variáveis com respostas de efeitos significativos na análise de variância para os tratamentos e/ou interações foram submetidas ao teste de médias Tukey (significância de 5%).
Resultados e Discussão
Na Tabela 2 estão apresentados os resultados das avaliações físico-químicas dos cortes de peito e coxa, sendo que não houve interação entre o tipo de corte e o sexo para nenhuma das variáveis analisadas.
Os cortes mostraram diferença significativa em função dos valores de pH final da carne, sendo que a coxa apresentou média superior em relação ao peito (Tabela 2). De acordo com Castellini et al.(5), o tipo e a localização dos músculos pode exercer efeito sobre o pH, variando de acordo com o metabolismo energético predominante, de forma que quanto maior a proporção de fibras musculares vermelhas, maiores os valores de pH final. Segundo Gomide et al.(17), músculos brancos recorrem imediatamente ao metabolismo glicolítico, fazendo com que ocorra uma maior queda do pH, devido à produção intensa de ácido lático e o consequente acúmulo no músculo. Chen et al.(6), Sarica et al.(7), Marchi et al.(18), Cheng et al.(19), Połtowicz e Doktor(20) e Sarsenbek et al.(21), avaliando frangos criados em sistema alternativo, observaram maiores médias de pH final em coxas, quando comparadas aos peitos.
Para os valores de luminosidade (L*), o peito apresentou maior média em comparação com a coxa, o que pode estar relacionado ao valor de pH final de cada corte. Segundo Castellini et al.(5), há uma correlação entre a taxa de queda e o valor final de pH, pois uma queda muito acentuada pode provocar a desnaturação dos pigmentos de mioglobina, fazendo com que a carne se torne mais clara, aumentando os valores de L*. Rizzi et al.(1), Chen et al.(6), Sarica et al.(7), Cheng et al.(19), Połtowicz e Doktor(20), Debut et al.(22) e Smith et al.(23) avaliaram frangos criados em sistema semi-intensivo e observaram maior média de L* no peito, em comparação com a coxa.
Conforme o esperado, houve diferença entre os cortes para os teores de vermelho (a*), sendo que a coxa apresentou média mais elevada e, portanto, uma carne mais vermelha. Chen et al.(6), Połtowicz e Doktor(20), Debut et al.(22) e Smith et al.(23) também observaram maiores valores de a* para a coxa do que para o peito. Isto pode ser devido às diferenças no teor de mioglobina dos cortes de peito e coxa, sendo que este último apresenta, geralmente, teores mais elevados(24).
Na coxa foram verificados maiores valores para o índice de croma (C*), o que significa que a cor deste corte é mais saturada, ou seja, com maior intensidade. Para o ângulo de tonalidade (h*), houve diferença significativa entre os cortes, sendo que a maior média foi encontrada no peito (94,2), o que indica que a cor predominante da carne foi amarela. Já para a coxa foi encontrada uma média mais baixa (68,1), indicando que a cor predominante assemelhasse ao laranja, conforme a escala de cor no Sistema CieLab. Com relação ao sexo, para machos e fêmeas, a cor predominante da carne foi amarela, porém os machos apresentaram a maior média.
Para os valores de força de cisalhamento (FC), houve diferenças entre os cortes e o sexos, sendo que a maior média foi encontrada pela coxa. Em geral, na literatura são relatados maiores valores de FC para a coxa em comparação ao peito para frangos criados em sistema alternativo(4-6, 21). Esses autores atribuem essas diferenças ao fato de que as aves, em sistema alternativo, buscam complementar sua alimentação através da ingestão de pasto e outros alimentos e, para isso, realizam exercícios, o que provoca um aumento da textura da carne da coxa. Souza et al.(25) não observaram diferenças entre sexos para os valores de FC do peito; entretanto, avaliando a coxa, estes autores encontraram, para as aves macho, a maior média de FC. Contudo, no presente estudo, as fêmeas apresentaram maiores médias de FC, o que pode estar relacionado ao menor teor de umidade (Tabela 3). Em geral, menores quantidades de água no músculo e de gordura intramuscular promovem redução nos aspectos de suculência e maciez (17).
Na Tabela 3 estão apresentados os dados de composição centesimal dos cortes de peito e coxa de acordo com o sexo. Foi verificada interação significativa entre o tipo de corte e sexo para a variável extrato etéreo (EE). A coxa apresentou um teor mais elevado de extrato etéreo quando comparado ao peito, em ambos os sexos. Resultados semelhantes foram encontrados por Souza et al.(4), Sarica et al.(7) e Lopez et al.(26). Segundo Gomide et al.(17), músculos em que predominam fibras vermelhas, como a coxa, e que apresentam preferencialmente o metabolismo oxidativo para a produção de energia, apresentam uma maior concentração de lipídeos no seu interior. Com isso, há um maior teor de extrato etéreo em músculos vermelhos, como a coxa, quando comparados ao peito, em que há a predominância de fibras musculares brancas e menor depósito de lipídeos.
As fêmeas apresentaram maior teor de extrato etéreo no corte coxa. Rizzi et al.(1), Lonergan et al.(24) e Souza et al.(25) avaliaram a composição centesimal da carne de frangos de diferentes linhagens e observaram maiores médias de extrato etéreo para as fêmeas, independente da linhagem avaliada. Em função das fêmeas atingirem a maturidade sexual mais precoce, estas depositam uma maior quantidade de gordura na carcaça(1).
Houve efeito do corte e do sexo sobre o teor de umidade, sendo que a coxa apresentou uma média mais elevada em relação ao peito (Tabela 3). Resultados semelhantes foram encontrados por Sarsenbek et al.(21) e Sirri et al.(27), que, comparando os cortes peito e coxa, observaram um maior teor de umidade em coxas. Com relação ao sexo, os machos apresentaram maiores teores de umidade (Tabela 3). Entretanto, trabalhos na literatura indicam não haver efeito do sexo sobre os teores de umidade da carne de frangos criados em sistema alternativo(25, 28).
A Tabela 4 apresenta o perfil de ácidos graxos dos cortes de peito e coxa, levando em consideração o sexo. Foram encontrados os seguintes ácidos graxos na carne das aves estudadas: C10:0, C11:0, C12:0, C14:0, C14:1,C15:0, C16:0, C16:1, C17:0, C17:1, C18:0, C18:1ω9t, C18:1ω9c, C18:2ω6c, C20:0, C18:3ω6, C:20:1, C18:3ω3, C20:2, C22:0, C20:3ω6, C22:1ω9, C20:3ω3, C20:4ω6, C22:6ω3. Houve interação entre o tipo de corte e sexo apenas para a variável C12:0 (Ácido Láurico), sendo que houve diferença entre sexos apenas para a coxa e os machos apresentaram a maior média (Tabela 4).
A análise do perfil lipídico revelou maiores médias dos ácidos graxos saturados C10:0, C15:0, C16:0 (ácido palmítico) e C17:0 para o peito; entretanto, a coxa apresentou um teor mais elevado para C20:0 (Tabela 4). De maneira geral, sob o ponto de vista de saúde, é desejável uma carne com menores teores de ácidos graxos saturados. Segundo Santos et al.(29), a gordura saturada (C12:0, C14:0 e C16:0), quando consumida, eleva a concentração plasmática de colesterol, aumentando o risco de doenças cardiovasculares.
Para os ácidos graxos monoinsaturados C17:1 e C18:1ω9t, o peito apresentou teores mais elevados, enquanto para os ácidos C20:1 e C16:1 (ácido palmitoléico), observaram-se maiores concentrações na coxa. Na coxa, verificou-se uma maior concentração dos ácidos graxos poli-insaturados C18:3ω3 (ácido N-linolênico), C18:3ω6 (ácido γ-linolênico) e C18:2ω6c (ácido linoleico). Por outro lado, no peito foram encontrados maiores médias dos ácidos graxos C20:3ω6 e C20:4ω6 (ácido aracdônico) (Tabela 4).
Novello et al.(30) avaliaram o perfil lipídico dos cortes de peito e coxa de frangos e observaram maiores teores dos ácidos graxos saturados (C14:0 (ácido mirístico), C16:0 (ácido palmítico) e C18:0 (ácido esteárico)), monoinsaturados (C16:1 (ácido palmitoléico) e C18:1ω9c (ácido oléico)) e dos poli-insaturados (C18:3ω3 (ácido C-linolênico) e C18:2ω6c (ácido linoléico)) na coxa. Resultados semelhantes foram encontrados por Saleh et al.(31), que observaram maiores concentrações dos ácidos graxos C14:0, C16:0, C18:0, C16:1, C18:1ω9c e C18:2ω6c na coxa de frangos. Os autores atribuíram estes resultados ao fato de que a coxa apresenta uma maior concentração de lipídeos, devido ao intenso metabolismo oxidativo que utiliza os lipídeos preferencialmente como substrato para a obtenção de energia.
O sexo influenciou os teores dos ácidos graxos C14:1, C16:1 (ácido palmitoléico), sendo que os machos apresentaram as maiores médias. Entretanto, não foram encontrados teores significativos de C20:3ω3 na carne dos machos, independente do corte avaliado. Em contrapartida, nas fêmeas foi observada uma média superior de C20:3ω3 na carne (Tabela 4).
Na Tabela 5 estão apresentados o somatório dos ácidos graxos, bem como suas relações, índices enzimáticos e teor de colesterol dos cortes de peito e coxa. De forma geral, não ocorreu interação corte e sexo para nenhuma das variáveis analisadas e o peito apresentou maior quantidade de ácidos graxos saturados (SAT) em relação à coxa. Este achado difere dos resultados de Novello et al.(30), Saleh et al.(31) e Ferioli e Caboni(32) que, avaliando o perfil lipídico destes cortes, observaram maior teor de ácidos graxos saturados em coxas de aves.
Maiores teores de ômega 3 (Σω3) foram encontrados para as fêmeas independente do corte (Tabela 5). Diferenças nos teores de ácidos graxos poli-insaturados ômega 3 (Σω3) pode estar relacionado ao potencial de crescimento da ave e, consequentemente, a taxa ou hábito de pastejo, de forma que aves que apresentam uma baixa ingestão de forragens frescas, ricas em ω3, tendem a apresentar uma menor deposição desses ácidos graxos nos tecidos(5). Sob o ponto de vista de saúde do consumidor, são desejáveis maiores teores de ácidos graxos poli-insaturados e da série ω3 na carne, pois, segundo Jump et al.(33), o consumo de dietas ricas nestes ácidos graxos promove uma diminuição no nível de colesterol sanguíneo e nos riscos de doenças cardiovasculares.
As fêmeas apresentaram uma menor relação Σω6/Σω3 com o valor médio de 27,13 enquanto nos machos foi verificado um valor de 34,36 (Tabela 5). A fim de evitar o desenvolvimento de doenças inflamatórias, alérgicas e cardiovasculares, a Organização Mundial da Saúde(34) recomenda a ingestão de dieta com relação de Σω6/Σω3 em torno de 4:1. Rule et al.(35) encontraram uma média de Σω6/Σω3 de 18,5 no peito de frangos de corte de linhagem comercial, criados em sistema intensivo. Michalczuk et al.(36), avaliando frangos da linhagem Hubbard JA, de crescimento lento, criados em sistema orgânico, observaram uma média de Σω6/Σω3 de 8,40. Sirri et al.(27), avaliando as linhagens Cobb 700 (crescimento rápido), Naked neck Kabir (crescimento médio) e Brown Classic Lohman (crescimento lento), criadas em sistema alternativo, observaram diferenças na relação Σω6/Σω3 do peito entre as linhagens com os seguintes valores: 6,83, 5,77 e 4,34, respectivamente. Dessa forma, independente do tipo de corte e sexo, a carne das aves deste estudo, demonstraram um valor superior da relação Σω6/Σω3, quando comparado aos valores encontrados em outros trabalhos, o que pode ser devido principalmente ao menor teor de ácidos graxos ômega 3 encontrado na carne destas aves.
Para estimativa da atividade da enzima ∆9-desaturaseC18, houve efeito do corte e do sexo, sendo que a coxa apresentou maior índice de atividade (Tabela 5). Isso significa que, na coxa das aves estudadas, teria ocorrido uma maior taxa de adição de insaturação na cadeia carbônica dos ácidos graxos e, consequentemente, uma maior facilidade na conversão do ácido graxo C18:0 (ácido esteárico) em C18:1ω9c (ácido oleico) do que no peito. Segundo Metz et al.(13), estas enzimas atuam na remoção de moléculas de hidrogênio nas cadeias carbônicas de ácidos graxos saturados, transformando-os em monoinsaturados e, assim, aumentando a formação de ácidos graxos cis-9, principalmente o ácido oléico (C18: 1ω9c) e o palmitoleico (C16:1ω7c). Com relação ao sexo, as fêmeas apresentaram maior índice de atividade de ∆9-desaturaseC18.
O corte de peito apresentou maior índice de trombogenicidade em comparação à coxa (Tabela 5), sendo este considerado como indicador de saúde e relacionado com o risco de doença cardiovascular(14). Os índices de trombogenicidade e de aterogenicidade indicam o potencial de estímulo à agregação plaquetária. Assim, quanto menores os valores destes índices, maior é a quantidade de ácidos graxos antitrombogênicos e antiaterogênicos presentes na gordura e, consequentemente, maior é o potencial de prevenção ao aparecimento de doenças coronarianas(37).
Sirri et al.(27), avaliando a linhagem Lohman Brown, de crescimento lento e criada em sistema semi-intensivo, encontraram valor inferior para o índice de trombogenicidade (0,59) do peito. Isso pode ser devido principalmente aos menores teores de C16:0 (ácido palmítico) e C18:0 (ácido esteárico), encontrados neste trabalho, que são considerados como trombogênicos. Dessa forma, quanto menores os teores destes ácidos graxos, menor será o índice de trombogenicidade. Ainda segundo Sirri et al.(27), o índice de aterogenicidade do peito de aves da linhagem Lohman Brown foi 0,32. Novello et al.(30), avaliando uma linhagem de frango comercial, observaram valores de índice de aterogenicidade e de trombogenicidade de 0,43 e 0,69 do peito, respectivamente, e para a coxa os valores foram 0,45 e 0,73, respectivamente. Saleh et al.(31) avaliaram o perfil lipídico de frangos da linhagem comercial Cobb 500 e observaram valores de índice de aterogenicidade e de trombogenicidade de 0,57 e 1,13 do peito, respectivamente, e para a coxa os valores foram 0,75 e 0,92, respectivamente. Os valores encontrados no presente trabalho demonstram que a carne das aves da linhagem Rodhe Island Red, independente do perfil de ácidos graxos encontrados, apresentou índices semelhante de aterogenicidade e trombogenicidade ao observado por outros autores para carne de aves.
Conclusões
O sexo demonstra pouca influência nos parâmetros de qualidade da carne de aves Rodhe Island Red criadas em sistema alternativo. As maiores diferenças em relação às características de qualidade foram observadas em função do tipo de corte, apresentando a coxa melhores parâmetros físico-químicos em função dos aspectos desejáveis pelo consumidor deste tipo de produto e de perfil lipídico para carne de aves neste sistema de produção, apesar do maior teor de lipídeos.
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