DOI:
10.1590/1809-6891v19e-27432
ZOOTECNIA
VALOR NUTRITIVO E CARACTERÍSTICAS FERMENTATIVAS DA SILAGEM
DE CAPIM-ELEFANTE COM DIFERENTES PROPORÇÕES DE CASCA DE CAFÉ
NUTRITIONAL VALUE AND CHARACTERISTICS OF ELEPHANT GRASS SILAGE WITH
DIFFERENT PROPORTIONS OF COFFE HULLS
Adauto Ferreira Barcelos1*
José Rodolfo Reis de Carvalho1
Valdir Botega Tavares2
Clenderson Corradi de Mattos Gonçalves1
1Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas
Gerais, Lavras, MG, Brasil.
2 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Sudeste de Minas, Rio Pomba, MG, Brasil.
*Autor para correspondência - adauto.barcelos@epamig.ufla.br
Resumo
Avaliaram-se o valor nutritivo e as características bromatológicas de
silagens de capim-elefante (CE), cultivar mineiro, cortado aos 70 dias de
rebrota, com adição de quatro níveis de casca de café (1-CE; 2-CE + 10%;
3-CE + 20% e 4-CE + 30%). Utilizou-se o delineamento experimental em
blocos casualizados com quatro tratamentos e seis repetições. Foram
determinados nas silagens os teores de lignina, celulose, cafeína, DIVMS,
pH, N-NH3 e as perdas de efluente e gás. Os valores de MS aumentaram
enquanto o pH reduziu linearmente com o aumento da casca de café na
silagem de capim elefante. A produção de efluente ocorreu somente na
silagem sem casca de café nos cinco primeiros dias, com maior produção nos
três primeiros. Os valores de N-NH3 decresceram linearmente com o aumento
da casca de café. Houve aumento do teor de PB à medida do aumento da casca
de café. Houve aumento de FDN e redução FDA e DIVMS linear com o aumento
da casca de café. Esses resultados mostram que a casca de café como
aditivo foi efetivo em melhorar as características da silagem de
capim-elefante cortado aos 70 dias de idade.
Palavras-chave: aditivo absorvente; conservação de forragem;
digestibilidade da matéria seca; fibras; padrão fermentativo.
Abstract
We evaluated the nutritional value and the bromatological characteristics
of elephant grass (EG) silages, cut at 70 days of regrowth, adding four
levels of coffee hulls (1-EG; 2-EG + 10%; 3-EG + 20%; and 4-EG + 30%). A
randomized block design with four treatments and six replicates was used.
The lignin, cellulose, caffeine, IVDDM, pH, N-NH3 and effluent and gas
losses were determined in the silages. The DM values increased as pH
decreased linearly with the increase of coffee hulls in EG silage. The
effluent production occurred only in the silage without coffee hulls on
the first five days, with higher production on the first three days. The
N-NH3 values decreased linearly with the increase of the coffee hulls.
There was an increase in CP content as the coffee hulls increased. There
was an increase of NDF and reduction of the ADF and IVDDM linear decrease
with the increase of the coffee hulls. These results show that the coffee
hulls as an additive was effective in improving the characteristics of
elephant grass silage cut at 70 days of age
Keywords: absorbent additive; dry matter digestibility; fiber;
fermentative standard; forage conservation.
Recebido em 21 de novembro de 2013.
Aceito em 23 de maio de 2018./
Introdução
O Brasil apresenta uma estação seca bem definida, a qual predispõe a uma queda considerável na disponibilidade e qualidade das pastagens, trazendo assim prejuízos diretos na produção de bovinos e diminuindo de forma sensível o rendimento dos pecuaristas. Visando amenizar esse problema, os pecuaristas buscam alternativas como: silagens, feno, forrageiras de inverno e outros. Mesmo assim, há necessidade de buscar fontes de alimentos alternativos a ser utilizados na alimentação animal. No entanto, existem recursos alimentícios pouco utilizados principalmente pela carência de estudos indicando quantidades seguras para sua inclusão na dieta animal. Um desses recursos nas regiões cafeeiras é a casca de café, que há alguns anos vem sendo pesquisada e utilizada na alimentação animal em alguns países da América Latina e Brasil(1, 2). Algumas pesquisas mostram a possibilidade de se incluir a casca na alimentação de ruminantes com confiabilidade e probabilidade de se obter respostas satisfatórias na produção de leite e no ganho de peso de novilhos em terminação(1, 2).
O capim-elefante é estudado há muitas décadas, mas os produtores e técnicos ainda veem a necessidade de se obter uma silagem melhor dessa forrageira, visto que seu elevado teor de umidade conduz a perdas na ensilagem. As perdas por efluente reduzem o valor nutricional da silagem, pois na solução existem nutrientes, como carboidratos solúveis, ácidos orgânicos, minerais e compostos nitrogenados solúveis, o que leva à maior proporção dos componentes da parede celular na silagem, que são nutricionalmente menos desejáveis(3). Outros fatores, como baixo teor de carboidratos solúveis e a alta capacidade tampão das gramíneas de maneira geral, podem impedir adequado processo fermentativo, o que desfavorece a produção de silagens de boa qualidade(4, 5).
Silagens produzidas com forrageiras com alto teor de umidade podem criar condições para atuação de bactérias do gênero Clostridium, que promovem a degradação da proteína e ácido lático e produzem ácido butírico. Esta formação de ácido butírico tem como resultado grandes perdas de massa de matéria seca e energia decorrente da produção de gás carbônico e água(4, 6). Dessa forma, o uso de aditivos absorventes ou o emurchecimento da forragem tem sido técnicas recomendadas no controle da produção de efluentes(7).
A utilização de resíduos agrícolas e de agroindústrias na alimentação de bovinos visando a redução de custos com a alimentação é objeto de estudos em várias pesquisas. Nesse contexto, a casca de café não poderia fugir à regra, devido, principalmente à sua disponibilidade nos estados e regiões produtoras. O uso da casca de café na alimentação de bovinos está se tornando rotineiro entre os pecuaristas, devido à sua grande disponibilidade e à significativa redução nos custos da alimentação com o uso dessa(6,7,8).
Na safra de 2017, o Brasil produziu 44,97 milhões de sacas de café beneficiado e, considerando-se a relação 1:1 para café beneficiado:casca de café, essa produção gerou 2,70 milhões de toneladas de casca de café(9). A casca do café beneficiado pode retornar às lavouras de café como adubo orgânico sendo dessa maneira fonte de potássio ou se perder por não ter utilização(10). Dessa forma, o aproveitamento da casca de café para a redução da umidade do capim-elefante na produção de silagem é uma solução prática para melhorar o aproveitamento da casca de café na alimentação de ruminantes. Com essa prática, a casca de café deve ser estudada como aditivo na silagem de capim-elefante buscando melhorar as características bromatológicas dessas silagens para a alimentação de bovinos.
Objetivou-se através deste trabalho avaliar o valor nutricional e as características da silagem de capim elefante, cortado aos 70 dias de rebrota, com a adição de quatro níveis de casca de café.
Material e Métodos
O experimento foi instalado no Campo Experimental de Três Pontas-CETP, localizado no município de Três Pontas, latitude 21º 22' 00" S, longitude 45º 30' 45" W e altitude 885m da EPAMIG, em área de meia encosta e que recebe rotineiramente somente adubação com esterco de curral, no período de fevereiro a abril de 2008. Para a instalação do experimento, foram utilizados silos de PVC medindo 150 mm de diâmetro e 750 mm de comprimento. A forrageira utilizada foi o capim-elefante (Pennisetum purpurum Schum), cultivar mineiro cortado aos 70 dias após o corte de nivelamento.
O delineamento experimental utilizado foi blocos casualizados com quatro tratamentos e seis repetições. Os tratamentos utilizados foram: T1 = capim-elefante (CE) cortado aos 70 dias de idade (CE); T2 = CE + 10 % de casca de café (CC); T3 = CE + 20 % de CC e T4 = CE + 30 % de CC. O processo de ensilagem foi feito misturando-se a casca de café ao capim-elefante seguindo os tratamentos e, em seguida, o material foi colocado nos silos. O capim foi picado em picadeira de forragem em partículas de aproximadamente 2 cm e a casca de café não sofreu nenhum tratamento ou moagem, mas foi compactada de maneira a obter aproximadamente 550 kg/m3. Após o enchimento, os silos foram fechados com tampa de PVC dotada de válvulas tipo "Bunsen" e lacrados com fita adesiva. A casca de café foi obtida da limpeza do café colhido das Lavouras da FETP.
O corte foi realizado manualmente em 18/02/2008, em seguida a forragem foi triturada em partículas de aproximadamente 2 cm, sendo posteriormente retirada uma amostra para determinação dos teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA), lignina, cálcio, fósforo e digestibilidade in vitro da MS (DIVMS)(11).
Foram coletadas amostras do material antes do processo de ensilagem para avaliar a sua composição bromatológica, cujos dados são apresentados na Tabela 1. Os silos foram abertos 60 dias após o fechamento para retirada de amostras desses. Parte das amostras foram secas em estufa a 55 °C com ventilação forçada por 72 horas, em seguida moídas em moinho com peneira de 2 mm para determinação dos teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA), lignina, cálcio, fósforo e digestibilidade in vitro da MS (DIVMS)(11). A cafeína foi determinada segundo metodologia do Instituo Adolfo Lutz(12). A celulose foi calculada pela diferença entre a FDN e lignina. Outra parte das amostras foi submetida a prensa hidráulica com pressão de 2 kgf cm-3 para obtenção dos extratos das silagens para determinação do nitrogênio amoniacal (N-NH3)(13). O pH foi medido em peagâmetro digital imediatamente após obtenção dos extratos.
A medida de produção de efluentes foi realizada coletando-se os efluentes em baldes de plástico previamente tarados e pesados diariamente até peso constante. Todos os silos foram pesados após o seu enchimento e antes de serem abertos. O valor da diferença entre essas pesagens e após descontada a produção de efluentes foi usada para o cálculo da produção de gases.
Os dados foram analisados utilizando-se o pacote estatístico Sistema de Análise de Variância para Dados Balanceados - Sisvar e, quando significativas, as médias foram comparadas pelo teste de regressão(14).
Resultados e Discussão
Os valores de pH, produção de efluente e gás, nitrogênio amoniacal (N-NH3), cafeína, cálcio e fósforo das silagens estão apresentados na Tabela 2. A análise de variância mostrou significância (P>0,01) para MS, pH, N-NH3, cálcio e fósforo. Na Tabela 3 estão apresentadas as equações de regressão mostrando o efeito do nível de casca de café sobre essas variáveis.
A MS, o pH e a concentração de N-NH3 em % do nitrogênio total (NT) são parâmetros indicativos de boa fermentação e alguns dos indicadores da qualidade das silagens. O termo qualidade da silagem é usado para caracterizar a extensão do processo fermentativo e se ele aconteceu de forma adequada e não para designar seu valor nutritivo(16).
Neste estudo, os valores de MS aumentaram enquanto os de pH reduziram linearmente com o aumento da quantidade de casca de café utilizada na silagem de capim-elefante (Tabela 3). Para a produção de MS, esse aumento foi estimado em 0,63% de MS para cada unidade de casca de café acrescida a silagem. Considerando que(5, 22 e 24) recomendam valores de MS para uma boa silagem entre 28 e 35%, a quantidade estimada pela equação de regressão de casca de café a ser adicionada ao capim-elefante cortado aos 70 dias de idade pode variar de 20 a 30%. Em relação ao pH, a redução foi estimada em 0,035% por unidade de casca de café adicionada. Os valores de pH estabelecidos na literatura(22,24), como adequados para silagem devem estar entre 3,8 e 4,2. Assim os valores encontrados neste trabalho podem ser considerados dentro desta faixa, com exceção da silagem com 30% de casca de café.
Os valores de pH deste estudo (Tabela 2) são próximos aos encontrados por(15, 16) que trabalharam com silagem de capim elefante, cultivar Cameroon, cortado com aproximadamente 70 dias de idade acrescido de diferentes níveis de casca de café. Segundo(15), os valores de pH das silagens com níveis de 0; 8,7; 17,4; 26,1 e 34,8 % de casca de café tiveram efeito quadrático nos níveis de casca e o valor de pH estimado foi igual a 3,78 para o nível de 26,87% de casca de café. As silagens com níveis 0 e 8,7% de casca apresentaram baixos teores de MS que, associados aos maiores valores de pH, podem ter contribuído para a ocorrência de uma fermentação inadequada, percebida por forte odor desagradável, semelhante à fermentação acética(15). Por outro lado, os maiores teores de carboidratos ácidos digeríveis determinados na casca de café em relação ao capim-elefante (25,97 e 19,48% na casca e capim elefante, respectivamente) podem indicar que a casca de café contribuiu para melhorar o padrão de fermentação de silagens de capins(15).
Trabalhando com silagens de capim elefante(16), cultivar Cameroon cortado aos 70 dias de idade, procedente da mesma capineira(15) e recebendo 0, 6, 12, 18 e 24% de casca de café moída com base na MS, também encontraram efeito quadrático da inclusão de casca de café sobre os valores de pH e de processamento da casca (com ou sem moagem), e estimaram o pH mínimo de 3,87 para casca inteira (18,59%) e de 3,95 para casca moída (9,87). Ainda segundo(15), o pH das silagens com 24% de casca moída foi de 4,29, muito próximo de 4,2.
Usando casca de café em silagem de capim-elefante Cameroon(16), no níveis 0, 10, 20, 30 e 40% com base na matéria natural, relatam que os valores de pH decresceram linearmente com a adição de casca de café, redução 0,026% por unidade de casca de café acrescida, e estes valores variaram de 5,1 (0% de casca) a 4,0 (40% de casca). Valores estes acima dos encontrados neste estudo.
A produção de efluente ocorreu somente na silagem de capim-elefante e nos cinco primeiros dias, com maior produção nos três primeiros, de 6,99% (Tabela 2). Avaliando a produção de efluente em silagem de capim-elefante Cameroon com diferentes níveis de casca de café, (18) relatam que, na primeira semana, apenas as silagens sem casca de café e as com 6 e 12% de casca inteira e moída e 18% de casca inteira produziram efluente, e o pico de produção foi registrado no primeiro dia de colheita. Outros autores(19), trabalhando com silagem de capim marandu, relatam que 80, 75 e 30% do total de efluente foram produzidos no primeiro dia de ensilagem em silagens com 0, 5 e 10% de polpa cítrica peletizada, e a produção de efluente cessou ao final de cinco. Também(20) relataram em trabalho com silagem de capim-elefante com 13% de umidade, que mais de 55% do total do efluente foi produzido nos dois primeiros dias, independente da compactação.
Segundo(18), a casca de café, em virtude de sua elevada quantidade de MS e sua boa capacidade em reter água e comprovada eficiência como aditivo absorvente, reduziu a produção de efluente, pois as silagens com 18 e 24% de casca não produziram efluente.
A produção de gás não apresentou diferença significativa (P>0,01) entre os tratamentos e foi em média 6,75% da MS. Estudando os efeitos da compactação, da inclusão de aditivo absorvente e do emurchecimento na composição bromatológica de silagens de capim-tanzânia, Tavares et al.(21) encontraram efeito significativo (P<0,01) para silagem, densidade e silagem x densidade quanto à produção de gás, mas a análise de regressão não mostrou efeito da densidade na silagem de capim emurchecido, que apresentou a menor produção média de gás, 4,2%, mas, nas silagens testemunhas e com polpa cítrica, a produção decresceu de 5,31 e 2,31% à medida que aumentou a densidade de 400 para 900 kg/m3.
As perdas por gases nas silagens estão diretamente ligadas ao tipo de fermentação que ocorre: se a fermentação é feita por bactérias homofermentativas, que utilizam glicose como substrato para produzir lactato, as perdas de MS são menores, mas, se a fermentação é realizada por bactérias do tipo heterofermentativas, enterobactérias e leveduras, ocorre a produção de álcool (principalmente etanol ou manitol) e as perdas são maiores por gases(22). Essa pesquisa afirmou também que gramíneas, principalmente as tropicais usadas para ensilagem, são colhidas com excesso de umidade e, nessa condição, as perdas de MS por gases podem ser ainda maiores pela ocorrência de fermentação butírica, normalmente ocasionada por clostrídios, levando também a grandes perdas de MS e energia.
Outro parâmetro que ajuda a avaliar a qualidade da silagem é o N-NH3, produto resultante da fermentação da proteína do material ensilado. Neste trabalho, os valores decresceram linearmente com o aumento da inclusão da casca de café na silagem de polpa de café na proporção de 1,97% para cada unidade de casca de café acrescentada a silagem (Tabela 2 e 3). No entanto, nenhuma silagem obteve valor abaixo de 10% considerado como limite para silagem de boa qualidade. Para(23), silagens classificadas como de boa qualidade têm valores de N-NH3 inferiores a 10%, pois assim, durante o processo de fermentação, não ocorreu quebra excessiva da proteína em amônia. Para(22), as bactérias acidoláticas podem agir com proteolíticas, mesmo não tendo esta característica, quando o ambiente é limitado de nutriente ou tem baixo poder de síntese de aminoácidos. Essa pode ser uma explicação para o fato de as silagens apresentarem altos valores para N-NH3, principalmente as silagens com 0, 10 e 20% de casca de café. Por outro lado, para(24), quando há condição ácida suficiente, microrganismos indesejados são inibidos. No entanto, isso parece não ter ocorrido neste estudo, pois existiram as condições ácidas com pH variando de 4,27 a 3,59 e o N-NH3 de 44,49 a 14,00 % do N total, respectivamente para as silagens com 0 e 30% de casca de café.
Estão apresentados na Tabela 2 os teores de cálcio e fósforo das silagens de capim-elefante com diferentes proporções de casca de café. Foram observadas diferenças significativas (P<0,01) para essas variáveis e as equações de regressão mostraram redução linear nos valores destes minerais em função do acréscimo de casca de café na silagem de capim da ordem de 0,014% e 0,006%, respectivamente, para o cálcio e fósforo, por unidade de casca de café acrescida à silagem de capim (Tabela 3). Essa redução pode ser explicada pela diferença entre os teores desses nutrientes no capim (Tabela 1) em relação à casca de café, pois, segundo(25), a casca de café tem em média menores valores de cálcio (0,35% na MS) e menores de fósforo (0,10% na MS) comparados ao capim-elefante (0,70 e 0,43% na MS respectivamente para cálcio e fósforo).
Esses teores encontrados (Tabela 2) em média são próximos aos encontrados por(8) que foram de 0,36 e 0,18% para cálcio e fósforo respectivamente. Segundo esses autores, considerando as exigências de mantença de um novilho adulto, de 9 g para cálcio e 7 para fósforo(26), a casca não pode ser considerada boa fonte destes minerais. Outro problema limitante, ao considerar a casca como fonte destes minerais, é sua biodisponibilidade ou valor biológico para os bovinos não ser conhecida.
Houve efeito significativo (P<0,01) sobre os teores de PB, FDN, FDA, lignina, celulose e DIVMS com o aumento na quantidade de casca de café nas silagens de capim elefante. Na Tabela 4 estão apresentados os valores de PB, FDN, FDA, lignina, celulose, DIVMS e cafeína em % na MS e, na Tabela 5, as equações de regressão mostrando o efeito do nível de casca de café nas silagens de capim-elefante.
A análise de regressão apresentou efeito cúbico para o teor de PB à medida do aumento da casca de café nas silagens de capim-elefante (Tabela 5). Os valores para PB encontrados neste estudo foram superiores aos de(17) com silagem de capim-elefante e casca de café, e (21) com silagem de capim-tanzânia e próximos aos de(15) e (16) para silagem de capim-elefante com casca de café. Menor teor de PB na silagem de capim sem casca de café comparado ao valor do capim antes de ensilar (16,98% - Tabela 1) pode ser resultado da perda de efluente. Segundo(15), a silagem de capim sem casca de café também teve seu teor reduzido, comparado ao valor antes da ensilagem e este fato foi atribuído à perda de compostos nitrogenados solúveis no efluente, fato este constado por(16, 21). De acordo com (4), a perda de MS como efluente pode ultrapassar 9% nas silagens com 85% de umidade. Muito provavelmente, foi o que ocorreu neste estudo.
Outro fator a influenciar a redução no teor de PB da silagem de capim pode estar associado à diluição, uma vez que a casca de café apresentou teor proteico menor que o capim-elefante (Tabela 1), assim o aumento da proporção de casca de café na silagem de polpa reduzirá o teor de proteína da silagem. Embora aconteça essa redução, os valores de PB podem ser considerados bons, pois estão acima de 10%. Estes valores estão próximos daqueles encontrados por(8) avaliando casca e polpa desidratada de café de três cultivares(21) em silagens de capim Tanzânia.
Como pode ser observado nas Tabela 4 e 5, os teores de FDN e FDA foram influenciados pelos níveis de casca de café (P<0,01) na silagem, sendo estimado o valor de 64,71% para FDN e 39,43% para FDA para silagem sem casca de café, e uma redução e aumento linear de 0,15 e 0,13%, respectivamente para FDN e FDA, por unidade de casca de café adicionada (Tabela 5). Os valores de FDN (Tabela 4) deste estudo foram próximos aos de(15) e(16) enquanto os de FDA foram inferiores aos encontrados por estes autores. O maior valor de FDN da silagem sem casca de café (66,15%) comparado ao do capim antes de ensilar (62,29%) pode ser explicado segundo(4) e(16) pela perda de componentes solúveis da MS pelo efluente (Tabela 2), o que provoca aumento nos teores dos componentes da parede celular. Efeitos lineares da inclusão de casca de café na silagem de capim elefante, sobre a FDN, semelhantes aos deste estudo, também foram encontrados por(15, 16 e 17). Resultados semelhantes foram encontrados por(27) quando avaliaram silagem de capim tanzânia com 0, 5 e 10% de polpa cítrica, o declínio foi, respectivamente, de 68,1; 63,9 e 60,8%. Também(28), trabalhando com farelo de mandioca na silagem de capim-elefante, verificaram redução linear nos teores de FDN das silagens.
Os teores de FDA e lignina das silagens aumentaram linearmente com o aumento dos níveis de casca de café nas silagens, enquanto os teores de celulose reduziram, como mostram as Tabelas 4 e 5. Esse aumento pode ser explicado pela FDA, que segundo(23), é composta principalmente pelas frações de lignina e celulose e, também, devido à casca de café apresentar maior teor de FDA (47,33%) comparada ao capim-elefante (39,20%) como apresentado na Tabela 1. Esses valores se comparam aos de(15) e são inferiores aos de(16 e (17), trabalhando com níveis crescentes de casca de café na silagem de capim elefante. No entanto,(17) afirmam em seu estudo que os valores de FDA (53,6%) e celulose (38,5%) das silagens de capim-elefante não foram influenciados pela adição de casca de café. Fato confirmado por(16), que afirmam ser o maior FDA da casca de café (50,17%) em comparação ao capim (47,17%) o fato contribuidor teor de para este comportamento.
A casca de café é um resíduo com alto teor de lignina. Neste estudo a inclusão de casca de café na silagem de capim aumentou linearmente os teores de lignina nas silagens (Tabela 4 e 5), e este aumento foi de 3,14 na silagem sem casca de café para 8,47% na silagem com 60% de casca.
A casca de café apresentou um teor de 1,1% de cafeína (Tabela 1) e ao ser acrescentada nas silagens de capim apresentou teores de 0,57; 0,58 e 0,65% nas silagens com 10, 20 e 30% de casca de café (Tabela 4) e segundo estes dados não sofre alteração em seu conteúdo com a fermentação durante o processo de ensilagem.
Segundo(29, 30 e 31), um dos fatores que pode reduzir o consumo voluntário em bovinos é a cafeína. Para(32), a presença de casca de café nas rações em níveis maiores de 0,12% de cafeína e 0,75% de taninos provoca efeitos adversos no consumo e na utilização do alimento pelos bovinos, mas(33) afirmam que ruminantes em crescimento toleram um consumo máximo de taninos de 28g/100 Kg de peso vivo/dia e este valor estaria associado à ingestão de 4,5g de cafeína/100 Kg de peso vivo/dia. Não foram realizados estudos de consumo das silagens de polpa de café acrescida de casca de café, portanto não sabemos se a cafeína contida nas silagens tem o mesmo efeito da contida no material sem ensilar. Será necessário estudo nesse sentido para recomendar, com segurança, silagem de capim-elefante mais casca de café para ruminantes.
A análise de variância indicou diferença significativa (P<0,01) entre as silagens quanto a DIVMS e a análise de regressão mostrou sua redução linear com o aumento da casca de café nas silagens de capim-elefante. Essa redução foi estimada em 0,14% para cada unidade de casca de café adicionada à silagem. O valor médio foi de 58,07% (Tabela 4), que consideramos médio a alto. Também(15) encontraram uma redução estimada de 0,14% na DIVMS por unidade de casca de café acrescida à silagem de capim-elefante cameroon. Esses valores são parecidos com os de(16), que encontraram efeito quadrático da inclusão de casca de café na silagem de capim-elefante. Esses autores afirmam que a redução na DIVMS com a inclusão da casca de café pode ser atribuída a menor DIVMS deste subproduto, decorrente do elevado teor de lignina.
Alguns resultados semelhantes foram encontrados por(17), que observaram redução linear da adição de casca de café na silagem de capim-elefante cameroon, estimada em 0,24% para cada unidade percentual de casca de café adicionada. Também estes autores afirmaram ser o elevado teor de lignina da casca de café o principal fator a contribuir para a redução da DIVMS.
Como informa(11), "a técnica da fermentação in vitro não se destina a considerar a composição química da forragem, mas, principalmente, a estimar sua digestibilidade". Pelos resultados existentes na literatura, podemos observar que são divergentes e essas diferenças podem estar relacionadas a cultivares de café de onde obteve-se o material, processos de preparação como secagem, se em terreiro ou secador mecânico, e forma de beneficiamento do produto, principalmente para produção da casca de café. Máquinas beneficiadoras potentes podem fazer uma separação melhor entre o endocarpo (pergaminho) e o epicarpo e mesocarpo (casca e polpa). Neste sentido, o produto final, ao ser recolhido, teria maior quantidade de epicarpo e mesocarpo. Se ocorrer o contrário, ou seja, no beneficiamento do café o pergaminho permanecer junto da casca, a qualidade deste resíduo pode ficar comprometida.
Conclusão
A casca de café se mostrou um aditivo eficiente em melhorar as características da silagem de capim-elefante cortado aos 70 dias de idade, principalmente pelo aumento no teor de MS das silagens e redução nas perdas de nitrogênio amoniacal.
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