AVALIAÇÃO
DA INTEGRIDADE DE MEMBRANA
Lucas
Luz Emerick1, Juliano Cesar Dias2,
Vicente Ribeiro do Vale Filho3, Martinho de Almeida e Silva3,
Venício José de Andrade3, Ticiano Guimarães Leite1,
Jorge
André Matias Martins4
1Doutorando da Escola de
Veterinária da
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,MG -
lucaslemerick@yahoo.com.br
2Professor Doutor do Instituto
Federal
Catarinense,
Laranjeiras do
Sul, PR
3Professor Doutor da Universidade
Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte, MG
4Bolsista Doutor
Universidade Federal do Ceará, Fortaleza. CE
RESUMO
EVALUATION OF MEMBRANE
INTEGRITY OF CRYOPRESERVED BOVINE SPERM TO PREDICT PREGANANCY RATES
ABSTRACT
INTRODUÇÃO
A demanda de sêmen criopreservado vem aumentando
no Brasil
nas últimas décadas em decorrência do uso cada vez mais intenso de
animais
geneticamente superiores nos rebanhos por meio de inseminação
artificial (IA) e
do maior emprego de outras biotécnicas como a transferência de embriões
(TE) e
a fertilização “in vitro” (FIV)
(FOLHADELLA, 2008). A IA é uma das técnicas mais simples e de baixo
custo
empregada na reprodução animal, além de ser a que apresenta melhor
resultado
nos programas de melhoramento genético do rebanho, com a utilização de
sêmen de
reprodutores de comprovado valor genético. Apesar de sua aparente
simplicidade,
a IA requer criterioso e rígido controle nas suas diferentes etapas,
que vão da
seleção dos reprodutores doadores de sêmen, passando pelos processos
tecnológicos de envasamento e criopreservação do material fecundante e
pelo
controle sanitário e ginecológico das matrizes, até o treinamento do
inseminador (OHASHI, 2002).
Índices de fecundação obtidos pelo sêmen
congelado, tanto no uso da IA quanto na FIV, têm apresentado grande
variabilidade, mesmo com amostras de alta qualidade quanto à qualidade
espermática pós-descongelação, avaliada segundo técnicas convencionais
como a
motilidade, a concentração e os defeitos espermáticos. Apesar dos
grandes
avanços ocorridos na obtenção de crioprotetores mais eficientes, ainda
são
necessários estudos que elucidem melhor a funcionabilidade de membranas
espermáticas (RODRIGUES-MARTINEZ, 2003), uma vez que a criopreservação
provoca
estress químico, osmótico, térmico e mecânico, sendo que eles são
originados,
principalmente, nas fases de resfriamento e descongelamento do sêmen,
conduzindo à perda de em torno 50 % na viabilidade espermática (WATSON,
1995).
Dessa forma, novos testes em sêmen bovino criopreservado têm sido
utilizados
para se avaliarem as membranas plasmática, mitocondrial e acrossomal,
além da
prova de resistência metabólica, na tentativa de predizer com maior
acurácia a
qualidade do sêmen, já que os testes-padrão utilizados (motilidade,
concentração e morfologia espermáticas) não são suficientes para o
diagnóstico
da real capacidade fecundante dos espermatozóides (ZHANG et al., 1999;
RODRIGUES-MARTINEZ, 2003; MELO et al., 2005) e que as membranas
espermáticas
possuem funções ativas no processo de fertilização como a capacitação,
reação
acrossômica, hiperativação da motilidade e interação com a membrana
plasmática
do oócito (GADELLA et al., 2001).
Portanto, o Thos (teste hiposmótico), o TTR
(teste de termorresistência) e a RAI (reação acrossômica induzida) têm
sido
estudados em sêmen criopreservado na tentativa de se obterem relações
satisfatórias com índices de prenhez. No entanto, na literatura, tem-se
observado contradição nesses resultados, pois resultados descritos por
RODRIGUES-MARTINEZ (2003) e KIRK et al. (2005) demonstram que nenhum
teste possui
alta correlação com fertilidade, dada a complexidade da célula
espermática, bem
como do processo de fertilização, sendo necessária a utilização de
modelos de
análises de regressões múltiplas para melhor prever índices de prenhez.
Dessa forma, objetivou-se com este trabalho
avaliar a qualidade de membranas espermáticas pós-criopreservação
obtida por
cinco testes diferentes, estimar as correlações entre as variáveis
observadas
incluindo-se o índice de prenhez e estabelecer o modelo de regressão
para prever
o índice de prenhez, utilizando-se amostras de sêmen de tourinhos
Tabapuã, aos
dois anos de idade, selecionados pela Classificação Andrológica por
Pontos
(CAP).
As colheitas de sêmen foram
realizadas com auxílio de aparelho eletroejaculador e as avaliações
físicas
(motilidade, vigor e turbilhonamento) dos espermatozóides realizadas
imediatamente após as ejaculações. O sêmen foi transportado em
temperatura
ambiente em solução de formol-salino tamponada (HANCOCK, 1957) para
posterior
avaliação morfológica e as demais análises foram realizadas no
Laboratório de
Andrologia da Escola de Veterinária da UFMG de acordo com a metodologia
do
CBRA, 1998.
Os animais cujo sêmen foi destinado
à criopreservação apresentaram as seguintes características: < 15%
de
defeitos maiores e < 25% de defeitos totais, e que, no momento da
coleta,
apresentaram motilidade espermática progressiva retilínea (Mot Pré) ≥
que 60%,
com vigor (0-5) = 5 (CBRA, 1998). A congelação do sêmen foi realizada
de acordo
com ABREU (2002) (comunicação pessoal). Após essas análises, o sêmen
foi
diluído e envasado em palhetas tipo francesa, 0,5 mL, com o diluidor
lactose-gema (CANISSO, 2008), com posterior resfriamento e equilíbrio
por
período de seis a oito horas, a 5°C.
Após a fase de equilíbrio, a
congelação do sêmen foi realizada por 15 minutos em vapor de nitrogênio
líquido
atingindo a temperatura de -120 °C com posterior imersão no mesmo.
Trinta doses
de sêmen foram congeladas para cada tourinho selecionado. Os critérios
para
aprovação do sêmen bovino pós-congelação seguiram as recomendações do
CBRA
(1998). A concentração espermática, por dose envasada por palheta foi
de 20
milhões de espermatozóides totais.
Os testes funcionais utilizados foram: (1) o hiposmótico (Thos); (2) a reação acrossômica induzida por heparina (RAI); (3) o teste de termoresistência lenta (TTRl); (4) teste de termoresistência rápida (TTRr); e (5) avaliação da viabilidade espermática pelo azul de tripan após a criopreservação (Txviv 0) e após a incubação com a heparina (Txviv RAI).
A metodologia para o
Thos (avaliação a integridade funcional da membrana plasmática
espermática)
consistiu na mistura de uma alíquota de 30 microlitros (µL) de sêmen em
300 µL
de solução contendo citrato de sódio e frutose, a 100 mOsmol/mL,
mantida a
Na
RAI (avaliação da
capacidade das membranas acrossomais passarem pela reação acrossômica),
o
material descongelado e contendo sêmen com diluente foi lavado por
centrifugação
(1) 250
µL sêmen + 750 µL Talp (controle) incubados por 4 horas e 15 minutos;
(2) 250
µL sêmen + 650 µL Talp + 100 µL de heparina, incubados por 4 horas e 15
minutos;
(3) 250
µL sêmen + 550 µL Talp + 100 µL de heparina + 100 µL de
Lisofosfatidilcolina
(LPC) adicionado depois de 4 horas, permanecendo por até 15 minutos de
incubação.
Após
essas incubações
e no tempo zero (logo após o descongelamento do sêmen), a viabilidade
espermática e a integridade do acrossoma foram avaliadas pelo método
azul
tripan e giemsa, respectivamente, adaptado de FELICIANO SILVA (1998).
Para tal,
primeiramente, o sêmen foi incubado com o azul de tripan em banho-maria
por um
período de 15 minutos. Após essa incubação, o azul de tripan foi
retirado por
três centrifugações sucessivas a 300 g por dez minutos, quando, então,
foi
ressuspendido por 100 µL em meio Talp Hepes. Posteriormente, uma gota
foi
obtida e colocada sob uma lâmina para realização do esfregaço, sendo
que para
cada amostra foram realizados três esfregaços. A concentração do azul
de tripan
foi de 0,4 % e do giemsa foi de 0,8 % diluídos em água destilada, sendo
que o
giemsa foi utilizado diretamente sob esfregaço na lâmina durante um
período de
60 minutos. A concentração de heparina foi 50 µg/mL e o LPC, 100 µg/mL
(SALVADOR et al., 2008).
A
fórmula usada para a
interpretação da RAI
foi a seguinte:
RAI =
((F3/(F2+F3)x100)-((C3/(C3+C2)x100)); em que:
F3= % de vivos
com acrossoma
reagido após 4: 15 h de
incubação;
F2= % de vivos
com acrossoma
íntegro após 4: 15 h de
incubação;
C2= % de vivos
com acrossoma
íntegro logo após
descongelamento do sêmen;
O sêmen dos doze tourinhos foi utilizado em novilhas para obtenção do índice de prenhez (IP) e submetidos aos testes funcionais, de acordo com parâmetros mínimos exigidos pelo CBRA (1998). O IP foi avaliado em quatro novilhas Nelore, por touro, inseminadas artificialmente, utilizando-se somente um ciclo estral por novilha.
As novilhas foram mantidas numa fazenda de
O delineamento experimental foi o
de blocos ao acaso. Foram estimados coeficientes de correlação entre as
variáveis testadas, incluindo-se o IP e ajustados diversos modelos de
regressão
para predizer o IP em função dos resultados obtidos nos testes para
avaliar a
integridade de membrana e características andrológicas, utilizando-se o
programa SAEG (2004).
Finalmente, as médias dos
resultados das variáveis obtidas nos testes funcionais foram comparadas
entre
si utilizando-se o teste SNK. As médias das variáveis de Mot Pós e de
ambos os
TTR foram comparadas utilizando-se o teste não paramétrico
Kruskal-Wallis, ao
nível de significância de 5% (SAMPAIO, 2002).
Entretanto, não foi observada correlação significativa entre a CAP e a Mot Pós. Esse resultado está de acordo com os de SALVADOR et al. (2008). Talvez, a explicação para isso seja o fato de que a alta qualidade do sêmen (verificada pela alta motilidade, baixos defeitos maiores e menores espermáticos), bem como a CE, sejam características indispensáveis à criopreservação de sêmen. Em outras palavras, como não há variabilidade entre características pós-congelação, não é possível de se detectar correlação significativa, uma vez que animais com baixas qualidades do sêmen pós-congelação são descartados desse tipo de experimento.
Na Figura 1 são apresentadas as comparações entre os resultados obtidos com os TTRs e a Mot Pós. A Mot Pós diferiu (p<0,05) quando comparados aos demais testes. Esse resultado sugere que os TTRs são mais sensíveis em relação à Mot Pós, trazendo informação adicional na avaliação de sêmen bovino criopreservado, uma vez que os resultados daqueles foram menores (p<0,05). Vale ressaltar que, neste estudo, nenhum resultado observado para qualquer dos testes foi correlacionado (p>0,05) com o IP.
O TTRr (10,1 %) não
diferiu do TTRl (16,7 %) (p>0,05), podendo ser recomendada a utilização do
TTRr, por requerer menor tempo na sua determinação em amostras de sêmen bovino
criopreservado com boa recuperação pós-descongelamento, uma vez que esse
resultado foi semelhante ao observado por ARRUDA et al. (1992), que trabalharam
com sêmen a fresco.
Na Figura 2 são apresentadas as comparações entre os testes funcionais de membrana. O Thos (24,7 %), a TxvivRAI (17,6%), a Txviv 0 (24,3 %) e o RAI (22,7 %) não apresentaram diferenças (p>0,05). Esses resultados sugerem que um teste pode ser utilizado como preditor do outro apesar de avaliarem diferentes aspectos das membranas espermáticas. O teste hiposmótico avalia a função da bomba de sódio e potássio, importante na passagem de água através da membrana (integridade funcional da membrana plasmática) (JEYENDRAN et al., 1984; CORREA & ZAVOS, 1994). O RAI avalia a capacidade das membranas acrossomais interna e externa passarem pela capacitação e reação acrossômica após incubação com heparina (FELICIANO SILVA, 1998; ASSUMPÇÃO et al., 2002) e os TxvivRAI e o Txviv avaliam a passagem do corante azul de Tripan pela bicamada lipídica (integridade estrutural da membrana plasmática) (VAZQUEZ et al., 1996).
Dessa forma, por qualquer método de avaliação da integridade da membrana, pode se determinar a viabilidade da mesma, já que, havendo alterações em sua estrutura, sua funcionalidade e a capacidade de haver reação acrossômica são também comprometidas, pois, com a formação de poros através da mesma, sua constituição e permeabilidade são alteradas afetando a fusão entre as membranas plasmática e acrossomal externa e a ação das bombas de sódio e potássio, respectivamente (WATSON, 1995).
A não diferença observada (p>0,05) entre os resultados
do RAI 3, Txviv 0 e TxvivRAI 3 corroborou as observações de PARRISH et al.
(1985). Esse resultado é esperado, porque na fórmula da interpretação da RAI
são considerados apenas os espermatozóides vivos após a incubação com a
heparina, pois tem sido descrito na literatura que espermatozóides submetidos à
capacitação e visualizados como mortos sem acrossoma são denominados de falsa
reação acrossômica (GADELLA et al., 2001).
FELICIANO SILVA (1998), trabalhando com sêmen a fresco,
observou valores do RAI, para grupos de baixa e alta fertilidade, de 14 e 34 %,
respectivamente, sugerindo que o sêmen de animais que possuem maiores resposta
de reação acrossômica estimulada pela heparina são aqueles que possuem maior
fertilidade. Talvez a explicação para isso seja o fato de que proteínas
ligadoras de heparina são necessárias para que essa exerça sua função de
capacitação e reação acrossômica, visto que tem sido reportado que animais que
possuem maiores concentrações de tais proteínas no plasma seminal são aqueles
potencialmente mais férteis (FOLHADELLA, 2008).
Neste experimento, o resultado obtido para o RAI foi
próximo (22,7 %) aos animais do grupo de alta fertilidade, como reportado por
FELICIANO SILVA (1998). Esse resultado reforça a idéia de que o sêmen
criopreservado utilizado neste experimento foi de alto poder fecundante e,
ainda, que o RAI pode ser considerado como um importante teste funcional de
membranas acrossômicas, relevante para indicar não somente a fertilidade do
sêmen fresco de um touro como também a congelabilidade e fertilidade do sêmen
criopreservado.
Tem sido relatado que animais com alta prevalência de
espermatozóides com defeitos de acrossoma “knobbed” possuem reduzida
fertilidade. Entretanto, permanece sem ser esclarecido se essa redução na
fertilidade se deve à falha na interação entre o espermatozóide e a zona
pelúcida dada a incompetência de receptor, ou à inabilidade funcional da
membrana espermática, impossibilitando-a de adquirir a hiperativação da
motilidade (SAACKE et al., 1994), ou à exocitose inadequada do conteúdo
acrossomal devido à alteração na forma acrossomal ou, ainda, à falha na
capacitação e reação acrossômica (THUNDATHIL et al., 2000).
Dessa forma, nesse experimento foi observada alta
correlação negativa entre os defeitos de acrossoma pré-congelação e o RAI (r =
-0,62 p<0,05), sugerindo que, pelo menos parcialmente, a incapacidade de
ocorrer reação acrossômica seja uma das explicações para a reduzida fertilidade
em espermatozóides com acrossoma “Knobbed”. Sabe-se que esse defeito de
acrossoma é o mais prevalente logo após a coleta de sêmen, visto que são
defeitos oriundos da espermiogênese e que as membranas espermáticas não foram
submetidas à injúria. Entretanto, vale ressaltar que esse resultado está em
desacordo com THUNDATHIL et al. (2002), pois eles observaram que o sêmen de
animais com alta incidência de defeito de acrossoma “Knobbed” possuíam maior
porcentagem de espermatozóides com acrossoma reagido.
A criopreservação provoca alterações semelhantes à
capacitação no espermatozóide bovino, desestabilizando a membrana plasmática
tornando-a mais sensível (GADELLA et al., 2001). O defeito de acrossoma
“Knobbed” resulta de espermiogênese imperfeita, seja por fatores ambientais ou
genéticos. Alta prevalência de defeitos oriundos da espermatogênese indica que
há falhas nesse processo, podendo acarretar o desenvolvimento anormal da
estrutura das membranas espermáticas (BLOM & BIRCH-ANDERSON, 1962), tornando-as
mais sensíveis, requerendo, assim, menor tempo para capacitação. Esses fatos
contribuem para explicar a divergência nos resultados observados entre este
experimento e o de THUNDATHIL et al. (2002), referente à relação entre o RAI e
o defeito de acrossoma, uma vez que esses autores trabalharam com sêmen
criopreservado e a metodologia para a RAI foi o tempo de incubação de duas
horas com a heparina, ou seja, o tempo de incubação foi mais curto e a
membrana, provavelmente, mais sensível, propiciando maior reação acrossômica
sem ter ocorrido a morte desses espermatozóides. Talvez, se esse autor tivesse
trabalhado com quatro horas de incubação, a maioria dos espermatozóides tivesse
morrido, ocorrendo, assim, apenas a falsa reação acrossômica.
TARTAGLIONE & RITA (2004) também registraram valores
próximos entre o Thos e a taxa de espermatozóides viáveis pelo método azul de
tripan/giemsa, sendo de 58,8 e 51,2 %,
respectivamente, corroborando o presente estudo. VAZQUEZ et al. (1996) e BRITO
et al. (2003) observaram diferenças entre os corantes vitais (azul de tripan) e
o Thos (p<0,05). Neste experimento as médias de Thos e Txviv 0 foram de 24,7
e 24,3 %, respectivamente. Esses valores foram a metade daqueles reportados em
todos os estudos supramencionados (≈ 50). Tem sido reportado na literatura que,
à medida que se aumenta a idade, ocorre também um aumento no percentual de
células espermáticas com membrana intacta quando o espermatozóide é submetido
ao processo de criopreservação, mesmo que o sêmen se encontre normal e com alta
qualidade sob o ponto de vista morfológico. Talvez o aumento da competência
estrutural e funcional associada à capacidade de crioresistência possa estar
relacionado ao volume da cabeça do espermatozóide detectada pela análise
morfométrica, uma vez que esse diminui com o avanço da idade e as
características indicativas de boa congelabilidade aumentam (MARTÍ et al.,
2011). Esse fato pode contribuir para explicar as diferenças nos resultados
obtidos neste experimento e naqueles, visto que nos últimos foram utilizados
touros Bos taurus taurus a partir de dois anos de idade, sendo que esses
animais são considerados mais precoces e possuem melhor congelabilidade quando
comparados a animais Bos taurus indicus (ANCHIETA et al., 2005).
Nos trabalhos citados anteriormente, não foram
apresentados os métodos de criopreservação; portanto, dada a importância na
qualidade de sêmen criopreservado, as diferenças entre o tipo diluidor e o
tempo de equilíbrio utilizados neste trabalho e naqueles também não podem ser
descartadas, pois são importantes para que ocorra adequada interação entre as
lipoproteínas do meio e a membrana plasmática e a manutenção da pressão
osmótica necessária para que ocorra adequadas troca de fluidos entre o meio
intra e extra celular, evitando formação de grandes cristais de gelo,
principalmente no interior da célula, que provocam lesões graves nas membranas
espermáticas (LEITE et al., 2010).
TARTAGLIONE & RITA (2004) reportaram que o Thos
avalia a integridade funcional da membrana plasmática na cauda do
espermatozóide. A correlação entre esse teste e a Mot Pós, o TTRl e o TTRr
foram de 0,76, 0,78 e 0,69 (p<0,05), respectivamente. Tais resultados
suportam essa hipótese, uma vez que a grande parte das mitocôndrias
responsáveis pela geração de ATP essencial para o batimento flagelar,
necessária para aquisição e manutenção da motilidade espermática, situa-se na
peça intermediária (CELEGHINI et al., 2008). Vale ressaltar que esse resultado
e aqueles registrados na Figura 2 sugerem que, apesar da compartimentalização
da célula espermática (regiões acrossômica, pós acrossômica e cauda), uma vez
que ocorre uma injúria em alguma porção da membrana plasmática, essa pode
ocorrer ao longo de toda a célula; portanto, a lesão pode não ser localizada ou
ainda a alteração na membrana plasmática espermática em qualquer porção pode
alterar de alguma forma a função da célula.
Na Tabela 2 são apresentados os resultados do sêmen
criopreservado de tourinhos Tabapuã com dois anos de idade, que foram usados na
IA, com obtenção do IP médio de 48 %. Foram formados dois grupos de IP (> ou
< do que 50 %), de acordo com CORREA et al (1997), comparando-os com
parâmetros de avaliação de sêmen pós-descongelamento e os testes funcionais
realizados. Como pode ser verificado, não houve diferença (p>0,05) entre as
variáveis estudadas nos dois grupos de touros quanto ao IP, desde que foram
preservados os valores mínimos preconizados pelo CBRA (1998) para sêmen
criopreservado, para se obter índices satisfatórios de prenhez, como obtido
neste experimento.
Esses resultados não estão de acordo com os encontrados por CORREA et al. (1997), que observaram diferenças (p<0,05) para Mot Pós, morfologia espermática, integridade de acrossoma e Thos, em relação a grupos de alta e de baixa fertilidade. Entretanto, vale ressaltar que esses autores trabalharam com taxa de não retorno aos 56 dias utilizando cio natural. Esses resultados também contrastam com os reportados por FELICIANO SILVA (1998), que trabalhou com monta e cio natural e encontrou diferença (p<0,05) entre a RAI de grupos com fertilidade superior (IP= 84 %) e inferior (IP= 65 %), porém estão de acordo com os obtidos por ASSUMPÇÃO et al. (2002). É possível que o fato de se ter usado sêmen criopreservado de tourinhos Tabapuã aos dois anos de idade, somente na primeira IA, em novilhas com o cio sincronizado pela PGF2α, e o tamanho da amostra utilizada neste estudo possam explicar o resultado contrastante observado neste experimento em relação aos autores mencionados. Esses resultados sugerem que existem outros fatores extra à qualidade do sêmen, sobretudo, a preservação das membranas espermáticas pós-criopreservação, não avaliadas neste experimento, que influenciam a fecundação e o desenvolvimento embrionário precoce.
Nenhuma característica analisada correlacionou-se (p>0,05) com IP, sendo o mesmo foi encontrado por ZHANG et al. (1999) e BRITO et al. (2003). As análises das equações de regressões múltiplas indicaram que o coeficiente de determinação aumentou progressivamente, à medida que foram acrescentadas ao modelo mais características a serem avaliadas. A inclusão de todas as variáveis explicativas no modelo, porém, não explicou significativamente as variações no IP, apesar de o modelo apresentar coeficiente de determinação R2= 0,83 (Tabela 3). Resultados prévios reportados por ZHANG et al. (1999) e KIRK et al. (2005) também indicam melhora na capacidade preditiva dos modelos para o índice de prenhez quando novas variáveis laboratoriais são acrescidas.
Dessa forma, visualiza-se a
complexidade dos eventos ligados à fertilidade e à célula espermática, que
envolvem diferentes fatores e podem explicar, parcialmente, a não significância
do modelo de regressão mesmo com R2 alto (0,83), por existirem
outros fatores envolvidos e que não foram controlados no presente estudo. A
utilização de maior número de fêmeas poderá permitir avaliar com melhor
precisão o efeito das variáveis, por diminuir o “erro” experimental.
O Thos, pela maior
facilidade de execução e maior repetibilidade de resultado, pode ser indicado
para a avaliação rotineira de amostras de sêmen criopreservado e para avaliar a
integridade das membranas espermáticas monitorando a qualidade da
criopreservação do sêmen.
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