RESUMO
Com o objetivo de avaliar as alterações no proteinograma sérico e
peritoneal de equinos submetidos a um modelo experimental de obstrução
intestinal, distribuíram-se vinte e quatro animais em quatro grupos:
controle instrumentado (GI), obstrução do duodeno (GII), íleo (GIII) e
cólon maior (GIV). Foram colhidas amostras de sangue e de líquido
peritoneal antes da intervenção cirúrgica (T0), após três horas de
obstrução (Ti) e com 1, 3, 12, 24, 72, 120 e 168 horas de reperfusão
(Tr). Após centrifugação e fracionamento das amostras, determinaram-se
as proteínas totais pelo método de biureto e separaram-se as frações
proteicas por eletroforese em gel de agarose. Foram observadas
alterações nas concentrações séricas e peritoneais das α, β e
γ-globulinas nos animais ensaiados. As alterações deveram-se ao
processo inflamatório intestinal desencadeado pelo modelo de obstrução
e ao trauma cirúrgico, associado à laparotomia. Animais submetidos à
obstrução de duodeno e íleo apresentaram maiores concentrações séricas
e peritoneais de proteínas de fase aguda. O fracionamento
eletroforético das proteínas contidas no líquido peritoneal é mais
sensível no diagnóstico de processos inflamatórios abdominais, quando
comparado ao sérico.
PALAVRAS-CHAVES: Cavalos, cólica, proteínas de fase aguda.
ABSTRACT
ELECTROPHORETIC PROFILE OF SERUM AND PERITONEAL PROTEINS OF HORSES
SUBMITTED TO EXPERIMENTAL OBSTRUCTION OF DUODENUM, ILEUM AND
LARGE COLON
Aiming at evaluating the electrophoresis profile of serum and
peritoneal protein in horses submitted to an experimental model of
intestinal obstruction, 24 animals were divided into four groups:
instrumented control (GI), duodenum obstruction (GII), ileum
obstruction (GIII) and large colon obstruction (GIV). Blood and
peritoneal fluid samples were collected before the surgical procedures
(T0), 3h after the obstruction (Ti) and 1, 3, 12, 24, 72, 120 and 168h
after reperfusion (Tr). After sample centrifuging and fractioning,
total protein were determined by biuret method, and the proteic
fractions were separated by electrophoresis in agarose gel. Alterations
were observed in serum and peritoneal concentrations of α, β and γ
globulins on the studied animals. The changes occurred due to the
intestinal inflammatory process caused by the obstruction model and the
surgical trauma, associated to laparotomy. Animals submitted to
duodenum and ileum obstruction showed higher serum and peritoneal
concentrations of acute phase proteins. The electrophoretic separation
of proteins included in the peritoneal liquid is more sensible when
compared to the serum concentration to the diagnosis of abdominal
inflammatory process.
KEYWORDS: Acute phase protein, colic, horse.699
INTRODUÇÃO
O paciente equino responde aos distúrbios gastrointestinais (cólicas) e
aos traumas cirúrgicos associados à laparotomia através de modificações
celulares, teciduais e sistêmicas. Estas modificações incluem alteração
no número, estrutura e função das células sanguíneas, desenvolvimento
de processos inflamatórios peritoneais e aumento na concentração das
proteínas de fase aguda (EURELL
et al., 1993).
As proteínas de fase aguda (PFA) são grupos de glicoproteínas
sintetizadas pelos hepatócitos, sendo suas produções estimuladas por
citocinas específicas, liberadas por leucócitos e macrófagos, com
rápidas elevações de sua concentração durante condições inflamatórias
(JACOBSEN & ANDERSEN, 2007). Podem ser classificadas em positivas,
representadas pela glicoproteína ácida, haptoglobina, ceruloplasmina,
macroglobulina e amiloide A, e em negativas, como a albumina e a
transferrina, cujos níveis séricos tendem a decrescer em condições
inflamatórias (MURATA
et al., 2004; CERÓN
et al.,
2005). De maneira geral, as PFA possuem a finalidade de inibir a
continuidade do dano tecidual, isolando e destruindo o organismo
agressor e ativando o processo de reparação necessária para o retorno
do organismo às funções normais (CERÓN
et al., 2005).
Na clínica, os métodos de detecção de proteínas de fase aguda têm
auxiliado o diagnóstico de processos inflamatórios. Alguns trabalhos
comparativos sugerem que as proteínas de fase aguda são mais sensíveis
para detecção de processos inflamatórios e infecciosos do que a análise
hematológica. De modo geral, o estímulo à síntese de proteína de fase
aguda ocorre no período de seis a oito horas após a injúria, sendo que
a concentração máxima é alcançada em dois a cinco dias. Porém, o pico e
a persistência das concentrações plasmáticas destas proteínas dependem
do metabolismo, extravasamento vascular e deposição tecidual (JAIN,
1993).
O fracionamento eletroforético representa um dos mais confiáveis
métodos de identificação e quantificação de proteínas dos fluidos
corporais (KANEKO
et al.,
2008). O eletroforetograma de equinos hígidos é caracterizado pela
ausência da região pré-albumina, α1-globulinas, α2-globulinas,
ß1-globulinas, ß2-globulinas e γ-globulinas. As proteínas que migram na
região das α-globulinas são as proteínas de fase aguda, que aumentam
imediatamente após inflamação ou infecção (CARAPETO
et al., 2006). Aumento nos níveis séricos de haptoglobina foi constatado por EURELL
et al. (1993) em pôneis submetidos à laparotomia exploratória. Por sua vez, SAQUETTI
et al.
(2008) verificaram aumento na concentração das PFA em equinos
submetidos à obstrução experimental do cólon menor. Resultados
semelhantes foram observados por FAGLIARI
et al.
(2008) em equinos com cólica e submetidos à laparotomia. Segundo esses
autores, os maiores percentuais de elevação apresentados pelos equinos
que foram a óbito após a cirurgia deveram-se, possivelmente, ao
agravamento do quadro clínico, indicando que a concentração plasmática
das proteínas de fase aguda é diretamente proporcional ao grau de lesão.
O objetivo do estudo foi avaliar e comparar possíveis alterações no
proteinograma sérico e no líquido peritoneal de equinos submetidos à
obstrução experimental do duodeno, íleo e cólon maior.
MATERIAL E MÉTODOS
Utilizaram-se 24 equinos, oito fêmeas (não gestantes), dezesseis
machos (doze castrados e quatro não castrados), sem raça definida, com
média de idade de 6,2±3,0 anos, escore corporal de três a quatro e peso
corporal médio de 295,9±32,7kg. Uma semana antes do experimento, após
avaliação clínica com o intuito de avaliar o status sanitário, fez-se o
controle de endoparasitas (mebendazol (Platelmin Equino – UCB S. A),
50mg kg
-1) e de ectoparasitas (deltametrina (Butox P –
Intervet S. A) a 0,025%). Os animais foram alojados em piquetes
coletivos com dieta à base de feno de coast cross (
Cynodon dactylon)
e água à vontade. A ração concentrada comercial (Tec Horse – Purina)
foi fornecida duas vezes ao dia em quantidade equivalente a 1% do peso
corpóreo (2,5 a 3,4kg), adicionada de 50g/dia de suplemento mineral
(Omolen Ephos – Purina).
Separaram-se os equinos em quatro grupos de seis animais (duas fêmeas,
três machos castrados e um não castrado), sendo um grupo-controle
instrumentado (G1, sem realização da obstrução intestinal, porém
submetidos aos mesmos procedimentos anestésicos e cirúrgicos descritos
para os animais dos demais grupos) e três grupos obstruídos. As
obstruções intestinais foram realizadas em três diferentes segmentos:
duodeno (GII), íleo (GIII) e cólon maior (GIV).
Os animais foram contidos em brete, e após tricotomia e antisepsia da
fossa paralombar foram sedados com acepromazina 1% (Acepran 1% - Univet
S.A- 0,025mg kg
-1, IV), cloridrato de xilazina 2% (Virbaxil 2% - Virbac - 0,5mg kg
-1,
IV) e meperidina (Dolosal - Cristália - 4mg kg-1, IM). Ato contínuo
procedeu-se à anestesia local infiltrativa, utilizando uma associação
(1:1) de lidocaína 2% (Lidovet - Bravet) e de bupivacaína 0,75%
(Neocaina 0,75% - Cristália), ambas sem vasoconstritor. Visando
mimetizar ao máximo as condições naturais, os animais ensaiados não
foram submetidos a jejum hídrico e alimentar prévios.
Com os animais em estação, por meio da laparotomia, flanco direito para
duodeno e íleo, e esquerdo para cólon maior, identificaram-se os
segmentos intestinais e, em seguida, um dreno de Penrose no 3 foi
posicionado ao redor da alça intestinal. Após o seu fechamento,
iniciou-se a obstrução intestinal, segundo modelo descrito por DATT
& USENIK (1975). Neste momento os animais receberam 1,5mg kg
-1,
IV de cloridrato de tramadol (Tramal - Cristália) e sequencialmente
procedeu-se à sutura simples contínua dos músculos transversos do
abdômen e da pele, utilizando-se de vicryl 0 e nylon no 4,
respectivamente. As obstruções foram mantidas por três horas e, após
este período, promoveu-se a reversão das obstruções, tendo como acesso
cirúrgico e protocolo os mesmos utilizados para promovê-las.
Removeram-se, então, os drenos e procedeu-se ao fechamento das
cavidades abdominais de acordo com a técnica descrita por TURNER &
MCILWRAITH (2002).
No pós-operatório, instituiu-se terapia antimicrobiana com penicilina
benzatina (Pentabiótico Veterinário Reforçado - Fort Dodge), na dose de
30.000UI kg
-1, im a cada 48 horas, perfazendo três
aplicações. Como analgésico e anti-inflamatório, administrou-se
flunixim meglumine, na dose de 0,5mg kg
-1, iv, a cada 24
horas, durante dois dias. Foi realizado curativo da ferida cirúrgica
com polivinilpirrolidona-iodo tópica a 1%, duas vezes ao dia até a
retirada dos pontos no décimo dia pós-operatório.
Para colheita do líquido peritoneal, realizou-se a paracentese abdominal segundo a técnica de NEVES
et al.
(2000). Após a colheita, as amostras de líquido peritoneal e as de
sangue, obtidas mediante punção da jugular, ambas colhidas em frascos
estéreis sem anticoagulante, foram centrifugadas e, após a dosagem das
proteínas totais, acondicionaram-se as alíquotas remanescentes em
flaconetes, identificadas e armazenadas a -20°C até o momento da
análise eletroforética. Obtiveram-se as proteínas totais (método de
Biureto), do soro e do líquido peritoneal com o auxílio de um conjunto
de reagentes (Abtest - Sistema de Diagnósticos Ltda. – Lagoa Santa,
Brazil.) e leituras espectrofotométricas (Labquest – Labtest). O volume
globular foi obtido em tubos de micro-hematócrito centrifugados a
14.000G, por cinco minutos com posterior leitura em escala especial.
O fracionamento eletroforético das frações proteicas do soro e do
líquido peritoneal foi obtido de acordo com o procedimento que se
segue. Após o preenchimento da cuba com 80 ml de tampão tris, pH 9,5 a
4°C, no filme de agarose (CELM – Cia. Equipadora de Laboratórios
Modernos – São Paulo, Brazil.), aplicaram-se alíquotas de 0,4µL das
amostras. Em seguida, colocou-se o filme de agarose em suporte
apropriado com a extremidade, onde foram colocadas as amostras voltadas
para o polo negativo. Colocou-se o “cassete” de modo a apoiar-se na
cuba, conectada a uma fonte (90 volts), durante vinte minutos. Em
seguida, mergulhou-se o filme em 200 mL de corante negro de amido, onde
permaneceu por cinco minutos, seguido por mais cinco minutos no
descorante à base de ácido acético a 5%. O filme foi colocado em
estufa, a 60ºC, até que ficasse completamente seco. Em seguida, passou
por nova fase de descoloração com banhos sucessivos de ácido acético a
5%, seguidos de nova secagem a 60ºC. Uma vez obtido o
eletroforetograma, caracterizado pela migração das frações proteicas
(albumina, α, β e γ-globulinas) no gel de agarose, realizaram-se
leituras densitométricas através do programa SDS-60, cujos valores
absolutos e relativos, de cada fração, foram finalmente obtidos.
Para cada equino, obtiveram-se as amostras de sangue e de líquido
peritoneal antes do início do procedimento cirúrgico (T0), após três
horas de obstrução (Ti) e após 1, 3, 12, 24, 72, 120 e 168 horas de
reperfusão ou pós-operatório (Tr). O ensaio foi aprovado pela Comissão
de Ética e Bem-Estar Animal, protocolo no 023232-05.
Utilizou-se um delineamento experimental inteiramente casualizado, com
quatro grupos submetidos a avaliações em nove momentos. Quando se
constatou significância entre grupos e momentos, aplicou-se o teste de
Tukey (P<0,05) para a comparação das médias, através do programa
estatístico SAS (Statistical Analysis of System – versão 8.).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados obtidos para os constituintes do proteinograma sérico e
peritoneal, com as respectivas médias, desvios-padrão e estatística
calculada estão expressos nas
Tabelas 1 e
2.
Durante toda a fase experimental, os valores das proteínas totais
encontrados no sangue dos animais dos quatro grupos experimentais
assemelharam-se aos valores de normalidade descritos na literatura
(LASSEN & SWARDSON, 1995), que estão em torno de 7,2 g/dL.
Entretanto, no líquido peritoneal dos animais dos grupos GII, nos T3r,
T12r, T72r, T120r e T168r, e nos do grupo GIII, nos T3r, T12r, T72r e
T168r, houve aumento nos valores das proteínas totais. Os resultados
foram associados à lesão entérica (MOORE & MOORE, 1994; LOPES
et al., 1999), resultante do modelo de obstrução.
Resultados semelhantes foram obtidos por DATT & USENIK (1975) em
equinos submetidos à obstrução experimental de diferentes segmentos
intestinais. Segundo estes autores, o aumento da concentração
peritoneal de proteína apresentado pelos animais submetidos à obstrução
do intestino delgado deveu-se à maior pressão intraluminal e
consequente lesão sofrida pela alça intestinal, em função do menor
diâmetro desta, quando comparada a segmentos do intestino grosso.
Ensaio realizado por SAQUETTI
et al.
(2008) em equinos submetidos à obstrução experimental do cólon menor
revelou aumento na concentração proteína no líquido peritoneal e,
segundo estes autores, os resultados deveram-se não somente à lesão
intestinal desencadeada pela obstrução experimental como também ao
trauma cirúrgico. O trauma cirúrgico também foi incriminado por EURELL
et al.
(1993) em pôneis submetidos à laparotomia exploratória. Neste ensaio,
ao se analisar os resultados apresentados pelos animais do grupo
controle-instrumentado (G1) ao longo do período experimental, pode-se
afirmar que o trauma cirúrgico, associado à laparotomia, também
contribuiu para os altos valores de proteínas apresentados.
Valores aumentados de proteínas no líquido peritoneal de equinos com cólica também foram verificados por SVENDSEN
et al. (1979) e, segundo SANTSCHI
et al.
(1988) e BARRELET (1993), os valores de proteína encontrados são, até
certo ponto, proporcionais à intensidade e à extensão do processo
inflamatório. Valores superiores a 2,5g/dL para proteína indicam lesão
vascular progressiva nas vísceras abdominais.
No eletroforetrograma sérico constatou-se aumento nos valores das α-globulinas nos equinos dos grupos GII e GIII, no T72r (
Tabela 1).
Valores aumentados das α-globulinas também foram observados no líquido
peritoneal dos animais dos referidos grupos, entretanto as alterações
iniciaram-se a partir da 3a hora de reperfusão (T3r) e perduraram por
todo o período experimental (T168r). A primeira fração α a migrar para
o foco inflamatório foi a α1-globulinas, seguida da α2-globulinas, que,
com exceção dos ruminantes, é um achado normal em muitas espécies de
animais, como descrito por KANEKO
et al.
(2008). As α1-globulinas (α1-antitripisina e a α1-glicoproteína ácida)
são induzidas principalmente pelas citocinas IL-1 e caracterizam-se por
elevarem-se precocemente após infecção ou lesão tecidual e
normalizarem-se rapidamente após o término do estímulo. Por sua vez, as
α2-globulinas (α2-macroglobulina, ceruloplasmina, amiloide A e
haptoglobina), induzidas pela IL-6, elevam-se mais tardiamente e,
segundo MURATA
et al. (2004) e CERÓN
et al. (2005), assim permanecem por várias semanas.
Na avaliação ao longo do período experimental, nos animais do GI, GII,
GIII e GIV observa-se que as α-globulinas, séricas e peritoneias,
elevaram-se após o T0 e assim permaneceram até o término da avaliação
(T168), demonstrando que o período estudado não permitiu avaliar por
quanto tempo as concentrações dessas proteínas manter-se-iam alteradas.
Ademais, tais resultados corroboram as afirmações anteriores de que o
trauma cirúrgico, acrescido ou não da obstrução intestinal, deflagra
estímulo para a síntese das proteínas de fase aguda.
Aumento nas concentrações das α-globulinas também foi observado por CARAPETO
et al.
(2006) em equinos com cólica, entretanto unicamente nos que
apresentavam um componente inflamatório na patogênese do distúrbio
primário (enterite aguda, enterite proximal e colite) e sinais
característicos de endotoxemia (febre, depressão, anorexia, leucopenia
e presença de neutrófilos tóxicos). Por sua vez, VANDENPLAS
et al.
(2005) observaram que equinos com cólica que não sobreviveram
apresentavam níveis de α2-globulinas, especificamente amiloide A,
superiores aos que sobreviveram. Além disso, AUER
et al.
(1989) demonstraram que equinos com endotoxemia, forma grave,
apresentaram aumento da α2-macroglobulina. Por fim, FAGLIARI &
SILVA (2002) e SAQUETTI
et al.
(2008) observaram aumento das frações α1-antitripsina,
α-antiquimotripsina, cerulosplasmina, haptoglobina e da
α1-glicoproteína ácida em equinos com cólica submetidos à laparotomia
para correção de torção de cólon maior, compactação de cólon maior e
encarceramento nefroesplênico de cólon maior, e em animais submetidos à
obstrução experimental do cólon menor, respectivamente.
A fração ß do ensaio eletroforético consiste em numerosas proteínas
(hemopexina, transferrina, ferritina, fibrinogênio, complemento,
proteína C-reativa e amiloide A) que apresentam pico entre sete e dez
dias após o estímulo inflamatório e que, segundo MURATA
et al.
(2004), podem permanecer elevadas por várias semanas. Neste ensaio, na
comparação entre grupos, houve aumento na fração ß no sangue e no
líquido peritoneal dos animais dos grupos GII e GIII e, à semelhança do
observado para as α-globulinas, as alterações detectadas no líquido
peritoneal iniciaram-se mais precocemente (T12r) e permaneceram por
todo o período experimental (T168r).
Ensaio realizado por FAGLIARI
et al.
(2008) revelou que os maiores percentuais de elevação nos níveis de
fibrinogênio e de proteína-C reativa foram apresentados pelos equinos
com cólica que foram a óbito sete a dez dias após laparotomia com
sinais de choque séptico. Por sua vez, SAQUETTI
et al.
(2008) observaram aumento na concentração peritoneal de proteína-C
reativa em equinos submetidos à obstrução experimental do cólon menor.
Em contraste com os resultados obtidos por FAGLIARI & SILVA (2002), CARAPETO
et al. (2006) e por FAGLIARI
et al.
(2008), foram observados aumentos nas concentrações peritoneais das
γ-globulinas nos animais dos grupos GII e GIII, nos T24r, T72r a T168r.
As proteínas da fração γ consistem, principalmente, em imunoglobulinas
(IgA, IgM, IgG e IgE) sintetizadas pelo sistema imunológico em resposta
a estímulo antigênico, principalmente viral e, segundo PETERSEN
et al. (2004), uma poligamopatia também pode ser observada em doenças inflamatórias crônicas.
O aumento da gamaglobulina pode estar relacionado à ativação policlonal
inespecífica das células B. Isto porque o aumento da produção de IL-6,
entre outras interleucinas, pode causar uma ativação policlonal
inespecífica das células B, resultando na produção de articorpos contra
os imunógenos contidos nos bancos de memória individuais, como
explicaram FLYNN
et al. (1994). Creditando essas afirmações, havia aumento das α2-globulinas, as quais, segundo MURATA
et al. (2004), são induzidas exclusivamente pela IL-6.
Adicionalmente, tem-se que a IgA em animais domésticos atua como
anticorpo secretório dentro do trato intestinal e dos pulmões, sendo
capaz de neutralizar vírus e prevenir aderências de patógenos
bacterianos aos tecidos-alvo. Presente nas secreções respiratórias,
gastrintestinais e genitourinárias e na lágrima e saliva, a IgA é
importante para defesa local e proteção das superfícies corporais
contra invasões bacterianas e virais (JAIN, 1993).
As diferenças observadas entre os resultados obtidos no proteinograma
sérico e peritoneal deveram-se à síntese extra-hepática das proteínas
de fase aguda, a qual ocorre especialmente nas células endoteliais e no
epitélio de órgãos que se comunica com o meio externo, tais como a
glândula mamária, o sistema respiratório e o trato gastrintestinal.
Segundo JACOBSEN & ANDERSEN (2007), a determinação dos níveis
locais das proteínas de fase aguda, por fornecer informações sobre o
status inflamatório/infeccioso de um órgão de particular interesse,
aumenta a precisão na elaboração do diagnóstico.
Achados semelhantes foram obtidos por EURELL
et al.
(1993) em equinos submetidos à laparotomia exploratória. Segundo esses
autores, as alterações nas concentrações peritoneais das proteínas de
fase aguda foram, quando comparadas às séricas, mais sensíveis no
diagnóstico de processos inflamatórios abdominais e estatisticamente
correlacionadas a sinais clínicos característicos de complicações
pós-operatórias. Entretanto, JACOBSEN
et al.
(2006) demonstraram que, ao injetar lipopolissacarídeos na articulação
de equinos, deflagrava-se uma resposta de fase aguda sérica tão intensa
quanto a verificada no líquido sinovial. Porém, verificaram que a
resposta inflamatória foi mais intensa quando 3μg de
lipopolissacarídeos eram injetados ao invés de apenas 1μg. Concluiu-se
que a magnitude e a duração da resposta de fase aguda refletem a
extensão do dano tecidual e a severidade do processo inflamatório e/ou
infeccioso.
Diferindo dos resultados obtidos por CARAPETO
et al.
(2006), em equinos com cólica em que os maiores percentuais de elevação
dos teores séricos das proteínas proteínas de fase aguda foram
associados a sinais de endotoxemia, como a hipertermia, depressão, dor
abdominal, anorexia, leucopenia, e à presença neutrófilos tóxicos
(citoplasma basofílico e vacuolização), os resultados do proteinograma
sérico e peritoneal apresentados pelos animais dos quatro grupos
experimentais não foram associados a alterações clínicas e/ou à
presença de intercorrências no pós-operatório. Desse modo, pode-se
considerar que traçado eletroforético com alta concentração de
proteínas de fase aguda nem sempre indica a presença de foco infeccioso
durante o pós-operatório ou agravamento do quadro clínico.
CONCLUSÕES
A eletroforese em gel de agarose permitiu detectar alterações nas
concentrações séricas e peritoneais das α, β e γ-globulinas nos animais
ensaiados. As alterações devem-se ao processo inflamatório intestinal
desencadeado pelo modelo de obstrução e ao trauma cirúrgico, associado
à laparotomia, porém não foram associadas a alterações clínicas e/ou à
presença de intercorrências no pós-operatório. Animais submetidos à
obstrução de duodeno e íleo apresentam maiores concentrações de
proteínas de fase aguda.
O fracionamento eletroforético das proteínas contidas no líquido
peritoneal é mais sensível no diagnóstico de processos inflamatórios
abdominais, quando comparado ao sérico.
O período de sete dias permitiu diagnosticar alterações no
proteinograma sérico e do líquido peritoneal, porém não foi suficiente
para determinar por quanto tempo as alterações se manteriam.
AGRADECIMENTO
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), pelo
financiamento integral a esta pesquisa (processos no05/58712-0 e
06/55377-8).
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Protocolado
em: 27 abr. 2010. Aceito em: 20 set.
2010.