RESUMO
Neste trabalho, avaliaram-se, mediante exame eletrocardiográfico, as
adaptações cardiovasculares de equinos ao treinamento com base na curva
velocidade-lactato. Para tanto, foram utilizados oito equinos da raça
Puro Sangue Árabe previamente submetidos a um período de quatro meses
de destreinamento. Os animais realizaram inicialmente um teste de
esforço progressivo (ET), durante o qual colheram-se amostras de sangue
para determinação do lactato. A velocidade na qual a concentração de
lactato atingiu 4,0 mmol/L (V4) foi calculada por meio de análise de
regressão. Utilizaram-se 60% de V4 como velocidade de treinamento em
esteira rolante, com duração de 45 minutos, três vezes por semana em
dias alternados, durante oito semanas. Exames eletrocardiográficos
(ECG) foram realizados antes e após o período de treinamento. O
treinamento melhorou o condicionamento físico dos equinos, confirmado
pelo aumento tanto de V2 como de V4 no segundo ET. Pelo exame ECG,
observou-se aumento significativo na amplitude de onda R após o
treinamento. Em que pese o treinamento ter melhorado a atividade
metabólica, não foi suficiente para conferir modificações em parâmetros
cardíacos, embora tenha promovido discretas mudanças no exame
eletrocardiográfico.
PALAVRAS-CHAVES: Adaptações ao treinamento, cardiovascular, eletrocardiografia, esteira, equino.
ABSTRACT
EQUINE ELECTROCARDIOGRAPHIC RESPONSES TO TRAINING BASED ON SPEED-LACTATE CURVE PERMORMED ON TREADMILL
The aim of this study was to evaluate, by electrocardiographic
analysis, equine cardiovascular adaptations to training based on
speed-lactate curve. For this evaluation, eight Arabian horses
previously submitted to four months of rest were used. The animals
performed a graded exercise test (ET) and samples were collected for
blood lactate measurement. The speed where the blood lactate
concentration reached 4.0 mmol / L (V4) was calculated by regression
analysis. The estimated training speed was 60% of V4 performed on a
treadmill for 45 min three times a week on alternate days for eight
weeks. The electrocardiogram (ECG) analysis was made before and after
the beginning of the training. The training improvement is confirmed by
the increase in both V2 and V4 of the second ET. After the second ECG
analysis, a significant increase in the R wave amplitude was observed.
Training improved the metabolic activity, promoted discrete changes in
electrocardiogram; however, it was not adequate to result changes in
cardiac parameters.
KEYWORDS: Training adaptation, cardiovascular, electrocardiogram, treadmill, equine.
INTRODUÇÃO
O coração é um órgão localizado na cavidade torácica, em sua posição
anterior e ventral. Nos equinos, encontra-se em posicionamento
característico, possui o ventrículo direito cranial à esquerda e está
deslocado à esquerda da linha média torácica. Sua posição apical
situa-se caudoventralmente no tórax, próxima ao osso esterno, à altura
da porção dorsal do olécrano, ao passo que sua base está situada mais
craniodorsalmente. Radiograficamente, o coração ocupa a extensão de
cinco costelas e quatro espaços intercostais, da segunda à sétima
costela (MENDES, 2004; REEF, 1998).
A principal função cardíaca é manter uma boa circulação sanguínea, a
qual deve ser adequada para o bom funcionamento de todos os órgãos e
tecidos do organismo. Se a demanda circulatória for aumentada, o
coração poderá compensar mediante dois modos básicos possíveis pelos
quais se proporciona maior volume circulante por minuto: aumento da
frequência cardíaca e aumento da força de contração (MENDES, 2004).
O coração é um músculo e, como tal, responde e se adapta aos
treinamentos na tentativa de manter a homeostase (MARLIN &
NANKERVIS, 2002; BUGAISKY
et al.,
1992). Qualquer mudança da demanda cardíaca, seja por atividade
atlética ou alteração patológica, levará ao aumento ou à diminuição da
massa cardíaca, denominados hipertrofia e atrofia cardíaca
respectivamente (BUGAISKY
et al., 1992).
Segundo GROSSMAN
et al.
(1975), existem dois tipos de adaptação em resposta ao treino de acordo
com o tipo de miofibrila produzida. Pode-se ter um aumento das
miofibrilas dispostas em série (hiperplasia), ampliando-se o diâmetro
da câmara cardíaca, ou um aumento das miofibrilas dispostas em
paralelo, expandindo-se a espessura do ventrículo esquerdo
(hipertrofia). De acordo com os autores, existe a hipótese de que o
aumento do diâmetro preceda o aumento da espessura cardíaca.
O aumento da espessura da parede favorece a força de contração, e o
aumento da câmara cardíaca proporciona crescimento no volume de ejeção
sanguínea (porcentagem de volume bombeado no final da sístole em cada
batimento cardíaco). Isso contribui para um melhor desempenho do
animal, pois mais sangue, e assim mais oxigênio, pode ser mandado para
os órgãos e os tecidos (MARLIN & NANKERVIS, 2002; POOLE &
ERICKSON, 2004).
Em equinos treinados, a massa cardíaca pode alcançar 1,1% do peso
corporal e está relacionada com volume de ejeção, débito cardíaco e
capacidade aeróbia. O débito cardíaco é definido como o volume de
sangue bombeado dos ventrículos e pode ser mensurado em L/minutos
Quando ocorre aumento do débito cardíaco, a demanda de oxigênio aos
tecidos é favorecida, sendo que essa variável é a principal
determinante da velocidade de distribuição de oxigênio máxima (VO
2máx).
Animais treinados podem obter valores de débito cardíaco superiores a
500 L/min em virtude do aumento da massa cardíaca (POOLE &
ERICKSON, 2004).
A maior complicação relacionada a essa adaptação cardíaca, estudada in
vivo, é o tamanho do coração comparado ao peso do animal. A hipertrofia
cardíaca pode, em alguns casos, estar acompanhada de áreas necróticas,
levando a desorganização miofibrilar, lesão mitocondrial e proliferação
de tecido conectivo com acúmulo de colágeno (BUGAISKY
et al., 1992).
A atividade elétrica do coração pode ser avaliada pelo exame
eletrocardiográfico. Esse é um exame não invasivo, de baixo custo, de
fácil realização e que pode fornecer informações sobre frequência e
ritmo cardíaco, além de detectar anormalidades ou arritmias visíveis no
traçado eletrocardiográfico (REEF, 1998). Em medicina esportiva equina
utiliza-se o eletrocardiograma para a investigação de queda de
desempenho atlético relacionada com fibrilação, bloqueio
atrioventricular completo e contrações atrial e ventricular prematuras
(EVANS, 1999).
Um dos fatores considerados importantes no formato dos diferentes tipos
de ondas são as características para cada espécie. Em equinos, a onda P
é geralmente bifásica ou polifásica e tem forma de “V”, que não deve
ser interpretada como anormalidade. A forma da onda P é, em parte,
dependente da frequência cardíaca e, à medida que a frequência aumenta,
o espaço entre os dois picos tende a ficar menor, ou mesmo desaparecer;
a primeira parte da onda pode se perder à medida que a segunda seção se
torna maior. Alterações na forma, independentemente da frequência,
indicam que a origem da contração atrial está mudando (SPEIRS, 1999).
Quando ocorrem alterações na ventilação ou perfusão, consideram-se os
aumentos de ondas T, os quais devem ser diferenciados nos casos de
hipercalemia. Variações em ondas T e no segmento ST podem ser
interpretadas também como uma variação fisiológica relacionada ao
treinamento (SPEIRS, 1999).
A onda T é o parâmetro mais variável de um eletrocardiograma em
equinos. Quando os animais são submetidos a estresse ou exaustão
física, é possível observar inversão de polaridade e aumento de
amplitude que pode exceder o complexo QRS (STEEL
et al., 1976; PICCIONE
et al., 2003).
O estabelecimento de um programa de treinamento deve considerar a
sobrecarga de esforço à qual serão submetidos os diferentes sistemas
orgânicos (POWERS & HOWLEY, 1997). As variáveis típicas que
refletem a sobrecarga incluem a intensidade, a duração e a frequência
do exercício (ISLER
et al., 1982), além, obviamente, do desenvolvimento das habilidades próprias de cada modalidade.
Para orientar o estabelecimento desses princípios deve-se considerar a
utilização de algumas variáveis úteis que avaliem o condicionamento e
determinem a carga de trabalho dos animais. Dentre essas variáveis
destaca-se o lactato, que tem sido o norteador de inúmeros programas de
treinamento, sejam estes realizados em campo, pistas ou trilhas (WITTKE
et al., 1994; COROUCÉ
et al., 1997), ou em esteiras rolantes, sob condições controladas (WERKMANN
et al., 1996; ETO
et al.,
2004). A curva estabelecida pelas concentrações sanguíneas de lactato
determinadas em velocidades crescentes é denominada curva
velocidade-lactato. A inclinação dessa curva reflete o padrão
metabólico predominante em intervalos subsequentes de velocidades
crescentes. Nas velocidades menores, há predomínio de metabolismo
aeróbio e as concentrações de lactato se mantêm relativamente baixas.
Entretanto, quando as exigências energéticas para atender velocidades
crescentes alcançam valores elevados, o metabolismo predominante passa
a ser o anaeróbio, havendo concomitantemente aumento marcante do
lactato que se caracteriza por uma inflexão repentina da curva para
cima. Esse ponto de inflexão é denominado limiar anaeróbio ou, o que
parece ser a denominação mais adequada, início do acúmulo de lactato
sanguíneo (BAYLY, 1986).
Dessa forma, objetivou-se com este estudo avaliar, por meio do
eletrocardiograma, possíveis adaptações do sistema cardíaco de equinos
ao treinamento físico realizado em esteira rolante com intensidade
determinada pelos valores de lactato sanguíneo.
MATERIAL E MÉTODOS
Animais
Foram utilizados oito equinos adultos da raça Árabe, machos e fêmeas,
com idades de cinco a seis anos, pesando entre 339 e 422 kg,
pertencentes ao rebanho experimental da Faculdade de Ciências Agrárias
e Veterinárias da Unesp, câmpus de Jaboticabal. Os animais foram
mantidos em piquetes de Tifton e receberam 40% da exigência energética
para trabalho moderado (NRC, 1989) em concentrado comercial.
Antes do período experimental, submeteram-se os animais a exame físico
para avaliação da higidez. Somente foram utilizados os equinos sadios,
em boas condições nutricionais e que haviam passado por combate a endo
e ectoparasitas e vacinação contra viroses respiratórias. Antes do
início do trabalho, os animais permaneceram em repouso pelo período de
pelo menos quatro meses. O casqueamento foi realizado previamente aos
procedimentos experimentais e a cada cinco semanas, até o final do
período experimental.
Exame eletrocardiográfico
O exame foi realizado com o animal em posição quadrupedal, sob
superfície de borracha, contido em tronco tipo brete, localizado em
ambiente calmo e silencioso.
Avaliou-se a atividade elétrica do coração mediante emprego do
eletrocardiógrafo computadorizado de 12 canais (modelo ECG – PC) na
derivação base ápice com velocidade 25 mm/s e sensibilidade 2N. Os
eletrodos foram fixados à pele por meio de agulhas 21G de aço
inoxidável, em região previamente umedecida com álcool. Obtiveram-se os
traçados segundo a técnica descrita por FREGIN (1982).
Um trecho de aproximadamente dez minutos do traçado foi capturado e
gravado em disco rígido de computador. Avaliaram-se frequência
cardíaca; sequência de despolarização e repolarização miocárdica;
morfologia; duração em segundos (seg.) da onda P; característica da
polaridade da onda T; intervalos QT, PR e QRS; e amplitude em milivolts
(mV) das ondas R, Q e T.
O mesmo procedimento foi realizado após oito semanas de treinamento sob as condições preestabelecidas.
Testes de esforço progressivo
Após três dias de adaptação a uma esteira rolante de alto desempenho
projetada para animais de grande porte, os cavalos foram considerados
aptos à realização do teste de esforço progressivo, denominado
exercício teste (ET). Antes do teste, os animais tiveram a veia jugular
cateterizada utilizando o cateter tamanho 14G, para permitir a colheita
de sangue com o animal em movimento. Uma vez os equinos posicionados na
esteira, esta foi acionada iniciando-se o ET. O teste consistiu em um
aquecimento de cinco minutos a 1,7 m.s
-1 e cinco minutos a 3,5 m.s
-1 sem inclinação. Após o período de aquecimento, a esteira foi elevada a 6% de inclinação, com velocidade inicial de 3,5 m.s
-1 e, a cada três minutos, acrescentou-se 0,5 m.s
-1
à velocidade anterior. O final do ET foi determinado pelo momento no
qual cada animal demonstrou sinais de fadiga, como desconcentração,
sudorese intensa, abaixamento da cabeça e cansaço, tendendo a não
acompanhar a esteira rolante, deslocando-se para trás. Após esse
período, o animal foi submetido a desaquecimento durante quinze
minutos, a 1,7 m.s
-1, objetivando sua recuperação.
As amostras de sangue para determinação do lactato sanguíneo foram
depositadas em frascos contendo fluoreto de sódio 1% na proporção de
1:2, nos seguintes momentos: antes do teste (basal), ao final do
aquecimento, trinta segundos antes do aumento de cada velocidade,
trinta segundos antes e após o término do teste e do desaquecimento e
sessenta minutos após o término do exercício. A determinação sanguínea
de lactato foi realizada pelo método da lactato oxidase, com um
analisador automático, e expressa em mmol/L.
Efetuaram-se os cálculos para determinação da velocidade na qual as
concentrações de lactato correspondiam a 2,0 e 4,0 mmol/L (V4) por meio
de análise de regressão, a partir dos valores obtidos no ET (COUROUCÉ
et al., 1997).
O cálculo de V4 foi utilizado no estabelecimento da carga de trabalho a
ser realizada durante o treinamento, assim como na avaliação da
eficiência do protocolo de treinamento. Os animais realizaram dois ET
em esteira rolante: antes de iniciar o treinamento (ET1) e após oito
semanas de treinamento (ET2).
Treinamento
Uma vez determinada a V4 nos exercícios testes, estabeleceu-se que a
intensidade de trabalho a ser imposta aos animais corresponderia a 60%
de V4, com duração de 45 minutos e frequência de três vezes por semana,
em dias alternados. O programa de treinamento durou oito semanas,
período em que os equinos realizaram um total de dezoito sessões de
exercícios em esteira. Os animais foram submetidos a exames clínicos
semanais para avaliação da integridade do sistema locomotor e higidez.
Análises estatísticas
Os diferentes parâmetros foram avaliados por meio de Análise de
Variância (ANOVA). Com os valores médios pelo teste de comparação das
médias (Teste t), com nível de significância igual a P<0,05
(SAMPAIO, 2002), utilizando o programa SAS – Statistical Analysis
Sistem (SAS 2002).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os valores de V2 e V4 obtidos durante os testes de esforço progressivo
realizados em esteira rolante, nas fases pré e pós-treinamento, estão
relacionados na
Figura 1.
O treinamento melhorou o condicionamento físico dos equinos, o que foi
confirmado pelos aumentos tanto de V2 como de V4 no segundo teste de
esforço. O modelo de treinamento utilizado, com base nos valores de
lactato obtidos no teste de esforço progressivo, também têm
proporcionado aumento das variáveis estudadas em pesquisas de
características semelhantes (GOMIDE
et al., 2006).
Na
Tabela 1
estão relacionadas as velocidades correspondentes a 2,0 (V2) e 4,0
mmol/L de lactato sanguíneo (V4), o valor para 60% de V4 e a velocidade
necessária para o desenvolvimento de fadiga (Vmáxima). A V2, a V4 e a
velocidade de treinamento (60% de V4) apresentaram aumento
significativo após o período de treinamento. Com relação à Vmáxima, não
se observou diferença significativa no ET realizado após o treinamento.
O programa de treinamento delineado para os eqüinos, neste trabalho com
a carga de esforço correspondente a 60% de V4, produziu aumento
significativo tanto da V2 como da V4. Outros trabalhos mostram a
importância de se adotar a velocidade em que a concentração sanguínea
de lactato atinge 4,0 mmol/L (V4) durante o teste de esforço como forma
de avaliação do condicionamento de equinos (GERARD
et al.,
2002; ART & LEKEUX, 1993). Neste experimento, houve aumento de
21,0% na V4 após o treinamento, superior ao relatado por TRILK
et al.
(2002), que observaram elevação de 17% nessa variável em treinamento
também guiado pelos resultados da curva velocidade-lactato e
desenvolvido em esteira rolante. Outro trabalho, utilizando a curva
velocidade-lactato para treinar equinos em esteira, não logrou êxito ao
procurar elevações na V4 após dois meses de treinamento, quando a
duração das sessões de exercícios foi de apenas cinco ou quinze minutos
(WERKMANN
et al., 1996).
O aumento da V4 observado no decorrer do treinamento deve-se às
adaptações metabólicas decorrentes do programa adotado. Segundo EATON
et al. (1999), GERARD
et al. (2002), HINCHCLIFF
et al. (2002) e McGOWAN
et al.
(2002), o aumento da V4 e as menores concentrações de lactato sob a
mesma intensidade de exercício no decorrer do treinamento indicam maior
produção energética por via aeróbia. Esta decorre do melhor
aproveitamento de lactato, segundo DONOVAN & BROOKS (1983), e de
gordura, segundo MUÑOZ
et al.
(2002), como fontes energéticas, assim como maior atividade das enzimas
do metabolismo aeróbio e do sistema tampão das fibras musculares
(McGOWAN
et al., 2002).
Aumento na atividade da citrato sintetase, a enzima envolvida na
entrada de acetil-CoA no ciclo dos ácidos tricarboxílicos, foi
verificado em equinos após o treinamento (HODGSON
et al.,
1985). Considerando que as vias enzimáticas de produção de energia
presentes na fibra muscular estão estreitamente inter-relacionadas, o
aumento na atividade da citrato sintetase implicaria em aumento de
atividade de outras enzimas envolvidas no ciclo mencionado.
Aparentemente, os progressivos aumentos na intensidade do treinamento
constituem o estímulo necessário para induzir contínuo aumento de
atividade enzimática nas fibras musculares. Esse aumento permitiria que
uma maior proporção de energia se originasse dos mecanismos aeróbios,
os quais são mais eficientes que as vias anaeróbias (EATON
et al., 1999).
Treinamentos realizados em velocidades menores e com duração de 45 minutos provocam maiores alterações musculares (MARTINS
et al.,
2007) e, consequentemente, mais efeitos positivos na capacidade de
resistência do que quando o treinamento tem maior intensidade e menor
duração (GANSEN
et al.,
1999). Neste experimento, sessões submáximas com intensidades baseadas
na V4 e com 45 minutos de duração provocaram estímulo suficiente para
aumentar a capacidade de resistência dos equinos. Apesar de TRILK
et al.
(2002) indicarem períodos de duas semanas para o ajuste da intensidade
do treinamento buscando aperfeiçoar o incremento do V4, neste caso,
mesmo sem a realização de ajuste, o treinamento durante oito semanas
foi suficiente para levar a um expressivo aumento nessa variável.
Ainda que McGOWAN
et al.
(2002) tenham encontrado concentrações de lactato maiores no plasma e
menores nos músculos no momento da fadiga, após um período de
treinamento, demonstrando que essa variável aumenta a capacidade de
tamponamento e de remoção do lactato muscular, não se observaram, com o
treinamento, alterações nas concentrações de lactato determinadas ao
final dos testes progressivos e após o período de desaquecimento.
HINCHCLIFF
et al. (2002)
também não encontraram, em dez semanas de treinamento, diferença
significativa na concentração de lactato ao final do teste. Os dados
obtidos se justificariam, portanto, por uma intensidade de exercício
insuficiente para induzir alterações significativas (ART & LEKEUX,
1993). Contudo, considerando que os valores de lactato obtidos durante
os testes de esforço apresentam grande variabilidade individual (RONÉUS
et al., 1994), aspecto
detectado durante esta avaliação, poderia ser esse o fator que
dificultou a obtenção de resultados significativos na análise
estatística.
A velocidade necessária para a manifestação de fadiga (Vmáxima) durante
os testes em esteira aumentou ao final de noventa dias de treinamento.
Esse dado mostra que o metabolismo dos animais sofreu adaptações que
possibilitaram a manutenção do exercício por mais tempo, melhorando o
desempenho (LINDNER, 1997). O aumento do tempo necessário para a
manifestação de fadiga com o treinamento já foi relatado por outros
autores (GERARD
et al., 2002; McGOWAN
et al., 2002) e pode ser um parâmetro para avaliar a melhoria no condicionamento físico (McGOWAN
et al., 2002).
TRILK
et al. (2002) relataram,
na fase final de uma pesquisa realizada com equinos treinados em
esteira, indícios de alterações psicológicas típicas de
sobretreinamento e caracterizaram a falta de disposição e a diminuição
na ingestão de alimentos como sendo os sinais de distúrbio. No entanto,
os animais utilizados neste trabalho mostraram excelente disposição
durante as sessões de exercícios e mantiveram o apetite. Atribui-se
essa resposta ao fato de os equinos utilizados neste trabalho terem
permanecido a campo, em grupo, com a oportunidade não apenas de manter
o relacionamento social, tão importante nessa espécie, como também de
diversificar a rotina do treinamento por meio de atividades de lazer,
no piquete.
Os dados referentes ao exame eletrocardiográfico estão apresentados na
Tabela 2.
Os valores de frequência cardíaca observados se encontram dentro dos
intervalos fisiológicos relatados para animais da espécie equina em
inatividade (FERNANDES
et al.,
2004). Os valores obtidos após o treinamento não diferiram
estatisticamente dos registrados antes do treinamento, porém, houve
tendência à diminuição, o que corrobora a afirmação de que cavalos
treinados – e consequentemente bem condicionados fisicamente –
apresentam frequência cardíaca inferior à de equinos não condicionados
(LITTLEJOHN, 1987).
O processo de despolarização no miocárdio ventricular pode ser afetado
pelo treinamento intensivo e provavelmente por ação direta da duração
da diástole e por fatores que interferem nssa duração, incluindo os
efeitos autonômicos e possivelmente os efeitos metabólicos nas fibras
miocárdicas influenciados pela circulação coronariana (HOLMES &
REZAKHANI, 1975). Neste estudo, houve diferença estatística na
amplitude de onda R, sugerindo aumento no tempo de despolarização dos
ventrículos, o que pode estar relacionado à hipertrofia ou à
hiperplasia da câmara cardíaca, em função do treinamento.
SKARDA
et al. (1976) avaliaram
a influência do treinamento sobre a frequência cardíaca, a duração dos
intervalos PQ e QT e do complexo QRS em equinos da raça Puro Sangue
Inglês. A análise foi realizada antes e após seis semanas de exercício
submáximo em pista de areia. Neste estudo, não se observaram alterações
significativas do traçado eletrocardiográfico que comprovassem uma
melhora do estado atlético com o treinamento.
O efeito do treinamento sobre os parâmetros eletrocardiográficos foi avaliado por YONEZAWA
et al.
(2009) utilizando oito éguas da raça Puro Sangue Árabe, submetidas a
treinamento de vinte dias em esteira de alta velocidade. Realizaram-se
a análise e a interpretação dos traçados eletrocardiográficos quanto a
ritmo, frequência cardíaca, duração e amplitude das ondas e intervalos.
Neste ensaio, foi observada somente uma diminuição da frequência
cardíaca de repouso após o treinamento, a qual foi atribuída ao manejo
dos animais durante o período experimental.
A onda T, segundo SEVESTRE (1982), compreende um parâmetro variável;
sua interpretação pode ser difícil, devido a variações de forma e
amplitude. Neste estudo, quanto à característica de polaridade, a onda
T permaneceu bifásica ao início do período experimental, assim como
após oito semanas de treinamento, em todos os animais avaliados no
exame proposto. Em estudo eletrocardiográfico de equinos da raça
Mangalarga Marchador realizado por DINIZ
et al.
(2008), a onda T foi positiva em onze (18,3%), negativa em doze (20%) e
bifásica em 37 (61,7%) dos casos. Segundo os autores, tal distribuição
para as ondas foi considerada compatível com o padrão descrito por
PATTESON (1996) para essa derivação e, portanto, semelhante à de outras
raças.
Tem sido postulado que alguns tipos de arritmias, como o bloqueio
atrioventricular de segundo grau detectado em equinos em repouso,
desaparecem durante o exercício (HOLMES & ALPS, 1966). Neste
trabalho, um dos cavalos estudados apresentou em repouso bloqueio
atrioventricular de segundo grau no ECG realizado antes do treinamento;
porém, essa arritmia desapareceu após o treinamento. A interrupção do
batimento observado no bloqueio atrioventricular de segundo grau é uma
resposta ao aumento gradual do pico de pressão aórtica (HOLMES, 1982).
Considerando que essa é provavelmente uma resposta baropressórica, o
esforço produzido durante o treinamento, associado a possíveis aumentos
da pressão arterial durante exercícios de maior intensidade, como
ocorreu neste trabalho, causaria ajuste na sensibilidade dos receptores
de pressão e, consequentemente, desaparecimento do bloqueio mencionado.
CONCLUSÃO
Embora o treinamento em esteira rolante, nas condições do presente
estudo, tenha melhorado as variáveis associadas à atividade metabólica
dos equinos, não foi suficiente para causar modificações na maioria dos
parâmetros eletrocardiográficos, com exceção da amplitude da onda R.
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Protocolado
em: 16 nov. 2009. Aceito em: 24 nov.
2010.