NÍVEIS SÉRICOS DE TESTOSTERONA EM BOVINOS DA RAÇA
NELORE COM DERMATITE DIGITAL
Maria Ivete de Moura1; Luiz Antônio Franco da Silva2; Ângela Moni Fonseca3; Jalily Bady Helou3; Sabrina Lucas Ribeiro de Freitas3; Leandro Batista Caetano3; Tales Dias do Prado4
1.
Médica
veterinária, doutoranda em Ciência Animal do Programa de Pós- Graduação da
Escola de veterinária, Universidade Federal de Goiás (UFG)
2. Médico veterinário,
Doutor, Professor do Curso de Medicina Veterinária, Escola de Veterinária,
Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil – e-mail:
lafranco@vet.ufg.br (autor correspondente)
3. Acadêmicos do Curso
de Medicina Veterinária, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Goiás
(UFG)
4. Médico Veterinário
Residente EV/UFG
PALAVRAS- CHAVE: Enfermidade podal, hormônio, reprodução
ABSTRACT
SERUM TESTOSTERONE LEVELS OF NELORE
CATTLE WITH DIGITAL DERMATITIS
Digital dermatitis may affect
fertility and reproductive performance of cattle. This study evaluates serum
testosterone levels of Nelore bulls before and after digital dermatitis (DD)
treatment. A total of 24 animals were randomly divided into three groups: Group
I – 9 animals with DD treated after the second blood collection; Group II – 7
animals with DD that did not receive any treatment; and Group III (control) –
healthy animals. Seven samples were taken from each animal with a 15-day
interval. Blood testosterone concentration was assessed by immunoassay (ELISA)
and values were established by Kruskal-Wallis, Mann Whitney U, and Friedmann
tests. GI presented a gradual increase of testosterone levels after the second
blood collection, and GIII had the highest increase. Statistically significant
differences were observed between GI and GIII as regards testosterone levels
from the first, second, and third blood collections. We conclude that DD may
influence the reproduction of bulls due to stress.
KEYWORDS: Bulls,
digital diseases, hormones.
INTRODUÇÃO
A eficiência reprodutiva do touro constitui característica relevante na produção de bovinos, principalmente nas criações extensivas em que a reprodução é fator determinante à produção e esta diretamente relacionada ao retorno econômico da atividade (SILVA et al., 2002). ANDERSSON (1992) encontrou correlação positiva entre a concentração sérica de testosterona e a fertilidade de touros e segundo POST et al. (1987) o hormônio é um preditor efetivo da fertilidade. Para LEZIER (2003), ainda desconhece alguns parâmetros hormonais em bovinos nelore em condições extensivas, apesar de a função reprodutiva depender do equilíbrio e dos níveis adequados de diferentes hormônios. De acordo com NICOLETTI (2004), acredita-se que as enfermidades digitais constituam agentes estressores que alteram as funções reprodutivas e causam decréscimo nas taxas de fertilidade e prenhez. Segundo LEÃO (2006), dentre as enfermidades podais a dermatite digital infecciosa é de grande importância econômica e produtiva e CHIQUETO (2004), ao avaliar os parâmetros de fertilidade em touros da raça Holandesa acometidos de dermatite digital, concluiu que a fertilidade foi afetada pela enfermidade. SILVA et al. (2006) também descreveram que a dermatite digital bovina promove interferência na performance reprodutiva, justificando a realização de pesquisas científicas que relacione alguns fatores de rico com a impotência coendi em touros.
O objetivo do presente estudo constituiu avaliar os níveis séricos de
testosterona em touros da raça Nelore, antes e após o tratamento da dermatite
digital bovina.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados 24 bovinos jovens, não castrados, da raça Nelore, com idade entre 30 e 36 meses, procedentes de propriedade rural que adotam o manejo extensivo, na região sudoeste do Estado de Goiás, durante o período de Agosto a Novembro de 2008. Todos os bovinos foram submetidos ao exame clínico geral e específico dos membros torácicos e pélvicos com a finalidade de diagnosticar a presença de dermatite digital. Posteriormente, os animais foram identificados e divididos aleatoriamente em três grupos, sendo o grupo I (GI) composto por nove animais portadores de dermatite digital, que foram tratados após a segunda colheita de sangue, o grupo II (GII) composto por sete animais doentes que permaneceram com lesões de dermatite até o término das colheitas de sangue e, finalmente, o grupo III (GIII) contendo oito animais saudáveis, que constituiu o grupo controle. Amostras sangüíneas foram colhidas no período das nove às 12 horas, por punção na veia caudal, obtendo-se 20 ml de sangue, as quais foram acondicionadas em frasco estéril sem anticoagulante. Foram colhidas sete amostras de sangue de cada animal, com intervalos de 15 dias. O sangue foi centrifugado a 1500G durante dez minutos para obtenção de soro, e em seguida dividido em alíquotas de 3,0 ml e mantido sob temperatura de congelamento (-20ºC), para posterior dosagem hormonal de testosterona. As amostras foram processadas no Laboratório de Endocrinologia da Universidade Estadual de São Paulo, Campus Araçatuba-SP. As dosagens de testosterona foram realizadas pelo método imunoensaio (ELISA), utilizando-se kits comerciais (Testosterone, Human- Invitro, Itabira- MG). Os valores séricos de testosterona obtidos das colheitas provenientes do controle, tratado e portador de dermatite digital foram submetidos aos testes de Kruskal-Wallis e U Mann Witney, sendo detalhada a análise pelo teste de Friedmann, com nível de significância 5% (P<0,05), conforme recomendação de SAMPAIO (1998).
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
Uma análise descritiva dos valores da concentração de testosterona obtidos nas sete colheitas indica que ao serem tratados, após a segunda colheita, os animais do GI apresentaram expressivo aumento da concentração dos níveis séricos de testosterona, sendo o mesmo gradual e chegando a atingir níveis até cinco vezes maiores em relação a colheitas anteriores. Em GIII observou-se médias de concentração sérica maiores que GI e GII, em todas as colheitas, exceto na colheita quatro, em que apresentou nível ligeiramente menor que GII, que teve média de 317,48 ng/dl, enquanto em GIII a média foi de 306,10 ng/dl. Ressalte-se que em GI ocorreu um acréscimo progressivo nos níveis de testosterona após o tratamento, exceto nas colheitas 6 e 7. O GII apresentou variação dos níveis e redução de 1,47 da testosterona sérica, ao se comparar a primeira e última colheitas.
Esperava-se que os animais do GII estivessem adaptados as condições de estresse e apresentassem níveis de testosterona sérica estáveis, contudo, os resultados mostraram certa instabilidade, com oscilação dos níveis séricos de testosterona. Esse fato contesta as afirmações de MOBERG & MENCH (2000), os quais descreveram que, se a intensidade do fator estressor estabilizar, o animal tende a se adaptar as condições impostas, normalizando as funções fisiológicas. Como na colheita sete houve diminuição da concentração do hormônio em todos os grupos, como esse fato ocorreu tanto em GI, como GII e GIII provavelmente se devem a algum fator adverso que envolveu todos os grupos. A testosterona, segundo MACKINNON et al. (1991) pode ter a secreção influenciada por fatores como nutrição, aspectos climáticos e estresse, é considerado uma variável instável, resultando em alto desvio padrão, justificando o emprego de mais de um teste estatístico na presente analise dos dados obtidos.
Dentre os grupos, apenas GI (p<0,001) e GIII (p=0,048) apresentaram diferença estatística significativa entre as médias das colheitas, sendo que entre as colheitas do GII, não teve diferença significativa com (p>0,05). Em GI, a colheita 1 apresentou a menor média (54,3 ng/dl) e a colheita 6 a maior (324,7 ng/dl). Essa melhora provavelmente se deu em função do tratamento realizado aos animais após a segunda colheita de sangue. Já em GIII, a colheita 2 apresentou a menor média (175,7 ng/dl), e a colheita 1, a maior (537,5 ng/dl). Pôde-se observar ainda, que dentre os três grupos analisados, GI apresentou a menor média de testosterona sérica, enquanto GIII apresentou a maior. Esse fato pode ser atribuído ao estresse e trauma tecidual decorrente da agudização da lesão em conseqüência da intervenção cirúrgica sofrida pelos animais de GI, situação também mencionada por CHIQUETTO (2004) e MOURA (2008).
Observou-se diferença significativa quanto ao nível sérico de testosterona apenas para as colheitas 1 (p=0,003), 2 (p=0,025) e 3 (p=0,034), não tendo interação entre os grupos GI, GII e GIII nas colheitas 4, 5, 6 e 7. Apesar de SANCHES et al. (1998) ter relatado o fato de a concentração sérica de testosterona aumentar com a aproximação da puberdade, o aumento observado, por exemplo, no grupo I, não pode ser atribuído a esse fator, haja vista que os animais do experimento já possuíam de 30 a 36 meses. Ressalte-se que a concentração desse hormônio tende a permanecer constante na fase adulta, decrescendo com a idade. Logo, esse aumento provavelmente deu-se em função da instituição do tratamento e conseqüente melhora do quadro de dermatite digital.
Fatores nutricionais, climáticos e estressantes também podem influenciar a secreção desse hormônio. Apesar de relatos em que a concentração de testosterona sujeitou-se a variações conforme estações do ano segundo SUNDBY & TOLLMAN (1978) e nas condições tropicais, a média mensal mais baixa deste hormônio ter sido encontrada no mês de outubro, em touros zebuínos conforme relatado por SANCHES et al. (1998), esse fato não foi observado no presente estudo. Segundo CHASE et al. (1993), a nutrição também influência sobremaneira a produção hormonal e altera as características de crescimento e reprodução, visto que o consumo insuficiente de energia pode reduzir a concentração de testosterona circulante. Esse fato não justifica a diferença de concentração de testosterona entre os grupos, haja vista que a alimentação fornecida aos três grupos foi semelhante.
O fato de os animais que não possuíam dermatite digital (GIII) terem apresentado concentração sérica de testosterona superior aos bovinos doentes e não tratados e, mesmo aqueles que foram tratados, reforça os achados de estudos, os quais propõem que a afecções digitais influenciam na fertilidade dos bovinos, sejam eles machos ou fêmeas. BARKER (1971) abordou a influência de enfermidades do sistema locomotor sobre a fertilidade de touros em seus estudos. O autor afirmou que um touro acometido de laminite sente muita dor durante o salto, falhando em seu serviço até que seja revertida a causa. Caso o processo inflamatório da laminite seja agudo e severo o suficiente para causar alteração sistêmica, a produção de sêmen deverá ser prejudicada por um período, talvez de dois meses após a cura, assim como ocorre com outras doenças sistêmicas relativamente severas, porém não informou a intensidade do comprometimento do sêmen.
Por último, os resultados aqui encontrados indicam que as variações observadas nos níveis de testosterona podem influenciar a eficiência reprodutiva dos animais. NICOLETTI (2004) afirmaram que injúrias no sistema locomotor podem influenciar na reprodução dos touros. CHIQUETO (2004), avaliando as características físicas e morfológicas do sêmen de touros da raça Holandesa, registrou diferenças significativas quanto a algumas características físicas e morfológicas do sêmen de animais portadores de dermatite digital em relação a animais saudáveis. No entanto, esses autores não relataram nenhum estudo direto avaliando a condição andrológica dos animais de forma mais específica, ou seja, analisando o sêmen dos animais que sofrem de alguma enfermidade no sistema locomotor em seus diversos aspectos, ou considerando se houve modificações na concentração sérica de testosterona.
CONCLUSÃO
Os níveis séricos de testosterona
em touros da raça Nelore com dermatite digital, tratados e saudáveis
apresentaram oscilações variadas nos diversos momentos de avaliação, mas à
doença provocou um decréscimo significativo nos níveis séricos do hormônio em
relação aos animais saudáveis.
AGRADECIMENTOS
Agradecimento ao CNPq
pelo auxílio concedido.
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