COMPORTAMENTO SEXUAL DE BOVINOS
MACHOS DA RAÇA NELORE COM DERMATITE DIGITAL
Luiz
Antônio Franco da Silva1; Maria Ivete de Moura2; Carlos
Vinícius de Miranda Faria2; Jordanna de Almeida e Silva4;
Ângela Moni Fonseca4; Sabrina Lucas Ribeiro de Freitas4;
Leandro Batista Caetano4; Jalily Bady Helou4; Tales Dias
do Prado5
1.
Professor Associado de Clínica
Cirúrgica Animal, EV/UFG, Universidade Federal de Goiás
(UFG), Goiânia, GO, Brasil, CEP 74001-970, – E-mail: silvaprofessor@hotmail.com
(autor correspondente)
2.
Aluna do Programa de Pós-Graduação EV/UFG – Bolsista CNPQ
3.
Médico veterinário autônomo
4.
Acadêmicos (as) de Medicina
Veterinária EV/UFG- Bolsista CNPQ
5. Médico Veterinário Residente EV/UFG
PALAVRAS-CHAVE: Desempenho sexual, enfermidades
digitais, reprodução animal.
ABSTRACT
ASSESSMENT OF THE SEXUAL
BEHAVIOR OF NELORE BULLS WITH DIGITAL DERMATITIS
Digital
dermatitis may affect fertility, conception rate, pregnancy, and milk
production. This study evaluates the behavior of Nelore cattle before and after
treatment of digital dermatitis. Three cows in estrus cycles were exposed to 30
bulls. They were 36 months old in the beginning and 48 months old by the end of
the experiment and were randomly distributed into two groups of 15 animals each
(GI and GII): Group I – animals with digital dermatitis in different degrees of
development; Group II – clinically healthy animals (control group). Friedman,
Kruskal-Wallis, and Mann-Whitney U tests at 5% (p≤0,05) significance level were
used to detect the presence or absence of a significant difference between
groups. A statistically significant difference was observed between GI and GII
in 2007, and GI (2007) and GII (2008). Animals in GI performed 34,43% less,
when compared to GII in 2007, and 19,9% less when compared to GII in 2008. In 2008,
GI animals still did 10,7% less when compared to GII. We conclude that the
sexual behavior of Nelore bulls is influenced by digital dermatitis; however,
treatment promotes increase of sexual performance.
KEYWORDS:
Cattle, digital injuries, sexual performance
INTRODUÇÃO
Enfermidades digitais
em bovinos ocasionam perdas de até 20% na produção de leite e 25% na de carne,
altos custos com o tratamento, descarte prematuro de animais de alto valor
zootécnico e interferência na produção e reprodução, tanto de machos como de
fêmeas (NICOLETTI,
2004). Dentre as enfermidades digitais de grande importância econômica e
produtiva, destaca-se a dermatite digital (DD) bovina, para qual MANSKE et al.
(2002) encontrou prevalência de 29,3% na Suécia e FERREIRA (2003) de 44,0%
pesquisando rebanho leiteiro confinado no Brasil. A fertilidade do touro tem
alta relação com o comportamento sexual e pode ser avaliada pela intensidade da
libido, taxa de serviço e comportamento sexual a campo (SANTOS, 2001). Conforme
afirmou MOURA (2008), as enfermidades que determinam impotência coeundi, como as doenças digitais atuam
como importante fator estressante, mas existem evidências dessas alterações
desencadearem esterilidade por impotência generandi,
relacionada à produção e qualidade dos espermatozóides. Este trabalho objetivou
avaliar o comportamento sexual de
bovinos machos da raça Nelore, saudáveis e com lesões de dermatite
digital, antes e após o tratamento da enfermidade.
MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa se desenvolveu em propriedade rural, no município de Quirinópolis, Goiás, entre 2007 e 2008, empregando 30 bovinos machos, Nelore, não castrados, com 36 meses de idade ao início e 48 meses ao final do estudo. Ao começo da avaliação, 50% dos animais apresentavam DD em diferentes graus de evolução clínica e independente do ano estipulou-se abril para a realização das avaliações. A precipitação pluviométrica na região em abril de 2007 foi de 36,5mm, a umidade relativa do ar de 70% e temperatura média de 24,3 oC. Em 2008, esses dados foram de 231,9mm, 78% e 23,1oC, respectivamente. Os bovinos foram distribuídos em dois grupos de 15 animais (GI e GII), sendo GI animais com DD em diferentes graus de evolução clínica e tratados logo após a primeira avaliação do comportamento e GII animais saudáveis, utilizados como controle. Para cada animal doente avaliava-se um bovino saudável com as mesmas características raciais e faixa etária. A avaliação ocorreu individualmente, sempre no período matutino, utilizando-se três vacas no cio. As observações do desempenho sexual dos machos foram realizadas, por dez minutos, sempre na presença das mesmas pessoas. Os principais parâmetros avaliados foram: tentativa de monta (Tm), monta completa (Mc), monta orientada (Mo), monta não orientada (Mn), cheiradas (Ch), lambidas (La), Flehmen (Fl), cabeçada (Cb), movimento pélvico (Mp), mugido (Mg) e masturbação (Ms) (SALVADOR et al., 2003). Após a primeira avaliação, os animais do GI tiveram as lesões digitais tratadas em duas etapas.
Na primeira removeu-se cirurgicamente as lesões e na seqüência fez-se o toalete dos estojos córneos digitais, doentes e saudáveis, segundo padrões de NUSS & PAULUS (2006). Na segunda etapa aplicou-se nas feridas cirúrgicas antisséptico, antibiótico e sulfato de cobre, protegendo-as com faixas elásticas impermeabilizadas. Realizou-se antibióticoterapia parenteral, removeu-se o curativo no sétimo dia do pós-operatório e iniciou-se-se a passagem dos animais no pedilúvio. Os grupos I e II tiveram a primeira avaliação em abril de 2007 e a segunda em abril de 2008. Os bovinos alocados no grupo GI a avaliação aconteceu antes e após o tratamento das lesões. Na avaliação dos dados obtidos utilizaram-se o teste Kruskal-Wallis, U Mann Witney e teste de Friedmann (p≤0,05). Os demais resultados foram analisados descritivamente conforme recomendação de (SAMPAIO, 2007).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após o tratamento, 13 (86,66%) animais do GI apresentaram cicatrização
completa das lesões e dois (13,34%) parcial. A grande variação na apresentação clínica da doença e a falta de qualificação da
mão-de-obra possivelmente foram os principais fatores que limitaram a
recuperação de todos os animais. Entretanto, como as avaliações ocorreram sempre no mesmo mês e
local provavelmente minimizou, em parte, possíveis interferências relacionadas
ao desempenho dos animais. A elevada umidade relativa do ar, adequada
precipitação pluviométrica e a temperatura amena observada no mês de abril
também podem ter contribuído para que ocorresse certa regularidade no
comportamento dos animais. Segundo CHAVES et
al. (2002) o comportamento sexual de touros depende de vários fatores,
como os genéticos, fisiológicos, idade e ambientais.
Os animais de GI, em 2007
praticaram 34,43% a menos das atitudes apontadas por SALVADOR et al. (2003), quando
comparados ao GII em 2007 e, menos 19,9% quando comparado ao GII em 2008. Em
2008, os animais de GI ainda realizaram 10,7% a menos quando comparados ao GII.
Além do tratamento, a maturidade também pode ter contribuído para que
acontecesse uma melhora nos índices de atitudes de comportamento sexual em
2008. Na ausência dos sinais clínicos da enfermidade os animais mostraram-se
mais ativos, justificando, em parte, o acréscimo nas atitudes de libido dos
touros do GI. A recuperação incompleta de dois animais
(13,33%) sugere que a causa a
interferência negativa no bem estar desses animais ainda persistiu, limitando o
retorno às atitudes comportamentais. A libido comprometida do touro pode
representar prejuízo substancial para o criatório, especialmente pela
possibilidade de reduzir o número de crias. SILVA
(2002) e CHIQUETO (2004) confirmaram
que as doenças dos cascos constituem importante fator limitante na manutenção
de bons níveis de fertilidade, mas a redução dos níveis de fertilidade possui
diversas questões ainda não explicadas.
Os resultados das médias das ocorrências por
touro de cada uma das atitudes comportamentais indicaram que houve interação
entre o reflexo de Flehmen dos grupos GI e GII (p= 0,028) no ano de 2007, sendo
que nos bovinos alocados no GII, essa atitude foi maior (5,73±3,33).. Portanto,
considerando que esse reflexo é uma das mais comuns e importantes atitudes de
libido dos bovinos frente a uma fêmea no cio (HAFEZ,
2004), é possível que essa maneira de se comportar tenha uma relação com
a impotência couendi, indicando que
os bovinos pertencentes ao grupo GII apresentaram melhor desempenho sexual.
Verificou-se que GI,
antes do tratamento para DD, apresentou atitudes de La de (24,89%), Ch (21,99%)
e Fl (13,27%) e em GII verificou-se La de (23,14%), Ch 20,98% e Fl 20,98% do
total de atitudes praticadas. Confrontando
os achados obtidos para o Grupo GI durante os anos de 2007 e 2008, não se
observou diferença entre as atitudes que foram praticadas com maior freqüência.
Em 2007, notou-se nesse grupo valores para La de 60 (24,89%), Ch 53 (21,99%) e Fl 32 (13,27%) enquanto que em 2008, houve
acréscimo nos valores observados para 67 (25,67%), 54 (20,68%) e 42 (16,09%), respectivamente. Acrescente-se que
em 2008, esse acréscimo nas diversas atitudes em ambos os grupos pode ser
justificado também pela idade, pois animais mais velhos tendem a apresentar
maior libido.
Autores com NICOLETTI (2004) e GREENOUGH (2006)
acreditam que as enfermidades digitais sejam um agente estressor que altera as
funções reprodutivas dos bovinos. Comparando os dados de GI no ano de 2007 e o GII em 2008, observa-se diferença significativa (p=0,008),
sendo que GII (4,62±2,72) praticou maior numero de atitudes comportamentais. O
mesmo ocorreu entre o grupo GII avaliado em 2007 com grupo GI de 2008, após o
tratamento, demonstrando que essa atitude ainda poderia estar sofrendo
influencia das enfermidades digitais decorridos um ano do tratamento.
Em
2007, GI apresentou índice de 9,12% e 3,73% para as atitudes de Mo e Mc,
respectivamente, já em 2008, após tratamento, esses índices ascenderam para
9,19% e 4,21%, estando de acordo com as afirmações de PÉREZ Y PEREZ (1969) que
a dor desencadeada no momento do salto, muitas vezes, obriga os animais
interromper a cópula. Em 2007, os bovinos de GII apresentaram freqüência de
8,95% para Mo e 4,01% para Mc, enquanto em 2008 esses valores foram de 10,72% e
4,15%. Como em 2008 os animais possuíam 48 meses, a idade mais elevada também
pode ter contribuído para a ascensão desses valores. É provável que
independente de estarem doentes ou saudáveis existe uma tendência de os bovinos
mais jovens praticar menor número de montas orientadas e completas. CHENOWETH
(1997) relatou que a experiência em relação às montas pode influenciar na
eficiência para a cópula e consequentemente em seus rankings e scores de
libido. Para CHAVES (2002) pode-se inferir que a correta
orientação de monta é aprendida por meio de experiência de montas praticadas
continuamente. Entretanto, os achados em relação à idade e o desempenho sexual
dos touros pode não corresponder aos dados obtidos para animais que apresentam
impotência generandi.
Na
avaliação realizada em 2008 para as atitudes de Mg, Ms e Cb, nos bovinos
pertencentes de GI ocorreu um decréscimo nos valores, mas os Mp permaneceram
estáveis. Em GII houve uma tendência dessas atitudes se manterem estáveis. Uma análise visual dos touros durante a aplicação dos testes de
comportamento indica que muitos animais apresentavam dificuldade de locomoção.
A relutância em se locomover agravada pela dificuldade do animal em suportar o
próprio peso sobre o membro acometido, manifestada por alguns, aparentemente
diminuiu a procura pelas fêmeas aptas ao acasalamento e, conseqüentemente,
ocasionou redução na capacidade de efetuar a cobrição. Apesar dessas
limitações, 3,73% das atitudes praticadas pelos animais pertencentes ao grupo
GI, em 2007, estão relacionadas a monta
GI (2007), mas discute-se a fertilidade
desses reprodutores, conforme apontado por MOURA (2008). Esses achados estão de
acordo com CHIQUETTO (2004). SILVA et al. (2006), afirmaram que a dermatite digital bovina constitui um relevante
exemplo de fator estressante que promove interferência na performance
reprodutiva dos bovinos o que pode ser comprovado com os resultados obtidos.
CONCLUSÃO
Algumas
atitudes que expressam o comportamento
sexual de bovinos machos da raça Nelore são influenciadas por lesões de
dermatite digital, mas o tratamento da enfermidade promove acréscimo nesses
caracteres. Nos animais saudáveis essas atitudes se mantêm estáveis, contudo
nas duas categorias de bovinos o comportamento varia com a idade.
AGRADECIMENTOS
Agradecimento ao CNPq pelo apoio financeiro concedido.
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