PREVALÊNCIA DE ANTICORPOS ANTI-Toxoplasma gondii E FATORES DE RISCO ASSOCIADOS À INFECÇÃO EM CAPRINOS DA ILHA DE SÃO LUÍS-MA

Vívian Magalhães Brandão1, Francisco Borges da Costa1, Iran Alves da Silva1, Daniela Franco da Silva2, Isabel Cristina L. Dias2, Júlia Gleicy Soares3, Solange M. Gennari4, Rudson Almeida Oliveira5, Maria Inez Santos Silva6

 

1.             Mestre em Ciências Veterinárias, Universidade Estadual do Maranhão

2.             Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Maranhão

3.             Médica Veterinária , mestranda do Curso de Ciências Veterinárias, Universidade Estadual do Maranhão

4.             Médica Veterinária, doutora, professora do Curso de Medicina Veterinária, Universidade de São Paulo

5.             Médico Veterinário, doutor, professor do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Maranhão

6.             Médica Veterinária, doutora, professora do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Maranhão

E-mail: vetvivian@hotmail.com (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Frequência, pequenos ruminantes, toxoplasmose.

 

ABSTRACT

 

PREVALENCE OF ANTI-TOXOPLASMA GONDII ANTIBODIES AND RISK FACTORS ASSOCIATED TO THE INFECTION IN GOATS RAISED ON THE ISLAND OF SÃO LUIS, MARANHÃO

Toxoplasmosis is a disease transmitted to animals by contaminated food. It affects several species, but mainly small ruminants, causing miscarriages and congenital disorders. This study assesses prevalence and risk factors of anti-T. gondii infection in goat herds on the island of São Luís, Maranhão. Serum samples from 197 goats were collected in three municipalities and analysed by indirect immunofluorescence (IIF) for detection of T. gondii antibodies. An agglutination titre at a 1:64 dilution was considered as a cut-off level. Results revealed an estimated prevalence of 35,53% (95% CI = 28,90% - 42,60%). Furthermore, 13 (92,90%) out of 14 properties showed seropositive samples. Factors associated with goat infection were: age, breed, floor of pen, water source, nipple drinking system, exploration system, health management, and reproductive abnormalities.

 

KEYWORDS: Frequency, small ruminants, toxoplasmosis.

 

INTRODUÇÃO

Em 1979, MUNDAY & MASON, foram os primeiros a descreverem a toxoplasmose como importante causa de prejuízos reprodutivos em caprinos. Em animais adultos a infecção com T. gondii, ocasiona febre, anorexia, dispnéia, enterite e encefalite; os que sobreviverem tornam-se clinicamente normais. Fêmeas prenhes infectadas podem abortar, podendo ocorrer ainda morte fetal, reabsorção do feto ou nascimento de crias fracas, acarretando em perdas econômicas (DUBEY, 1980). Por meio de infecções experimentais observou-se a eliminação do agente no leite, saliva, urina (VITOR, 1991) e sêmen (DUBEY & SHARMA, 1980).

É fato de grande preocupação a transmissão da toxoplasmose caprina através do leite “in natura” e dos seus derivados, bem como da carne e subprodutos, quando consumidos quer pelos seres humanos quer por outras espécies (DUBEY, 1980). O consumo de leite de cabra mal esterilizado tem interferido na saúde pública, contribuindo para que a toxoplasmose se torne uma das mais difundidas zoonoses, considerando-se que as cabras portadoras de infecção aguda podem eliminar taquizoítos pelo leite (VITOR et al., 1991). Nesse sentido, o presente trabalho objetivou verificar a frequência de rebanhos caprinos soropositivos ao T. gondii na ilha de São Luís-MA.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização da área, amostragem e colheita do material

Para calcular o tamanho da amostra utilizou-se prevalência esperada de 25,8% (PIRES, 2009), de acordo com precisão absoluta desejada de 0,10 e nível de confiança de 99% (CANNON E ROE, 1982). Foram colhidas 197 amostras sanguíneas de 14 propriedades da ilha de São Luís, através da venopunção da jugular. As amostras foram centrifugadas e os soros armazenados à - 20oC até a realização dos testes sorológicos. A amostragem utilizada foi por conveniência definida como: 30,0 % de cada faixa etária; compreendendo animais com idade igual ou inferior a 12 meses e acima de 12, dentre machos e fêmeas e grupo raciais distintos. Utilizou-se questionário epidemiológico para obter informações sobre características individuais dos animais e relativas às propriedades.

Teste sorológico

Os soros foram analisados pela RIFI para detecção de anticorpos contra o T. gondii, de acordo com CAMARGO (1974), testados inicialmente a uma diluição de 1:64, em lâminas previamente sensibilizadas (IMUNODOT®), incubadas por 30 min a 37oC, e lavadas  com PBS (pH 7,2). Utilizou-se conjugado antigoat IgG (Sigma F7367) diluídos em 1:2000, em solução de PBS 7,2 contendo azul de Evans 0,01%. As reações foram consideradas positivas quando os taquizoítos apresentavam fluorescência periférica total em 50% dos taquizoítos no campo observado, na diluição ≥ 1:64 (FIGLIUOLO et al., 2004). As amostras de soro reagentes foram tituladas na base quatro até a obtenção da diluição 1:16.834 positiva na RIFI.

Análise estatística

As variáveis foram analisadas pelo teste Qui-quadrado (Ҳ2), quando não possível, pelo teste Exato de Fisher, utilizando-se o Programa Epi Info (CDC, versão 3.4.3). Associações entre variáveis e freqüência de soropositivos foram estimadas a partir do nível de significância de 5% (p < 0,05) e pela Odds Ratio (OR), com intervalo de confiança de 95%.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Das 197 amostras séricas colhidas de caprinos da ilha de São Luís - MA, testadas pela reação de imunofluorescência indireta (RIFI) para Toxoplasma gondii, estimou-se prevalência de 35,53% (70/197) [95% IC=28,90%-42,60%]. Os resultados obtidos para anticorpos anti - T. gondii (35,5%) foram superiores aos estimados por JITTAPALAPONG et al. (2005) na Tailândia (27,9%), FIGLIUOLO et al. (2004) em São Paulo (28,7%) e por LIMA et al. (2008) em Mossoró - RN (17,1%). Porém, a prevalência estimada foi inferior à registrada por SILVA et al. (2003) em Pernambuco (40,4%). Em relação às 14 propriedades estudadas, verificou-se que 13 (92,90%) apresentaram amostras reagentes para T. gondii, verificando-se por este estudo, que o T. gondii é um patógeno que se encontra difundido nos capris da ilha de São Luís - MA.

Os títulos variaram de 64 a 16.834, obtendo-se 41,50% (29/70) de amostras reagentes para título de 256 e apenas 1,40% (1/70) reagentes para título de 16.834. De acordo com DUBEY & KIRKBRIDE (1989), títulos > 1024 podem indicar uma infecção ativa e títulos <1024 são sugestivos de infecção crônica. Assim, os títulos de anticorpos anti - T. gondii registrados neste estudo indicam que uma grande parte dos caprinos apresentava infecção crônica.

Para variável sexo não foi verificada associação significativa (p > 0,05). Porém em relação ao grupo racial e faixa etária houve associação significativa (p < 0,05). Animais mestiços apresentaram freqüência de 41,12%, verificando-se 1,99 mais chances de apresentarem a infecção por T. gondii que animais puros. SILVA et al. (2003), semelhante a este estudo, verificaram maiores taxas de infecção em animais mestiços, com 51,92% caprinos soropositivos, apresentando associação significativa, podendo este comportamento ser devido ao menor cuidado no manejo higiênico-sanitário das criações de animais mestiços.

Em relação à faixa etária, verificou-se frequência de 41,32% animais soropositivos com faixa etária acima de 12 meses, com risco de 1,97 mais chances de apresentarem a infecção que animais com faixa etária ≤ 12 meses, podendo estar associado ao fato de maior período de contato de animais adultos com oocistos de T. gondii no ambiente. CAVALCANTE et al. (2008) verificaram que caprinos com mais de 37 meses de idade, o risco de estarem infectados pelo T. gondii foi 2,01 vezes maior que em animais mais jovens.

Para as variáveis fontes de água e tipo de bebedouro, verificou-se que nas propriedades em que a água era tratada pela fonte de abastecimento da cidade (CAEMA), e bebedouro era do tipo balde, provavelmente favoreceram a uma maior freqüência de amostras reagentes 45,57% (OR=2,06) e 41,30% (OR=4,22) respectivamente. O acesso de felinos a reservatórios de água deve ser evitado, evidenciando-se a possibilidade de felinos defecarem próximos a reservatórios de água, onde não existe proteção (DUBEY, 2004). Os oocistos podem ser carreados a longas distâncias pelo vento ou pela água como também através da contaminação por vetores mecânicos.

O tipo de exploração de maior frequência registrado no estudo foi o tipo leiteira com 47,06%, apresentando um risco 9,48 maior de apresentar a infecção quando comparado à exploração mista, concordando com vários estudos que afirmam que o tipo de exploração leiteira pode estar associado à infecção pelo fato da exigência de animais puros e estes serem mais suscetíveis que os mestiços, em decorrência do manejo intensivo que favorece a maior concentração de animais (JITTAPALAPONG et al., 2005), sendo a do tipo corte menos suscetível pelo fato do manejo ser mais extensivo, o que diminui chance de infecção.

Verificou-se que houve associação significativa (p<0,05) com a presença de gatos nas propriedades, cuja freqüência foi de 44,85%, assim, o risco de animais estarem infectados pelo T. gondii foi 4,70 vezes maior que em animais procedentes de propriedades onde não havia a presença de gatos, corroborando com CAVALCANTE et al. (2008) que observaram associação entre a soroprevalência de anticorpos anti - T. gondii e a presença de gatos em propriedades, indicando que o contato com essa espécies é importante no que diz respeito a epidemiologia da doença. LIMA et al. (2008) que apesar de ter sido observada a presença de gatos em 11 (78,6%) das 14 propriedades visitadas e em 64,3% destas foi relatado o contato dos gatos com as pastagens e com os caprinos, não verificaram associação significativa.

Verificou-se maior freqüência de amostras reagentes em propriedades com histórico de abortamento, 41,30% (OR=4,22). A associação significativa (p<0,05) verificada neste estudo corrobora com resultados obtidos por MASALA et al. (2003), que em estudos utilizando 362 amostras de fetos caprinos abortados, estimaram 23 (6,4%) amostras positivas para T. gondii através da PCR, indicando relação significativa do T. gondii com o abortamento em caprinos.

Outro fator associado com a infecção foi em relação ao destino do material abortado, cuja frequência de soropositivos foi maior em propriedades que jogam fora o material em terrenos baldios na própria propriedade ou em áreas próximas, com 53,44% de amostras reagentes, apresentando um risco de 2,23 mais chances de animais apresentarem a infecção que em propriedades onde enterram o referido material. Não destinando corretamente os fetos e tecidos fetais abortados, estes ficam expostos, facilitando assim que outros animais entrem em contato com material possivelmente contaminado por T. gondii.

 

CONCLUSÕES

A partir dos resultados obtidos pôde-se concluir que a prevalência de anticorpos anti - T. gondii foi considerada alta em rebanhos caprinos da ilha de São Luís-MA. As variáveis faixa etária e grupo racial foram associadas à infecção. Assim como, tipo de piso do aprisco, fonte de água, tipo de bebedouro, tipo de exploração, manejo sanitário e distúrbios reprodutivos. Portanto faz-se necessário um planejamento de sanidade animal na cadeia de produção dessas espécies, e da conscientização dos produtores para as formas de controle desta enfermidade.

 

REFERÊNCIAS

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CAVALCANTE, C. R.; CARNEIRO, M. A.; GOUVEIA, A. M. G.; PINHEIRO, R. R.; VITOR , R. W. A. Risk factors for infection by Toxoplasma gondii in herds of goats in Ceará, Brazil. Arquivo Brasileiro de Medicina. Veterinária e Zootecnia, Belo Horizonte, v. 60, n. 1, p. 36-41, 2008.

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