INFLUÊNCIA DA TRANSMISSÃO TRANSPLACENTÁRIA DO ANAPLASMA MARGINALE NO HEMOGRAMA E NO METABOLISMO OXIDATIVO DOS NEUTRÓFILOS (NBT) EM BOVINOS

 

Tamires Soares de Assis1; Nívea Caroline M. Silva1; Marcos Roberto A. Ferreira1; Cecília Nunes Moreira2

1- Alunos (as) do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Goiás – CAJ.

2- Professor Adjunto do Curso de Medicina Veterinária, CAJ/UFG, Jataí, Goiás, Brasil. CEP:75800-000.

E-mail: cissanm@yahoo.com.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Leucograma, nitroblue tetrazolium, parto.

 

ABSTRACT

 

INFLUENCE OF TRANSPLACENTAL TRANSMISSION OF ANAPLASMOSIS ON HEMOGRAM AND NEUTROPHILS OXIDATIVE METABOLISM PARAMETERS (NBT) IN CATTLE

This study determines the dynamics of transplacental infection by Anaplasma marginale in calves through assessment of hematological parameters and functional neutrophil activity by the NBT method. The animals investigated were reared in a dairy farm called “Fazenda Santa Rosa” located at Universidade Federal de Goiás, Jataí Campus, southwest of Goiânia, Goiás State. Blood smear tests were carried out to diagnose A. marginale. They showed that 71,43% of cows and 42,85% of calves were positive for anaplasmosis. As regards hemogram analysis, evidence revealed prepartum leukocytosis and decrease in leukocytes in the postpartum period due to stress during parturition. Transplacental transmission of A. marginale was detected in all cases and the infected calves presented an increase in neutrophils oxidative metabolism on their first day of life.

 

KEYWORDS: Leucocyte count, nitroblue tetrazolium, parturition.

 

INTRODUÇÃO

A anaplasmose é causada por uma rickettsia intra-eritrocitária, gênero Anaplasma, que infecta ruminantes domésticos e alguns silvestres. O A. marginale é transmitido biológica e mecanicamente por um grupo diversificado de artrópodes, insetos hematófagos e instrumentos contaminados. O carrapato Rhipicephalus boophilus microplus é o principal transmissor no Brasil. A forma transplacentária em infecções agudas pode ocorrer, ocasionando a anaplasmose neonatal. O período de incubação varia de duas a doze semanas. Os sinais clínicos são: febre, anemia, perda de peso, queda na produção, aborto e, eventualmente, morte (PEREIRA, 2006).

Os animais que sobrevivem à infecção aguda permanecem infectados por vários anos, servindo de importantes reservatórios com níveis microscópicos indetectáveis de eritrócitos infectados. Os métodos de profilaxia empregados para a anaplasmose são: o controle de dípteros hematófagos, medidas de controle de carrapatos, porém, o carrapato não deve ser erradicado da propriedade, e sim controlado, de forma que os animais sejam parasitados durante todo o ano com infestações baixas, permitindo assim doses infectantes adequadas; e o uso de vacinas (FRASER et al, 1997).

            A imunidade conferida a A. marginale é de duração variável e de origem humoral e celular. O aumento da produção de substâncias oxidativas no interior do neutrófilo é fundamental para a eficiência deste processo de defesa (TIZARD, 2000). O teste da redução do nitroblue tetrazolium (NBT) foi um método desenvolvido para a determinação desta atividade oxidativa dos neutrófilos (BAEHNER & NATHAN, 1968).

O objetivo deste estudo foi determinar a dinâmica de infecção transplacentária por Anaplasma marginale em bezerros e suas mães, avaliando parâmetros hematológicos encontrados no hemograma e relacionando a atividade funcional neutrofílica avaliada pelo método NBT.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho foi conduzido na propriedade rural Fazenda Santa Rosa, da Universidade Federal de Goiás – Campus Jataí, situada na região Sudoeste do Estado de Goiás, no município de Jataí. Foram coletadas amostras de sangue de 11 vacas girolando, 7 dias antes do parto e 24hs após o parto, e de seus bezerros 24hs depois do nascimento. A colheita foi realizada por punção da veia jugular com anticoagulante EDTA, a 10%, obtendo 5ml de sangue, para a determinação do volume globular (COLES, 1984), proteína total por refratometria, fibrinogênio plasmático pela técnica de precipitação no tubo de micro hematócrito a 56oC, contagem total de hemácias e de leucócitos com utilização de câmara de Newbauer e dosagem de hemoglobina pelo método de cianometahemoglobina por espectrofotometria (JAIN, 1993).

            Para a determinação do teste de NBT, foram obtidos 500 μL de sangue em tubos ependorf,  contendo 2,0 μL de heparina (Roche, São Paulo, Brasil). Desta solução de NBT foram pipetados e transferidos 50μL para frascos plásticos de e 50μL de sangue heparinizado, misturando-se as amostras com os reagentes, incubados a 37°C por 15 minutos em banho-maria e depois mais 15 minutos em temperatura ambiente (STIMULANT, USA).  Em seguida, utilizando-se lâminas foram preparados esfregaços que foram corados pelo método de Leishman conforme JAIN (1993). Por meio de microscopia, com aumento de 1000X, para cada amostra foram contados 100 neutrófilos, discriminando o percentual de células NBT positivas ou negativas, no interior do citoplasma. Os esfregaços de sangue obtidos  da veia jugular, fixados com álcool metílico, à temperatura ambiente e corados pelo método de Panótipo. Foram examinados em microscópio óptico, sob objetiva de imersão (100x), para o diagnóstico de A. marginale.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

            Na avaliação hematológica antes do parto, obteve-se os seguintes valores na série vermelha: hematócrito (32,4% ± 6,4%), hemácias (6,2 mm³ ± 0,61 mm³), fibrinogênio (525 g/dL ± 320 g/dL), proteínas plasmática (8,7g/dL ± 0,68g/dL), VCM (52,8 fl ± 5,9 fl), CHCM (33,3 g% ± 0,61g%) e , plaquetas, (316.625 mm³ ± 188.348 mm³). Quanto ao eritrograma,  no período pré-parto,  9,09% (1/11) das vacas apresentaram anemia, sendo que 100% foi do tipo normocítica e normocrômica, 45,45% (5/11) dos animais apresentaram trombocitopenia e 54,54% (6/11) contagem de plaquetas normais. Em relação às proteínas plasmáticas totais, 54,45% (6/11) apresentaram hiperproteinemia, enquanto 45,45% (5/11) tinham índices normais de proteínas.

Passando à análise da série branca, os valores médios obtidos foram: leucócitos totais (15.675 mm³ ± 5.715 mm³). No leucograma diferencial, os linfócitos (9.640 mm³ ± 6.104 mm³), segmentados (10.238 mm³ ± 11.620 mm³), bastonetes (402 mm³ ± 727 mm³). Com relação ao leucograma, no período pré-parto, 54,55% (6/11) dos animais apresentaram leucocitose e 45,45% (5/11) contagem de leucócitos normais;  dos linfócitos, 45,45% (5/11) mostraram linfócitos normais e 54,55% (6/11) linfocitose. Em relação à contagem de neutrófilos totais, 54,55% (6/11) resultou em contagem normal e 45,45% (5/11) neutrofilia. Na contagem dos monócitos, 36,36% (4/11) apresentaram monocitose e 63,64% (7/11) contagem de monócitos normais. Evidenciou-se que 63,64% (7/11) apresentaram eosinofilia e 36,36% (4/11) contagem normal de eosinófilos.

Na avaliação hematológica após o parto, obteve-se os seguintes valores na série vermelha: hematócrito (33% ± 5,6%), hemácias (6,2 mm³ ± 0,60 mm³), fibrinogênio (2.188 g/dL ± 4.000 g/dL), proteínas plasmática (8,3 g/dL ± 0,66 g/dL), VCM (53,4 fl ± 4,16 fl), CHCM (33,3 g% ± 0,42 g%) e , plaquetas, (362.286 mm³ ± 167.305 mm³). Quanto ao eritrograma pós-parto, 100% (11/11) das vacas apresentaram-se sem alterações, 27,27% (2/11) apresentaram trombocitopenia e 72,73% (8/11) contagem de plaquetas normais. Em relação às proteínas plasmáticas totais, 45,45% (5/11) apresentaram hiperproteinemia, enquanto 54,55% (6/11) apresentaram índices normais de proteínas.

No que se refere à série branca, leucócitos totais (13.594 mm³ ± 3.108 mm³), no leucograma diferencial, os linfócitos (8.051 mm³ ± 3.360 mm³), segmentados (3.991 mm³ ± 2.357 mm³), bastonetes (14 mm³ ± 39 mm³). Quanto ao leucograma pós-parto, 45,45% (5/11) dos animais apresentaram leucocitose, 54,55% (6/11) contagem de leucócitos normais. Quanto aos linfócitos, 36,36% (4/11) apresentaram linfopenia e 63,64% (7/11) contagem de linfócitos normais. Já na contagem de neutrófilos totais, 72,73% apresentaram contagem normal e 27,27% neutrofilia.  Na contagem dos monócitos, 36,36% (4/11) apresentaram monócitopenia e 63,64% (7/11) estavam com contagens normais. Evidenciou-se que 9,09% (1/11) apresentaram eosinofilia, enquanto 90,91% (10/11) apresentaram índice normal de eosinófilos.

Na avaliação hematológica dos bezerros recém nascidos, obteve-se os seguintes valores na série vermelha: hematócrito (36,3% ±7,1%), hemácias (6,5 mm³ ± 0,74 mm³), fibrinogênio (1029 g/dL ± 293 g/dL ), proteínas plasmática (7,9 g/dL ± 0,98 g/dL), VCM (55,3 fl ± 5,13 fl), CHCM (33,4 g% ± 0,40 g%) e , plaquetas, (298.120 mm³ ± 67.038 mm³).

No eritrograma e na contagem de plaquetas, 100% destes animais apresentaram resultados dentro dos parâmetros fisiológicos normais (MEYER et al., 1995). Em relação às proteínas plasmáticas totais, 18,18% (2/11) apresentaram hiperproteinemia e 72,72% (8/11) apresentaram índices normais de proteínas. Quanto a série branca, leucócitos totais (10.214 mm³ ± 3.818,2 mm³), contagem diferencial de leucócitos, os linfócitos (4.669 mm³ ± 1.731,5 mm³), segmentados (3.853 mm³ ± 2.543,8 mm³), bastonetes (142 mm³ ± 130,5 mm³). No leucograma dos bezerros, 54,55% (6/11) dos animais apresentaram contagem de leucócitos normais e 45,45% (5/11) leucocitose. Quanto aos linfócitos, 18,18% (2/11) apresentaram linfocitose e 72,72% (8/11) da contagem de linfócitos normais. Quanto a contagem de neutrófilos totais, 63,64% (7/11) apresentaram contagem normal e 36,36% neutrofilia. Quanto aos monócitos, 18,18% (2/11) apresentaram monocitose e 72,72% (8/11) contagem de monócitos normais. Evidenciou-se que 18,18% (2/11) apresentaram eosinofilia, 36,36% (4/11) apresentaram eosinopenia e 36,36%(4/11) contagem normal de eosinófilos.

            Da análise do NBT, verificou-se que os valores médios antes do parto foram (47% ± 0,17%), e depois do parto foram de 32% ± 0,17%; sendo que 54,45% (6/11) das vacas apresentaram significativo decréscimo na porcentagem do NBT pós-parto, em relação à porcentagem do NBT pré-parto. E 45,45% (5/11) das vacas tiveram um aumento na sua porcentagem. Com relação aos bezerros, os valores médios de NBT foram de 41% ± 0,15%.

            Quanto à parasitemia, 54,54% (6/11) das vacas foram positivas para Anaplasma marginale, dessas, 18,18% (2/11) foram positivas pré e pós-parto e 72,72% (8/11) positivas somente no pós-parto. Quanto aos bezerros, 45,45% (5/11) foram positivos para A. marginale.

            As vacas no pré-parto demonstraram uma leucocitose e uma redução nos leucócitos pós-parto, porém não caracterizando uma leucopenia, pois os valores estavam dentro dos parâmetros normais. As vacas pós-parto, independente da parasitemia, apresentavam um decréscimo na imunidade celular refletindo uma queda no NBT de 47% para 32%, sendo esta justificada provavelmente por um estresse puerperal. As vacas que se mostraram parasitadas pelo Anaplasma marginale apresentaram um acréscimo de 36% para 47% no resultado do teste de NBT do pré-parto para o pós-parto, concordando com BIRGEL JUNIOR & SAUT (2006) e demonstrando a resposta imunológica a infecção. Os bezerros positivos para o Anaplasma marginale apresentaram maiores valores no resultado do teste de NBT do que os bezerros não parasitados, o que reflete já o pleno funcionamento do metabolismo oxidativo dos neutrófilos nas primeiras horas de vida, concordando com TIZARD (2000).

Todos os bezerros que se mostraram positivos para Anaplasma marginale possuíam suas mães também parasitadas; comprovando a transmissão transplacentária do Anaplasma marginale, considerando que não houve tempo para contaminação dos bezerros recém-nascidos por vetores da anaplasmose bovina, concordando com SILVA (2007).

 

CONCLUSÕES

Foi possível concluir que a transmissão placentária do A. marginale ocorreu em todos os casos estudados e os bezerros infectados apresentaram já no primeiro dia de vida um acréscimo no metabolismo oxidativo dos neutrófilos.

 

REFERÊNCIAS

BAEHNER, R. L.; NATHAN, D. G. Chronic granulomatous disease. New England Journal of Medicine, Waltham, v. 278, p. 1972-4, 1968.

BIRGEL JUNIOR, E. H.; SAUT, J. P. E. Influência do período pós-parto sobre o leucograma de fêmeas bovinas da raça holandesa. Brazilian Journal Veterinary Research Animal Science, São Paulo, v. 43, n. 5, p. 588-597, 2006.

COLES, E. H. Patologia clínica veterinária. 3.ed. São Paulo: Manole, 1984, 566p.

ELSIEVO, K. A.; MOORE, W. E. Effects of dietary protein and stage of lactation on the hematology and erythrocyte enzymes activities of high-producing dairy cattle. Research in Veterinary Science, London, v. 26, n. 1, p. 53-58, 1979.

FRASER, C. M.; BERGERON, J. A.; MAYS, A.; AIELLO, S. E.; Manual Merk de veterinária. 7.ed. São Paulo: Rocca, 1997. 2169p.

JAIN, N. C. Essentials of veterinary hematology. Philadelphia: Lea & Febiger, 1993, 417p.

MEYER, J. D.; COLES, H. E; RICH, J. L. Medicina de laboratório veterinária Interpretação e diagnóstico. São Paulo: Roca, 1995.

PEREIRA, M. A. Dinâmica da infecção por Anaplasma marginale e Babesia bovis e Babesia bigemina em bezerras de propriedades leiteiras da microrregião de Lavras, Sul de Minas Gerais. 58p. 2006. Dissertação (Mestre em Ciência Veterinária) - Universidade Federal de Lavras, Lavras.

SILVA, R. A.; CORRÊA, F. N.; BOTTEON, R. C. C. M.; BOTTEON, P. T. L. Infecção natural por hemoparasitos em bezerros submetidos à quimio-profilaxia aos 30 dias de idade. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária, São Paulo, v. 16, n. 3, p. 163-165 2007.

TIZARD, I. R. Veterinary immunology: an introduction. 6.ed. London: Saunders Company, 2000, 482p.