INCIDÊNCIA DE BRUCELLA OVIS EM OVINOS COM HISTÓRICO DE DISTÚRBIOS REPRODUTIVOS NO ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL

 

Huber Rizzo1, Lilian Gregory2, Eliana Scarcelli Pinheiro3, Aline Feola de Carvalho4, Rosana Lisboa Santana4, Lílian Márcia Paulin Silva3

 

1. Doutorando do Departamento de Clinica Médica da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo – E-mail: hubervet@usp.br (autor correspondente)

2. Professora Doutora da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo

3. Laboratório de Doenças Bacterianas da Reprodução, Instituto Biológico de São Paulo

4. Mestranda do Programa de Pós-graduação do Instituto Biológico de São Paulo.

 

PALAVRAS- CHAVE: Aborto, Actinobacillus seminis, brucelose, orquite.

 

ABSTRACT

 

INCIDENCE OF BRUCELLA OVIS IN SHEEP WITH A HISTORY OF REPRODUCTIVE DISORDERS IN SÃO PAULO, BRAZIL

To investigate the incidence of Brucella ovis in sheep, samples were collected from 22 males and 182 females raised in 26 farms located in 19 different cities in São Paulo. They all had a history of some kind of reproductive problem, such as abortion, impairment of fertility, neonatal deaths, delivery of weak neonates, distocic delivery, vaginal discharge, orchitis, epididymitis, testicular degeneration, and lack of sexual desire. The samples analysed included: 204 blood samples, 15 semen samples, 16 aborted fetuses, 4 placenta samples, and 12 vaginal mucous samples. The percentage of serologically positive females for Brucella ovis was 1,96%. It was not possible to isolate Brucella ovis from samples submitted to the microbiological examination, although Actinobacillus seminis was isolated from one of the semen samples, which is considered a differential diagnosis for ovine brucelosis.

 

KEYWORDS: Abortion, Actinobacillus seminis, brucellosis, orchitis.

 

INTRODUÇÃO

A brucelose em ovinos é uma doença de distribuição mundial. A primeira descrição da infecção foi feita por BUDDLE & BOYES em 1953, em 1956, BUDDLE isolou estirpes de Brucella sp. na Nova Zelândia e Austrália. No Brasil o primeiro diagnóstico clínico de brucelose por Brucella ovis foi firmado por RAMOS et al. (1966) e confirmado por BLOBEL et al. (1972). Posteriormente, NOZAKI et al. (2004), examinaram 1.033 ovinos do Estado de São Paulo e encontraram 12% de positividade para Brucella ovis. AZEVEDO et al. (2004), no Rio Grande do Norte, observaram 11,3% e CLEMENTINO et al. (2007) 5,57% de ovinos sororeagentes na Paraíba.

             O sinal clínico inicial da infecção de ovinos por Brucella ovis é febre, acompanhada de desgaste físico, dispnéia e inflamação escrotal e testicular (ROBLES, 1998). A infecção geralmente é disseminada e pode causar infertilidade em machos, abortamento em fêmeas e mortalidade neonatal em cordeiros, os principais órgãos comprometidos são: epidídimo, túnica vaginal, testículos e placenta (BUDDLE, 1956). Os animais naturalmente infectados apresentam epididimite (CAMERON & LAUERMAN Jr., 1976; BURGESS et al., 1982) e podem excretar o microorganismo no sêmen ou apenas apresentam resposta sorológica (BURGESS et al., 1982).

             Em casos agudos os testículos estão aumentados de tamanho, há edema inflamatório, presença de exsudado fibrinoso na região da túnica vaginal, hiperemia testicular e edema do epidídimo (EPSTEIN et al., 1964, ROBLES, 1998). Na fase crônica são observadas regiões no testículo hipertrofiadas e endurecidas à palpação, deformações na cauda do epidídimo, bolsa escrotal espessa e com fibrosamento que restringe a mobilidade do testículo, há inclusive aderências fibrosas obstruindo a cavidade que separa as túnicas (ROBLES, 1998; RIDLER, 2002).

            O objetivo desse trabalho é observar a incidência de Brucella ovis em ovinos que apresentaram distúrbio em sua vida reprodutiva.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Animais

            Foram colhidas amostras de 22 machos e 182 fêmeas ovinas pertencentes a 26 propriedades de 19 municípios do estado de São Paulo, todos os animais apresentavam histórico de distúrbios reprodutivos como: aborto, infertilidade caracterizada por repetição de cio, morte neonatal, parição de cordeiro fraco, parto distócico, presença de secreção uterina, orquite, epididimite, degeneração testicular e baixo libido.

 

Avaliação clínica dos animais

          Os animais foram examinados individualmente por meio do exame clínico geral e específico do aparelho genital de acordo com critérios recomendados por ROSENBERGER (1993) e as observações foram registradas em fichas clínicas.

Amostras

Foram colhidas 204 amostras de sangue para obtenção de soro e realização da técnica diagnóstica de imunodifusão em gel ágar, utilizando antígenos produzidos pelo Instituto de Tecnologia do Paraná (TECPAR).

Para realização do isolamento bacteriano de Brucella ovis foram utilizados 15 amostras de sêmen, colhidas com vagina artificial e os animais que não aceitassem esse método de colheita o procedimento foi efetuado com o uso da técnica de eletroejaculação, 16 fetos resultado de abortamento, 4 amostras de secundinas e 12 amostras de secreção uterina, todas as amostras foram mantidas sob refrigeração e processada até 24 horas após a colheita.

 

Cultivo microbiológico de Brucella ovis

As amostras foram semeadas no meio de cultura (100 µL), ágar triptose (Difco ou Oxoid) acrescido de 5% de soro fetal bovino e da seguinte mistura de antibióticos: polimixina B (Sigma) (1800 UI/L), ciclohexamida (Sigma) (30 mg/L) e bacitracina (Sigma) (7500 UI/L) (Brown; et al., 1971). A Incubação foi executada em microaerofilia a 37oC durante 10 dias. Após o período de incubação, foi realizada a identificação das colônias isoladas de acordo com ALTON et al. (1976).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A incidência de ovinos com histórico de distúrbios reprodutivos sororeativos a Brucella ovis foi de 1,96% (4/204), observou-se que os quatro ovinos positivos pela prova de IDGA para pesquisa de anticorpos anti- Brucella ovis eram fêmeas. AZEVEDO et al. (2004), ao analisarem 115 soros de ovinos do Rio Grande do Norte, não observaram significância estatística (P=0,14) entre a positividade e o sexo, indicando assim que machos e fêmeas estão igualmente expostos ao risco de infecção, no entanto TAMAYO et al. (1989) descreve que os machos são mais susceptíveis que as fêmeas.

Dentre os animais positivos, três possuem histórico de abortos a no máximo seis meses do momento da coleta e um com queixa de repetição de cio, sinais que também foram observados por outros autores (LIBAL & KIRKBRIDE, 1983: HOMSE et al., 1995: GRILLO et al., 1999). Os animais pertencem a três rebanhos diferentes e no momento da coleta não apresentavam sinais característicos da enfermidade.

As fêmeas podem agir como disseminadoras da enfermidade no rebanho acometendo principalmente os machos no momento do coito (PLANT et al., 1986). Eliminam o agente na secreção vaginal, secundinas e abortamentos (LIBAL & KIRKBRIDE, 1983; GRILLO et al., 1999), leite (BAIGUN et al., 1999) ou ainda podem parir cordeiros débeis ou prematuros que podem desenvolver a enfermidade após a puberdade (ESTEIN, 1999).

Não foi possível o isolamento do agente em nenhuma das amostras submetida ao exame microbiológico por isso não podemos afirmar que os abortos ocorreram devido a Brucelose, no entanto em uma das amostras de sêmen de um reprodutor que apresentava quadro clinico de orquite e azoospermia, ocorreu o crescimento de colônias de Actinobacillus seminis que é o diagnostico diferencial no caso de casos de orquite e epididimite em ovinos.

SCHAFER et al. (1997) em Santa Catarina, observaram que 18,84% dos animais que apresentavam alterações nos órgãos genitais, nem um reagiram positivamente ao teste de IDGA, isso porque outros patógenos podem ser responsáveis por lesões epididimárias e/ou testiculares em ovinos, como por exemplo, Actinobacillus seminis, A.actinomycetemcomitans, Haemophilus somnus, Corynebacterium pseudotuberculosis, C. pyogenes, Pasteurella spp., Streptococcus spp. e Staphylococcus spp. (WALKER et al., 1986; ROBLES et al., 1990), limitando assim o uso do exame clinico como único método diagnóstico para Brucella ovis.

 

CONCLUSÃO

O resultado alcançado pela presente pesquisa sorológico prova a existência de Brucella ovis nos rebanhos comerciais de ovinos do estado de São Paulo, sendo que fêmeas sororeativas podem agir como disseminadoras da enfermidade no rebanho.

Faz-se necessário estudos mais amplos com amostragens significativas da população ovina, adoção de medidas sanitárias de controle e prevenção para evitar a propagação da doença.

 

REFERÊNCIAS

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