PREVALÊNCIA SOROLÓGICA DA ARTRITE-ENCEFALITE CAPRINA
Carla
Caroline Valença de Lima1, Thiago Sampaio Souza2,
Priscila Martinez Martinez3, Joselito Nunes Costa4, Maria
das Graças Ávila Ribeiro Almeida5, Antônio Vicente Magnavita
Anunciação6 e Raymundo Rizaldo Pinheiro7
1.
Acadêmica da Escola de Medicina Veterinária (EMV), Universidade Federal da
Bahia (UFBA) -
CEP:
40170-110 Salvador- Bahia, Brasil. E-mail:
carla.ccvl@gmail.com (autor correspondente)
2 Médico
Veterinário, mestrando
3
Médica Veterinária da CODEVASF 6ªSR, Ms.
4 Professor
Doutor do Departamento de Patologia e Clínicas da EMV/UFBA.
5
Médica Veterinária do Laboratório de Viroses do Hospital Veterinário da EMV/UFBA.
6
Professor Ms. do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da EMV/UFBA
7 Pesquisador
Doutor da Embrapa Caprinos e Ovinos.
PALAVRAS-CHAVE:
CAEV, caprino, epidemiologia, IDGA, Lentivirus.
ABSTRACT
SEROLOGIC
PREVALENCE OF CAPRINE ARTHRITIS-ENCEPHALITIS (CAE) IN THE CITY OF
This study aims to verify serologic prevalence of
caprine arthritis-encephalitis (CAE) in the city of
KEYWORDS: AGID, CAEV, epidemiology, goat, Lentivirus.
INTRODUÇÃO
A caprinocultura é uma das mais importantes
atividades pecuárias da região Nordeste. Na maioria das propriedades,
observa-se o uso extensivo da terra, com nível rudimentar de tecnologia, pouca
ou nenhuma assistência técnica, obtendo baixos índices de produtividade,
resultando numa baixa remuneração ao produtor. O homem do campo dessa região
utiliza a agricultura e a pecuária como modo de vida, sendo muito mais uma
atividade para o autoconsumo (SOUZA, 2004). O município de Juazeiro possui uma população
caprina estimada em 218.951 cabeças (IBGE, 2008). A maioria dos rebanhos tem
origem local e não possui animais de raça exótica, ou seja, que apresentem
características zootécnicas determinantes de raças importadas (SOUZA et al.,
2007). Surge, portanto a necessidade de melhoramento genético utilizando-se
animais de outras regiões, a fim de aumentar a produtividade. Isto reforça a importância de se
controlar a entrada de enfermidades como a artrite-encefalite caprina (CAE).
A CAE é uma doença causada por vírus da família Retroviridae, gênero Lentivirus, e apresenta período de
incubação longo, variando de meses a anos, evolução geralmente crônica, com
agravamento progressivo das lesões, perda de peso e debilidade até a morte
(FRANKE, 1998). É uma enfermidade que acarreta grandes perdas econômicas nos
rebanhos caprinos, principalmente naqueles de produção leiteira, acometendo
animais de diferentes raças, idades e sexo. As perdas econômicas se
caracterizam por morte de animais jovens, diminuição da produção láctea e perda
de peso dos adultos devido a dificuldades de locomoção. Perdas indiretas
importantes decorrem da desvalorização dos rebanhos, reposição precoce de
animais, despesas com medidas de controle e barreiras comerciais para produtos
(matrizes, reprodutores e sêmen) (PINHEIRO et al., 2001).
Ao considerar-se a CAE como uma das enfermidades mais
importantes para os caprinos, realizou-se este trabalho com o objetivo de
verificar a sua prevalência sorológica no município de Juazeiro –Bahia e
caracterizar os sistemas de criação da região.
MATERIAL
E MÉTODOS
A área de atuação desse
levantamento epidemiológico da CAE envolve o município de Juazeiro, que
pertence à Região do Baixo Médio São Francisco, composta por mais sete
municípios: Pilão Arcado, Campo Alegre de Lourdes, Remanso, Sento Sé, Casa
Nova, Sobradinho e Curaçá. O efetivo
caprino desta região é de 985.076 caprinos, o que representa aproximadamente
30,9% do rebanho baiano e 10,4% do rebanho nacional (IBGE, 2008). As maiores
concentrações são observadas nos municípios de Juazeiro e Casa Nova.
Como este trabalho
representa estudos preliminares de um projeto de pesquisa que abrange toda a
Região do Baixo Médio São Francisco, o cálculo de amostragem foi realizado
levando-se em consideração todos os municípios dessa região. O número mínimo de
amostras foi de 619, determinado a partir da fórmula de ASTUDILLO (1979), sendo
que esse total foi distribuído pelos oito municípios de forma proporcional ao
rebanho de cada um deles. Os dados de rebanho utilizados nos cálculos foram do
IBGE disponíveis no ano de 2008. Para o município de Juazeiro, foram testadas
150 amostras, oriundas de 10 propriedades.
As propriedades
visitadas foram cadastradas. Além disso, foi aplicado um questionário abordando
dados do criador, da fazenda e do rebanho, objetivando-se correlacionar
diferentes variáveis acerca do nível tecnológico, sanidade e aspectos
zootécnicos com a soroprevalência observada.
Os animais foram
avaliados clinicamente, buscando-se alterações características da CAE, segundo RADOSTITS
et al. (2002). A idade dos animais foi estimada com base no número de mudas de
dentes. Após a anti-sepsia com álcool iodado, as amostras de sangue foram
colhidas através da punção da veia jugular, utilizando-se tubos a vácuo, sem
anticoagulante. Em seguida, após a formação de coágulo, os tubos foram
centrifugados a 1600g por 10 minutos para a obtenção do soro, que foi
acondicionado em tubos plásticos tipo eppendorf
® e estocados a -20ºC até a realização do teste sorológico.
Para detecção de
anticorpos contra o lentivírus caprino (LVC), foi utilizada a técnica de imunodifusão
em gel de ágar (IDGA), utilizando-se antígeno nacional produzido no Laboratório
Biovetech®. Toda a técnica realizada seguiu rigorosamente as recomendações do
fabricante. Este teste utiliza um antígeno específico do LVC, a proteína do
capsídeo (p28). A leitura foi realizada após 48-72 horas, com luz indireta
sobre fundo escuro, sendo considerada definitiva a última leitura.
Considerou-se como reação positiva a presença de uma linha de precipitação
esbranquiçada e uniforme entre o poço teste e o antígeno, apresentando
identidade com a linha formada pelo soro padrão e como reação negativa a
ausência de uma linha de precipitação ou linhas sem identidade (ABREU et al.,
1998).
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
Foram visitadas propriedades das comunidades do
município de Juazeiro, BA, denominadas de Carnaíba, Juremal, Massaroca, Junco,
Boqueirão e Campos, onde se colheu amostras de 150 animais. Verificou-se que os
sistemas de criação são essencialmente extensivos, voltados para a exploração
de carne, sendo que 80% realizam suas criações em terras devolutas, com capril
de chão batido e apenas 20% destes possuem cobertura. Os animais ficam soltos
em grandes áreas, comuns a vários produtores, onde o criador pouco atua no
controle da sanidade da criação. Além disso, 70% das criações são consorciadas
com ovinos, destas 20% também com bovinos e 20% consorciadas apenas com
bovinos. Com relação à presença de animais de raça, foram observados mestiços
de Anglonubiano, Boer e Saanem em respectivamente 30%, 10% e 10% das
propriedades, sendo que em todas eram predominantes animais sem raça definida.
Estas observações estão de acordo com as verificadas
por SOUZA et al. (2007) ao trabalhar com ovinos na região de Juazeiro,
salientando que os animais são criados sem nenhuma tecnologia e vivem
principalmente do pastejo, o que acarreta baixa produtividade e também elevada morbidade em virtude de alterações climáticas, de manejo
sanitário deficiente e de alimentação inadequada. Ainda assim é possível
afirmar que a caprinocultura nesta região possui grande impacto social,
econômico e cultural, exigindo, portanto, atenção e dedicação para maiores
pesquisas (SOUZA, 2004).
Através dos
questionários os proprietários relataram a ocorrência das seguintes
enfermidades em seus rebanhos: linfadenite caseosa (100%), miíase (90%),
ceratoconjuntivite (90%), diarréias (80%), ectoparasitas (70%), ectima contagioso
(70%), mastite (60%), artrite (20%) e pododermatite (20%).
Os resultados obtidos
demonstraram que anticorpos para o vírus da CAE não ocorrem nestes rebanhos caprinos, corroborando com estudos que
associam a ocorrência do lentivírus a criações de exploração leiteira ou com
animais de raça, em sistema intensivo (ALMEIDA et al., 2001; PINHEIRO et al.,
2001; SILVA et al., 2005, OLIVEIRA et al., 2006).
A soroprevalência
encontrada é similar à relatada por PINHEIRO et al. (2001) em um estudo
realizado no estado do Ceará, no qual foi obtido uma soroprevalência de 0,1% em
caprinos mestiços. No estado da Bahia, ALMEIDA et al. (2001) observaram uma
soropositividade de 3,06% para caprinos sem raça definida (SRD), contrastando com
18,92% para animais da raça Saanen, 16,06% para Pardo Alpino, 15,76% para Anglonubiano,
criados intensivamente. Num outro
levantamento realizado com caprinos criados extensivamente no Sudoeste do
estado, OLIVEIRA et al. (2006) observaram uma soroprevalência de 0% para animais
SRD, diferente dos resultados obtidos ao se trabalhar com animais das raças
Anglonubiano e Saanem, de 1,87% e 5,6% respectivamente. Resultados de baixa
ocorrência sorológica para CAE em animais oriundos do semiárido baiano foi
detectado por RAMALHO (2000), que obteve uma soropositividade de 3,3% para CAE
pelo método de IDGA, contrastando com os 48,8% observados no mesmo estudo para
animais da Região Metropolitana de Salvador.
CONCLUSÕES
Não foi observada
soropositividade para CAE no município de Juazeiro – Bahia, demonstrando a
aparente ausência da doença nesta região. O sistema de criação observado foi predominantemente
extensivo, com presença de animais nativos, mestiços e sem raça definida,
visando principalmente a produção de carne, com baixa produtividade e baixo
índice de tecnificação. A ausência da sorologia positiva para o vírus da CAE no
município estudado aponta a importância da realização de um levantamento
epidemiológico mais abrangente no estado, servindo como base para a elaboração
de um programa sanitário que evite a entrada de animais portadores do vírus e a
disseminação deste para outras regiões.
AGRADECIMENTOS
À Fundação de Amparo a
Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) pelo financiamento do projeto, à Companhia
de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (CODEVASF 6ªSR) pelo
apoio técnico às ações realizadas a campo, ao Laboratório de Viroses da
EMV/UFBA pela estrutura laboratorial utilizada para a realização dos exames e
aos criadores de caprinos da Microrregião de Juazeiro - BA pela disponibilidade
dos animais para que as colheitas pudessem ser realizadas.
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