DISTRIBUIÇÃO DE ANTICORPOS PARA Leptospira sp EM BÚFALOS (Bubalus bubalis) DA REGIÃO NORDESTE DO ESTADO DO PARÁ, BRASIL

 

 

Geanne Rocha da Silva1, Carla Cristina Guimarães de Moraes2, Keyla Cristina do Nascimento de Melo1, Amanda de Sousa Matos1, Ivan Mattoso de Andrade1, João Maria do Amaral Jr1, Dinaiara de Souza Fragoso1, Carolina Ferreira Freitas Pereira1, Iara Costa Soares1, Carmen Silvia Araujo Neves1, Rosely Bianca dos Santos3, André Marcelo Conceição Meneses4, Ana Paula Vilhena Beckman Pinho5, Zenaide Maria de Morais6, Gisele Oliveira de Souza 7, Silvio Arruda de Vasconcellos8

 

1 Acadêmica do curso de Medicina Veterinária, Universidade Federal do Pará

2 Médica veterinária, doutora, professora do curso de Medicina Veterinária - Universidade Federal do Pará, CEP: 68743-000 – Castanhal – Pará – Brasil. E-mail: ccmoraes@ufpa.br (autor correspondente)

3 Médica veterinária, doutoranda CAPES, FMVZ – Universidade de São Paulo

4 Médico Veterinário, doutor, professor do curso de Medicina Veterinária - Universidade Federal Rural da Amazônia

5 Medica veterinária, mestranda, Universidade Federal do Pará

6 Bióloga, laboratório de zoonoses bacterianas, FMVZ- Universidade de São Paulo

7 Nutricionista, laboratório de zoonoses bacterianas, FMVZ- Universidade de São Paulo

8Medico Veterinário, professor titular, professor da FMVZ-Universidade de São Paulo

 

PALAVRAS–CHAVE: Bubalino, leptsopirose, soroaglutinação microscópica.

 

 

ABSTRACT

 

PREVALENCE of ANTI-LEPTOSPIRA SPP. ANTIBODIES in buffaloes RAISED IN ParÁ, Brazil

This study investigates the occurrence of leptospirosis in buffaloes (Bubalus bubalis) from the northeast region of Pará, Brazil. Sera samples from 127 animals were tested by microscopic agglutination test (MAT) with live antigens using reference strains of 24 different leptospiral serovars, which was carried out in the Laboratory of Bacterial Zoonosis (FMVZ/USP). Positive MAT titres (between 100 and 3,200) were found. A total of 67,72% of samples were reactive to one or more Leptospira spp. serovars, of which serovar Hardjo genotype hardjioprajitno was the most common (15,75%), followed by serovars grippotyphosa, pomona (11,81% each), and wolffi (7,09%). Research findings were very similar to those of other studies in Brazil, although some differences were observed as regards predominant serovars in buffaloes. We conclude that the prevalence of Leptospira spp. in the herds studied is probably due to the region's climate, which facilitates the spread of bacteria.

KEYWORDS: Buffalo, leptospirosis, microscopic seroagglutination.

INTRODUÇÃO

A região norte concentra 63% da população de bubalinos (Bubalus bubalis) criados no território nacional e segundo dados do IBGE (2007) grande parcela destes animais é criada na ilha do Marajó/Pará. As características geográficas desta região dificultam o manejo dos animais, fazendo com que sejam criados em regime basicamente extensivo e sem devidos cuidados para uma alimentação adequada. Por outro lado, em outras regiões do estado o manejo desta espécie é mais adequado mesmo porque são animais destinados para a reprodução e produção de carne ou leite (MARQUES, 2000).

A leptospirose é uma zoonose de curso agudo que afeta diversas espécies de animais domésticos, silvestres e pode, acidentalmente, acometer os seres humanos. Possui como agente etiológico bactérias espiraladas, pertencentes a ordem Spirochaetales, família Spirochaetaceae e gênero Leptospira (SMITH, 2006). As infecções por Leptospira  sp na espécie bubalina comumente são determinadas pelos sorovares Hardjo, Wolffi, Pomona, Icterohaemorrhagiae, Canicola e Grippothyphosa (LANGONI et al., 1999; RADOSTITS, 2002; AGUIAR et al., 2006).

A bactéria após penetrar as mucosas ou a pele, lesionadas ou integras friáveis, alcança a circulação sangüínea onde se multiplica ativamente, caracterizando um processo denominado de leptospiremia, indo colonizar praticamente todos os tecidos, causando comprometimento de órgãos vitais (RIET, 2007). Assim como em bovinos, nos bubalinos esta fase pode ser responsável por importantes alterações reprodutivas algumas semanas após a infecção (COSTA et al., 1998; ELLIS, 1994; RADOSTITS et al., 2002).

A pesquisa de anticorpos (Ac) constitui a principal prova de diagnóstico da leptospirose, incluindo teste sorogrupos – específicos, dos quais a prova de soroaglutinação microscópica (SAM) é a mais importante e amplamente utilizada. A organização Mundial de Saúde (OMS) considera esta prova como de referência para o diagnóstico da enfermidade, tanto no homem quanto nos animais, pois, além de detectar Ac específicos é utilizada também na classificação e identificação dos sorotipos isolados (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2003; LOMAR et al., 2005; OLIVEIRA et al., 2005).

Em virtude da escassez trabalhos científicos publicados com enfoque na bubalinocultura, este trabalho objetivou avaliar a ocorrência da leptospirose em rebanhos bubalinos em municípios da região nordeste do estado do Pará.

 

MATERIAL E MÉTODO

Animais e colheita de amostras

Os 127 bubalinos participantes deste estudo eram provenientes da região Nordeste do Estado do Pará, sendo 25 machos e 102 fêmeas, da raça Murrah e Mestiço, criados sob manejo de sombra e em regime extensivo. A colheita das amostras de sangue foi realizada por venopunção jugular com tubos de coleta a vácuo sem anticoagulante. O soro obtido foi armazenado em tubos de polietileno com capacidade de 2ml, em temperatura de -20°C, até o momento da execução da análise sorológica de soroaglutinação microscópica (SAM), no Laboratório de Zoonoses Bacterianas (LZB) do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Saúde Animal (VPS) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da Universidade de São Paulo (USP), no período de Janeiro do ano de 2008.

Método

Para a realização da prova de SAM, foram utilizadas como antígenos as culturas de cepas-padrão de 24 sorovares de Leptospira sp (Australis, Bratislava, Autumnalis, Butembo, Castellonis, Bataviae, Canicola, Whitcombi, Cynopteri, Grippotyphosa, Hebdomadis, Copenhageni, Icterohaemorrhagiae, Javanica, Panama, Pomona, Pyrogenes, Hardjo genotype hardjoprajitno, Wolffi, Hardjo (hardjobovis), Shermani, Tarassovi, Patoc, Sentot).

A prova de SAM é constituída por duas fases, antes das quais todos os antígenos foram isoladamente examinados ao microscópio de campo escuro, contudo convém informar que precedendo o teste, com o intuito de se observar presença de auto-aglutinação, mobilidade ou mesmo de contaminantes nestas culturas. Durante a fase de triagem o soro de cada animal foi diluído na proporção 1:50 em solução salina de Sorense estéril e distribuído, com auxílio de pipeta automática, em microplacas de polietileno com fundo em “U”, onde cada amostra foi testado frente a um sorovar de Leptospira sp. Após a homogeneização do antígeno com o soro, as placas permaneceram em temperatura ambiente por aproximadamente 2 horas e, ao final deste período foi realizada a leitura de cada “Wells” (compartimento) em microscopia de campo escuro com objetiva de 10x e ocular de 10x a 15x. a interpretação dos resultados foi baseada na ausência ou intensidade de aglutinação das leptospiras, de modo que os soros que apresentaram valor ³ 50% de leptospiras aglutinadas foram encaminhados à titulação.

Durante a fase de titulação, as amostras reagentes na triagem eram diluídas em escala geométrica de razão dois a partir da diluição 1:100, sendo o título final análogo a maior diluição onde foi observada aglutinação leptospírica ³ 50%. Os resultados foram submetidos a tratamento estatístico pelo teste de comparação de proporções baseado na estatística Qui-quadrado (c2) no nível de 5% de significância (ZAR, 1996).

 

RESULTADO E DISCUSSÃO

Das 127 amostras de soros búfalos analisadas, 67,72% (86/127) apresentaram-se reagentes para um ou mais sorovares de Leptospira interrogans pela prova de soroaglutinação microscópica (SAM), com títulos variáveis entre 100 a 3.200. O maior percentual de positivos foi observado para o sorovar Hardjo (hardjioprajitno) com 15,75% (20/127), seguido pelos sorovares Grippotyphosa e Pomona os quais reagiram igualmente em 11,81% (15/127) dos animais pesquisados. O sorovar Wolffi foi reagente em 7,09% (9/127) das amostras testadas, enquanto que as cepas de Autumnalis e Icterohaemorrhagiae foram igualmente reagentes em 4,72% (6/127) dos soros estudados. Os sorovares Shermani e Butembo foram observados na proporção de 3,94% (5/127) e 3,15% (4/127), respectivamente, enquanto que 1,57% (2/127) dos animais testados reagiram de modo equivalente aos sorovares Patoc e Pyrogenes. Novamente em igual proporção os sorovares Australis e Copenhageni reagiram para 0,79% (1/127) das amostras testadas. Por outro lado, os sorovares Australis, Bratislava, Castellonis, Bataviae, Canicola, Whitcombi, Cynopteri, Hebdomadis, Copenhageni, Javanica, Panama, Hardjo (hardjobovis), Tarassovi, Sentot não foram reagentes em nenhuma das amostras analisadas.

Ao analisar independentemente do sorovar, a positividade para anticorpos contra Leptospira interrogans os resultados desta pesquisa foram superiores aos encontrados por Langoni et al.,(1999) que ao testarem 403 soros de búfalos encontraram 37,7% de reações positivas em animais do Vale do Ribeira/SP; as respectivas amostras foram reagentes para os sorovares Wolffi (n=68, 44,8%), Icterohaemorrhagiae (n=51, 33,6%), Hardjo (n=51, 33,6%), Castellonis (n=25, 16,5%), Djasiman (n=12, 7,9%), Grippotyphosa (n=10, 6,6%), Pomona (n=8, 5,2%), Bratislava (n=6, 4,0%), Copenhageni (n=5, 3,3%) e Tarassovi (n=4, 2,7%). Como os sorovares Wolffi, Hardjo e Icterohaemorrhagiae foram os mais prevalentes, estes achados concordam parcialmente com o presente estudo em virtude do comportamento expressivo do sorovar Icterohaemorrhagiae.

O presente estudo também apresentou valores de positividade, independente de sorovar, superiores aos relatados por FAVERO, et al. (2002) que ao avaliarem 879 soros de búfalos observaram 43,7% de sororeagentes, no entanto, proporcionalmente o valor percentual de reagentes para os sorovares Hardjo (43,3%) e Wolffi (32,5%) demonstrou discordância com o presente trabalho que referiu valores percentuais de 15,75% e 7,09% para os mesmo sorovares, respectivamente.

Ao investigarem a prevalência de anticorpos contra Leptospira spp em 2.109 vacas bubalinas do município de Monte Negro/RO AGUIAR et al. (2006), encontraram 52,8% de reagentes sendo os sorovares mais prevalentes representados por Hardjo (14,5%), Wolffi (12,3%), Shermani (10,8%), Patoc (7,9%) e Hebdomadis (6.1%), apesar dos valores próximos aos resultados aqui apresentados, se pode notar discordâncias entre os valores proporcionais na análise individual destes sorovares.

Como se acredita que o comportamento fisiológico dos bubalinos possua grande identidade com o dos bovinos, este estudo discute um paralelo com a investigação soroepidemiológica realizada por CASTRO et al. (2008) que analisaram 8.216 amostras soro de fêmeas bovinas em idade reprodutiva e referiram uma soroprevalência de 49,4% na qual foram encontrados identificados os sorovares Hardjo (46%), Wolffi (21%), Shermani (8,9%), Autumnalis (4,4%) e Grippotyphosa (3,9%).

A avaliação individual da ocorrência do sorovar Pomona figurando entre um dos mais prevalentes neste estudo 11,81% (15/127), demonstra discrepância em comparação proporcional com os estudos divulgados por LANGONI et al. (1999), AGUIAR et al. (2006) e de CASTRO et al. (2008). Por outro lado, os resultados obtidos nesta pesquisa corroboram com estes mesmo autores quando relata que os sorovares Hardjo, Pomona e Wolffi foram os de maior ocorrência nos soros testados.

 

REFERÊNCIAS

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