FREQUÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS À INFECÇÃO PELO VÍRUS DA DIARRÉIA VIRAL BOVINA (BVDV) EM BOVINOS LEITEIROS NÃO VACINADOS NAS REGIONAIS DE BACABAL E PEDREIRAS, ESTADO DO MARANHÃO

 

Nancyleni Pinto Chaves1, Danilo Cutrim Bezerra2, Francisco Borges Costa2, Vanessa Evangelista de Sousa3, Hamilton Pereira Santos4 e Hélder de Moraes Pereira5

 

1. Médica Veterinária, MSc, Universidade Estadual do Maranhão

2. Pós-graduando, Mestrado em  Ciências Veterinárias (MCV), Universidade Estadual do Maranhão

3. Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Maranhão

4. Médico Veterinário, MSc, Professor de disciplina de doenças bacterianas, Universidade Estadual do Maranhão

5. Médico Veterinário, Doutor, Professor da disciplina clínica médica e terapêutica de Ruminantes, Departamento das Clínicas, Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), CEP 65055-970 – São Luís-MA. E-mail: helderpereirap@yahoo.com.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Anticorpos, doenças infecciosas, ELISA indireto.

 

ABSTRACT

 

FREQUENCY AND FACTORS ASSOCIATED WITH BOVINE VIRAL DIARRHEA VIRUS (BVDV) INFECTION IN DAIRY CATTLE RAISED IN THE MUNICIPALITIES OF BACABAL AND PEDREIRAS, MARANHÃO

This study assesses the frequency and factors associated with antibodies against bovine viral diarrhea virus (BVDV) in the municipalities of Bacabal and Pedreiras, Maranhão. Blood samples from 360 cows that were not vaccinated against BVDV were analysed by indirect ELISA. The research was carried out in 36 dairy farms located in 9 municipalities. An epidemiological questionnaire was used during sample collection period to find out which factors could be associated with infection. Results revealed that 69,44% (n=250) of animals were positive for BVDV. As regards regional samples, there was a frequency of 59,20% (n=148) in Bacabal and 40,80% (n=102) in Pedreiras. Seropositivity was evidenced in all 9 municipalities and in 91,66% (n=33) of farms. The variables considered as risk factors for BVDV infection were not significantly associated with BVDV seropositivity. This is the first report of high incidence of BVDV infection in Bacabal and Pedreiras.

 

KEYWORDS: Antibodies, indirect Elisa, infectious diseases

INTRODUÇÃO

O vírus da diarréia viral bovina (BVDV) é o agente etiológico da diarréia viral bovina (BVD), enfermidade altamente contagiosa que, na fase aguda da doença, apresenta potencial imunodepressor. A importância econômica dessa virose está diretamente relacionada aos aspectos produtivos e reprodutivos, que podem incluir queda na produção de leite, decréscimo na taxa de concepção, abortamento, mumificação fetal, nascimento de bezerros fracos e aumento da taxa de mortalidade neonatal (HOUE, 1999).

Tanto em rebanhos bovinos de corte quanto de leite o BVDV está associado a várias manifestações clínicas como problemas reprodutivos e entéricos e/ ou respiratórios. A infecção fetal com amostras não citopatogênicas (NCP) entre os dias 90 a 120 de gestação frequentemente resulta na produção de bezerros PI, que constituem o principal fator de disseminação natural do vírus no rebanho e por isso constituem-se no alvo principal de medidas de combate do agente (BROWNLIE, 1990).

Na maioria dos países a BVD é endêmica, com soroprevalência de 50% a 90%, (HOUE, 1999). A infecção pelo BVDV está amplamente difundida no rebanho bovino brasileiro. Isolamentos do vírus foram realizados nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul e nos estados de São Paulo (78%), Rio de Janeiro (71%), Minas Gerais (61%), Goiás (54%), Mato Grosso do Sul (43%), Rio Grande do Sul (73%), Paraná (67%), Bahia (56%), Pernambuco (70%) e Sergipe (64%), os resultados sorológicos comprovam que o vírus está disseminado na população bovina destes estados (FLORES et al., 2005).

Deste modo, considerando-se a importância que a BVD possui nos rebanhos bovinos, principalmente aqueles voltados à exploração leiteira, o trabalho foi realizado com o objetivo de conhecer a situação epidemiológica da infecção pelo BVDV nos rebanhos bovinos de aptidão leiteira das regionais de Bacabal e Pedreiras, por meio da determinação da frequência e de possíveis fatores de risco associados a essa enfermidade.

 

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo foi realizado nas regionais de Bacabal (municípios de Bacabal, Bom Lugar, Lago Verde, Olho d’Água das Cunhas e São Luís Gonzaga) e Pedreiras (municípios de Bernardo do Mearim, Igarapé Grande, Pedreiras e Trizidela do Vale), integrantes da bacia leiteira do estado do Maranhão. Inicialmente foram realizados sorteios para determinar quais propriedades deveriam ser amostradas. O tamanho amostral determinado foi de 360 animais, utilizando uma expectativa de prevalência de 70%, margem de erro de 3% e um nível de confiança de 95% (STEVENSON, 1981).

Alguns critérios foram considerados por ocasião da escolha das propriedades, entre eles sistema de criação semi-intensivo, condições de manejo e nutrição semelhantes e sem histórico de vacinação anterior para BVD. Com essas características, foi possível selecionar 36 propriedades, sendo, 20 da regional de Bacabal e 16 da regional de Pedreiras.

Em cada propriedade foi aplicado questionário epidemiológico para obter informações referentes às propriedades, animais estudados e fatores eventualmente associados à infecção pelo BVDV, como idade, tipo de ordenha, produção de leite/dia, assistência veterinária reprodução e alterações reprodutivas. Para o estudo da associação entre a soropositividade e as variáveis analisadas, foi utilizado o teste exato de Fisher, com 95% de confiança, para verificar diferença significativa entre as observações.

O sangue foi coletado de fêmeas bovinas pela punção da veia jugular, com agulhas descartáveis e sistema de vácuo, em tubos esterilizados. O soro foi separado do sangue total por centrifugação a 250 x g, durante 15 min. Em seguida, as amostras foram acondicionadas em microtubos e estocados à temperatura de -20°C até o momento do uso. A detecção qualitativa de anticorpos anti-BVDV foi realizada mediante a técnica de ELISA, conforme descrito por HOWARD et al. (1985) utilizando o reagente (CHEKIT BVD – SERO - Dr. BOMMELI AG / Liebefeld – Bern – Swiss) comercial de ELISA indireto (I-ELISA).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O presente estudo sorológico revelou que 69,44% (n=250) das amostras analisadas apresentaram anticorpos anti-BVDV. Valor que está de acordo com as estimativas de prevalência de anticorpos na população bovina adulta, que varia de 50 a 90% (BROWNLIE, 1990; HOUE, 1999). Nas regionais estudadas, Bacabal obteve frequência de 59,20% (n=148) e Pedreiras de 40,80% (n=102) de animais reagentes. As frequências encontradas por regional apresentaram valores próximos aos encontrados por GUIMARÃES et al. (2000), com 47,83% de reagentes no estado de Goiás e QUINCOZES et al. (2007) com 66,32%, no estado do Rio Grande do Sul.

Nos 09 municípios estudados, 100% tiveram animais reagentes. Das 36 propriedades amostradas, 91,66% (n=33) apresentaram pelo menos um animal reagente, esta freqüência corrobora com os achados de DIAS & SAMARA (2003), no estado de Minas Gerais e noroeste do estado de São Paulo. Apenas 8,34% (n=03) propriedades não apresentaram amostras reagentes. A frequência de bovinos reagentes para o BVDV por propriedade variou de 0 a 100%, essa variação ocorreu tanto nas propriedades onde houvera aquisição recente de animais como naquelas que não receberam novos bovinos há pelo menos 01 ano, o que significa que a fonte de infecção deve provavelmente estar dentro das próprias fazendas.

Quanto à faixa etária foi encontrado maior frequência para animais três a sete anos de idade, com 41,94% (n= 151) de reagentes. Situação semelhante foi observada por CASTRO et al. (1993), no estado de Pernambuco. Isto pode ser atribuído ao fato destes animais estarem no pico das atividades produtiva e reprodutiva, tornando-os susceptíveis a enfermidades de etiologias diversas.

Entre as variáveis abordadas no questionário epidemiológico, algumas propriedades apresentaram dados sugestivos da presença da infecção pelo BVDV, bem como prováveis fatores de risco para a infecção no rebanho.

Em relação ao tipo de ordenha verificou-se que 100% (n=36) das propriedades realizavam ordenha manual, já a variável produção de leite/vaca mostrou maior frequência de reagentes nas propriedades com produção de 1 a 5 litros de leite (58,61%), entretanto, não houve associação significativa destas duas variáveis (P>0,05) com a ocorrência da infecção. SAMARA et al. (2004), concluem que as maiores ocorrências de animais reagentes ao BVDV são encontradas nos rebanhos menos tecnificados corroborando com os resultados do estudo.

Em relação à assistência médica veterinária, verificou-se que nenhuma das propriedades utilizava assistência técnica. No presente estudo, a ausência de “assistência veterinária” não foi considerada fator de risco para BVDV, entretanto, a falta de assistência pode ter refletido especialmente no diagnóstico e na ausência de implantação de programas de controle para BVD.

Todas as propriedades utilizavam somente monta natural como forma de reprodução. FRAY et al. (2000) observaram que o sêmen de reprodutores cursando a forma aguda da doença pode se tornar fonte transitória de infecção. Acerca do histórico de sinais reprodutivos e abortamento nas propriedades estudadas, verificou-se que 100% das propriedades apresentavam alterações reprodutivas.

Os resultados do estudo são preocupantes, já que se trata de uma região onde as propriedades não adotam vacinação contra BVD em seu manejo sanitário; os anticorpos, portanto, não são de origem vacinal. De modo geral, os dados obtidos no estudo reforçam que a BVD é mais um problema sanitário com o qual os pecuaristas têm de conviver. Adotar medidas de controle, como a identificação de animais PI seria uma alternativa viável para alguns rebanhos. A vacinação pode ser o meio mais vantajoso para controlar essa situação, porém é importante ressaltar que as vacinas nem sempre são eficazes. Isso porque existe o agravante de algumas estirpes isoladas no Brasil serem pouco neutralizadas pelos anticorpos contra estirpes de referência internacional usadas nas vacinas comerciais (VAN OIRSCHOT et al., 1999).

O pouco conhecimento que muitos profissionais têm sobre a importância da doença, associado à alta prevalência de animais reagentes, pode aumentar a probabilidade da disseminação da infecção entre os rebanhos, o que reforça a necessidade da implantação de programas de controle.

 

CONCLUSÕES

Com este trabalho registra-se a primeira ocorrência de anticorpos anti-BVDV nas regionais de Bacabal e Pedreiras, e pode-se concluir que, a frequência de anticorpos anti-BVDV nesta região foi alta e os fatores de risco analisados não apresentaram associação estatística significativa para a infecção.

 

REFERÊNCIAS

BROWNLIE, J. The pathogenesis of bovine viral diarrhea virus infections. Revue Scientifique et Tecnique, Office International des Epizooties, v. 9, p. 43-59, 1990.

CASTRO, R. S.; MELO, L. E. H.; ABREU, S. R. O.; MUNIZ. A. M. M.; ALBUQUERQUE. A. P. S. Anticorpos neutralizantes contra pestivirus em soros bovinos do estado do Pernambuco. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 28, n. 11, p. 1327-1331, 1993.

DIAS, F.C.; SAMARA, S.I. Detecção de anticorpos contra o vírus da diarréia viral bovina no soro sangüíneo, no leite individual e no leite de conjunto em tanque de expansão de rebanhos não vacinados. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, São Paulo, v. 40, p. 161-168, 2003.

FLORES, E. F.; WEIBLEN, R.; VOGEL, F. S. F.; ROEHE, P. M.; ALFIERI, A. A.; PITUCO, E. M. A infecção pelo vírus da diarréia viral bovina (BVDV) no Brasil - Histórico, situação atual e perspectivas. Pesquisa Veterinária Brasileira, Rio de Janeiro, v. 25, n. 3 p. 125-134, 2005.

FRAY, M. D.; PATON, D. J.; ALENIUS, S. The effects of bovine viral diarrhoea virus on cattle reproduction in relation to disease control. Animal Reproduction Science, Amsterdam, v. 60-61, p. 615-627, 2000.

GUIMARÃES, P. L. S. N.; CHAVES, N. S. T.; SILVA, L. A. F.; ACYPRESTE, C. S. Freqüência de anticorpos contra o vírus da diarréia viral bovina em bovinos do entorno de Goiânia, em regime de criação semi-extensivo. Ciência Animal Brasileira, Goiânia, v. 1, n. 2, p. 137-142, 2000.

HOUE, H. Epidemiological features and economical importance of bovine viral diarrhea virus (BVDV) infections. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v. 64, p. 89 – 107, 1999.

HOWARD, C.J.; CLARKE, M.C.; BROWNLIE, J. An enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA) for the detection of antibodies to bovine viral diarrhea virus (BVDV) in cattle sera. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v.10, p.359-369, 1985.

QUINCOZES, C. G.; FISCHER, G.; HUBNER, S. O.; VARGAS, G. D’AVILA.; VIDOR, T.; BROD, C. S. Prevalência e fatores associados à infecção pelo vírus da diarréia viral bovina na região Sul do Rio Grande do Sul. Ciências Agrárias, Teresina, v. 28, n. 2, p. 269-276, 2007.

SAMARA, S. I.; DIAS.; F. C.; MOREIRA.; S. P. G. Ocorrência da diarréia viral bovina nas regiões sul do Estado de Minas Gerais e nordeste do Estado de São Paulo. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, São Paulo, v. 41, p. 396-40, 2004.

STEVENSON, W. J. Estatística aplicada à administração. São Paulo: Harper e Ron do Brasil, 1981. 485p.

VAN OIRSCHOT, J. T.; BRUSCHKE, C. J.; VAN RIJN, P. A. Vaccination of cattle against bovine viral diarrhoea. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v. 64, p. 169-183, 1999.