SINAIS CLÍNICOS DA INFECÇÃO EXPERIMENTAL DE BEZERROS BUBALINOS POR SALMONELLA ENTERICA SUBESPÉCIE ENTERICA SOROTIPO DUBLIN

 

André Marcos Santana1, Daniela Gomes da Silva2, Lucas José Luduverio Pizauro3, Priscila Arrigucci Bernardes3 e José Jurandir Fagliari4

 

1Doutorando em Medicina Veterinária (Clínica Médica Veterinária) da FCAV – UNESP – Campus de Jaboticabal

2Pós-doutoranda do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da FCAV – UNESP – Campus de Jaboticabal

3Graduandos em Medicina Veterinária da FCAV – UNESP – Campus de Jaboticabal

4Docente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP – Campus de Jaboticabal. Via de Acesso Prof. Paulo Donato Castellane, s/n. 14.884-900 – Jaboticabal, SP, Brasil. E-mail: fagliari@fcav.unesp.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Bubalus bubalis, diarréia, febre, salmonelose

 

ABSTRACT

 

CLINICAL SIGNS OF EXPERIMENTAL SALMONELLA ENTERICA SUBSPECIES ENTERICA SOROVAR DUBLIN INFECTION IN BUFFALO CALVES

The clinical signs of healthy buffalo calves infected with experimental 108 CFU of Salmonella Dublin were evaluated and the viability of the experimental model in disease induction was verified. A total of 10 animals aged 10 to 26 days were examined. They were allocated into two groups: control and experimentally infected with 108 CFU of Salmonella Dublin. Animals were submitted to physical examination before inoculation and every 12 hours during 7 days after infection. Samples of rectal swabs were collected for Salmonella Dublin isolation. From 60 to 96 hours after infection, four of the five animals had fever with rectal temperatures ranging from 40,0 to 41,0 ºC. All buffalo calves showed signs of diarrhea containing rectal mucus and/or bleeding 24 to 96 hours after experimental infection with Salmonella Dublin. The isolation of the agent from rectal swabs occurred 24 hours postinfection. Therefore, oral administration of 108 CFU of Salmonella Dublin induced clinical signs of salmonellosis in 10 to 26-day-old buffalo calves.

 

KEYWORDS: Bubalus bubalis, diarrhea, fever, salmonellosis.

INTRODUÇÃO

As maiores taxas de mortalidade em búfalos são registradas em animais com até seis meses de idade, sendo a diarréia neonatal dos bezerros uma das principais causas dessas perdas (SUNIL CHANDRA & MAHALINGAM, 1994; BENESI, 2004).

            Dentre as causas de diarréia, a salmonelose é uma das mais importantes (HOUSE et al., 2001) e o sorotipo S. Dublin é o mais frequentemente isolado em búfalos (LÁU, 1999). Em bezerros bubalinos, as salmoneloses podem ser responsáveis por 13% a 14% do total de casos de diarréia, com taxa de mortalidade variando de 40% a 72% (FAGIOLO et al., 2005).

            A principal porta de entrada para a infecção é a cavidade oral, através da ingestão de água e alimentos contaminados. De maneira geral, em bovinos sob condições experimentais, a infecção com 104 a 107 UFC da bactéria causa diarréia transitória que persiste por 48 a 192 horas, enquanto doses entre 108 a 1011 UFC causam sepse de evolução aguda, com morte em curto espaço de tempo (SANTOS et al., 2002). Estudo realizado por SILVA et al. (2008) permitiu concluir que doses de 108 UFC de Salmonella Dublin são suficientes para induzir salmonelose em bezerros com 10 a 15 dias de idade .

            Em búfalos, os principais sinais clínicos da salmonelose são diarréia, febre e desidratação. A diarréia é profusa, aquosa e fétida, com presença de muco e sangue. Nos casos em que as endotoxinas bacterianas são absorvidas, a diarréia é acompanhada de febre, dor abdominal, apatia, anorexia, fraqueza e taquipnéia; o animal pode morrer dentro de quatro a sete dias (FAGIOLO et al., 2005).

            O objetivo do estudo foi avaliar o quadro clínico de bezerros bubalinos submetidos à infecção experimental com 108 UFC de Salmonella Dublin e, adicionalmente, verificar a viabilidade do modelo experimental na indução da doença nesta espécie.

 

MATERIAL E MÉTODOS

            Foram examinados 10 bezerros bubalinos da raça Murrah sadios, com 10 a 26 dias de idade e peso médio de 51,2 kg, obtidos de rebanhos comerciais dos municípios de Ibitinga e Marília, Estado de São Paulo. Os bezerros foram alojados em abrigos individuais cobertos, para evitar estresse térmico, e receberam, duas vezes ao dia, um total de quatro litros de leite de vaca in natura pasteurizado, além de ração, feno e água à vontade. O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética e Bem Estar Animal da FCAV-UNESP-Campus de Jaboticabal (Protocolos nº 010885-08).

            Os animais foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos experimentais, com cinco bezerros cada. Os animais do grupo 1 foram infectados experimentalmente, por via oral, com 108 UFC de Salmonella Dublin suspensas em 10 mL de caldo Brain Heart Infusion (BHI) (CM0225, Oxoid), antes da primeira mamada do dia. Os bezerros do grupo 2 receberam apenas 10 mL de caldo BHI (grupo controle).

            A cepa de Salmonella Dublin (registro IOC 3101/03) foi isolada de bezerro infectado naturalmente e cedida pela Fundação Oswaldo Cruz (Manguinhos–RJ). A bactéria foi cultivada de acordo com as recomendações de WRAY & SOJKA (1981) e quantificada pela técnica de MILES & MISRA (1938).

Os bezerros foram submetidos ao exame físico antes da inoculação e a cada 12 horas, ao longo de sete dias após a infecção experimental, como propôs DIRKSEN et al. (1993). A colheita de suabes retais dos bezerros, para avaliar a presença da Salmonella Dublin, foi realizada logo antes da inoculação e, a partir daí, diariamente até a constatação de dois resultados negativos consecutivos, em intervalo de 15 dias, conforme sugerido por ANDREWS et al. (2008). Os suabes retais foram posteriormente enriquecidos em caldo selenito-cistina (CM0699, Oxoid), caldo tetrationato Muller-Kauffmann (CM0343, Oxoid) e caldo Rappaport-Vassiliadis (CM0866, Oxoid) e plaqueados em ágar verde brilhante modificado (CM0329, Oxoid), contendo 50 µg/mL de ácido nalidíxico, como preconizado por SANTOS et al. (2002). Colônias com morfologia característica do gênero Salmonella foram submetidas a testes bioquímicos, utilizando-se ágar tríplice açúcar ferro (TSI) (CM0277, Oxoid) e ágar lisina ferro (LIA) (CM0381, Oxoid). Após a comprovação bioquímica foi realizada soroaglutinação em lâmina, utilizando-se soro polivalente anti-antígenos somáticos (anti-O) de Salmonella (Probac do Brasil) e soro anti-antígenos somáticos do sorogrupo D (Probac do Brasil), no qual se inclui S. Dublin.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

            Não se constatou sinal clínico algum de infecção por salmonela nos bezerros bubalinos do grupo controle. As frequências cardíaca e respiratória dos animais deste grupo variaram de 48 a 96 bpm e de 14 a 42 mpm, respectivamente. A temperatura retal oscilou entre 36,9 a 39,7ºC, semelhantes àquela relatada por TITTO et al. (1997), em búfalos mantidos em câmara bioclimática, em condições típicas de clima tropical.

            No grupo de bezerros infectados, as frequências cardíaca e respiratória variaram de 44 a 106 bpm e de 15 a 53 mpm, respectivamente. Os primeiros sinais de febre surgiram 60 horas após a inoculação e 96 horas após a infecção quatro animais (80%) já apresentavam febre, com temperatura retal entre 40,0 e 41,0 ºC; apenas um bezerro não apresentou febre durante o período experimental. Seis dias após a inoculação, os sinais clínicos dos bezerros regrediram espontaneamente, com temperatura retal dentro da normalidade em todos os animais. SILVA et al. (2008), estudando bezerros bovinos com 10 a 15 dias de idade infectados experimentalmente com 108 UFC de Salmonella Dublin, observaram os primeiros sinais de febre mais precocemente, 24 horas após a inoculação, sendo que 84 horas após a infecção experimental os animais apresentavam temperatura média de 40,1ºC.

            Entre 24 e 96 horas após a inoculação, todos os bezerros bubalinos do grupo infectado manifestaram diarréia discreta a grave, com presença de muco e/ou estrias de sangue; sete a dez dias após a infecção experimental notou-se recuperação espontânea da diarréia, nestes animais. SILVA et al. (2008) verificaram diarréia grave em todos os bezerros de vacas 12 a 36 horas após a infecção experimental por S. Dublin.

            Dois bezerros infectados (40%) apresentaram desidratação discreta 72 e 96 horas após a inoculação, respectivamente; por outro lado, SILVA et al. (2008) relataram a ocorrência de desidratação 36 horas após a inoculação. Também, não se constatou sintoma respiratório, como tosse, secreção nasal e taquipnéia, relatados por SILVA et al. (2008) em bezerros bovinos. Quanto ao apetite, apenas um animal apresentou inapetência e apatia entre 120 e 136 horas após a inoculação.

            Não foi isolada Salmonella Dublin nas amostras de suabes retais dos animais do grupo controle. No grupo de bezerros infectados, o isolamento ocorreu 24 horas após a inoculação, sendo verificada excreção contínua em dois animais e intermitente em três búfalos durante os sete dias após a infecção. SILVA et al. (2008) isolaram a bactéria a partir de 12 horas após a infecção experimental de bezerros bovinos, sendo que dois dos seis animais infectados apresentaram excreção contínua, também durante os sete dias após a infecção.

            Apesar de os bezerros infectados já não apresentarem sinais clínicos de salmonelose entre sete e dez dias após a infecção experimental, constatou-se eliminação de Salmonella Dublin por até 16 dias após a inoculação, achado este de relevância epidemiológica. De modo semelhante, ÁVILA (2008), estudando bezerros bovinos com 10 a 15 dias de idade infectados experimentalmente com 109 UFC de Salmonella Typhimurium, verificou excreção da bactéria por até 31 dias após a inoculação e que a partir de sete dias após a infecção experimental os animais já não apresentavam sintomas de salmonelose.

            Não se verificou óbito de bezerros bubalinos infectados com Salmonella Dublin, ao contrário do relatado por SILVA et al. (2008), que constataram dois óbitos (33,3%) no grupo de bezerros infectados durante o período experimental de sete dias.

 

 

CONCLUSÃO

            Os resultados permitem concluir que a administração oral de 108 UFC de Salmonella Dublin é suficiente para induzir quadro clínico de salmonelose em bezerros bubalinos com 10 a 26 dias de idade, cujos principais sinais clínicos são diarréia, febre e desidratação.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPESP pela concessão de bolsa e à Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ pelo fornecimento da cepa de Salmonella Dublin.

 

REFERÊNCIAS

ANDREWS, A. H.; BLOWEY, R. W.; BOYD, H.; EDDY, R. G. Medicina bovina: doenças e criação de bovinos. 2.ed. São Paulo: Roca, 2008. 1080 p.

ÁVILA, L. G.; SATO, R. A.; JORGE, R. L. N.; NOGUEIRA, C. A. S.; FAGLIARI, J. J. Avaliação clínica e do modelo experimental da infecção de bezerros com Salmonella Typhimurium. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE MEDICINA VETERINÁRIA, 35., 2008, Gramado. Título... Gramado: 2008. Disponível em: <http://www.sovergs.com.br/conbravet2008/anais/cd/resumos>. Acesso em: 23 jul. 2009.

BENESI, F. J. Principais enfermidades de bezerros neonatos. Como diagnosticá-las e tratá-las? 2004. Disponivel em: <http://www.spmv.org.br/conpavet2004/palestras%20-%20resumos/Neonatologia%20-%20Fernando%20Jose%20Benesi.doc>. Acesso em 23 jul. 2009.

DIRKSEN, G.; GRÜNDER, H. D.; STÖBER, M. Rosenberger: Exame clínico dos bovinos. 3.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1993. 419p.

FAGIOLO, A.; RONCORONI, C.; LAI, O.; BORGHESE, A. Buffalo Pathologies. In: BORGHESE, A. Buffalo Production and Research. Roma: FAO, 2005. cap. 13, p. 249-296.

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