BIOVARIEDADES DE Brucella abortus ISOLADAS DE BOVINOS NO BRASIL

 

Sílvia Minharro1,2, Juliana Pinto da Silva Mol3, Rebeca Barbosa Pauletti4, Elaine Seles Dorneles4, Fernando Padilla Poester1, Maurício Gautério Dasso5, Eliana Scarcelli6, Paulo Martins Soares Filho7, Marcos Bryan Heinemman8, Renato de Lima Santos8, Andrey Pereira Lage9

 

1 – Médico Veterinário, MSc, Doutor, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG;

2 – Professora, Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade Federal de Tocantins – UFT;

3 – Bióloga, MSc, Doutoranda, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG;

4 – Médica Veterinária, Mestranda, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG;

5 – Médico Veterinário, MSc, Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária,

Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor

6 – Biomédica, MSc, Doutora, Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal, Laboratório de Doenças Bacterianas da Reprodução

7 – Médico Veterinário, MSc, Laboratório Nacional Agropecuário – LANAGRO/MG,

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

8 – Médico Veterinário, MSc, Dr., Prof., Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG;

9 – Médico Veterinário, MSc, DSc, Professor,  Laboratório de Bacteriologia Aplicada, Departamento de Medicina Veterinária Preventiva, Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais. Av. Antônio Carlos, 6627, Caixa Postal 567, 30123-970 – Belo Horizonte – MG. Fax: (31) 3409 2080.

E-mail: alage@vet.ufmg.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: biotipificação, epidemiologia

 

ABSTRACT

 

BIOTYPES OF BRUCELLA ABORTUS ISOLATED FROM CATTLE IN BRAZIL

Brucellosis is a worldwide zoonotic disease that causes significant economic losses due to abortions and culling of infected animals. In Brazil, only a few studies discuss identification of Brucella spp. species and biotypes, which is necessary for the development of brucellosis control and eradication programs. Therefore, this study assesses B. abortus strains isolated from 137 animals in Minas Gerais, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, and Tocantins from 1977 to 2008. B. abortus biovars 1, 2 and 3 were observed and biovars 4 and 6 were identified. All B. abortus biovar 3 strains were classified as sub-group 3b by AMOS-ERY PCR. A further enhanced procedure revealed three biovar 3 positive samples in Pará, which may be considered an epidemiological marker for isolates from that region.

 

KEYWORDS: biotyping, epidemiology.

 

INTRODUÇÃO

No Brasil existem poucos estudos realizados com relação à identificação das biovariedades de Brucella spp., porém já foram identificadas B. abortus biovariedade 1, 2 e 3 (GARCIA-CARRILO, 1972). O objetivo deste trabalho foi biotipar as amostras de B. abortus isoladas de bovinos de vários estados do Brasil e observar possíveis padrões de agrupamentos e distribuição das biovariedades de B. abortus no país visando apoiar o Programa Nacional de Controle e Erradicação de Brucelose e Tuberculose (PNCEBT).

 

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizadas 137 amostras de B. abortus, isoladas de bovinos entre 1977 a 2008 no Brasil. Dessas amostras, 38 amostras foram isoladas de bovinos oriundos do Estado de Minas Gerais, 31 de animais do Pará, 31 isolados de animais do Rio Grande do Sul, 15 de animais de São Paulo, 8 de animais de Santa Catarina e 14 de animais do Tocantins.

As amostras foram submetidas aos testes bioquímicos de catalase, oxidase, urease, citrato e redução de nitrato (ALTON et al., 1988). A confirmação das espécies e das biovariedades de Brucella spp. foram determinadas pelas provas de crescimento em atmosfera de CO2 e O2, teste de aglutinação com acriflavina, produção de H2S, crescimento na presença de tionina (20 mg/mL e 40 mg/mL) e fucsina básica (20mg/mL) e aglutinação frente a soros anti-A, anti-M e anti-R (Cepanzo - Argentina) (ALTON et al., 1988). Além das provas bioquímicas, os DNA de todas as amostras foram testados por PCR para a amplificação do gene bcsp31 (BAILY et al., 1992) e pela PCR AMOS enhanced (BRICKER, 2002). Em decorrência das amostras identificadas como B. abortus biovariedade 3 serem negativas na PCR AMOS enhanced, estas foram analisadas também pela PCR AMOS ERY (OCAMPO-SOSA et al., 2005) para a classificação nos subgrupos 3a e 3b. A B. abortus biovariedade 4 foi confrimada por PCR-RFLP para o gene omp 2b com restrição por TaqI (CLOECKAERT, et al., 1995).

RESULTADOS

Todas as 137 amostras isoladas foram confirmadas como Brucella spp. pelo PCR para o gene bcsp31, e aos testes bioquímicos e pelas PCR AMOS enhanced e AMOS ERY foram identificadas como B. abortus.

As biovariedades de B. abortus encontradas neste estudo pelas provas bioquímicas foram 1, 2, 3, 4 e 6. A biovariedade de B. abortus mais frequente foi a biovariedade 1 (52,5%) seguida pela biovariedade 3 (20,4%), biovariedade 6 (14,6%), biovariedade 2 (11,7%) e, a menos frequente, a biovariedade 4 (0,7%). Todas as amostras classificadas no teste bioquímico como B. abortus biovariedade 3 foram confirmadas como sendo do subgrupo 3b.

Pela PCR AMOS enhanced noventa e duas (67,1%) das 137 amostras foram identificadas como B. abortus biovariedade 1, B. abortus biovariedade 2 ou B. abortus biovariedade 4. Estas biovariedades foram encontradas em todos os Estados estudados, sendo mais frequentes nos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo totalizando 61,3%. As amostras negativas à PCR AMOS enhanced foram isoladas com maior frequência nos Estados do Pará e Tocantins (22,62%) e só não foram identificadas no Estado de Santa Catarina.

Uma amostra de B. abortus isolada do Rio Grande Sul foi biotipada como biovariedade 4 e apresentou padrão de restrição idêntico ao da amostra de referência B. abortus biovariedade 4 292.

Na comparação entre os resultados dos testes bioquímicos e da PCR AMOS enhanced houve concordância em 97,8% (134/137) das amostras. Três amostras classificadas bioquimicamente como B. abortus biovariedade 3, no entanto, foram positivas à PCR AMOS enhanced.

 

DISCUSSÃO

Das biovariedades de B. abortus encontradas neste trabalho a B. abortus biovariedade 1 foi a mais frequente entre as amostras isoladas de bovinos no país, concordando com os achados anteriores descritos no Brasil (POESTER et al., 2002) e da maioria das regiões no mundo (CORBEL et al., 2006).

Interessantemente, as amostras de B. abortus biovariedade 2 isoladas no presente estudo, não necessitaram da adição de soro ao meio de cultivo para seu isolamento como regularmente descrito (ALTON et al., 1988).

          Das duas biovariedades até então não relatados no Brasil que foram observadas no presente estudo, a B. abortus biovariedade 4 só foi isolada de um bovino oriundo do Rio Grande do Sul, e sua origem provavelmente tenha sido dos países fronteiriços a este Estado, como a Argentina onde esta biovariedade de B. abortus já foi encontrada (LUCERO et al., 2008). B. abortus biovariedade 6, que foi encontrada em todos os estados estudados com exceção de Santa Catarina, teve maior freqência no Estado do Pará, e não havia sido descrita até o presente momento na América do Sul. A origem da infecção por esta biovariedade no Brasil não é muito clara, mas B. abortus biovariedade 6 é uma das biovariedades mais frequentes descritas na Índia, país de origem das raças zebuínas cuja população predomina no Estado do Pará e na maior parte das áreas de produção de bovinos de corte do Brasil.

Todos os isolados de B. abortus biovariedade 3 identificados no presente estudo foram classificados com sendo do subgrupo 3b o que demonstra que estas amostras estão mais relacionadas com as amostras de B. abortus biovariedade 3 de origem européia do que com as amostras de origem africana (OCAMPO-SOSA et al., 2005).

Curiosamente, três amostras de B. abortus biovariedade 3, isoladas do município de Conceição do Araguaia no Estado do Pará em intervalo diferenciados, reagiram positivamente na PCR AMOS enhanced, técnica descrita com possibilidade de somente detectar B. abortus das biovariedades 1, 2 e 4. Estas amostras são atípicas e não se enquadram nas tabelas e chaves de identificação, pois em função do pequeno número de diferenças entre as espécies e as biovariedades de Brucella spp., a menor mutação pode resultar em dados conflitantes, dificultando a interpretação da caracterização dos isolados (BRICKER, 2002), podendo tratar-se essa característica de um marcador de amostras da região.

A biotipificação de amostras de B. abortus realizado neste estudo pode contribuir para a compreensão da epidemiologia e controle da brucelose bovina no país.

 

AGRADECIMENTOS

À Capes, CNPq, FAPEMIG e a FEP-MVZ pelas bolsas e suporte financeiro à realização deste projeto.

 

REFERÊNCIAS

ALTON, G. G., JONES, L. M., ANGUS, R. D., VERGER, J. M. Techniques for the brucellosis laboratory. INRA, Paris. 1988, 189p.

BAILY, G. G., KRAHN, J. B., DRASAR, B. S., STOCKER, N. G. Detection of Brucella melitensis and Brucella abortus by DNA amplification. Journal of Tropical Medicine and Hygiene, Oxford, v. 95, p. 271-275, 1992.

BRICKER, B. Diagnostic strategies used for the identification of Brucella. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v. 90, p. 433-434, 2002.

CLOECKAERT, A., VERGER, J. M., GRAYON, M., GREPINET, O. Restriction site polymorphism of the genes encoding the major 25 kDa and 36 kDa outer-membrane proteins of Brucella. Microbiology, Reading, v. 141, p. 2111-2121, 1995.

CORBEL, M. J., ELBERG, S. S., COSIVI, O. Brucellosis in humans and animals. Geneva: WHO Press, 2006. 89p.

GARCIA-CARILLO, D.; SZYFRES, B.; GONZALES-TOME, J. Tipificação de brucelas isoladas del hombre y los animales en América Latina. Revista Latinoamericana de Microbiologia, Mexico, v. 14, p. 117- 125, 1972.

LUCERO, N. E., AYALA, S. M., ESCOBAR, G. I., JACOB, N. R. Brucella isolated in humans and animals in Latin America from 1968 to 2006. Epidemiology and Infection, v. 136, p. 496-503, 2008.

OCAMPO-SOSA, A. A.; BALBÍN, J.A.; GARCIA-LOBO, J. M. Development of a new PCR assay to identify Brucella abortus biovars 5, 6 and 9 the new subgroup 3b of biovar 3. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v. 110, p. 41-51, 2005.

POESTER, F. P.; GONÇALVES, V. S. P.; LAGE, A. P. Brucellosis in Brazil. Veterinary Microbiology, Amsterdam, v. 90, p.55-62, 2002.