DISPLASIA
FISEAL EM BOVINOS MANEJADOS EM SISTEMA INTENSIVO
Ingrid Rios Lima1;
Ângela Moni Fonseca2; Luiz Henrique da Silva2; Cássia
Maria Molinaro Coelho1; Júlio Carlos Canola3; Naida Cristina Borges4
1. Médica veterinária, mestre em Clínica e Cirurgia de Grandes Animais
2. Acadêmicos (as) do Curso de Medicina Veterinária, Universidade
Federal de Goiás (UFG)
3. Médico veterinário, doutor, professor do Curso de Medicina
Veterinária, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP)
4. Médica veterinária, doutora, professora do Curso de Medicina
Veterinária, Escola de Veterinária, Hospital Veterinário, Universidade Federal
de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil, CEP 74001-970.
E-mail: naida@vet.ufg.br (autor correspondente)
PALAVRAS-CHAVE:
Claudicação, enfermidades digitais, epifisite.
ABSTRACT
PHYSEAL DYSPLASIA IN CATTLE RAISED IN INTENSIVE
SYSTEMS
Little is
known about bovine physeal dysplasia due to lack of research on this subject.
There are no incidence records or information related to how its etiological
characteristics are similar to those of other species. This study investigates
the occurrence of epiphysitis in
confined male cattle from Goiás
as well as the influence of age, digital injuries, lameness, and other
locomotor disorders in the distal extremities of limbs. A total of 50 crossbred
cattle (Zebu x European) of
different ages, weighing 404kg, were evaluated. A significant correlation was
found between age (p=0,048) and physeal displasia, and between lameness
(p=0,885) and digital injuries (p=0,728). Analysis of the other bone
alterations in the digits showed that they were negatively influenced by
physeal displasia. We conclude that confinement
may be a determining factor in the development of physeal injuries in cattle,
and more radiographic studies are needed to be carried out during the growth
phase in order to better understand the etiopathogenicity of the disease.
KEYWORDS: Digital injuries; epiphysitis; lameness.
INTRODUÇÃO
Displasia fiseal (DF),
conhecida como fisite, epifisite e epifisiólise, é definida por HURTIG
&POOL (1996) como a manifestação anormal do crescimento da placa
metafisária caracterizada pelo alargamento da mesma causando dor e claudicação
em animais jovens de crescimento rápido. MCLLWRAITH (2004) considera essa
afecção como uma forma de manifestação da osteocondrose, e HURTIG & POOL
(1996) a descrevem como doença ortopédica do desenvolvimento.
Segundo THRALL (1998),
a osteocondrose (OCD) constitui desordem relativamente comum em animais jovens
e consiste em falha na maturação da cartilagem, ou seja, defeito na ossificação
endocondral. Sua etiologia ainda não está clara, RADOSTITS et al. (2002)
afirmam que na maioria dos casos as lesões são multifatoriais e secundárias a
defeitos de conformação, lesões traumáticas, processo de envelhecimento e
deficiência nutricional. MARQUES et al. (1998) citam que em bovinos a OCD
acomete as articulações atlanto-ocipital, coxofemoral, fêmuro-tíbio-patelar,
tíbio-társica, escapulo - umeral, rádio-carpal e metacarpo-falangeana.
Clinicamente os animais apresentavam claudicação súbita com discreto inchaço ao
redor da articulação metatarso falangeana (MURPHY et al., 1975). De acordo com
BARGAI et al. (1988) as alterações radiográficas observadas são espessamento
irregular da fise na placa de crescimento distal do metacarpo, múltiplas linhas
de calcificação sobrepostas, extensão e separação das bordas das placas de
crescimento da epífise e da metáfise formando projeções denominadas lips ou em forma de lábios.
A displasia fiseal é um
tema pouco abordado em bovinos. Não se sabe ao certo com que freqüência ocorre
nesses animais e se sua etiologia se assemelha à relatada em outras espécies.
Sendo assim, este trabalho teve como objetivo verificar a ocorrência de
epifisite em bovinos machos confinados e relacioná-la a idade, presença de
lesões digitais, claudicação e outras alterações radiográficas localizadas nas
extremidades distais dos membros locomotores.
MATERIAL
E MÉTODOS
Avaliou-se 50 bovinos machos
de diferentes idades, com média de peso corporal de 404 kg, criados em sistema
intensivo de produção. Estes animais permaneceram 112 dias confinados,
alcançando média diária de ganho de peso de 1,5 kg. Ao final do período, o
escore de locomoção dos animais foi avaliado adotando os critérios de FERREIRA
et al. (2005), em seguida, os animais foram encaminhados ao abate em
frigorífico sob Inspeção Federal e procedeu-se a colheita das quatro
extremidades distais, perfazendo assim o total de 200 extremidades para serem
estudadas.
A idade dos bovinos foi
estimada por cronologia dentária, sendo três animais com até 24 meses; 14 entre
24 a 30 meses; 24 entre 30 a 36 meses e nove entre 36 a 48 meses. Durante o
período de confinamento os bovinos foram analisados quanto ao escore de
locomoção; os membros coletados foram examinados quanto à presença e tipo de
lesões podais e radiográficas.
Após devidamente
lavados, os 200 membros foram avaliados quanto à presença ou ausência de lesões
podais, as quais, quando observadas, foram classificadas segundo as
recomendações de SILVA et al. (2001) e NICOLETTI (2004). A ocorrência de mais
uma lesão no mesmo dígito foi classificada como lesão mista.
As radiografias foram
obtidas nas projeções palmaro/plantaro-dorsal e latero-medial, sendo o
colimador centrado na altura da articulação metacarpo/metatarso e das falanges.
Na projeção latero-medial, para evitar a sobreposição das falanges distais,
fez-se uso de separador interdigital de madeira BORGES et al., (2006). As
radiografias foram avaliadas de acordo com as recomendações de BARGAI et al.
(1988).
O
teste de Qui-quadrado para independência foi aplicado na avaliação de
associações entre DF versus lesão radiográfica, DF versus claudicação, DF
versus lesão podal e DF versus localização no dígito. As análises foram
realizadas com auxílio do programa SPSS, versão 15.0®, considerando
a significância de 5% (p < 0,05).
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
A displasia fiseal foi
observada em 18 (52,9%) dos bovinos com faixa etária entre 31 a 36 meses de
idade, 13 (38,2%) com idade entre até 30 meses, e em apenas três (9%) com 37 a
48 meses. Verificou-se a influência da idade sobre a ocorrência de displasia
fiseal em bovinos de diferentes idades (p = 0,048). Quanto às faixas etárias
avaliadas, pôde-se observar que a DF ocorreu em 61,7% dos bovinos com idade
entre 31 a 48 meses. De acordo com WEAVER (1997), as placas de crescimento dos
ossos longos nos bovinos se fecham entre 24 a 30 meses de idade. TURNER (1994)
afirma que a DF cursa com retardo na maturação dos condrócitos e
conseqüentemente no fechamento das fises. Essa afirmação pôde ser comprovada
nesse estudo pelo maior número de casos em animais que já haviam atingido a
maturidade óssea. Como a avaliação radiográfica foi realizada apenas no momento
em que os animais foram encaminhados para o abate, não se pode precisar em que
idade esses animais desenvolveram a doença.
Avaliando-se a
ocorrência de displasia fiseal em relação a sua localização nos membros
verificou-se que as lesões se apresentaram de forma semelhante em membros
torácicos e pélvicos (p = 0,307). Resultado semelhante foi relatado por MURPHY
et al. (1975) onde a displasia fiseal ocorreu tanto nos membros pélvicos quanto
nos membros torácicos de quatro touros em fase de desenvolvimento.
A DF não ocorreu
associada (p = 0,015) a outras lesões radiográficas em 81,6% dos membros
avaliados. Paralelamente, constatou-se que as principais lesões radiográficas
que ocorreram concomitantemente à essa afecção (n=125) foram doença
degenerativa articular (4,8%), osteíte (3,2%), periostite, artrite séptica e
calcificação do tendão flexor profundo (2,4%), artrite anquilosante, fratura em
lasca e calcificação do tendão extensor (1,6%).
A ocorrência de DF não
esteve associada à presença de claudicação (p = 0,855), ou seja, as chances de
um animal claudicante apresentar ou não displasia fiseal são as mesmas. Além
disso, a distribuição de freqüência demonstrou que 80% dos animais portadores
de DF não apresentaram claudicação, o que contraria os relatos de MURPHY et al.
(1975) e BARGAI et al. (1988) onde os autores afirmam que a claudicação é o
principal sinal clínico evidenciado em animais portadores de displasia fiseal.
Displasia fiseal também
não esteve relacionada à ocorrência de lesões podais (p=0,728). A possibilidade
de bovinos portadores de DF apresentarem outras lesões podais nos dígitos é de
apenas 27,2%, ou seja, a DF foi constatada de forma
isolada em 72,8% dos animais avaliados. Resultados semelhantes foram
encontrados por BORGES et al. (2006), onde 65% das extremidades distais de
bovinos manejados extensivamente, sem sinais de enfermidades digitais,
apresentaram displasia fiseal. A partir destas observações, pode-se supor que,
apesar da proximidade das falanges com as fises distais do metacarpo/metatarso,
tais enfermidades não influenciam o desenvolvimento de displasia fiseal,
reforçando as hipóteses citadas por TURNER (1994) de que sua etiologia está
relacionada a fatores nutricionais, genéticos e mecânicos.
Paralelamente,
verificou-se que as lesões podais predominantes nos membros portadores de
displasia fiseal (n=125) foram pododermatite séptica e a lesão mista (9,6%
cada), dermatite interdigital (4,8%), dermatite digital e erosão de talão (1,6%
cada).
Comparando o trabalho
de BORGES et al. (2006) com o presente estudo verificou-se que a ocorrência de
displasia fiseal também ocorreu em animais que não foram manejados
intensivamente, não sendo possível determinar até que ponto o tipo de manejo a
que os animais foram submetidos pode influenciar no desenvolvimento de
displasia fiseal.
CONCLUSÕES
A displasia fiseal
ocorre em bovinos com idade entre 31 a 48 meses. Para que se compreenda melhor
a etiopatogenia dessa enfermidade é necessária a realização de estudos
radiográficos que acompanhem o animal durante seu crescimento, visando
determinar se essa constitui uma enfermidade economicamente relevante para o
processo produtivo.
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