AVALIAÇÃO DE QUATRO PROTOCOLOS TERAPÊUTICOS PARA A SINUSITE

PÓS-DESCORNA PLÁSTICA EM BOVINOS (1998-2008)

 

Luiz Antônio Franco da Silva1, Jalily Bady Helou2, Jordanna de Almeida e Silva2, Leandro Batista Caetano2; Caroline Rocha de Oliveira Lima3; Luiz Augusto de Souza3; Benito Juarez Nunes Alves de Oliveira3; Ângela Moni Fonseca3

 

  1. Professor Associado de Clínica Cirúrgica Animal, EV/UFG, Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil, CEP 74001-970, – E-mail: lafranco@vet.ufg.br (autor correspondente)

2.       Acadêmicos de Medicina Veterinária EV/UFG- Bolsista CNPQ

3.       Alunos do Programa de Pós- Graduação EV/UFG- Bolsista CNPQ

 

PALAVRAS-CHAVE: Cirurgia, ruminante, tratamento

 

ABSTRACT

 

EVALUATION OF FOUR TREATMENT PROTOCOLS FOR SINUSITIS AFTER PLASTIC DEHORNING IN CATTLE (1998-2008)

Plastic dehorning in adult cattle may result in several trans and postoperative complications. Sinusitis is a sequelae that results from an inflammatory process in which the exposed frontal sinus is affected. This study evaluates the efficacy of treatment protocols. These included sodium hypochlorite, policresulen, povidone-iodine, and isotonic sodium chloride solutions. A total of 60 cows were divided into four experimental groups of 15 animals each: GI, GII, GIII, and GIV. During the opening of the frontal sinus to begin local treatment, attempts to identify foreign bodies, bone fragments, grass stems, suture material, and wood splints were made. Drainage of mucous-purulent liquid and removal of excess solutions were facilitated by the animal’s lateral head rotation and placement of the frontal sinus gap as ventrally as possible. The results of a chi-square test revealed significant differences between treatments. Sodium hypochlorite and povidone-iodine were the most effective agents, and therefore are recommended as regards sinusitis therapeutic protocols.

 

KEYWORDS: Ruminant, surgery, treatment.

 

INTRODUÇÃO

A sinusite é um processo inflamatório que acomete os seios paranasais, ocorrendo com maior freqüência nos bovinos, após realização de descorna plástica, mochação com ferro candente, trepanações ou decorrente de fraturas dos cornos, com exposição do seio frontal (JUBB et al., 1990; RADOSTISTS et al., 2002; BLOWEY & WEAVER, 2003). Como os seios paranasais se comunicam com o meato nasal médio e são revestidos por membranas mucosas, permitem que eventuais processos infecciosos resultem em otites, rinites e faringoamigdalites (KONIG, 2004). Fatores relacionados à anti-sepsia, realização de intervenções cirúrgicas por pessoas inabilitadas, presença de corpo estranho e pós-operatório conduzido de forma inadequada também podem participar na etiopatogenia das sinusites em bovinos (FIORAVANTI et al., 1996).

Para a correção desta afecção alguns protocolos terapêuticos têm sido descritos na literatura. Foi relatado que medicamentos a base de policresuleno e iodopovidona apresentam bons resultados no tratamento dessa enfermidade (FIORAVANTI et al., 1999). Embora algumas informações encontradas na literatura considerem a sinusite uma complicação pós-operatória importante da descorna plástica em bovinos (RADOSTITS, et al., 2002), a maioria se limita a discutir o assunto de forma pouco científica. Essa situação suscita dúvidas, especialmente sobre os principais protocolos terapêuticos empregados no tratamento da afecção (ROSEMBERGER, 1988; JUBB et al., 1990;  RADOSTITS, et al., 2002), aumentando as perdas econômicas dos criatórios, devido aos gastos com medicamentos, perda de peso e eventuais óbitos dos animais.

Na tentativa de buscar respaldo científico para o emprego do hipoclorito de sódio, policresuleno e iodopovidona no tratamento da sinusite pós-descorna em bovinos, nesse estudo avaliou-se a eficácia de protocolos terapêuticos específicos com tais princípios ativos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo foi conduzido no Hospital Veterinário da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás e em diferentes propriedades rurais do Estado de Goiás, entre 1998 e 2008. Empregaram-se 60 bovinos, de diferentes categorias com um ou mais sinais clínicos compatíveis com sinusite pós descorna cirúrgica como secreção de aspecto purulento fluindo pelas narinas, fistula na região do corno amputado, febre, postura anormal da cabeça, deformação dos ossos frontais, distúrbios neurológicos e exoftalmia. Os animais foram distribuídos em quatro grupos de 15 animais cada, o GI tratado com hipoclorito de sódio a 0,2%, GII com solução de policresuleno a 2%, GIII com iodopovidona a 5% e O GIV com solução fisiológica, sendo, este ultimo o grupo controle.

Os animais foram sedados com 0,1 a 0,2mg/kg cloridrato de xilazina a 2%5 e imobilizados em decúbito esterno-abdominal, após jejum de 12 horas. Efetuou-se higienização, tricotomia, anti-sepsia e promoveu-se a anestesia infiltrativa circular subcutânea da região com 20 ml de cloridrato de lidocaína 2% (MASSONE, 2008). Após o acesso ao seio frontal seja por incisão da região e/ou fístula ou trepanação sinusal, efetuava-se higienização sistemática do local, adotando os protocolos de tratamento. Não se realizou a dermorrafia havendo cicatrização por segunda intenção. Cada protocolo foi aplicado cinco vezes com intervalo de 48 horas entre as aplicações sendo os animais avaliados a cada 15 dias e por dois meses consecutivos. Considerou-se cura clínica a ausência de sinais clínicos, fístulas e secreções e cicatrização desejável da ferida cirúrgica. As recidivas foram associadas ao recrudescimento de fístulas e/ou a presença de secreção nasal muco purulenta, além de sinais clínicos.

Para avaliação estatística utilizou-se o software SAS e o teste Qui-quadrado, aceitando o nível de significância p<0,01, o qual forneceu resultados para independência ou associações entre as variáveis testadas.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O diagnóstico conclusivo fundamentou-se basicamente na observação de sinais clínicos de sinusite, como secreção de aspecto purulento fluindo pelas narinas, fistula na região do corno amputado, febre, postura anormal da cabeça, deformação dos ossos frontais, distúrbios neurológicos e exoftalmia. De acordo com JUBB et. al.(1990) na ausência desses sinais clínicos, tal enfermidade pode passar despercebida. Embora tenha sido relatado que sinais clínicos como febre, letargia e exoftalmia sejam freqüentemente observadas em animais portadores de sinusite WILKINS et al. (2006), estes não foram verificados em nenhum dos animais do presente estudo.A sedação dos bovinos com 0,1 a 0,2mg/kg cloridrato de xilazina a 2% possibilitaram a imobilização dos animais em decúbito esterno-abdominal e a implementação das manobras necessárias à drenagem do seio frontal comprometido. Em seis bovinos (10%) a anestesia infiltrativa circular subcutânea com cloridrato de lidocaína 2%, não resultou em dessensibilização completa da região a ser manipulada, provavelmente pelo pH ácido no local conferido pela reação inflamatória. Em um animal (0,6%) foi necessário realizar trepanação sinusal, visando facilitar o acesso ao seio frontal e drenagem do seio.

A higienização sistemática do local, após a remoção de corpos estranhos alojados nas fistulas ou no seio frontal, foi considerada medida fundamental para o sucesso do tratamento. Sobre esse aspecto, dentre os 60 animais examinados constatou-se que cinco (8,33%) apresentavam anorexia e postura anormal da cabeça, dois (3,33%) deformações dos ossos frontais e em 19 (31,66%), presença de resquícios de esquírolas ósseas na região do corno amputado. Em sete animais (11,66%) constataram-se resquícios de fios de algodão ou de náilon provavelmente empregados na dermorrafia e em quatro (6,66%) foram encontradas farpas de vegetais ou hastes de capim na região da fistula ou no próprio seio frontal. Nos 23 restantes (38,33%), observou-se apenas presença de fístulas na região do seio frontal.  Assim, ao associar a presença desses corpos estranhos em 37 casos (61,66%), dos 60 animais atendidos, fica evidente que tais objetos podem não somente veicular agente infeccioso, mas criar condições favoráveis ao acesso desses agentes aos seios paranasais. Nesse caso, apontam-se também, as esquírolas ósseas as quais sem a irrigação sanguínea, desencadeiam inicialmente reações inflamatórias local, seguidas de fistulização, resultando em sinusite.

Considerando os índices de recuperação dos animais verificou-se que houve cura completa de 14 (93,33%) bovinos do grupo GI, oito (53,33%) do GII, 13 (86,66%) do GIII e de três (20%) do GIV. Foram observadas diferenças significativas entre os valores comparados com nível de significância (p<0,01). Em relação aos tratamentos nota-se que o protocolo com hipoclorito de sódio foi eficaz contra a sinusite em 14 (93,33%) animais, não apresentou a eficácia desejada em apenas um (6,66%) animal. Ao comparar-se o grupo GI com o GII constatou-se que o hipoclorito mostrou-se significativamente eficaz, quando comparado com a solução de policresuleno a 2% (p<0,05). Estes dados confirmam que a recuperação completa dos 14 (93,33%) animais que compuseram o grupo GI pode estar associada à ação germicida do hipoclorito de sódio (NaOCl). De acordo com RUIZ (1992) a maior parte das bactérias cresce em pH ótimo próximo da neutralidade e os fungos se desenvolvem melhor em meio ácido, justificando, em parte, a melhor eficácia do tratamento empregado no GI quando comparado com GII. Portanto, o pH alcalino do hipoclorito proporcionou maior eficácia da solução, ao contrario da solução de policresuleno a 2% cuja acidez (0,6) é pronunciada. Ainda sobre esse assunto, apesar da ação positiva da solução de policresuleno a 2% contribuindo para a remoção de debris celulares, granulomas e tecido necrosado decorrente do processo inflamatório, provavelmente não exerceu a mesma ação microbicida do hipoclorito de sódio, conforme apontado SIQUEIRA JUNIOR et al. (2007). FIORAVANTI et al. (1996), relataram que o policresuleno têm apresentado bons resultados no tratamento da sinusite e SILVA et al. (1984), afirmaram que o principio ativo age com eficiência no controle de processos inflamatórios.

            Ao compararem-se os resultados obtidos para os animais pertencentes ao grupo GI com os dos alocados no grupo GIII não se observou diferença significativa (p>0,01) entre os tratamentos. Essa semelhança entre os dois protocolos terapêuticos poderia ser responsabilizada, em parte, ao sucesso alcançado pelo tratamento com iodopovidona a 5% empregado no GIII, recuperando 13 (86,66%) dos 15 bovinos tratados, pois se sabe que o principio ativo possui amplo espectro ação, agindo sobre bactérias Gram (-), Gram (+), fungos, micobactérias, clamídias, vírus e protozoários. Quanto ao pequeno número de animais, três (20%), alocados no grupo GIV que obtiveram recuperação completa, tal fato ocorreu provavelmente devido à solução fisiológica não possuir ação antibiótica, agindo apenas como adjuvante na limpeza dos seios paranasais, ao contrário da ação do hipoclorito de sódio, policresuleno e iodopovidona, que sabidamente possuem ação antimicrobiana, conforme relatos de FIORAVANTI et al. (1996). Mesmo assim, os resultados indicaram que, apenas a limpeza dos seios sem o emprego de uma solução com ação microbicida não recupera um numero expressivo de animais com o problema.

            Considerando os protocolos terapêuticos avaliados, observou-se diferença significativa entre o GI e o GIV. A diferença foi altamente significativa quando se confrontou o grupo GIII com GIV (p<0,01). Entretanto não se observou diferença significativa comparando o grupo GII com GIII (p=0,109) e GII com GIV (p=0,13). Portanto, analisando todos esses achados é possível inferir que os protocolos terapêuticos empregando solução de hipoclorito de sódio a 0,2% e iodopovodona a 5% foram os que recuperaram maiores numero de bovinos, podendo ser recomendados para essa finalidade. Quanto à freqüência de higienização do seio frontal, acredita-se ter sido a ideal, pois auxiliou na recuperação dos animais antes que a cicatrização clínica da ferida de pele, decorrente da fístulação existente ou da incisão de pele, se efetivasse.

 

CONCLUSÃO

Conclui-se que dentre os quatro protocolos terapêuticos avaliados a solução de hipoclorito de sódio a 0,2% e iodopovidona a 5% propiciou a recuperação de um maior número de bovinos com sinusite pós descorna plástica.

 

REFERÊNCIAS

 

BLOWEY, R. W. ;WEAVER, A. D. Color atlas of diseases and disorders of cattle. Editora: Elsevier Mosby, Philadelphia 2.ed, 223p. 2003.

FIORAVANTI, M. C. S., SILVA, L. A. F., LEÃO, M. A., JULIANO, R. S., EURIDES, D.; ALVES, C. D. Descorna de bovinos utilizando grampos de metal na dermorrafia. Ciência Rural, Santa Maria, v. 29, n. 1, p. 507-510, 1999.

FIORAVANTI, M. C. S.; SILVA, L. A. F.; MOREIRA, P. C. Ácido metacresolsulfonico associado à nitrofurazona e enrofloxacina no tratamento de sinusite em bovinos. Veterinária Noticia, Uberlândia, v. 2, n. 1, p. 31-36, 1996.

JUBB, K. U. F.; KENNEDY, P. C.; PALMER, N. Patologia de los animales domésticos. Montevidéo: Hemisfério Sul, v. 2, 653p, 1990.

KONIG, H. E.; LEIBICH, H. G. Anatomia dos animais domésticos. Porto Alegre: Artmed, v. 2. 400p, 2004.

RADOSTISTS, O. M.; BLOOD, D. C.; GAY, C. C. Clínica veterinária. 9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. 1737p.

ROSEMBERGER, G. Enfermidades de los bovinos. Montevideo: Hemisferio Sul, 1988. 577p.

SILVA, L. A. F.; DEL CARLO, R .J.; TONIOLLO, G. H.; FERREIRA, H. I.; ALVES, G. E. S.; SILVEIRA, J. M. Ácido metacresol sulfônico associado à extirpação cirúrgica de tumor venéreo canino. Revista Brasileira Reprodução Animal, Belo Horizonte. v. 8, p. 63-68. 1984.

SIQUEIRA JUNIOR, J. F.; GUIMARÃES-PINTO, T.; RÔÇAS, I. N. Effects of chemomechanical preparation with 2.5% sodium hypochlorite and intracanal medication with calcium hydroxide on cultivable bacteria in infected root canals. Journal of Endodontics, New York. v. 33, p. 800-805, 2007.

WILKINS, P. A.; BAKER, J. C.; AMES, T. R. Doença do sistema respiratório. In: SMITH, B. P. Medicina interna de grandes animais. 3.ed. São Paulo: Manole, p. 488-489. 2006.