PERFIL BIOQUÍMICO DE CABRAS LACTANTES DAS RAÇAS SAANEN E ANGLO-NUBIANA

 

Kalina Simplício1, Felipe Cotrim2, José Jurandir Fagliari3, Cláudia Aparecida da Silva Nogueira4

  1. Mestranda do programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da UNESP, Campus de Jaboticabal. E-mail: kalinamms@hotmail.com (autor correspondente)

2.       Acadêmico do curso de graduação de Medicina Veterinária da FCAV / UNESP, Campus de Jaboticabal

3.       Docente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da FCAV/ UNESP, Campus de Jaboticabal

4.       Laboratório de Pesquisa do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da FCAV/UNESP, Campus de Jaboticabal

 

PALAVRAS-CHAVE: Bioquímica sérica, caprinos, lactação.

 

ABSTRACT

 

BIOCHEMICAL PROFILE OF SAANEN AND ANGLO-NUBIAN LACTATING GOATS

Although nutrient requirements are now relatively well-defined for sheep and cattle, there is still a lack of reliable information in the literature about the nutritional needs of lactating goats. Most of the information available are based on extrapolated values obtained in cattle and sheep experiments. Nevertheless, due to specific physiological features of the goat, this approach requires further validation. Thus, to determine the biochemical profile of Saanen and Anglo-Nubian lactating goats, a total of 20 serum samples were collected and submitted to laboratorial analysis. The aim was to determine serum concentrations of total protein, aspartate aminotranspherase, gama-glutamyltranspherase, alkaline phosphatase, urea, creatinine, calcium, phosphorus, magnesium, sodium, potassium, and ionized calcium. Our results reveal the influence of genotype on some of the biochemical components in both breeds of lactating goats.

 

KEYWORDS: Clinical biochemistry, caprine, lactation.

 

INTRODUÇÃO

Embora o requerimento nutricional de cabras e ovelhas esteja relativamente bem estabelecido ainda há pouca informação acerca das necessidades nutricionais de cabras em lactação. A maior parte da informação disponível consta de extrapolações advindas de experimentos com bovinos e ovinos. Não obstante, devido a características fisiológicas específicas dos caprinos são necessários mais estudos (AGUILERA et al., 1990) e o estabelecimento de valores de referência é vital (SKINNER, 2001). Ainda, a dosagem de determinados constituintes bioquímicos nos diversos fluidos inclusive no sangue pode auxiliar no diagnóstico, no prognóstico e no acompanhamento do tratamento dos animais (MORAIS et al., 2000). No entanto, para a correta interpretação de exames laboratoriais, é necessário se conhecer os valores de referência de normalidade para as diferentes espécies, raças, sexos e idades de animais criados em diferentes regiões do Brasil (BARIONI et al., 2001).

Em ruminantes de alta produção, a lactação é considerada um período de balanço energético negativo. Para manter a produção leiteira, o uso de fontes protéicas e energéticas maternas é necessário para complementar a dieta. Cabras leiteiras têm atraído atenção para o estudo desta condição devido sua alta produção de leite por unidade de peso vivo quando se leva em conta suas proporções corpóreas (BARACOS et al., 1991).

Diante deste cenário o presente trabalho objetivou determinar o perfil bioquímico de cabras lactantes das raças Saanen e Anglo-nubiana.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Animais

A triagem dos animais foi efetuada após realização de exame físico segundo PUGH (2005). A formação dos dois grupos foi realizada de forma a totalizar 10 fêmeas lactantes da raça Saanen e 10 fêmeas lactantes da raça Anglo-Nubiana, pertencentes ao Setor de Caprinocultura da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias/UNESP/Campus de Jaboticabal e mantidos sob sistema de manejo semi-intensivo.

 

Colheita das amostras

Para obtenção do soro, o sangue foi colhido mediante punção jugular, em tubos a vácuo, sem anticoagulante. A amostra foi mantida a 37 ºC, durante 10 minutos, para retração do coágulo e posteriormente centrifugada a 1000 g durante 15 minutos.

 

Bioquímica Sérica

A concentração sérica de proteína total foi determinada pelo método do biureto, empregando-se reagente comercial (Labtest, Belo Horizonte). Foram também determinadas as atividades séricas de aspartato aminotransferase (método de Reitman-Frankel), gama glutamiltransferase (método de Szaz modificado) e fosfatase alcalina (método de Bowers e McComb modificado) e os teores de magnésio (método de Tonks), sódio, potássio e cálcio ionizado (método do íon seletivo), bem como de uréia (método da urease) e creatinina (método de Basques-Lustosa) empregando-se kits comerciais (Labtest, Belo Horizonte). A leitura foi realizada em analisador bioquímico semi-automático (Labquest, Labtest, Belo Horizonte) em comprimentos de onda específicos para cada componente do sangue.

 

Análise dos Dados

Para análise dos resultados obtidos realizou-se o teste “t” de Student para variáveis independentes.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A concentração sérica média da proteína total de cabras da raça Saanen foi 8,24 ± 0,6 g/dL e de cabras Anglo-Nubiana foi de 7,41 ± 1,0 g/dL, sendo a diferença significativa (P < 0,05) entre estas duas raças. Aguilera et al. (1990), em trabalho com cabras Granadina em lactação concluíram não ser plausível a transferência e utilização de valores de referência de componentes protéicos e energéticos de outras espécies ruminantes para a espécie caprina.

As atividades séricas médias de aspartato aminotransferase (AST), gama glutamiltransferase (GGT) e fosfatase alcalina (ALP) em cabras lactantes da raça Saanen foram 64,4 ± 12,4 UI, 46,67 ± 10,5 UI e 121,93 ± 110 UI respectivamente. Nas cabras Anglo-Nubiana foram observados valores mais elevados de AST (114,7 ± 35,7 UI) e GGT (58,14 ± 8,2 UI).  Entretanto, constatou-se atividade inferior de ALP (67,17 ± 23,6 UI) em fêmeas da raça Anglo-nubiana em relação àquelas verificadas na raça Saanen. Estes três componentes enzimáticos apresentaram diferença significativa (P<0,05) entre as duas raças. Não foi encontrada nenhuma citação na literatura que pudesse colaborar com a discussão destas constatações.

A concentração sérica média de uréia no grupo de cabras da raça Saanen foi 52,13 ± 5,3 g/dL e em animais da raça Anglo-Nubiana foi 35,17 ± 8,9 g/dL. Em ruminantes, devido ao ciclo diferenciado da uréia, em que a microflora ruminal metaboliza um porcentual maior do que a flora entérica dos monogástricos, a concentração de uréia pode não acompanhar, em proporção, o aumento do teor de creatinina nos casos de insuficiência renal (MORAIS et al., 2000). KANEKO (2008) ressalta que tal fato deve ser considerado quando se avalia a concentração sérica deste catabólito.

Os teores de fósforo e cálcio em cabras da raça Saanen foram 9,59 ± 1,7 mg/dL e 9,89 ± 0,5 mg/dL, respectivamente, enquanto em fêmeas Anglo-Nubiana foram constatadas as médias respectivas de 5,78 ± 1,8 mg/dL e 8,88 ± 0,5 mg/dL para estas variáveis. O teor de cálcio ionizado, ou biologicamente ativo, foi 0,71 ± 0,1 mmol/L em cabras Saanen e 1,06 ± 0,1 mmol/L nas cabras Anglo-Nubianas. BARIONI et al. (2001) em estudo com fêmeas lactantes e não lactantes da raça Pardo Alpina não observaram influência da idade nos teores séricos de cálcio. Quanto à concentração sérica de fósforo notou-se diferença significativa (P < 0,05) entre animais jovens e adultos, sendo valores inferiores encontrados nos adultos. BHATTACHARYYA et al. (1994), afirmaram que os teores de cálcio e fósforo são significantemente maiores na fase pré-púbere e que isso pode ser decorrência do crescimento ou da alta taxa de absorção gastrointestinal. Ainda, segundo estes autores, com o avanço da idade ocorre decréscimo nas concentrações de sódio e potássio. No entanto, no presente trabalho não foram constatados valores diferentes das faixas de normalidade citadas por KANEKO (2008).

A teores séricos de magnésio de cabras das raças Saanen e Anglo-Nubiana foram 2,98 ± 0,3 mg/dL e 2,30 ± 0,3 mg/dL, respectivamente. JOHNSON & POWLEY (1990) observaram, em trabalho com cabras em lactação, que a adição de potássio á dieta resultou em diminuição da disponibilidade do magnésio dietético e, consequentemente, diminuição da concentração sérica de magnésio.

Em relação às concentrações de sódio e potássio de fêmeas da raça Saanen obteve-se média de 153,30 ± 7,2 mmol/L para o sódio e 5,25 ± 0,7 mmol/L para o potássio; no grupo de cabras da raça Anglo-Nubiana essas médias foram 143,40 ± 4,0 mmol/L e 4,48 ± 0,2 mmol/L, respectivamente, sendo as diferenças entre as raças significativas (P < 0,05). BHATTACHARYYA et al. (1994) afirmaram que com a idade ocorre um decréscimo na concentração de sódio e potássio, porém não fazem menção à diferença entre raças.

 

CONCLUSÃO

Concluiu-se que o genótipo pode influenciar o perfil bioquímico de alguns componentes do soro sanguíneo de fêmeas lactantes das raças Saanen e Anglo-nubiana.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e a Kleber Tomas Resende, docente do Departamento de Zootecnia da FCAV/UNESP, Campus de Jaboticabal e responsável pelo Setor de Caprinocultura desta instituição.

 

 

REFERÊNCIAS

AGUILERA, J. F.; PRIETO, C.; FONOLLÁ, J. Protein and energy metabolism of lactating Granadina goats. British Journal of Nutrition, Cambridge, v. 63, p. 165-175, 1990.

BARACOS, V. E.; BRUN-BELLUT, J.; MARIE, M. Tissue protein synthesis in lactating and dry goats. British Journal of Nutrition, Cambridge, v. 66, p. 451-465. 1991.

BARONI, G; FONTEQUE, J, H; PAES, P. R. O; TAKAHIRA, R, K; KOHAYAGAWA, K; LOPES, R. S; LOPES, S. T. A; CROCCI, A. J. Valores séricos de cálcio, fósforo, sódio, potássio e proteínas totais em caprinos fêmeas da raça Parda Alpina. Ciência Rural, Santa Maria, v. 31, n.3, p. 435-438. 2001.

BHATTACHARYYA, B. N.; TALUKDER, S. C.; BARUAH, R. N. Influence of age on macro elements status of non-descript goat. Indian Veterinary Journal, Madras, v. 71, p. 338-340, 1994.

JOHNSON, C. L.; POWLEY, G. Magnesium metabolism in lactating goats fed on grass diets differing in mineral content. Journal of Agricultural Science, Cambridge, v. 114, p. 133-138. 1990.

KANEKO, J. J.; HARVEY, J: W.; BRUSS, M: L. Clinical biochemistry of domestic animals. 6.ed. New York: Academic Press, 2008. 916p.

MORAIS, M. G., RANGEL, J. M., MADUREIRA, J. S., SILVEIRA, A. C. Variação sazonal da bioquímica clínica de vacas aneloradas sob pastejo contínuo de Brachiaria decumbens. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, Belo Horizonte, v. 52, n. 2, p. 98-104, 2000.

PUGH, D. G. Clínica de ovinos e caprinos. Porto Alegre: Editora Roca, 2005. 513p.

SKINNER, J. G. International standardization of acute phase proteins. Special Report. Veterinary Clinical Pathology, Santa Barbara, v. 30, n. 1, p. 2-7, 2001.