ACIDOSE RUMINAL EM OVINOS,
DIAGNOSTICADA PELA CENTRAL DE DIAGNÓSTICO VETERINÁRIO (CEDIVET) DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARÁ, NO PERÍODO DE 2000 A 2008
Natália
da Silva e Silva1, José Alcides Sarmento da Silveira2,
Karinny Ferreira Campos3, Melina Garcia Saraiva de Sousa3,
Cinthia Távora de Albuquerque Lopes3, Carlos Magno Chaves Oliveira4,
Marcos Dutra Duarte2, José Diomedes Barbosa5
1. Aluna de
mestrado do Programa de Pós-Graduação Saúde Animal na Amazônia, Faculdade de
Medicina Veterinária da Universidade Federal do Pará (UFPA)
2. Médico
Veterinário, MSc, Faculdade de Medicina Veterinária (UFPA)
3. Acadêmica da
Faculdade de Medicina Veterinária (UFPA)
4. Médico
Veterinário, MSc, professor da Faculdade de Medicina Veterinária (UFPA)
5. Médico
Veterinário, doutor, professor da Faculdade de Medicina Veterinária (UFPA)
Central de
Diagnóstico Veterinário (CEDIVET), Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade
Federal do Pará, Campus Castanhal, Rua Maximino Porpino da Silva, nº 1000, 68740-080,
Castanhal - PA, Brasil - E-mail: nataliasilva@ufpa.br
(autor correspondente)
PALAVRAS
– CHAVE: Carboidratos, doenças metabólicas, intoxicação por
grãos.
ABSTRACT
DIAGNOSIS OF RUMINAL
ACIDOSIS IN SHEEP AT THE
A total of 11 sheep from
six farms located in Pará and Maranhão were diagnosed with acute ruminal
acidosis at CEDIVET between 2000 and 2008. The disease was caused by the
ingestion of large amounts of rapidly digestible carbohydrates. The main
clinical signs were lethargy, anorexia, ocular mucosa, congested and engorged
episcleral vessels, tachycardia, tachypnea, different degrees of dehydration,
increased abdominal volume, ruminal atony, and lack of stratification of rumen
contents. At necropsy, we observed detachment of the mucosa, hyperemia in the
submucosal arterioles, and absence of ruminal papillae in some cases.
Histopathological findings in the rumen included hydropic change and
coagulative necrosis of epithelial cells followed by influx of neutrophils,
areas of focal necrosis, and ulcerations.
KEYWORDS: Acidosis, carbohydrates, grain poisoning.
INTRODUÇÃO
A
necessidade de um modelo de produção intensivo, com o intuito de se obter em
curto prazo metas excessivas de ganho de peso, tem gerado erros na forma de
alimentar os ruminantes, acarretando distúrbios digestivos e metabólicos
relacionados às diferentes dietas empregadas. Na ovinocultura, a acidose
láctica ruminal aguda, principalmente em sistemas de criação intensivo e
semi-intensivo, tem causado perdas econômicas consideráveis (SIQUEIRA et al.,
1993; BARROS et al., 1997). Esta enfermidade, resultante da ingestão rápida e
excessiva de carboidratos de fácil digestibilidade, representa um sério
problema na exploração pecuária, pois pode causar nos animais acometidos um quadro clínico que varia desde inapetência
temporária até sintomas gastrointestinais graves com importante comprometimento
do estado geral. Além disso, existe a acidose ruminal latente crônica ou
subclínica, que ocorre devido uma produção intensiva de ácidos graxos voláteis
com aumentos temporários de ácido láctico, neste caso, o pH oscila ao redor de
5,5, podendo haver mínimos breves de 5,2 dependendo da alimentação, e provocar
alterações relacionadas ao aspecto produtivo dos animais acometidos, incluindo
diminuição na produção de leite e episódios de laminite, abscessos hepáticos e
polioencefalomalácia (DIRKSEN et al.,
2005).
O
objetivo do presente trabalho é relatar a ocorrência da
acidose ruminal em ovinos, diagnosticada pela Central de Diagnóstico
Veterinário (CEDIVET) da Universidade Federal do Pará (UFPA), no período de
MATERIAL E MÉTODOS
No período de 2000 a 2008, foram atendidos 11 ovinos,
pertencentes a seis propriedades localizadas nos municípios de Castanhal, Santa
Maria do Pará e Santo Antônio do Tauá, no estado do Pará e Açailândia, no
estado do Maranhão.
O exame clínico dos animais foi realizado segundo PUGH
(2004). O exame do fluido ruminal, efetuado segundo DIRKSEN et al. (1993), foi
realizado em amostras obtidas por meio de sondagem orogástrica, ou durante a
ruminotomia ou a necropsia (quando esta era realizada imediatamente após a
morte do animal), sendo colhidos em frascos de vidro, aproximadamente 200 mL de
líquido ruminal. No método da sondagem orogástrica, os primeiros jatos de
fluido ruminal foram descartados para evitar uma possível contaminação da
amostra por saliva. A aferição do pH dessas amostras foi realizada imediatamente
após à coleta, utilizando fita de pH com escala de 5 a 9. Adicionalmente, em
três animais, foram colhidas amostras de sangue por punção da veia jugular,
para determinação do hematócrito e da proteína plasmática total, exames
realizados no Laboratório de Patologia Clínica da CEDIVET (UFPA).
Nos animais que morreram, realizou-se a necropsia e
coleta de fragmentos de diversos órgãos, que foram fixados em formol a 10%,
processados rotineiramente para a histopatologia e corados pelo método da
hematoxilina/eosina no Setor de Anatomia Patológica do Projeto Sanidade Animal,
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
Na propriedade 1, os animais recebiam
simultaneamente, no cocho, milho inteiro, milho triturado, ração comercial e
feno triturado; na propriedade 2, recebiam milho triturado e ração comercial;
na propriedade 3, recebiam raspa de mandioca e milho inteiro e na propriedade
4, somente milho triturado. Nestas propriedades, parte dos animais era mantida
em sistema de criação intensiva, recebendo a alimentação acima descrita, e os
demais animais permaneciam metade do dia a pasto e a outra metade estabulados
em apriscos coletivos suspensos, onde recebiam uma suplementação alimentar à
base de rações comerciais.
Nas propriedades 5 e 6, os animais eram mantidos em
sistema de criação extensiva, em pastos de Brachiaria
brizantha e recolhidos no final do dia aos apriscos. Na propriedade 5, a
enfermidade foi causada pelo fornecimento aos animais de restos de pipoca,
doados pela fábrica ao proprietário. Na propriedade 6, os animais tiveram
acesso a uma área de cultura de milho, onde as espigas tinham sido colhidas
manualmente e amontoadas em diversos locais da área, possibilitando a ingestão
de grande quantidade desses grãos.
Dos 11 animais atendidos, seis vivos e cinco para
necropsia, sete eram da raça Santa Inês, dois da raça Dorper e dois mestiços de
Santa Inês, sendo quatro machos e sete fêmeas. Nove animais tinham acima de
três anos de idade e dois em torno de quatro meses.
Os casos clínicos de acidose láctica aguda
observados nas propriedades 1, 2, 3 e 4, que acometeram somente os animais
criados de forma intensiva, provavelmente ocorreram devido a um aumento brusco
nas quantidades de carboidratos de fácil digestibilidade ofertadas. Estes
resultados estão de acordo com as observações feitas por PUGH (2004) e AFONSO
& MENDONÇA (2007), que demonstraram que esses tipos de alimentos e a forma
de alimentação podem ser a causa da queda do pH ruminal e do aumento dos níveis
de ácido láctico, com conseqüente
desequilíbrio da microbiota ruminal, desencadeando uma acidose ruminal aguda.
Nas propriedades 5 e 6, os
quadros de acidose ruminal aguda ocorreram devido ao acesso dos animais a
alimentos ricos em carboidratos de fácil digestibilidade (pipoca e milho,
respectivamente) em grande quantidade, sem um período prévio de adaptação,
fator esse importante, pois de acordo com DIRKSEN (1981) são necessários 20
dias para que haja uma adaptação da microbiota ruminal a um alimento de fácil
digestibilidade.
Ao exame clínico, três animais
apresentavam-se em estação e três em decúbito lateral. Outros sinais clínicos observados, foram apatia,
anorexia, mucosas oculares congestas e vasos episclerais ingurgitados,
taquicardia, taquipnéia, diferentes graus de desidratação, aumento de volume
abdominal, atonia ruminal e ausência de estratificações, presença de bastante
líquido no rúmen ao balotamento, fezes de aspecto pastoso a aquoso, fétidas e
com partículas de grãos. Esses achados são semelhantes aos observados por SMITH & SHERMAN (1994), AFONSO et al. (2002) e MIRANDA NETO (2003).
O exame do fluido ruminal
revelou aspecto leitoso, odor ácido, tempo de sedimentação diminuído e ausência
de flotação, pH em torno de 5 e ausência de protozoários vivos. Estes achados
condizem com os encontrados por DUNLOP (1972), CAO et al. (1987) e AFONSO & MENDONÇA (2007), que relacionam a diminuição do
pH no rúmen à elevação na concentração de ácido láctico, que aumenta a
osmolaridade do meio, tornando-o hipertônico em relação ao plasma e provocando
maior fluxo de água dos compartimentos intra e extracelulares para o interior
do trato digestivo, principalmente o rúmen, o que causa a distensão abdominal e
a desidratação evidenciadas neste trabalho.
Observou-se aumento do hematócrito
e das proteínas plasmáticas totais o que é explicado pela desidratação
instalada. Para WATSON (2000), a hemoconcentração é um achado comum em animais
com acidose láctica ruminal.
Nos três animais que se
encontravam em decúbito lateral no momento do exame foi estabelecido um
prognóstico ruim, confirmado pelas mortes dos mesmos logo após o atendimento
clínico. Nos outros três animais foi realizada laparotomia e ruminotomia, onde evidenciou-se em dois animais, mucosa do
rúmen acentuadamente hiperêmica e com desprendimento do epitélio, estes animais
morreram dois dias após a cirurgia. O animal que não apresentou alterações na
mucosa ruminal, recuperou-se após o tratamento, que incluiu a retirada do
conteúdo ruminal e transfaunação.
Dos seis animais atendidos vivos, apenas um
recuperou-se. Na necropsia dos dez animais, evidenciou-se fluido ruminal de
aspecto leitoso e de odor ácido. Em três, observou-se, hiperemia acentuada da
mucosa com desprendimento do epitélio, ausência de papilas ruminais em algumas
áreas e presença de grande quantidade de milho inteiro e/ ou triturado. Em dois
animais o abomaso apresentava mucosa hiperêmica com presença de úlcera. Estes
achados estão de acordo com as observações feitas por UNDERWOOD (1992), DIRKSEN
et al. (2005) e AFONSO & MENDONÇA (2007). Além disso, foi observada na
maioria dos animais a presença de grande quantidade de tecido adiposo no
subcutâneo e na cavidade abdominal, contribuindo para diminuição da capacidade
ruminal.
Histologicamente observou-se vacuolização do
citoplasma das células epiteliais, freqüentemente formando vesículas, discreto
infiltrado inflamatório de neutrófilos na mucosa e áreas focais de erosão e
ulceração, resultados esses descritos por McGAVIN et al. (2007) e AFONSO & MENDONÇA (2007).
CONCLUSÕES
No presente trabalho, pôde-se
observar que o acesso a grandes quantidades de carboidratos altamente
fermentáveis em um curto espaço de tempo, foi a condição determinante para o
aparecimento da enfermidade.
A alta letalidade observada,
deveu-se entre outros fatores, à demora no atendimento e tratamento dos animais
enfermos, uma vez que estes foram solicitados quando os animais encontravam-se
em estágio avançado da doença.
REFERÊNCIAS
AFONSO, J. A. B. et al.
Efeito da monensina sódica sobre as características do suco ruminal na acidose
láctica ruminal induzida experimentalmente em ovinos. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, Rio de Janeiro, v. 24,
p. 203-212, 2002.
MC GAVIN, M. D.; ZACHARY, J. F.; MOSBY, E. (Ed). Pathologic basis of veterinary Disease. 4. ed. [S.l.], 2007.