TRANFERÊNCIA DE IMUNIDADE PASSIVA EM CORDEIROS CUJAS MÃES RECEBERAM DIETAS COM DIFERENTES NÍVEIS DE ENERGIA OU PROTEÍNA NO TERÇO FINAL DA GESTAÇÃO

 

Karina Keller Marques da Costa Flaiban1; Mara Regina Stipp Balarin2; Edson Luís de Azambuja Ribeiro3; Filipe Alexandre Boscaro de Castro4; Rinaldo Masato Mori5; Júlio Augusto Naylor Lisboa2

 

1. Médico Veterinário, mestre, professor do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual de Londrina

2. Médico Veterinário, doutor, professor do Curso de Medicina Veterinária, Departamento de Clínicas Veterinárias (DCV), Universidade Estadual de Londrina (UEL)

E-mail: janlisboa@uel.br (autor correspondente)

3. Zootecnista, doutor, professor do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Estadual de Londrina

4. Zootecnista, doutorando em Ciência Animal, Universidade Estadual de Londrina

5. Médico Veterinário, doutor em Ciência Animal, Universidade Estadual de Londrina

 

PALAVRAS-CHAVE: IgG, imunoglobulinas, nutrição, ovinos.

 

ABSTRACT

 

PASSIVE IMMUNITY TRANSFER IN LAMBS FROM EWES WITH DIFFERENT PROTEIN OR ENERGY LEVELS DURING LATE PREGNANCY

This study assesses the passive immunity transfer in lambs from ewes that were fed diets with different energy or protein supplements during the last trimester of the gestational period. Blood samples were collected from 70 lambs born from 50 ewes to determine serum gamma-glutamyl transferase activity, total protein, gammaglobulin, and immunoglobulin G concentrations. Statistical analysis showed no differences related to the type of diet ingested by the ewe. Furthermore, findings from single and twin lambs were compared, revealing that the latter group presented lower levels for all variables.

 

KEYWORDS: IgG, immunoglobulins, nutrition, sheep.

 

 

INTRODUÇÃO

            Em ovinos, a transferência de anticorpos de origem materna para o neonato ocorre essencialmente após o parto, por meio da absorção intestinal das imunoglobulinas presentes no colostro. A transferência de imunidade passiva (TIP) adequada depende de fatores ligados à mãe, ao cordeiro e ao manejo dos animais. Dentre os fatores relacionados à ovelha, pode-se citar o estado nutricional ou a condição corporal, a habilidade materna e a conformação da glândula mamária. Uma nutrição adequada na fase final da gestação pode aumentar a produção do colostro, tanto em volume quanto em concentração de imunoglobulinas (MELLOR & MURRAY, 1985).

Fatores relacionados ao cordeiro incluem o tipo de parto, o tempo transcorrido entre o parto e o início das mamadas e a absorção intestinal das imunoglobulinas. Cordeiros que porventura não possuam níveis adequados de imunoglobulinas são mais susceptíveis a infecções. A mortalidade neonatal é frequentemente associada à falha na transferência de imunidade passiva (FTIP) (SAWYER et al., 1977).

Para reconhecer os animais que apresentam FTIP pode-se efetuar a mensuração da atividade da enzima GGT e as concentrações séricas de proteína total, beta e gamaglobulina, além da estimativa da imunoglobulina G por meio da turvação pelo sulfato de zinco, teste preciso, rápido e de baixo custo (FEITOSA et al., 2001).

O objetivo deste estudo foi verificar se diferentes níveis de energia e de proteína na dieta da ovelha no terço final da gestação seriam capazes de alterar a colostrogênese a ponto de interferir na transferência de imunidade passiva e comparar a TIP em cordeiros gêmeos e não gêmeos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Amostras de sangue de 70 cordeiros, filhos de 50 ovelhas, foram coletadas às 24 horas de vida para verificar a existência de FTIP em decorrência do tratamento nutricional oferecido à mãe durante o terço final de gestação. As ovelhas foram submetidas a seis tratamentos com diferentes níveis de proteína bruta e energia (baseado no NRC, 1985): grupo 1, 100% dos requerimentos de proteína bruta e de energia; grupo 2, 100% dos requerimentos de proteína bruta e 92,5 % dos requerimentos de energia; grupo 3, 100% dos requerimentos de proteína bruta e 85% dos requerimentos de energia; grupo 4, 70% dos requerimentos de proteína bruta e 100% dos requerimentos de energia; grupo 5, 85% dos requerimentos de proteína bruta e 100% dos requerimentos de energia; e, grupo 6, 115% dos requerimentos de proteína e 100% dos requerimentos de energia. A alimentação fornecida foi constituída de silagem de sorgo e concentrado - milho triturado e farelo de soja, em diferentes proporções para suprir as necessidades diferenciadas de proteína bruta e de energia.

Dos 70 cordeiros, 37 eram frutos de parto gemelar e 33 eram frutos de parto único. As amostras de sangue foram coletadas sem anticoagulante e o soro foi obtido por centrifugação após a retração do coágulo e congelado até a realização das análises.

A concentração de proteínas séricas (PT) foi determinada pelo método biureto e a atividade da enzima GGT, pelo método cinético, utilizando-se reagentes comerciais e leitura espectrofotométrica. As concentrações séricas das frações protéicas albumina, alfa 1, alfa 2, beta e gamaglobulinas foram determinadas por eletroforese em gel de agarose. A concentração sérica de IgG foi estimada pela técnica de turvação pelo sulfato de zinco com leitura espectrofotométrica, conforme método empregado por PFEIFER et al. (1977) com modificações (FEITOSA et al., 2001). Foi considerado FTIP quando o cordeiro teve concentração de gamaglobulina inferior a 1000 mg/dL.

Para avaliar os efeitos do tratamento nutricional da mãe sobre as variáveis mensuradas nos cordeiros foi empregada a análise de variância. Foram efetuadas comparações entre gêmeos e únicos por meio do Teste t. Em ambos os testes foi admitida uma probabilidade de erro de 5%.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Não foi evidenciada diferença significativa na concentração de PT, gamaglobulina, IgG e atividade de GGT entre os grupos de tratamento nutricional que as ovelhas foram submetidas no terço final de gestação, evidenciando que estes níveis de proteína e energia na dieta materna durante o período estudado não influenciou na TIP.

Os resultados de PT, expressos em g/dL (x ± s), obtidos em cordeiros filhos das ovelhas submetidas aos tratamentos 1, 2, 3, 4, 5 e 6, foram, respectivamente: 7,07±1,66; 6,97±1,46; 7,74±1,59; 5,72±1,79; 6,97±1,40 e 5,99±1,79. A concentração de PT reflete a quantidade de albumina e de globulinas, podendo ser utilizada com indicativo de TIP, sendo um teste simples, rápido e acessível, no entanto é pouco específico.

Os resultados de gamaglobulinas, expressos em g/dL (x ± s), obtidos em cordeiros filhos das ovelhas submetidas aos tratamentos 1, 2, 3, 4, 5 e 6, foram, respectivamente: 2,67±1,49; 1,82±1,31; 2,97±1,72; 1,76±1,39; 2,67±1,26 e 2,20±1,61. A gamaglobulina é a fração eletroforética que concentra os principais anticorpos séricos.

Os resultados de IgG, expressos em g/dL (x ± s), obtidos em cordeiros filhos das ovelhas submetidas aos tratamentos 1, 2, 3, 4, 5 e 6, foram, respectivamente: 2,42±1,01; 1,81±0,88; 2,78±0,93; 1,99±1,06; 2,67±1,05 e 2,71±1,38. A  IgG, principal subclasse presente no colostro ovino (SMITH et al., 1975), é importante na defesa do animal pela sua capacidade de opsonização, facilitando a fagocitose.

Os resultados da atividade da GGT, expressos em U/L (x ± s), obtidos em cordeiros filhos das ovelhas submetidas aos tratamentos 1, 2, 3, 4, 5 e 6, foram respectivamente: 3.903,7±2.196,0; 2.117,6±1.276,1; 3.345,5±2.001,4; 2.454,0±1.495,4; 3.741,6±2.552,2 e 3.657,1±2.459,8. A GGT é considerada uma medida indireta da capacidade de absorção de imunoglobulinas presentes no colostro.      

            O tratamento nutricional ao qual as ovelhas foram submetidas no terço final de gestação não foi determinante para prejudicar a TIP. Embora tenham ocorrido FTIP em 21,42% (15/70) dos animais, estas se distribuíram entre todos os tratamentos, exceto o grupo 5. Possivelmente tais falhas estejam relacionadas a outros fatores inerentes ao cordeiro ou ao manejo. HASHEMI et al. (2008) estudaram o efeito de diferentes níveis nutricionais durante o final da gestação na produção de colostro e nos níveis séricos de imunoglobulinas na ovelha e no cordeiro e concluíram que, apesar de aumentar o volume de colostro produzido, a concentração de IgG no colostro, no soro das ovelhas e no soro dos cordeiros não se alterou.

            A comparação entre cordeiros frutos de partos únicos e gemelares foi realizada para verificar a existência de diferença entre estes grupos nos animais estudados. Os resultados de média ± desvio padrão da atividade de GGT (3.924,9±2.266,9 U/L e 2.538,1±1.622,2 U/L), PT (7,08±1,77 g/dL e 6,53±1,59 g/dL), imunoglobulina G (2,86±1,14 g/dL e 1,87±0,74 g/dL) e gamaglobulina (2,83±1,57 g/dL e 1,89±1,25 g/dL) foram significativamente inferiores nos cordeiros gêmeos.

 

CONCLUSÕES

            Pequenas restrições de energia e de proteína na dieta das ovelhas no terço final da gestação não foram suficientes para influenciar a TIP dos cordeiros. No entanto, a FTIP ocorreu mais nos cordeiros gêmeos provavelmente por nascerem menores e mais fracos e não mamarem colostro em quantidade e de forma adequada.

 

REFERÊNCIAS

 

FEITOSA, F. L. F.; BIRGEL, E. H.; MIRANDOLA, R. M. S.; PERRI, S. H. V. Diagnóstico de falha de transferência de imunidade passiva em bezerros através da determinação de proteína total e de suas frações eletroforéticas, imunoglobulinas G e M e da atividade da gama glutamiltransferase no soro sanguíneo. Ciência Rural, Santa Maria, v. 31, p. 251-255, 2001.

HASHEMI, M.; ZAMIRI, M. J.; SAFDARIAN, M. Effects of nutritional level during late pregnancy on colostral production and blood immunoglobulin levels of Karakul ewes and their lambs. Small Ruminant Research, Amsterdam, v. 75, p. 204-209, 2008.

MELLOR, D. J.; MURRAY, L. Effects of maternal nutrition on udder development during late pregnancy and on colostrums production in Scottish Blackface ewes with twin lambs. Research of Veterinary Science, London, v. 39, p. 230-234, 1985.

PFEIFER, N. E.; MCGUIRE, T. C.; BENDEL, R. B.; WEIKEL, J. M. Quantitation of bovine immunoglobulins: comparison of single radial immunodiffusion, zinc sulfate turbidity, serum electrphoresis, and refratometer methods. American Journal of Veterinary Research, Chigaco, v. 38, n. 5, p. 693-8, 1977.

SAWYER, M.            ; WILLARDSEN, C. H.; OSBURN, B. I.; MCGUIRE, T. C. Passive transfer of colostral immunoglobulins from ewe to lamb and its influence on neonatal lamb mortality. Journal of the American Veterinary Medical Association, Schaumburg, v. 171, n. 12, p.1255-1259, 1977.

SMITH, W. D.; DAWSON, M.; WELLS, P. W., BURRELS, C. Immunoglobulin concentrations in ovine body fluids. Research in Veterinary Science, London, v. 19, p. 189, 1975.