MEGAESÔFAGO EM CAPRINO: RELATO DE CASO

 

Luiz Cosme da Silva Júnior1, Lúcia Cristina Pereira Arruda1, Danilo Gonçalves Beltrão da Silva1, Filipe Aureliano Pedrosa Soares1, Álvaro Veloso Borba Neto1, Jacinta Eufrásia Brito Leite2, Pierre Castro Soares2

 

1. Acadêmicos do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco

2. Médicos veterinários, doutores, professores do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Rua Dom Manoel de Medeiros, S/N – Dois Irmãos, CEP 52171-900 Recife-PE/ Brasil.

E-mail: psoares@dmv.ufrpe.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Esôfago, diagnóstico, radiografia, ruminante

 

ABSTRACT

 

MEGAESOPHAGUS IN GOATS: CASE REPORT

This study investigates a 7-month-old female mixed breed goat showing increased volume of the neck, apathy, inappetence, and regurgitation. Radiological examination in lateral projection revealed a radiopaque content in the esophageal lumen dorsally positioned at the apex of the heart. It was located between the second and sixth rib pairs and its density and appearance were similar to the rumen contents. Single-contrast esophagram with barium sulfate showed esophageal dilatation cranial to the radiopaque content detected by simple radiography. Once the probe was introduced, which found no obstacles in the passage into the rumen, the same clinical signs were observed. Therefore, radiographic findings contributed to the diagnosis of megaesophagus.

 

KEYWORDS: Diagnosis, esophagus, radiography, ruminant.

 

INTRODUÇÃO

O esôfago é responsável pelo simples e rápido deslocamento da ingesta desde a faringe até o estômago. Sua distribuição anatômica começa dorsalmente a laringe e segue sob a traquéia, desviando-se a esquerda para entrar na cavidade torácica. Na região torácica o esôfago passa pelo mediastino à direita da aorta penetrando na cavidade abdominal através do hiato diafragmático presente no músculo diafragma (TORRES, 1997). Inúmeras são as enfermidades que podem comprometer a integridade deste segmento anatômico e alterar a dinâmica do sistema digestivo em ruminantes.

Megaesôfago é o termo utilizado para designar a dilatação esofágica resultante de um esôfago com hipomotilidade ou aperistáltico, secundário a distúrbios neuromusculares, e por obstrução da luz esofagiana. A dilatação é resultante do acúmulo de alimento na luz do esôfago, sendo uma causa comum de regurgitação (TORRES, 1997).

Pode estar classificado em congênito, ocorrendo em animais jovens logo após o desmame, sendo freqüentemente hereditário e resultante de anormalidades no desenvolvimento da inervação esofágica ou pela persistência do quarto arco aórtico direito; ou secundário, ocorrendo devido à ausência da motilidade esofágica gerada por uma disfunção do nervo vago, que pode ocorrer devido a diversas enfermidades (STURION et al., 2008). Qualquer enfermidade que comprometa o reflexo nervoso controlador da deglutição ou que obstrua a luz esofagiana pode resultar em dilatação esofágica.

Os sinais geralmente observados são de esôfago com anormalidade funcional, dilatado e repleto com saliva, alimento, anorexia, ansiedade, inquietação, sialorréia, tentativas vigorosas de deglutição e regurgitação, tosse, movimentos de mastigação contínuos, debilidade geral, além de insuficiência respiratória e cardíaca aguda ou pneumonia aspirativa (SCHERMAN, 2008). Nos ruminantes o megaesôfago pode causar timpanismo por impedir a eructação (RADOSTITS et al., 2000).

Esofagiopatias podem ser diagnosticadas por meio de exames radiográficos contrastados e exame endoscópico do esôfago, além da observação dos sinais clínicos. Técnicas como a fluoroscopia também pode ser útil para esclarecer os distúrbios da motilidade. O tratamento visa combater à causa primária e garantir o retorno ao funcionamento normal do órgão, porém este pode ser prolongado ou não acontecer a tempo, complicando a saúde do animal e leva-lo a óbito. Poucos são os relatos na literatura sobre tal enfermidade, tendo identificado alguns casos descritos em cães (TORRES, 1997; GAIGA et al., 2006; WRAY & SPARKES, 2006; ANDRADE et al., 2007 e SCHERMAN, 2008) e gato (FORBES e LEISHMAN, 1985), porém nenhum caso ainda foi descrito em animais de produção, particularmente em caprinos. Relevante considerar que relatos de casos desta enfermidade são importantes para se conhecer mais efetivamente a fisiopatologia e as conseqüências sobre a saúde animal, além das possíveis possibilidades de diagnóstico que têm sido implementadas para caracterização e confirmação deste problema. Assim sendo, este trabalho descrever pioneiramente aspectos clínicos e procedimento de diagnóstico de megaesôfago em caprino através do esofagograma simples e contrastado.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Foi atendido no Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco um caprino sem raça definida, fêmea, com aproximadamente sete meses de idade, com histórico de aumento de volume na região do pescoço, apatia, falta de apetite, salivação, inquietude, tosse e regurgitação. O proprietário também relatou que os episódios de regurgitação ocorriam apenas após ingestão de alimento sólido, além de registrar significativa perda de peso.

Após a anamnese o animal foi submetido ao exame físico, observando-se aumento de volume na porção cervical ventral, taquicardia, taquipnéia, sialorréia, estado senso-motor diminuído, anorexia, fezes e urina com aspectos normais, grau discreto de desidratação, tendo como suspeita clínica o megaesôfago. O animal foi conduzido ao setor de diagnóstico por imagem e submetido ao esôfagograma.

Para a realização do exame radiológico foi utilizada a projeção lateral para as análises (75,0 kw / 8,0 mAs). Foram realizadas radiografias simples e contrastadas com a utilização de sulfato de bário. Este foi administrado oralmente em volume correspondente a 120ml. A primeira radiografia foi realizada antes da administração do contraste e outras três radiografias foram feitas consecutivamente, sendo uma imediatamente após a administração do contraste (t=0), outra cinco minutos após a t=0 (t=5), e outra dez minutos após a t=5 (t=10). Os dados foram analisados de modo descritivo, auxiliando o diagnóstico clínico.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na radiografia simples, observou-se conteúdo radiopaco na luz esofágica, dorsal a base do coração, situado entre o segundo e sexto pares de costelas, com densidade e aspecto semelhantes ao conteúdo ruminal. Na esofagografia em t=0, constatou-se uma dilatação do esôfago, cranial ao conteúdo radiopaco descrito na radiografia simples. Já no t=5, realizada na mesma projeção anterior, possibilitou concluir que o contraste não evoluiu para o rúmen. Nesse momento, optou-se por inserir uma sonda na luz esofágica, verificando-se que esta foi feita sem observação de resistência de passagem no seu trajeto até o rúmen. A esofagografia em t=10 foi realizada com o paciente sondado. Na interpretação radiográfica neste último tempo, não foi visualizada qualquer modificação quanto aos achados já descritos anteriormente. Associando-se os sinais radiográficos descritos, conclui-se que se tratava de uma dilatação esofágica cérvico-torácica, cranial ao conteúdo observado e descrito na luz do esôfago, compatível com conteúdo alimentar, sendo o quadro sugestivo de megaesôfago.

Conforme exame clínico verificou-se que o animal apresentava um quadro de emagrecimento conseqüente a hiporexia e dificuldade de apreensão e deglutição do alimento. Naturalmente tal condição altera diferentes sistemas, levando o animal a progressiva debilidade (TORRES, 1997; GAIGA et al., 2006), compatível com a evolução deste animal. Sinais de megaesôfago incluem regurgitação seguida de perda de peso, desidratação e fraqueza. Era observado que a regurgitação ocorria logo após a ingestão do alimento, conforme observado também por Forbes & Leishman (1985), além de que sinais respiratórios como tosse, respiração ofegante e cianose estiveram presentes e estes sinais indicavam uma pneumonia como conseqüência de provável aspiração secundária (NELSON & COUTO, 1998). Tal observação torna o prognóstico reservado para os animais acometidos com esta patologia (ANDRADE et al., 2007), o que aconteceu com o referido animal com tal enfermidade.

O exame radiográfico confirmou a suspeita de megaesôfago e este foi preciso em revelar os segmentos anatômicos com alterações, particularmente quando se procedeu com a utilização do contraste, bem como a passagem da sonda oroesofágica, a qual permitiu mostrar a permeabilidade esofágica existente associado a dilatação esofágica. Considerando o que Sturgess et al. (2001) citaram, esta afecção pode ser congênita ou adquirida e, neste caso, considerando a idade, os fatores responsáveis provavelmente estão relacionados a fatores mecânicos com comprometimento neural do esôfago. Outro fato a considerar é que esta afecção tem sido descrita em cães (WRAY & SPARKES, 2006) e em gatos (STURGESS et al., 2001), porém nenhuma literatura foi encontrada relatando casuística de megaesôfago em caprinos, sendo, portanto, este relato de grande importância para a ciência veterinária, particularmente quanto ao diagnóstico, o qual geralmente é feito através dos sinais clínicos e achados radiográficos (RADOSTITS et al., 2000; WRAY & SPARKES, 2006; SCHERMAN, 2008). Neste caso, tal afecção foi facilmente diagnosticada com o uso do esofagograma contrastado, permitindo um diagnóstico precoce e medidas de controle.

 

 

 

 

CONCLUSÕES

Associando-se os sinais clínicos e, particularmente, os radiográficos descritos, conclui-se tratar de diagnóstico de megaesôfago em caprino, além de que o esofagograma contrastado é recomendado para auxiliar efetivamente o diagnóstico de tal afecção.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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WRAY, J. D.; SPARKES, A. H. Use of radiographic measurements in distinguishing myasthenia gravis from other causes of canine megaoesophagus. Journal of Small Animal Practice, Oxford, v. 47, n. 5, p. 256-263, 2006.