PARÂMETROS METABÓLICOS SANGUÍNEOS DE VACAS LEITEIRAS DE ALTA PRODUÇÃO NO PERÍODO DE TRANSIÇÃO

 

Tiago André Frigotto¹, Rüdiger Daniel Ollhoff², Ivan Roque de Barros Filho³ e Rodrigo de Almeida4

1. Médico Veterinário, mestrando em Ciências Veterinárias, Universidade Federal do Paraná (UFPR)

2. Médico Veterinário, PhD, professor do Curso de Medicina Veterinária, Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)

3. Médico Veterinário, PhD, professor do Curso de Medicina Veterinária, UFPR

4. Médico Veterinário, doutor, professor do Curso de Zootecnia, Departamento de Zootecnia, Setor de Ciências Agrárias, UFPR, CEP 80035-050, Curitiba, Paraná, Brasil.

E-mail: ralmeida@ufpr.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: AGNE, BHB, bovinocultura de leite, cálcio, parâmetros sanguíneos.

 

ABSTRACT

 

BLOOD METABOLIC PARAMETERS OF HIGH PRODUCING DAIRY COWS DURING THE TRANSITION PERIOD

The transition period refers to the last 3 weeks of gestation and the first 3 weeks after parturition. It is critically important as regards health, production, and profitability of cows, and the fact that most health disorders occur during this time. Therefore, the aim of this study was to assess blood metabolic parameters of high producing dairy cows during the transition period. A total of 106 postpartum cows (72 multiparous and 34 first-lactation) from two herds in the municipality of Arapoti, Paraná, Brazil, were monitored from April to July 2009. Blood samples were collected 1, 2, 5, and 10 days after calving. Serum analysis determined beta-hydroxybutyrate (BHB), nonesterified fatty acids (NEFA), and calcium concentrations. Average values for the first two serum components – obtained 1, 5, and 10 days after calving – were: 0,548 - 0,665 - 0,506 mmol/L; and 0,91 - 0,77 - 0,68 mmol/L, respectively. Calcium levels on days 1, 2, 5, and 10 were: 10,25 - 10,30 - 11,08 - 11,22 mg/dL, respectively. Results show that blood metabolic parameters may be used as tools for monitoring the adaptation of high producing dairy cows in the periparturient period.

 

KEYWORDS: BHBA, blood parameters, calcium, dairy production, NEFA.

 

INTRODUÇÃO

O período de transição se refere ao intervalo de tempo que compreende as três semanas antes do parto e as três semanas pós-parto de vacas leiteiras. Considera-se que a transição entre o final da gestação e o início da lactação seja o estágio mais desafiador e de maior interesse do ciclo produtivo de uma vaca leiteira (GRUMMER, 1995; DRACKLEY, 1999). Neste estágio, severas alterações metabólicas, fisiológicas e anatômicas ocorrem na vaca parturiente, favorecendo a ocorrência de diversos distúrbios patológicos que podem prejudicar a eficiência produtiva da futura lactação pela diminuição da produção leiteira, redução do desempenho reprodutivo e aumento na taxa de descarte (HUZZEY et al., 2007).

A maioria das doenças metabólicas em vacas leiteiras (retenção de placenta, endometrite, hipocalcemia, cetose, deslocamento de abomaso e outras) ocorrem nas primeiras duas semanas da lactação (GOFF & HORST, 1996). DUFFIELD & LEBLANC (2009) acrescentam que os problemas deste período tipicamente possuem algum elemento metabólico como componente causal da doença clínica.

Os perfis metabólicos são usados como procedimento de monitoramento rotineiro para o diagnóstico de transtornos metabólicos, deficiências derivadas da nutrição e como preventivo de transtornos subclínicos, além da pesquisa de problemas de saúde e de desempenho de um rebanho (DUFFIELD & LEBLANC, 2009).

O acompanhamento da qualidade do período de transição de vacas leiteiras pela realização de exames metabólicos pode ser individual ou geral do rebanho. O objetivo do exame individual é identificar as vacas com risco para doenças e com isso evitar ou atenuar o problema clínico, e no caso do exame do rebanho, pode-se avaliar a eficiência do manejo realizado com a detecção precoce dos problemas existentes (LEBLANC et al., 2006). Para DUFFIELD & LEBLANC (2009) a interpretação dos parâmetros metabólicos focada no rebanho é essencial, pois pouco se sabe sobre o tratamento individual de vacas com altos parâmetros séricos.

Dois parâmetros metabólicos séricos são importantes ferramentas clínicas para medição do status nutricional e da adaptação ao balanço energético negativo de vacas leiteiras durante o período periparto. São eles os ácidos graxos não-esterificados (AGNE) e o β-hidroxibutirato (BHB) (CHUNG et al., 2008).

Devido à grande demanda de cálcio após o parto, este também deve ser monitorado em vacas até uma semana após o parto, no entanto, antes ou depois desse período, não faz sentido medir cálcio (DUFFIELD & LEBLANC, 2009).

Este trabalho teve como objetivo monitorar parâmetros metabólicos sanguíneos de vacas leiteiras de alta produção nos primeiros 10 dias após o parto.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Dois rebanhos leiteiros comerciais de alta produtividade no município de Arapoti, estado do Paraná, foram monitorados de 01 de abril a 12 de julho de 2009. Ambos os rebanhos possuíam o mesmo sistema de criação do tipo “free-stall”, com ordenha realizada três vezes ao dia e média de produção de 35 litros de leite/dia. As dietas fornecidas foram balanceadas de acordo com as exigências nutricionais para vacas no início da lactação (NRC, 2001) e consistiam em silagem de milho, pré-secado de forrageiras temperadas, concentrado comercial, caroço de algodão, farelo de soja, milho grão moído, gordura protegida e suplemento mineral.

Foi avaliado um total de 106 fêmeas da raça Holandesa, sendo 72 vacas (67,9%) e 34 novilhas (38,1%). Coletaram-se amostras de sangue, após a ordenha da manhã, nos dias 1, 2, 5 e 10 pós-parto, mediante punção venosa coccígea em tubos sem anticoagulante, sendo centrifugadas a 3000 rpm por 10 minutos para obtenção de soro, os quais foram divididos em frações, identificados e congelados a -20°C até o momento das correspondentes determinações.

Ácidos graxos não-esterificados (AGNE) e beta-hidroxibutirato (BHB) foram analisados nos dias 1, 5 e 10, e cálcio arsenazo nos dias 1, 2, 5 e 10, por meio de provas enzimáticas colorimétricas utilizando equipamento automático (Biosystems A15, Espanha) e reagentes comerciais (Randox, Reino Unido).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As altas produções no início da lactação da vaca leiteira especializada justificam a mobilização de tecido adiposo das reservas corporais, a liberação de ácidos graxos livres e o acúmulo destes AGNE no fígado (SMITH et al., 1997). O acúmulo de triglicerídios hepáticos é fisiológica em vacas leiteiras periparturientes, mas quando o aporte de AGNE ultrapassa a capacidade do fígado em oxidar ácidos graxos, há um acúmulo de metabólitos intermediários, conhecidos por corpos cetônicos, entre os quais o β-hidroxibutirato (BHB).

Desta forma, a concentração sérica de AGNE reflete o grau de adaptação da vaca ao balanço energético negativo (DUFFIELD & LEBLANC, 2009). Os valores de AGNE séricos encontrados no presente trabalho, nos dias 1, 5 e 10 pós-parto foram de 0,91, 0,77 e 0,68 mmol/L, respectivamente. Níveis séricos de AGNE são aceitáveis até 0,50 mmol/L e valores acima deste são associados com aumento dos riscos de ocorrência de doenças metabólicas como o deslocamento de abomaso (LEBLANC et al., 2005). De acordo com o NRC (2001), altas concentrações de AGNE estão presentes antes do parto, mas após seus níveis decrescem rapidamente, como pôde ser verificado neste trabalho. O mesmo ocorreu nos experimentos de LEBLANC et al. (2005) e CHUNG et al. (2008). Contrariamente, PICKETT et al. (2003) demonstraram um pico de concentração de AGNE no sexto dia pós-parto. Observou-se no presente trabalho que no dia 1 pós-parto 71,1% das vacas apresentaram valores maiores que os aceitáveis (>0,5 mmol/L), no dia 5 (65,6%) e no dia 10 (52,3%).

O BHB é importante em vacas leiteiras como indicador de cetose subclínica, ocasionada pela mobilização de gordura corporal para suprir o déficit energético durante o balanço energético negativo (ENJALBERT et al., 2001). No presente experimento encontrou-se valores médios de BHB sérico nos dias 1, 5 e 10 pós-parto de 0,548, 0,665 e 0,506 mmol/L, respectivamente. Resultados similares foram encontrados por CHUNG et al. (2008), em que os valores mais altos de BHB também ocorreram aproximadamente no quinto dia após o parto, salientando-se que na pesquisa destes autores o manejo alimentar do rebanho foi similar ao do presente trabalho. Entretanto, PICKETT et al. (2003) encontraram resultados distintos, onde a concentração de BHB após o parto foi crescente, alcançando o pico na quarta semana de lactação. Os resultados médios de rebanho para BHB encontrados neste trabalho estão abaixo dos níveis considerados como indicativos de cetose subclínica (> 1,4 mmol/L) segundo GEISHOUSER et al. (2000). Entretanto, ao se avaliar os resultados individualmente, pôde-se verificar a prevalência de cetose subclínica em 2,9% dos animais no primeiro dia após o parto, 6,9% no quinto dia e 3,0% no décimo dia de avaliação. No rebanho avaliado por GEISHOUSER et al. (2000), 20% das vacas apresentaram cetose subclínica.

Níveis de cálcio sanguíneo diminuem nos dias que antecedem o parto pela formação do colostro, no entanto, a partir do parto, estes níveis são controlados por diversos mecanismos fisiológicos (NRC, 2001). Assim, o monitoramento de cálcio sérico após o parto torna-se importante com o objetivo de evitar doenças metabólicas, principalmente a hipocalcemia subclínica, diagnosticada por níveis menores que 7,5 mg/dL no sangue (NRC, 2001; DUFFIELD & LEBLANC, 2009). Neste trabalho, valores séricos de cálcio para os dias 1, 2, 5 e 10 pós-parto foram de 10,25, 10,30, 11,08 e 11,22 mg/dL, respectivamente. Resultados semelhantes foram apresentados por LEBLANC et al. (2005), onde também não foram observados níveis abaixo do aceitável. Entretanto, avaliando-se individualmente o rebanho, pôde-se observar nos dias 1 e 2 pós-parto presença de hipocalcemia subclínica em 11,3 e 4,7% das vacas, respectivamente.

CONCLUSÃO

Vacas leiteiras avaliadas no presente experimento apresentaram baixas incidências de cetose subclínica e hipocalcemia, no entanto, a maioria das vacas analisadas apresentaram altos valores para AGNE, indicando uma aguda mobilização das reservas corporais nos primeiros 10 dias pós-parto.

Com os resultados encontrados neste trabalho, pôde-se concluir que as determinações de ácidos graxos não-esterificados, beta-hidroxibutirato e cálcio sanguíneo são importantes no monitoramento de vacas leiteiras de alta produção no período de transição, indicativos da eficiência do manejo pré e pós-parto.

 

AGRADECIMENTOS

Ao corpo técnico da Química Geral do Nordeste (QGN) e Laboratórios Pfizer Ltda. pelo auxílio financeiro que viabilizou a aquisição dos reagentes comerciais.

 

REFERÊNCIAS

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DRACKLEY, J. K. Biology of dairy cows during the transition period: the final frontier? Journal of Dairy Science, Champaign, v. 82, p. 2259-2273, 1999.

DUFFIELD, T. F., LEBLANC, S. J. Interpretation of serum metabolic parameters around the transition period. Southwest Nutrition and Management Conference, p. 106-114, 2009. Disponível em:                 http://ag.arizona.edu/ANS/swnmc/papers/2009/11%20Duffield

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