teor de FERRO e de outros componentes do soro sanguíneo de bezerros da raça Holandesa submetidos À suplementação injetável de ferro dextrano

Camila Franciosi1, Thaís Gomes Rocha1, Marcos Vinicius Vilela2, Renata Lemos Nagib Jorge3, José Carlos Barbosa4, José Jurandir Fagliari5

1. Pós-graduandas da FCAV/UNESP/Campus de Jaboticabal - SP

2.Graduando da FCAV/UNESP/Campus de Jaboticabal - SP

3. Laboratório de Apoio à Pesquisa do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária, FCAV/UNESP/Campus de Jaboticabal – SP

4. Docente do Departamento de Ciências Exatas da FCAV/UNESP

5. Docente do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof. Paulo D. Castellane, s/n. CEP: 14884-900 – Jaboticabal, SP, Brasil

E-mail: fagliari@fcav.unesp.br (autor correspondente)

 

PALAVRAS-CHAVE: Anemia ferropriva, neonatos bovinos.

 

ABSTRACT

 

CONCENTRATION OF IRON AND OTHER BLOOD SERUM COMPONENTS OF HOLSTEIN CALVES SUPPLEMENTED BY IRON DEXTRAN INJECTIONS

This study assesses serum levels of iron, creatinine, urea, bilirrubin, gamma-glutamyltransferase, aspartate aminotransferase, and alkaline phosphatase in Holstein calves before colostrum intake. Data was collected when calves were 5, 10, 20, 30, and 60 days of age in order to observe the effect of parenteral iron supply. The results showed that two or three injections of iron-dextran were more effective in the control of iron deficiency anemia.

 

KEYWORDS: bovine neonates, iron deficiency anemia

 

INTRODUÇÃO

O ferro é considerado elemento fundamental para várias funções orgânicas dos mamíferos (Atyabi et al. 2006) e sua deficiência causa debilidade ao organismo (HENTZE et al., 2004). A anemia ferropriva é mais frequente em animais recém-nascidos devido ao rápido crescimento dos animais nos primeiros dias de vida, ao baixo conteúdo de ferro no leite e no colostro e à baixa reserva orgânica do mineral (Smith, 2009). Em bezerros, a anemia ferropriva cursa sem que se percebam sintomas, sendo diagnosticada apenas com auxílio de exames laboratoriais (Rizzoli et al., 2006). ATYABI et al. (2006) relataram que bezerros lactentes necessitam teor de ferro muito maior do que aquele disponível no leite, sendo essencial sua suplementação para o desenvolvimento adequado do neonato.

A importância biológica do ferro é amplamente atribuída a sua propriedade química como um metal de transição. Esta mesma propriedade explica porque o excesso de ferro é tóxico: a sobrecarga de ferro ocasiona saturação excessiva nos sítios de ligação com a transferrina; assim, o ferro passa a circular na forma livre. No citoplasma, uma considerável fração de ferro é reduzida e pode reagir com peróxido de hidrogênio, gerando radicais livres, que lesionam as membranas lipoprotéicas e os ácidos nucléicos; portanto, as conseqüências patológicas do excesso de ferro sistêmico estão relacionadas com o acúmulo crônico do mineral nos tecidos (HENTZE et al. 2004). Segundo MILLER et al. (1991), menor consumo de alimento, diminuição da taxa de crescimento e da eficiência da conversão alimentar são sinais característicos de intoxicação crônica por ferro; o grau de toxicidade está diretamente relacionado com a biodisponibilidade do composto utilizado na suplementação.

O objetivo do presente estudo foi avaliar as concentrações séricas de ferro, creatinina, uréia e bilirrubinas, bem como as atividades das enzimas gama glutamiltransferase, aspartato aminotransferase e fosfatase alcalina de bezerros neonatos da raça Holandesa, submetidos a quatro protocolos de aplicação injetável de ferro dextrano, com o objetivo de avaliar os efeitos destes procedimentos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Foram analisadas amostras de sangue de 40 bezerros recém-nascidos da raça Holandesa, distribuídos em cinco grupos, de acordo com o tipo de suplementação de ferro dextrano injetável administrada: Grupo 1 - controle; Grupo 2 – administração intramuscular (IM) de 5mL de ferro dextrano aos 5 dias de idade; Grupo 3 - administração IM de 5mL de ferro dextrano aos 5 e 20 dias de idade; Grupo 4 - administração IM de 5mL de ferro dextrano aos 5  e 30 dias de idade; e Grupo 5 - administração IM de 5mL de ferro dextrano aos 5, 20 e 45 dias de idade. Os animais foram mantidos com as mães até completarem três dias de idade e, após a colostragem, foram transferidos para baias individuais, onde recebiam apenas leite de vaca integral até completarem 60 dias de idade.

Para realização dos exames bioquímicos séricos, amostras de sangue foram obtidas por venopunção jugular em seis momentos: por ocasião do nascimento (M1) e aos 5 (M2), 10 (M3), 20 (M4), 30 (M5) e 60 (M6) dias de idade. Foram determinadas as concentrações séricas de ferro (método de Goodwin modificado), creatinina (método de Basques-Lustosa), uréia (método da urease) e de bilirrubinas total e direta (método Sims-Horn), bem como as atividades das enzimas gama glutamiltransferase (método de Szasz modificado), aspartato aminotransferase (método de Reitman-Frankel) e fosfatase alcalina (método de Bowers e McComb modificado), utilizando-se conjunto de reagentes comerciais (Labtest Diagnóstica, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil). As leituras das amostras foram realizadas em espectrofotômetro semi-automático (Labquest, Labtest, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil), com luz de comprimento de onda apropriado para cada teste.

            Para a análise estatística utilizou-se um delineamento com parcelas subdivididas (split-plot) com medidas repetidas no tempo. As estatísticas F calculadas foram consideradas significativas quando P<0,05. Os contrastes entre pares de médias foram determinados pelo teste de Tukey.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os teores séricos de ferro, creatinina, uréia, bilirrubinas total e direta e as atividades das enzimas gama glutamiltransferase, aspartato aminotransferase e fosfatase alcalina dos bezerros da raça Holandesa submetidos a quatro protocolos de ferro dextrano suplementar estão apresentados a seguir, na forma de média e desvio-padrão.

Nos bezerros dos Grupos 1 e 2, o teor sérico de ferro não apresentou variação significativa (P<0,05) entre os momentos, com valores que oscilaram entre 96,4±57,8 µg/dL a 167±52,6 µg/dL. No grupo 3 ocorreu aumento significativo nos momentos 3 e 5, o que pode ser justificado pela aplicação intramuscular de ferro dextrano aos 5 (M2) e aos 10 (M3) dias de idade. No grupo 4, apesar da aplicação de ferro aos 20 dias (M4), o teor sérico diminuiu no momento 5. No grupo 5, a maior concentração de ferro foi verificada aos 60 dias de idade (M6), fato que pode ser explicado pela aplicação intramuscular do mineral aos 45 dias após o nascimento. Apenas em M6 (60 dias de idade) notou-se diferença significativa entre os grupo 5 e os demais grupos. Segundo KNOWLES et al. (2000), a concentração sérica de ferro em bezerros recém-nascidos diminui com a idade e só aumentam após 83 dias de vida.

A concentração sérica de creatinina variou de 0,74±0,34 mg/dL a 1,90±0,49 mg/dL, sem diferença significativa entre os grupos. Em todos os grupos, os teores séricos de creatinina foram maiores logo após o nascimento (M1), diminuindo e mantendo-se estáveis nos demais momentos, concordando com os achados de KNOWLES et al. (2000). Os valores encontraram-se dentro da faixa de normalidade para espécie (FAGLIARI et al., 1998, KNOWLES et al., 2000).

Os teores séricos de uréia não apresentaram diferença significativa entre os grupos, tampouco entre momentos, variando de 16,4±3,10 mg/dL a 31,2±16,6 mg/dL. Tais achados diferem do relato de KNOWLES et al.(2000), que constataram valores  superiores logo após o nascimento, diminuindo após 6 dias de idade.

Em todos os grupos atividade sérica da enzima gama glutamiltransferase foi maior em M1, variando de 375±316 U/L a 1.399±686 U/L, em razão da ingestão de colostro, com diminuição a partir de M2, até M6, quando se notou valor de 22,0±4,90 U/L. Também, notou-se diferença significativa entre os grupos no momento 1, fato que se deve às diferentes quantidades e qualidades de colostro ingerido pelo animal. Segundo ZANKER et al. (2001), a alta atividade sérica de gama glutamiltransferase em ruminantes neonatos é indicativa de ingestão adequada de colostro. Segundo KNOWLES et al. (2000), a atividade sérica desta enzima só atinge os valores de referência de adultos, aproximadamente, aos 40 dias de idade. Em relação à atividade sérica de aspartato aminotransferase, o maior valor foi constatado em M1 (logo após o nascimento), em bezerros do Grupo 2, ou seja 240±487 U/L. Não houve variação significativa nos demais grupos e momentos, com valores oscilando entre 30,1±6,72 a 77,7±58,0 U/L. A atividade sérica da enzima fosfatase alcalina variou entre os grupos e os momentos, com valores de 121±59 U/L a 530±226 U/L, com valor máximo logo após o nascimento, achado também relatado por FAGLIARI et al. (1998).

As concentrações séricas de bilirrubina total e direta variaram de 0,28±0,10 a 0,80±0,42 mg/dL e de 0,07±0,04 a 0,28±0,13 mg/dL, respectivamente, sem diferença significativa entre os grupos e discreta variação entre os momentos, com valor máximo ao nascimento e decréscimo gradativo em função da idade, à semelhança do relatado por FAGLIARI et al. 1998.

 

CONCLUSÃO

As concentrações séricas de ferro dos bezerros aumentaram logo após a administração de ferro injetável, nos grupos que receberam mais de uma aplicação, sugerindo que todos os protocolos que implicaram na administração injetável de ferro dextrano foram efetivos no controle de anemia ferropriva. As concentrações séricas de creatinina, uréia e bilirrubinas total e direta e as atividades das enzimas gama glutamiltransferase, aspartato aminotransferase e fosfatase alcalina foram compatíveis para a espécie bovina nesta faixa etária, sugerindo que nenhum dos protocolos de suplementação de ferro ocasionou hepatoxidade ou nefrotoxidade aos animais.

 

 

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPESP pela concessão de auxílio financeiro para a realização deste projeto.

 

REFERÊNCIAS

Atyabi, N.; Gharagozloo, F.; Nassiri, S. M. The necessity of iron supplementation for normal development of commercially reared suckling calves. Comparative Clinical Pathology, London, v.15, n.3, p.165–168, 2006.

FAGLIARI, J. J.; SANTANA, A. E.; LUCAS, F. A.; CAMPOS FILHO, E.; CURI, P. R. Constituintes sanguíneos de bovinos recém-nascidos das raças Nelore (Bos indicus) e Holandesa (Bos taurus) e de bubalinos (Bubalus bubalis) da raça Murrah. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, Belo Horizonte, v. 50, n. 3, p. 253-262, 1998.

Hentze, m. w.; Muckenthaler, M. U.; Andrews, n. c. Balancing acts molecular control of mammalian iron metabolism. Cell, Cambridge, v. 17, n. 3, p. 285-297, 2004.

KNOWLES, T. G.; EDWARDS, J. E.; BAZELEY, K. J., BROWN, S. N., BUTTERWORTH, A.; WARRISS, P. D. Changes in the blood biochemical and haematological profile of neonatal calves with age. Veterinary Record, London, v. 147, p. 593-598, 2000.

MILLER, W. J.; GENTRY, R. P.; BLACKMON, D. M. et al. Effects of high dietary iron as ferrous carbonate on performance of young dairy calves. Journal of Dairy Science, Champaign, v. 74, n. 6, p. 1963-1967, 1991.

RIZZOLI, F. W., FAGLIARI, J. J., SILVA, D. G. Teores séricos de cálcio, fósforo, magnésio e ferro de bezerros recém-nascidos que mamaram colostro diretamente na vaca ou em mamadeira. Ars Veterinaria, Jaboticabal, v. 22, n. 3, p. 4-8, 2006.

Smith. P. S. Large animal internal medicine. 4.ed, Saint Louis: Mosby/Elsevier. 2009. 1821p.

ZANKER, I. A.; HAMMON, H. M.; BLUM, J. W. Activities of γ-glutamyltransferase, alkaline phosphatase and aspartate-aminotransferase in colostrum, milk and blood plasma of calves fed first colostrum at 0-2, 6-7, 12-13 and 24-25 h after birth. Journal of Veterinary Medicine, Berlin, v. 48, p. 179-185, 2001.