DOI: 10.5216/cabv.v11i4.6910

ANÁLISE HISTOLÓGICA, HISTOQUÍMICA E ULTRAESTRUTURAL DA MUSCULATURA DORSAL E VENTRAL DO GUARU (Poecilia vivipara BLOCHI & SCHNEIDER, 1801)


Ana Paula Rezende dos Santos,1 Joana Cristina Neves de Menezes Faria2 e
Simone Maria Teixeira de Sabóia-Morais3

1. Mestranda em Biologia Celular e Molecular, pela Universidade Federal de Goiás.
E-mail: ana_p_bio@yahoo.com.br
2. Professora substituta de Biologia Celular e Histologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFG
3. Professor associado II da Universidade Federal de Goiás.


RESUMO

Poecilia vivipara (guaru), peixe neotropical de pequeno porte, eurialino, tem sido usado como biomonitor. Analisou-se a musculatura dorsal e ventral do guaru, a fim de se padronizar metodologias para avaliação da estrutura normal deste tecido, com a perspectiva de que sejam usados em estudos de toxicidade. Para tanto, realizaram-se fixações químicas e físicas, que visaram procedimentos histológicos e histoquímicos de coloração e reação. Os métodos H.E. e TM evidenciaram a organização das FMEE, com feixes musculares epiaxial e hipaxial e conjuntivo associado. O AM marcou as FMEE e facilitou a observação dos sarcômeros com a presença de uma fina faixa corada metacromaticamente. Parte das FMEE foi PAS positiva e amilase reativa, indicando a distribuição de glicogênio entre as fibras. Na presença do SBB, as fibras foram reativas, principalmente na região dorsal, indicando a presença de lipídeos. Na SDH pH 10,5 detectou-se presença de células com citoplasma rico em enzimas mitocondriais. As FMEE coradas com AT apresentaram-se organizadas em faixas transversais alternadas, que correspondem ao padrão visualizado ao MET. O uso destas metodologias permitiu indicar a musculatura do guaru como um instrumento para estudos de variações ambientais, visto que sua estrutura normal é padrão nos teleósteos.

PALAVRAS-CHAVES: Fibra muscular, morfologia, peixe neotropical.  


ABSTRACT

HISTOLOGICAL, HISTOCHEMICAL AND ULTRASTRUCTURAL ANALYSIS OF THE DORSAL AND VENTRAL MUSCULATURE OF THE GUARU (Poecilia vivipara BLOCHI & SCHNEIDER, 1801)

Poecilia vivipara (guaru), a neotropical, small, euryhaline fish, has been being used as a biomonitor. Dorsal and ventral muscles of Poecilia vivipara were analyzed to standardize methodologies for evaluating the normal tissue structure, in order to use them in toxicity studies. Thus, chemical and physical fixations were carried out, aiming at the histological and histochemical procedures of staining and reaction. The methods HE and MT revealed the organization of SSMF with epiaxial and hypaxial muscle bundles and associated conjunctive. MA marked the SSMF and facilitated the observation of sarcomeres in the presence of a thin metacromatically stained band. Part of the SSMF was positive PAS and reactive amylase, indicating the distribution of glycogen within the fibers. In the presence of SBB the fibers were reactive mainly in the dorsal region, indicating the presence of lipids. Cells with mitochondrial enzyme-rich cytoplasm were found in SDH pH 10.5. The SSMF stained with AT were arranged in alternating transverse bands, which correspond to the pattern seen under the MET. The use of these methodologies allowed the indication of Poecilia vivipara muscles as a tool for environmental variations studies, because its normal structure is standard in teleosts.

KEYWORDS: Morphology, muscle fiber, neotropical fish.


 INTRODUÇÃO

O movimento em organismos multicelulares é desempenhado por células especializadas, as fibras musculares, e contraem-se de acordo com estímulos apropriados (HUXLEY, 1954). Os estímulos desencadeiam ativações moleculares e permitem que conjuntos de proteínas contráteis respondam de forma eficaz, na dependência de energia e funcionalidade de outras moléculas para desempenharem sua atividade (ALEXANDER, 2004).
A organização das fibras musculares em peixes elasmobrânquios e teleósteos corresponde a um músculo axial, constituído principalmente de fibras brancas-rápidas, que são cobertas por uma camada fina de fibras musculares vermelhas-lentas, com uma camada de fibras-rosa entre elas (SANTOS, 2007). As fibras vermelhas possuem alta capacidade aeróbica e contração lenta, tendo a cor do músculo relação como grau de vascularização das fibras, em consequência da grande quantidade de mioglobinas e citrocromos (KIESSLING et al., 2006). As fibras brancas possuem alta capacidade anaeróbica e glicolítica, além de rápida contração, correspondendo nunca menos que 70% dos músculos esqueléticos (SÄNGER & STOIBER, 2001; CEDIEL et al., 2008). Mitocôndrias, que interrompem a organização das miofibrilas, são poucas, bem como gotas lipídicas e mioglobinas estão presentes em pequena quantidade (KIESSLING et al., 2006). As fibras rosas, ou intermediárias em jovens e adultos de teleósteos, estão entre as fibras musculares branca e vermelha. Caracterizam-se pela rápida contração, resistência à fadiga e velocidade de encurtamento (KIESSLING et al., 2006).
A presença de um ou mais tipos de fibras e a distribuição e frequência dos subtipos são determinantes das características metabólicas e contráteis do músculo esquelético, revelando suas propriedades bioquímicas e fisiológicas. É válido ressaltar que o fenótipo definitivo de fibras musculares esqueléticas adultas é resultado de eventos que começam no embrião e são modulados no decorrer da vida do organismo (SARTORI et al., 2001).
O conhecimento quantitativo da composição química dos músculos de peixes de interesse comercial é importante para a formulação de dietas apropriadas, para a definição de procedimentos técnicos e para as indústrias de processamento de pescado (SALES & SALES, 1990).
O estudo dos componentes biológicos em peixes tem sido utilizado como bioindicador de qualidade ambiental. Substâncias tóxicas lançadas no ambiente por ações antrópicas fazem com que estes interajam com o organismo vivo, provocando alterações que podem gerar graves desequilíbrios ecológicos (ARIAS et al., 2007). Segundo SELLANES et al. (2002), a musculatura de peixes serve para monitoramento dos teores de mercúrio total nos organismos aquáticos utilizados para consumo humano, tanto pelas autoridades sanitárias quanto pela sociedade, por ações antrópicas.
Diversos estudos têm sido realizados com o intuito de se verificar a acumulação tanto de mercúrio quanto de outros metais pesados (SELLANES et al., 2002; PLOETZ et al., 2007; SEIXAS et al., 2007). Para averiguar o grau de contaminação de ambientes aquáticos por metais pesados Zn, Cu, Mn e Cd, foram realizados estudos de monitoramento da concentração desses metais no fígado, pele e músculo do Lethrinus lentjan (Lacepéde, 1802), constatando-se que as maiores concentrações de cádmio foram encontradas no fígado e no músculo, sugerindo que tais tecidos são bons bioindicadores (AL-YOUSUF et al., 2000).
O pescado, quer de água doce, quer marinho, não tem sido fiscalizado de maneira sistemática como é necessário, por órgãos oficiais, conforme KITAHARA et al. (2000), o que justifica o uso de espécimes forrageiros como biomonitores em condições ambientais naturais ou no cativeiro.
Neste estudo, foi utilizado como elo biológico o guaru, recebendo outras denominações vulgares no Brasil segundo IHERING (1931). Sua classificação taxonômica obedeceu aos critérios de ROSEN & CORNFORD (1963), como segue: Poecilia vivipara, pertencentes à ordem Cyprinodontiformes e à família Poeciliidae.
Os guarus são espécimes larvófagos, onívoros e cosmopolitas do continente americano, usados como espécimes forrageiros em criadouros de peixes. O fato de serem eurialinos, ou seja, responderem e se adaptarem a variações de salinidade nos corpos d´água,  permite que estes sejam responsivos às condições adversas do ambiente aquático (SABÓIA-MORAIS, 1996).
A proposta deste trabalho foi estudar a distribuição histológica das fibras musculares estriadas esqueléticas na musculatura dorsal e ventral do P. vivipara, analisar respostas de fibras constituintes destes músculos através do uso de histoquímica e determinar o procedimento de fixação e meio de inclusão que melhor preserve a morfologia e os sítios de reação para fins de contribuir com a biologia da conservação.

MATERIAL E MÉTODOS

Coletaram-se seis fêmeas adultas guarus em tanques específicos (16o 35’ 37”S e 49o 16’ 50” W), sendo transferidas para o Laboratório de Comportamento Celular (LCC). Foram aclimadas durante 48 horas em aquários de quarenta litros, dotados de aeração promovida por bombas de ar, com temperatura da água mantida a ± 27ºC. O fotoperíodo (claro/escuro) era de ciclos com 12:12 horas. O quantitativo de amônia dissolvida na água era de 0 μl/L a 0,01μ/L. A alimentação diária foi feita com ração comercial (Alcon COLOURS®). Removeram-se restos de alimento e fezes diariamente, com sifão, seguindo-se de reposição do volume da água.
Os guarus foram expostos à hipotermia, decapitados, eviscerados e tiveram sua musculatura total fixada em diferentes soluções como paraformaldeído a 10% e em tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 over night, também em Bouin, Carnoy, Zenker, e McDowell. Incluíram-se alguns fragmentos de músculo em parafina e outros em historresina (Historresina Leica - USA), sendo seccionados a 4 e 2µm, respectivamente.
Submeteu-se o material cortado aos métodos histológicos: hematoxilina e eosina, azul de toluidina + floxina, azul de metileno e tricrômico de masson, para ser observada a organização geral das fibras musculares.
Para a análise histoquímica foram utilizados: ácido periódico Schiff (PAS), com a finalidade de detectar glicoconjugados neutros, e diastase + PAS, para diagnosticar a presença de glicogênio.
Realizou-se Sudan Black B para se verificar a distribuição e a quantidade de lipídeos. A análise da tipagem muscular foi feita por meio da técnica succinodesidrogenase em pH 10,5, após pré-incubação ácida (pH 4,6), para a detecção de enzimas mitocondriais e com isso ser diagnosticado o tipo de contração (rápida ou lenta) que a fibra muscular apresenta.
Para análise do material em microscopia eletrônica, o tecido foi imediatamente imerso em uma solução fixadora por 2,5% de glutaraldeído (GTA) + 4% tampão fosfato (PFA) em tampão cacodilato de sódio 0,1mmol/L, pH 7,4, por três horas a 4ºC.
Em seguida, o material passou por um processo de pós-fixação em OsO4 2% por uma hora. Após a desidratação, o tecido muscular foi embebido em resina Spurr. As secções semifinas com 0,5 μm de espessura foram coradas com azul de toluidina. Posteriormente, os cortes ultrafinos com 70 nm de espessura foram contrastados com acetato de uranila 0,5% e citrato de chumbo 1% e analisados no microscópio eletrônico de transmissão (Jeol 1200 EXII).

RESULTADOS

Em análise dos meios de fixação propostos, detectou-se que o fixador mais adequado para o tecido em estudo foi o paraformaldeído a 10% em tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4. O Bouin, Zenker e o Carnoy não foram eficientes para a preservação do tecido muscular em todos os sítios estudados. A fixação realizada com uso de crioprotetor associado a nitrogênio líquido caracterizou-se como eficaz para a preservação das proteínas e outros componentes químicos.
A historresina mostrou-se como o meio de inclusão química mais adequado, visto que se manteve a morfologia tecidual, com melhores resultados do que a parafina. A coloração pelo tricrômico de Masson possíbilitou observar a estrutura geral dos feixes musculares, cuja coloração vermelha intensa marcou todas as fibras musculares epiaxiais e hipoaxiais (Figura 1). Nas fibras da região epiaxial, a organização dos miótomos apresentou-se com maior adensamento em relação à porção hipaxial. Foi possível perceber na região dorsal a presença de duas estruturas musculares denominadas supracarinalis, as quais, segundo WINTERBOTTOM (1974), são como feixes de cordões pareados, que se localizam ao longo da região dorsal e interconectam os elementos de suporte das nadadeiras pares e mediana. Estas são individualizadas do restante dos miótomos hipoaxiais por tecido conjuntivo denso. Observou-se também que os feixes musculares encontram-se envolvidos por fibras colágenas (Figura 1).
Os miótomos epiaxiais mostraram-se subdivididos por um septo de tecido conjuntivo denominado septo vertical, o qual formou um eixo divisor desde a região dorsal até a coluna vertebral, do qual partiram feixes de fibras colágenas que subdividiam os miótomos (Figura 1).
Nos cortes corados em HE, as fibras musculares mostraram-se acidófilas (Figura 2), ao passo que seus núcleos periféricos eram basófilos.
A coloração azul de metileno evidenciou fibras musculares organizadas segundo um padrão de faixas transversais alternadas, coradas em tons crescentes de azul com uma fina faixa corada metacromaticamente (Figura 3).
Na coloração pelo azul de toluidina junto com a floxina, as bandas A das miofibrilas estavam representadas como espessas listras verticais violetas, em virtude do padrão de metacromasia. As bandas claras estiveram coradas em azul e nesta as bandas I foram atravessadas por linhas escuras denominadas linhas Z. Estas igualmente apresentam padrão metacromático, dividindo uma banda I em duas hemibandas. Os núcleos localizam-se perifericamente nas fibras e apareceram corados em azul intenso (Figura 4).
Pelo PAS (ácido periódico Schiff), foi possível a identificação das fibras glicolíticas, ou seja, fibras musculares que possuem o glicogênio em grande quantidade e são de contração lenta (fibras vermelhas). As fibras musculares esqueléticas reagiram de forma distinta ao PAS. As regiões epiaxial e superficial apresentaram maior positividade ao reativo, apesar de haver regiões em que foi possível se observar uma mistura de fibras com diferentes padrões de reatividade (Figura 5a). Nos cortes que foram submetidos ao bloqueio pela diástase, constatou-se que o conteúdo tratava-se de glicogênio, uma vez que elas não foram reativas ao PAS, após a atividade enzimática ter se realizado (Figura 5b).
A musculatura esquelética do guaru apresentou positividade para a reação do Sudan Black B, que faz a marcação de lipídeos. Tanto na região dorsal quanto ventral do peixe, constatou-se a presença de fibras ricas em miofilamentos reativos aos Sudan Black B, sendo que a positividade é maior em fibras vermelhas (Figura 6).
Pela succinodesidrogenase (SDH) pH 10,5, foi confirmada a presença de células com citoplasma pobre em enzimas mitocondriais na porção ventral, ou seja, onde havia fibras brancas (Figura 7), havia muitas fibras musculares reativas, principalmente na região epiaxial, rica em fibras vermelhas.
A microscopia eletrônica de transmissão possibilitou observar os sarcômeros repetindo-se ao longo da miofibrila, separados por duas estrias finas e eletrondensas, as chamadas linhas Z, e estando presentes neste espaço a banda A e dois segmentos de banda I (Figura 8). E entre as miofibrilas foi possível notar a presença de retículo sarcoplasmático e mitocôndrias, as quais se localizavam com grande frequência na região adnuclear e nas proximidades do sarcolema (Figura 9).

DISCUSSÃO

Ao comentar os resultados deste estudo, pode-se entender que a padronização do método de fixação é essencial para que trabalhos de análise quantitativa e qualitativa em músculo de peixes sejam realizados com segurança, posto que a metodologia inadequada de fixação leva à obtenção de resultados discrepantes (EGGINTON & CORDINER, 1995).
O Bouin, em virtude de suas propriedades coa­gulantes (AMARAL et al., 2004), não preservou o tecido muscular, pois promoveu retração dos miótomos e das fibras, desordenando a morfologia tecidual. O mesmo foi aceito para o Zenker e para o Carnoy. Entendeu-se que isso se deva aos sítios de preservação que estes fixadores promovem.
O bom resultado obtido com paraformaldeído a 10% em tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 provavelmente se deva à sua capacidade de manutenção da química das estruturas proteicas. O mesmo observado com a crioproteção, que manteve a morfologia do tecido de forma satisfatória. Tais dados estão de acordo com TAKAHASHI (1988), que indicou que a boa preservação de proteínas e enzimas musculares é feita pela fixação física e por poucas misturas fixadoras químicas, das quais as mais indicadas são as que possuem aldeídos em sua composição.
A historresina foi considerada neste estudo como o mais adequado método de inclusão química, primeiramente em razão da temperatura de processamento do material. Além de outras vantagens como a polimerização à temperatura ambiente, além de a resina permitir a fácil integração dos cromógenos com os sítios ligantes. Isto possibilita a realização de cortes mais finos e consequentemente maiores detalhes nas análises feitas.
A parafina, ao exigir temperatura em torno de 65ºC, promoveu a retração do tecidos muscular, bem como a desnaturação protéica, o que no caso deste estudo foi desvantajoso.
O padrão geral de organização das fibras musculares esqueléticas dos vertebrados, quando analisadas sob luz polarizada, mostrou diferenças quanto à refringência. As bandas coradas em escuro birrefringentes, denominadas anisotrópicas, correspondem à banda A, ao passo que as claras são isotrópicas e correspondem às bandas I (BARRAL & EPSTEIN, 1999).
Esse perfil é semelhante ao descrito por BARRAL & EPSTEIN (1999), por ocasião da utilização da coloração azul de toluidina, em que foi possível visualizar as bandas A coradas em violeta e as bandas I em azul, representando um padrão metacromático na miofibrila, que refletiu a refringência observada por meio da luz polarizada. 
As fibras musculares posicionadas na periferia dos feixes musculares, ou seja, na região epiaxial e lateral do guaru, apresentaram maior positividade ao PAS, em relação à porção hipaxial, sendo essa reação indicativa da presença de glicoproteínas neutras e glicogênio. No PAS, ocorreu a oxidação aos grupamentos 1-2 glicol, produzindo aldeídos, e estes foram reagentes com a fucsina descorada, chamada de reativo de Schiff, dando um composto de adição, violeta e insolúvel. Esse mesmo resultado foi obtido por KIESSLING et al. (2006), em análise do padrão de distribuição de glicogênio ao longo de toda a musculatura de peixes teleósteos. Estas fibras, segundo os autores referidos, são vermelhas e de contração lenta.
A positividade ao Sudan Black B, que identifica lipídeos, ocorreu principalmente nas fibras posicionadas nas regiões dorsal e lateral. Da mesma forma como ocorreu a reatividade ao PAS. Pode-se, portanto, inferir que estas fibras são vermelhas e desempenham um trabalho lento, de longa duração, com pouco gasto de energia adquirida através do metabolismo oxidativo, que caracteristicamente estas fibras contêm (DAL PAI et al., 2000; SANTOS, 2007).
Observou-se que fibras musculares não reativas às SDH localizaram-se principalmente nas regiões ventral ou hipaxial do guaru. Essa reação é indicativa de células com citoplasma rico em enzimas mitocondriais, sugerindo que as regiões não reativas são constituídas por fibras musculares brancas (CHAUVIGNÉ et al., 2005; SANTOS, 2007).
As fibras vermelhas dos guarus apresentaram maior reatividade ao SDH em relação às fibras rosa e branca, que foram fracamente reativas. Esses dados estão em consonância com os obtidos por THÉBAULT et al. (2005), que, em estudo histoquímico e enzimático da musculatura do teleósteo Scyliorhinus canicula (Linnaeus, 1758), observaram que as fibras vermelhas possuíam maior reatividade ao SDH em relação às fibras rosa e branca, que foram fracamente coradas. Neste mesmo estudo, constatou-se que a NADH possui reação compatível à obtida para SDH, o que permite supor que em musculatura de peixes o emprego de uma das duas metodologias é suficiente para se analisar as reações e a tipagem das fibras musculares.
Nas análises ao M.E.T., foi possível perceber que são encontradas mais fibras ricas em mitocôndrias na região dorsal da musculatura do que na região ventral. De acordo com SANTOS (2007), a grande quantidade de mitocôndrias dessas fibras se deve à alta capacidade aeróbia que as fibras vermelhas possuem.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, sugere-se que as distribuições de fibras musculares do guaru podem ser usadas para detectar reações adversas a agentes intervenientes indesejáveis na água, uma vez que estes poderiam interferir na organização e disposição normais de proteínas, lipídeos e polissacarídeos distribuídos nas fibras musculares estriadas esqueléticas. O guaru seria um biomonitor, sendo que as alterações na distribuição de fibras musculares poderiam indicar processos de intoxicação do animal relacionados a alterações ambientais.

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Protocolado em: 20 ago. 2009.  Aceito em: 5 ago. 2010.