DOI: 10.5216/cab.v11i1.6747
FATORES RELACIONADOS AO RENDIMENTO DE CARCAÇA DE NOVILHOS OU NOVILHAS SUPERJOVENS, TERMINADOS EM PASTAGEM CULTIVADA
Fabiano Nunes Vaz,1 João Restle,2 Miguelangelo Ziegler Arboitte3
Leonir Luiz Pascoal,4 Cristian Faturi5 e Guilherme Joner6
1. Doutor, professor da Universidade Federal do Pampa – Email: fabianovaz@unipampa.edu.br.
2. PhD, professor visitante da Universidade Federal de Goiás
3. Instituto Federal de Catarinense - Campus Sombrio
4. Doutor, professor da Universidade Federal de Santa Maria
5. Doutor, professor da Universidade Federal Rural da Amazônia
6. Acadêmico de zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria.
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo
estudar os fatores corporais envolvidos na variação do rendimento de
carcaça em machos castrados ou fêmeas não prenhes, abatidos aos
quatorze meses de idade. Os animais foram terminados com suplementação
energética sobre pastagem cultivada. Utilizaram-se doze animais de cada
sexo, mestiços Nelore (3/8) x Hereford (5/8), contemporâneos do mesmo
rebanho. Os pesos de fazenda, de frigorífico e de carcaça quente foram
superiores nos machos, sendo de 365,8; 350,4 e 203,4 kg,
respectivamente, enquanto as fêmeas apresentaram 310,3; 294,5; e 168,6
kg, citados na mesma ordem. Bovinos machos também apresentaram maiores
rendimentos de carcaça quente em relação ao peso de fazenda (55,6 vs
54,4%) e em relação ao peso de frigorífico (58,1 vs 57,2%) do que as
fêmeas. O menor rendimento de carcaça das fêmeas deveu-se ao maior
percentual de couro (9,03 vs 7,96%), gordura inguinal, junto ao úbere
das fêmeas ou à capadura dos machos (1,02 vs 0,67%), trato digestivo
cheio (19,35% vs 16,84%), rúmen mais retículo vazios (2,34 vs 1,91%) e
intestino vazio (2,54% vs 2,11%). Não houve diferença significativa
entre sexos nos percentuais de coração, fígado, pulmões, rins e baço,
sendo, respectivamente, 0,40%, 0,93%, 1,01%, 0,22% e 0,35% nos machos e
0,41%, 0,98%, 1,02%, 0,22% e 0,30% nas fêmeas, citados na mesma ordem.
PALAVRAS-CHAVES: Braford, couro, órgãos, rúmen, sexo.
ABSTRACT
The objective of the experiment was
to study the body factors related to the variation of dressing
percentage in castrated males or non-pregnant females, slaughtered at
fourteen months of age. The animals were finished with energetic
supplementation on cultivated pasture. Twelve contemporary animals of
each sex were used, all crossbred Nellore (3/8) x Hereford (5/8) from
the same herd. Farm live weight, slaughterhouse live weight and hot
carcass weight were superior in males, being 365.8; 350.4 and 203.4 kg,
respectively, while the females showed 310.3; 294.5; and 168.6 kg, in
the same order. Males also showed higher hot carcass dressing
percentage in relation to farm live weight (55.6 vs 54.4%) and in
relation to slaughterhouse weight (58.1 vs 57.2%) than females. The
lower female dressing percentage was a result of the higher hide (9.03
vs 7.96%), inguinal fat in the udder of heifers or cod fat of steers
(1.02 vs .67%), full digestive tract (19.35 vs 16.84%), empty rumen
plus reticulum (2.34 vs 1.91%) and empty intestine (2.54 vs 2.11%)
percentages. There was no significant difference between sexes in
heart, liver, lungs, kidneys and spleen percentages, being,
respectively, 0.40, 0.93, 1.01, 0.22 and 0.35% in males and 0.41, 0.98,
1.02, 0.22 and 0.30% in females, cited in the same order.
KEY WORDS: braford, hide, organs, rumen, sex.
INTRODUÇÃO
Atualmente, existem dois fatores
marcantes no segmento da pecuária de corte brasileiro: o primeiro diz
respeito à modernização e intensificação dos sistemas produtivos; e o
segundo é a crescente demanda por carne de melhor qualidade. A
intensificação dos sistemas tem aumentado as taxas de natalidade e
reduzido a idade de abate dos animais, resultando, assim, em animais
abatidos em idade jovem, com bom acabamento e carne de excelente
qualidade (RESTLE & VAZ, 1997).
As pesquisas que analisam a viabilidade de machos bovinos inteiros ou
castrados, terminados com menos de dezoito meses de idade, mostram bons
resultados econômicos (PACHECO et al., 2006b; RESTLE et al., 2007).
Também a terminação de novilhas jovens, embora com resultados
econômicos levemente inferiores (COUTINHO FILHO et al., 2006), tem sido
indicada como estratégia dos sistemas produtivos que atingem altas
taxas de natalidade, constituindo, dessa forma, uma opção a mais para
melhorar a qualidade da carne oferecida ao consumidor.
Em outros países que já atingiram altos índices de produtividade na
pecuária de corte, a terminação de novilhas jovens é prática comum
desde longa data (KROPF & GRAF, 1959). Dado que os frigoríficos
começam a vislumbrar crescimento na demanda de carne bovina para
exportação, e aumenta a exigência de mercado interno para qualidade de
carne, lentamente ocorre a redução da última barreira a essas
categorias, relacionada ao peso de carcaça de animais jovens.
VAZ & RESTLE (2000) salientam aos produtores que o uso de
categorias precoces, embora mais leves ao abate, traz benefícios no que
diz respeito à melhor eficiência alimentar dos animais. No entanto,
para os mesmos autores citados, a terminação de animais jovens exige
trabalhar com altos níveis nutricionais, o que pode ser conseguido
mediante pastagens cultivadas, principalmente quando estas estão
aliadas à suplementação energética.
PAULINO et al. (2008) demonstraram que as fêmeas jovens possuem
eficiência alimentar na transformação de alimento em peso de carcaça
superior ao de machos inteiros e semelhante ao dos machos castrados.
Entretanto, os produtores comercializam seus produtos tomando por base
o rendimento de carcaça. Assim sendo, se o rendimento de carcaça das
novilhas for menor que o rendimento dos machos castrados, o
investimento em alimentação dos animais terá sido menos eficiente. Além
disso, na maioria dos casos, por ocasião da comercialização de novilhas
jovens, os produtores recebem dos frigoríficos a mesma remuneração paga
por quilograma de carcaça de vacas velhas de descarte.
A explicação para isso está no fato de existir conhecimento sobre os
rendimentos de machos e fêmeas adultos (DI MARCO, 1994; VAZ et al.,
2002). No entanto, ainda são escassas as informações a respeito dos
rendimentos de carcaça e de subprodutos de fêmeas jovens comparadas a
machos castrados, da mesma idade.
O rendimento de subprodutos é muito importante para as indústrias
frigoríficas, pois, a partir de um bom aproveitamento de subprodutos,
pode ser viabilizada uma melhor remuneração para animais jovens. Estes
geralmente possuem melhor qualidade do couro, por estarem expostos por
menos tempo aos fatores depreciantes, além de apresentarem melhor
sanidade, resultando em menor condenação de miúdos.
O objetivo deste trabalho é comparar as características de carcaça,
rendimento de subprodutos e outros fatores correlacionados com o
rendimento de carcaça de fêmeas e machos mestiços Nelore x Hereford
jovens, visando alicerçar conhecimentos sobre a produção de bovinos de
ambos os sexos para a produção de carcaças de qualidade superior,
usando a suplementação em pastagem cultivada.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido no Setor
de Bovinocultura de Corte do Departamento de Zootecnia da Universidade
Federal de Santa Maria, utilizando doze machos e doze fêmeas, mestiços
Nelore (3/8) x Hereford (5/8), contemporâneos, oriundos do mesmo
rebanho e mantidos nas mesmas condições de manejo e alimentação. Ao
abate, os animais possuíam idade média de quatorze meses.
Após o desmame aos oito meses, os animais permaneceram em pastagem cultivada de Avena strigosa + Lolium multiflorum de julho até outubro, e após foram mantidos em uma área cultivada com Pennisetum purpureum,
onde permaneceram até o abate, em dezembro do mesmo ano. Desde julho
até o abate, em dezembro, suplementaram-se os animais na quantidade
equivalente a 1% do peso vivo com grão de aveia ou de sorgo,
triturados, oferecidos duas vezes ao dia, tanto na pastagem de inverno
como na pastagem de verão.
O abate dos animais ocorreu em abatedouro comercial. Pesaram-se os
animais na fazenda antes do embarque, após um jejum de sólidos de doze
horas, e posteriormente no frigorífico, após duas horas de viagem.
O abate dos animais obedeceu ao fluxo normal do matadouro comercial. À
medida que os animais eram abatidos, foram sendo removidos e pesados
todos os órgãos, externos e internos, tão logo ocorria a eviscerção de
cada carcaça. Além das vísceras, também as carcaças foram pesadas logo
após o abate e antes da lavagem, obtendo-se o peso de carcaça quente.
Depois de pesadas, identificaram-se as carcaças, sendo resfriadas por
24 horas a -2º C. Depois, foram retiradas da câmara fria e novamente
pesadas, obtendo-se o peso de carcaça fria dos animais. A partir dos
pesos de carcaça quente e fria, calcularam-se os rendimentos em função
do peso vivo de fazenda e na chegada ao frigorífico. Os pesos dos
órgãos, pesados ainda quentes, foram ajustados para o peso de carcaça
quente dos animais, visando facilitar a discussão dos resultados.
As avaliações de área do músculo Longissimus dorsi
na altura da 12ª costela, conforme a metodologia sugerida por MÜLLER
(1987), foi realizada após o resfriamento das carcaças por 24 horas a
0°C. calcularam-se os percentuais de músculo, de osso e de gordura,
segundo a metodologia proposta por HANKINS & HOWE (1946).
Utilizou-se o delineamento experimental inteiramente casualizado, com
doze repetições por tratamento, correspondentes ao sexo dos animais,
conforme o modelo estatístico:
Yij = µ + αi + εij
sendo, Yij = o valor observado no i-ésimo sexo, na j-ésima repetição; µ
= a média geral da variável; αi = o efeito do i-ésimo sexo; εij = o
efeito aleatório associado a cada observação, pressuposto NID (0; σ² ).
Depois de coletados e tabulados, os dados foram submetidos à análise de
variância e teste t de Student ao nível de 5% de probabilidade de erro
(SAS, 1990).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na
Tabela 1
se observa que o peso do úbere das novilhas foi significativamente
maior (P<0,001) do que o peso da graxa existente sobre o púbis dos
machos, chamado popularmente de “graxa da capadura”. OWENS et al.
(1993) também relataram alto teor de gordura no úbere de fêmeas,
atribuindo tal fato ao alto nível de suplementação em pastagem durante
a terminação.
Em bovinos abatidos antes dos dois anos de idade, como no presente
trabalho, COUTINHO FILHO et al. (2006) verificaram maiores valores para
o peso (257 vs 202 kg) e o rendimento de carcaça (55,6 vs 52,8%) nos
machos não castrados Santa Gertrudis. Já as fêmeas da mesma raça
mostraram mais gordura renal-pélvica-inguinal (7,66 vs 5,88 kg), embora
não tenha sido observada diferença para espessura de gordura subcutânea
entre novilhos e novilhas.
Observou-se similaridade (P>0,05) nos percentuais de orelhas e de vassoura da cola (
Tabela 1),
que podem ser afetados por fatores raciais europeu x zebu. Também as
representatividades percentuais dos pesos da cabeça e das patas foram
similares (P>0,05) entre os dois grupos (
Tabela 1),
talvez pelo fato de os animais serem jovens, em idade na qual o
dimorfismo sexual está menos pronunciado. Com o avanço do dimorfimso
sexual, espera-se uma alteração do calibre e tamanho das estruturas
ósseas (BERG & BUTTERFIELD, 1976; DI MARCO, 1994), principal
componente nas pesagens da cabeça e das patas.
Removida a gordura presente na capadura dos novilhos ou no úbere das
novilhas, observa-se que a graxa de toalete não diferiu (P>0,05)
entre os dois grupos sexuais (
Tabela 1).
Na comparação de sexos usando bovinos Marchigiana x Nelore, observou-se
que as aparas de gordura foram menores nos machos, mas não houve
diferença quanto a retalhos magros, ossos e na quebra durante o
processo de desossa, na comparação entre sexos (JUNQUEIRA et al., 1998).
Todas as características apresentadas na
Tabela 1
são de interesse econômico para a indústria. A remoção da carne de
cabeça gera 0,69% do peso de carcaça de carne magra usada para
embutidos e carne moída. As patas geram tendões que são destinados à
exportação para a Ásia, além de óleo e ossos usados para sopas. A graxa
de toalete e a gordura de capadura são transformadas em sebo e
biodiesel. Os pelos da vassoura da cola são usados para fabricação de
escovas e vassouras e os pelos da orelha pra pincéis (CEZAR et al.,
2005). Entretanto, de todas as características listadas na
Tabela 1,
a maior representatividade econômica está no couro, que recebe
remuneração variável conforme as exportações de estofados, vestuário e
calçados de couro.
O percentual de couro foi significativamente maior (P<0,038) nas
fêmeas em relação aos machos, fator que também interfere no rendimento
de carcaça dos animais. TERRY et al. (1990) compararam novilhas e
novilhos de raças britânicas e mestiços zebu, verificando nos novilhos,
respectivamente, 8,19 e 8,94% de couro, e para as novilhas, 7,54 e
7,99%, citados na mesma ordem.
Um maior percentual de couro nas fêmeas poderia ser reflexo de um maior
trato digestivo, com maior arqueamento de costelas, o que permitiria à
fêmea consumir uma quantidade de forragem suficiente para manter a
gestação/lactação e a mantença/crescimento. Existindo maior arqueamento
de costelas, seria necessária uma maior quantidade de couro para
envolver o corpo.
Estudando as partes não integrantes da carcaça de novilhos abatidos em
três diferentes estágios de maturidade, RESTLE et al. (2005)
verificaram que o percentual de couro em relação ao peso de abate e em
relação ao peso de corpo vazio é semelhante à medida que aumenta o
estádio de maturidade de novilhos mestiços Nelore x bos taurus.
Ainda com respeito ao arqueamento de costelas, VAZ et al. (2002)
comentam que este é fator preponderante no rendimento de carcaça de
novilhos. Em vacas de descarte o arqueamento de costelas talvez possua
ainda maior representatividade, já que vacas que passaram por, no
mínimo, uma gestação precisam desenvolver as costelas, visando criar
espaço no ventre para suportar o crescimento fetal (BERG &
BUTTERFIELD, 1976). Essa teoria foi suportada por RESTLE et al. (2001),
ao verificarem que, em fêmeas Charolês, o rendimento de carcaça fria
foi mais alto em novilhas (51,1%) do que em vacas (48,9%); entretanto,
novilhas e vacas 3/4 Charolês 1/4 Nelore apresentaram rendimento de
carcaça similar.
O comentário anterior de que as novilhas possuíam maior conteúdo no trato digestivo que os novilhos foi confirmado na
Tabela 2.
O conteúdo do trato digestivo foi mais representativo nas novilhas do
que nos novilhos. Embora o peso vivo das novilhas fosse bem inferior ao
dos machos, como será visto mais adiante (
Tabela 5),
o conteúdo do trato digestivo pesou apenas 3 kg a menos (P>0,05). Em
valores percentuais, o trato digestivo cheio foi superior nas novilhas,
sendo de 19,35% contra 16,84% (P<0,042).
O peso vazio do rúmen + retículo foi superior nas novilhas
(P<0,005), justificando o maior peso relativo do conteúdo do trato
digestivo verificado nesses animais. Esses resultados mostram que as
fêmeas, mesmo jovens, possuem maior capacidade de ingestão de
alimentos, característica evoluída a partir da necessidade que esse
sexo possui de ingerir uma maior quantidade de alimentos em
determinadas fases de sua vida, visando atender não somente a
requerimentos de manutenção corporal e de ganho de peso, como os
machos, mas também a necessidades nutricionais para a lactação e/ou
gestação. Para a indústria frigorífica, o rendimento dos estômagos é
importante fonte de renda na comercialização de subprodutos, em função
da boa remuneração e do peso que representa por animal abatido.
Por outro lado, observando os dados de KUSS et al. (2007a), o conteúdo
do trato digestivo, em percentagem do peso de abate e em percentagem do
peso de corpo vazio, foi maior nas fêmeas mais leves. PACHECO et al.
(2005) compararam machos mestiços Charolês x Nelore abatidos com 15,2
ou 22,8 meses de idade e com peso de abate uniforme (430 kg),
verificando que os animais mais jovens apresentaram maiores percentuais
de rúmen + retículo vazios e de omaso vazio, embora não tenham
observado diferença significativa entre as idades de abate nos
percentuais de abomaso vazio e de intestinos vazios. Essas diferenças
se comportaram de forma similar, tanto em relação ao peso de abate como
em relação ao peso de corpo vazio dos novilhos.
Assim como o rúmen + retículo, também o peso do intestino vazio foi
superior nas fêmeas em relação aos machos (P<0,027). TERRY et al.
(1990) verificaram percentual de intestino delgado em relação ao peso
vivo de 2,22% e 1,98%, respectivamente, para fêmeas e machos mestiços
europeu x zebuíno com menos de 50%
Bos indicus. Já o percentual de intestino grosso foi de 3,93% e 3,49%, citados na mesma ordem.
Além do sexo, o crescimento do trato digestivo e, principalmente dos
estômagos, responde principalmente ao teor de fibra na dieta ingerida.
Entretanto, o intestino responde não somente a isso, mas também ao tipo
de dieta e também aos suplementos (SAINZ & BENTLEY, 1997; MACITELLI
et al., 2005).
Na comparação entre novilhos mestiços Nelore x Charolês, abatidos aos
15,2 ou 22,8 meses de idade, PACHECO et al. (2005) observaram menores
valores nos primeiros para o peso do conjunto trato digestivo vazio
ajustado para peso de corpo vazio (7,71 vs 6,77%), efeito do peso vazio
dos intestinos (r = 0,80), do peso vazio do rúmen + retículo (r = 0,54)
e do omaso (r = 0,52). Entretanto, no mesmo trabalho, os novilhos de
15,2 meses foram superiores aos novilhos de 22,8 meses no total de
gorduras internas. KUSS et al. (2007b) observaram que, em vacas
adultas, o peso do rúmen + retículo relativo ao corpo vazio cresceu
quando as vacas passaram de 465 para 507 kg, mas decresceu quando esses
animais atingiram 566 kg de peso vivo.
BUCKLEY et al. (1990) usaram fêmeas Hereford, Charolês e Simental,
observadas do nascimento aos quatorze meses de idade, para estudar os
conteúdos teciduais das carcaças em quatro frações: carcaça, couro +
cabeça + patas, trato digestivo com gordura e vísceras + sangue,
verificando que o teor de água decresceu de 73% para 51% e o teor de
proteína de 20% para 18%. Já o teor de cinzas passou de 4,3% para 3,5%,
enquanto o teor de gordura aumentou de 3% para 28%.
Existe uma correlação positiva e alta entre peso dos órgãos internos e
o peso de corpo vazio e a massa muscular de bovinos. No entanto, para
bovinos com idade e peso similar, o fígado seria o melhor indicador da
massa muscular corporal, por apresentar as melhores correlações com os
pesos vivo e de corpo vazio (KRAYBILL et al., 1954). Assim, poderia ser
esperado maior percentual de fígado nos machos em relação às novilhas.
Essa tendência, porém, não foi verificada (
Tabela 2), observando-se valores de 0,98% e 0,93%, respectivamente, para fêmeas e machos (P>0,05).
Os resultados de composição física da carcaça mostram que a percentagem de costilhar foi superior nas fêmeas (
Tabela 3).
A maior percentagem de costilhar está bastante associada à espessura de
gordura que os animais apresentam (RESTLE et al., 1999a). Em relação
aos demais cortes, observa-se que estes foram similares entre os dois
grupos de animais.
A percentagem de serrote foi 50,5% nos machos e 50,4% nas fêmeas
(P>0,830). Se forem observados os pesos de abate e de carcaça,
verifica-se que os animais ainda estavam em fase de crescimento, o que
pode ser comprovado não só pela idade dos animais, mas pelos reduzidos
pesos de abate e de carcaça que eles apresentavam, conforme será
apresentado mais adiante (
Tabela 5).
Esse fato torna-se importante, na medida em que, pela ordem normal de
crescimento dos bovinos, as diferenciações musculares nos quartos
posteriores começam a ser salientadas a partir de idades mais avançadas
(BERG & BUTTERFIELD, 1976), alterando o percentual de serrote de
machos e fêmeas.
Também com animais de um ano de idade, mas da raça Santa Gertrudis,
COUTINHO FILHO et al. (2006) verificaram maior percentual de serrote
(50,0% contra 48,1%) e de costilhar (14,3% contra 13,3%) nas fêmeas em
relação aos machos inteiros, os quais apresentaram maior percentagem de
dianteiro (38,6% contra 35,7%) do que as novilhas. Em animais adultos,
VAZ et al. (2002) observaram similaridade nos pesos e percentuais de
serrote e de dianteiro entre novilhos e vacas, mas estas últimas
mostraram maior peso (16,9 contra 14,9 kg) e percentual de costilhar
(15,3% contra 14,2%) do que os novilhos.
Em se tratando de animais com um ano de idade ao abate, os dois sexos
apresentaram espessura de gordura adequada, sendo 4,06 mm nos machos e
5,07 mm nas fêmeas. A discussão a respeito da cobertura de carcaça dos
animais foi publicada por VAZ et al. (2009), mostrando que, mesmo
leves, as novilhas de descarte podem produzir carcaça com adequado
acabamento aos quatorze meses de idade. CHIZZOTTI et al. (2007)
pesquisaram as exigências nutricionais de machos e fêmeas mestiços zebu
x europeu, verificando que as fêmeas são mais leves que os machos
castrados e depositam gordura mais cedo, com variações observadas
também nas exigências de energia e proteína para crescimento de 0,75 e
1,5 kg por dia, respectivamente. Os dados de composição física da
carcaça mostram as variações entre machos castrados e fêmeas observadas
neste trabalho (
Tabela 4).
A percentagem de gordura da carcaça foi superior nas fêmeas
(P<0,004) em relação aos machos, sendo que a diferença de 4,8 pontos
percentuais representa 25% a mais de gordura na carne das fêmeas. Essa
diferença acentuada pode ser resultado do fato de os animais serem
mestiços, com 5/8 de uma raça britânica, considerada bastante precoce,
como é o caso da raça Hereford (BERG & BUTERFIELD, 1976). Em
animais Santa Gertrudis, raça mais tardia, COUTINHO FILHO et al. (2006)
observaram que animais com a mesma idade que estes do presente
trabalho, confinados por 109 dias com alto nível energético na dieta,
apresentaram valores semelhantes de espessura de gordura, entre machos
não castrados (7,07 mm) e para fêmeas (7,29 mm). Os mesmos autores
verificaram que as fêmeas mostraram maior peso de gordura renal mais
pélvica mais inguinal (7,66 vs 5,88 kg) e maior percentual de aparas de
gordura (4,30 vs 3,21%) durante o processo de desossa do traseiro
especial, em relação aos machos.
Em novilhas e novilhos Hereford, JOHNSON (1994) verificou maior
percentagem de músculo em detrimento a gordura e ossos nos machos.
Aplicando equações de regressão, o autor observou o mesmo peso de ossos
entre os sexos, mas verificou haver 3 kg a mais de músculo e 3,5 kg a
menos de gordura nos novilhos em relação às fêmeas.
O valor para a área de
Longissimus dorsi
ajustado para o peso de carcaça dos animais foi superior para as fêmeas
(30,7 contra 28,4 cm²) em relação aos novilhos. O valor da área de
Longissimus dorsi observada
nos machos do presente trabalho foi similar ao observado por RESTLE et
al. (1997), estudando machos da raça Hereford, abatidos aos quatorze
meses de idade. COUTINHO FILHO et al. (2006) observaram similaridade na
área de
Longissimus dorsi ajustada entre machos não castrados e fêmeas.
Os dados referentes às características peso de fazenda, peso de carcaça
quente e rendimento de carcaça quente em relação ao peso de fazenda
foram publicados por VAZ et al. (2010) em artigo que discute a
qualidade da carcaça dos animais. Esses dados são mostrados na
Tabela 5, por serem fundamentais à discussão do rendimento de carcaça de frigorífico.
Os machos apresentaram maior peso vivo de frigorífico (P<0,01) do que as fêmeas (
Tabela 5),
reflexo do maior ímpeto de crescimento causado pelos hormônios
androgênicos, principalmente a testosterona (DANNER et al., 1980; DI
MARCO, 1994). Segundo BERG & BUTTERFIELD (1976), os menores pesos
das novilhas em relação aos novilhos se deve ao fato de estas começarem
a depositar gordura mais cedo, diminuindo a velocidade de crescimento.
Embora o peso de carcaça quente e o rendimento de carcaça quente em
relação ao peso vivo na fazenda tenham sido maiores nos machos (VAZ et
al., 2009), houve similaridade (P>0,05) no rendimento de carcaça em
relação ao peso de frigorífico dos animais, indicando que a diferença
de rendimento de fazenda foi afetada pelo enchimento dos animais no
momento da pesagem ainda na origem, embora os animais tenham sido
pesados após jejum de sólidos de doze horas.
Menor rendimento de carcaça nas fêmeas (56,8%) em relação aos machos
(58,9%) é relatado por JUNQUEIRA et al. (1998). PAULINO et al. (2008)
observaram maior ganho de peso diário em deposição de carcaça e em
deposição de corpo vazio em machos inteiros, se comparados com fêmeas,
ficando os animais castrados com valores intermediários, sem diferença
significativa. Entretanto, no mesmo trabalho, os autores constataram
que as novilhas foram mais eficientes em conversão de alimento em peso
de carcaça do que os machos inteiros. A mesma tendência é citada por
CHIZZOTTI et al. (2007).
PACHECO et al. (2006a) calcularam as correlações entre as
características de carcaça em animais mestiços Charolês x Nelore
abatidos aos 24 meses de idade, verificando que o rendimento de carcaça
fria possui correlação negativa com o peso do couro (r = -0,45), peso
do abomaso (r = -0,52) e peso das gorduras inguinal (r = -0,46), renal
(r = -0,43), de toalete (r = -0,68) e gordura ruminal + intestinal (r =
-0,72).
CONCLUSÕES
Novilhos são mais pesados ao abate,
refletindo um maior ímpeto de crescimento e uma melhor resposta animal
com a suplementação em pastagem cultivada.
O maior rendimento de carcaça dos novilhos é em função do menor peso
relativo do couro, rúmen vazio, do conteúdo do trato digestivo e da
gordura depositada sobre o púbis em relação ao úbere das novilhas.
Novilhas apresentam maior percentual de gordura e maior percentagem de costilhar dos que os novilhos, bem como maior área de Longissimus dorsi ajustada para 100 kg de carcaça do que os machos.
REFERÊNCIAS
BERG, R. T.; BUTTERFIELD, R.
M. New concepts of cattle growth. Sydney: Sydney University Press, 1976.
240 p.
BUCKLEY, B. A.; BAKER, J.
F.; DICKERSON, G. E.; JENKINS, T. G.
Body composition and tissue distribution from birth to 14 months for three
biological types of beef heifers. Journal of Animal Science, v. 68, n.
10, p. 3109-3123, 1990.
CEZAR, I. M.; QUEIROZ, H.
P.; THIAGO, L. R. L. S.; CASSALES, F. L.
G.; COSTA, F. P. Sistemas de produção de gado de corte no Brasil: uma
descrição com ênfase no regime alimentar e no abate. Campo Grande: Embrapa,
2005. (Documentos Embrapa Gado de Corte, n. 151).
CHIZZOTTI, M. L.; VALADARES
FILHO, S. C.; TEDESCHI, L. O.; CHIZZOTTI, F. H. M.; CARSTENS, G. E. Energy and
protein requirements for growth and maintenance of F1 Nellore x Red Angus
bulls, steers, and heifers. Journal of Animal Science, v. 85, n. 5, p.
1971-1981, 2007.
COUTINHO FILHO, J. L. V.;
PERES, R. M.; JUSTO, C. L. Produção de carne de bovinos contemporâneos, machos
e fêmeas, terminados em confinamento. Revista Brasileira de Zootecnia,
v. 35, n. 5, p. 2043-2049, 2006.
DANNER, M. L.; FOX, D. G.;
BLACK, J. R. Effect of feeding system on performance and carcass
characteristics of yearling steers, steer calves and heifer calves. Journal
of Animal Science, v. 50, n. 3, p. 394-404, 1980.
DI MARCO, O. N. Crescimiento
y respuesta animal. Balcarce: AAPA, 1994. 129 p.
HANKINS, O. G.; HOWE, P. E. Estimation
of the composition of beef carcasses and cuts. [s.l.]: 1946. 20 p.
(Technical Bulletin, 926).
JOHNSON, E. R. Comparison of
the prediction of carcass components using fat thickness measurements in
heifers and steers. Australian Journal of Experimental Agriculture, v.
34, n. 4, p. 435-438, 1994.
JUNQUEIRA, J. O. B.;
VELLOSO, L.; FELÍCIO, P. E. Desempenho, rendimentos de carcaça e cortes de
animais, machos e fêmeas, mestiços marchigiana x nelore, terminados em
confinamento. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 27, n. 6, p.
1199-1205, 1998.
KRAYBILL,
H. F.; HINER, R. L.; FARNWORTH, V. M. The relation of organ weights to lean
body mass and empty body weight in cattle. Journal of Animal Science, v.
13, n. 2, p. 548-555, 1954.
KROPF, D. H.; GRAF, R. L.
The effect of carcass grade, weight and classification upon boneless beef
yield. Journal of Animal Science, v. 18, n. 1, p. 95-103, 1959.
KUSS, F.; RESTLE, J.;
BRONDANI, I. L.; PACHECO, P. S.; SILVEIRA,M. F.; PAZDIORA, R. D.; CEZIMBRA, I.
M. Órgãos vitais e trato gastrintestinal
de vacas de descarte mestiças Charolês x Nelore abatidas com pesos distintos. Revista
Brasileira de Zootecnia, v. 36, n. 2, p. 421-429, 2007b.
KUSS, F.; RESTLE, J.;
BRONDANI, I. L.; PASCOAL, L. L.; MENEZES, L. F. G.; LEITE, D. T.; SANTOS, M.
F. Componentes externos do corpo e
gordura de descarte em vacas mestiças Charolês x Nelore abatidas com diferentes
pesos. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 36, n. 4, p. 865-873, 2007a.
MACITELLI, F.; BERCHIELLI,
T.T.; SILVEIRA, R.N.; ANDRADE, P.;
LOPES, A. L.; SATO, K. J.; BARBOSA, J. C. Biometria da carcaça e peso de
vísceras e de órgãos internos de bovinos mestiços alimentados com diferentes
volumosos e fontes protéicas. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 34, n.
5, p. 2005.
MULLER, L. Normas para
avaliação de carcaças e concurso de carcaça de novilhos. 2. ed. Santa
Maria: Imprensa Universitária, 1987. 31 p.
OWENS, F. N.; DUBESKI, P.;
HANSON, C. F. Factors that alter the growth and development of ruminants. Journal
of Animal Science, v. 71, n. 11, p. 3138-3150, 1993.
PACHECO,
P. S.; RESTLE, J.; SILVA, J. H. S.; ARBOITTE, M. Z.; ALVES FILHO, D. C.;
FREITAS, A. K.; ROSA, J. R. P.; PÁDUA, J. T. Características das partes do
corpo não-integrantes da carcaça de novilhos jovens e superjovens de diferentes
grupos genéticos. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 34, n. 5, p.
1678-1690, 2005.
PACHECO, P. S.; RESTLE, J.;
SILVA, J. H. S.; FREITAS, A. K.; ARBOITTE, M. Z.; PÁDUA, J. T. Relação entre
componentes do corpo vazio e rendimentos de carcaça de novilhos de corte. Ciência
Animal Brasileira, v. 7, n. 2, p. 107-113, 2006a.
PACHECO, P. S.; RESTLE, J.;
VAZ, F. N.; FREITAS, A. K.; PÁDUA, J. T.; NEUMANN, M.; ARBOITTE, M. Z.
Avaliação econômica da terminação em confinamento de novilhos jovens e
superjovens de diferentes grupos genéticos. Revista Brasileira de Zootecnia,
v. 35, n. 1, p. 309-320, 2006b.
PAULINO, P. V. R.; VALADARES
FILHO, S. C.; DETMANN, E.; VALADARES, R. F. D.; FONSECA, M. A.; VÉRAS, R. M.
L.; OLIVEIRA, D. M. Desempenho produtivo de bovinos Nelore de diferentes classes
sexuais alimentados com dietas contendo dois níveis de oferta de concentrado. Revista
Brasileira de Zootecnia, v. 37, n. 6, p. 1079-1087, 2008.
RESTLE, J.; CERDÓTES, L.;
VAZ, F. N.; brondani, i. l.
Características de carcaça e da carne de novilhas Charolês e 3/4 Charolês 1/4
Nelore, terminadas em confinamento. Revista Brasileira de Zootecnia, v.
30, n. 3, p. 1065-1075, 2001. (Suplemento 1).
RESTLE, J.; MENEZES, L. F.
G.; ARBOITTE, M. Z.; PASCOAL, L. L.; PACHECO, P. S.; PÁDUA, J. T.
Características das partes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8 Nelore
3/8 Charolês abatidos em três estádios de desenvolvimento. Revista Brasileira
de Zootecnia, v. 34, n. 4, p. 1339-1348, 2005.
RESTLE, J.; PACHECO, P. S.;
COSTA, E. C.; FREITAS, A. K.; VQZ, F. N.; BRONDANI, I. L.; FERNANDES, J. J.
R. Apreciação econômica da terminação em
confinamento de novilhos Red Angus superjovens abatidos com diferentes pesos. Revista
Brasileira de Zootecnia, v. 36, n. 4, p. 978-986, 2007.
RESTLE, J.; VAZ, F. N.
Aspectos quantitativos da carcaça de machos Hereford, inteiros ou castrados,
abatidos aos quatorze meses. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 32, n.
10, p. 1091-1095, 1997.
RESTLE, J.; VAZ, F. N.;
BRONDANI, I. L.; GONÇALVES, J. M.; ANDREATTA, E. Estudo da carcaça de machos
Braford desmamados aos 72 ou 210 dias, abatidos aos catorze meses. Pesquisa
Agropecuária Brasileira, v. 34, n. 11, 1999a.
RESTLE, J.; VAZ, F. N.;
QUADROS, A. R. B.; MULLER, L. Características de carcaça e da carne de novilhos
de diferentes genótipos de Hereford x Nelore. Revista Brasileira de
Zootecnia, v. 28, n. 6, p. 1245-1251, 1999b.
SAINZ, R. D.; BENTLEY, B. E.
Visceral organ mass and cellularity in growth-restricted and refed beef steers.
Journal of Animal Science, v. 75, n. 5, p. 1229-1236, 1997.
SAS, Institute Inc. SAS
Language reference: version 6. Cary, NC: SAS Institute Inc., 1990. 1042 p.
TERRY, C. A.; KNAPP, R. H.;
EDWARDS, J. W.; MIES, W. L.; SAVELL, J.
W.; CROSS, H. R. Yields of by-products from different cattle types. Journal
of Animal Science, v. 68, n. 12, p. 4200-4205, 1990.
VAZ, F.
N.; RESTLE, J. Aspectos qualitativos da carcaça de machos Hereford, inteiros ou
castrados, abatidos aos quatorze meses. Revista Brasileira de Zootecnia,
v. 29, n. 6, p. 1894-1901, 2000.
VAZ, F. N.; RESTLE, J.;
ARBOITTE, M. Z. Características de carcaça e da carne de novilhos ou novilhas
Braford superjovens, terminados com suplementação em pastagem cultivada. Ciência
Animal Brasileira, 2009 [no prelo].
VAZ, F. N.; RESTLE, J.;
QUADROS, A. R. B. Características da carcaça e da carne de novilhos e de vacas
de descarte Hereford, terminados em confinamento. Revista Brasileira de
Zootecnia, v. 31, n. 3, p. 1501-1510, 2002. (Suplemento).
Protocolado
em: 23 jul. 2009. Aceito em: 18 nov.
2009.