DOI: 10.5216/cab.v11i1.6747
FATORES RELACIONADOS AO RENDIMENTO DE CARCAÇA DE NOVILHOS OU NOVILHAS SUPERJOVENS, TERMINADOS EM PASTAGEM CULTIVADA


Fabiano Nunes Vaz,1 João Restle,2 Miguelangelo Ziegler Arboitte3
Leonir Luiz Pascoal,4 Cristian Faturi5 e Guilherme Joner6

1. Doutor, professor da Universidade Federal do Pampa – Email: fabianovaz@unipampa.edu.br.
2. PhD, professor visitante da Universidade Federal de Goiás
3. Instituto Federal de Catarinense - Campus Sombrio
4. Doutor, professor da Universidade Federal de Santa Maria
5. Doutor, professor da Universidade Federal Rural da Amazônia
6. Acadêmico de zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria.


RESUMO

Este trabalho teve como objetivo estudar os fatores corporais envolvidos na variação do rendimento de carcaça em machos castrados ou fêmeas não prenhes, abatidos aos quatorze meses de idade. Os animais foram terminados com suplementação energética sobre pastagem cultivada. Utilizaram-se doze animais de cada sexo, mestiços Nelore (3/8) x Hereford (5/8), contemporâneos do mesmo rebanho. Os pesos de fazenda, de frigorífico e de carcaça quente foram superiores nos machos, sendo de 365,8; 350,4 e 203,4 kg, respectivamente, enquanto as fêmeas apresentaram 310,3; 294,5; e 168,6 kg, citados na mesma ordem. Bovinos machos também apresentaram maiores rendimentos de carcaça quente em relação ao peso de fazenda (55,6 vs 54,4%) e em relação ao peso de frigorífico (58,1 vs 57,2%) do que as fêmeas. O menor rendimento de carcaça das fêmeas deveu-se ao maior percentual de couro (9,03 vs 7,96%), gordura inguinal, junto ao úbere das fêmeas ou à capadura dos machos (1,02 vs 0,67%), trato digestivo cheio (19,35% vs 16,84%), rúmen mais retículo vazios (2,34 vs 1,91%) e intestino vazio (2,54% vs 2,11%). Não houve diferença significativa entre sexos nos percentuais de coração, fígado, pulmões, rins e baço, sendo, respectivamente, 0,40%, 0,93%, 1,01%, 0,22% e 0,35% nos machos e 0,41%, 0,98%, 1,02%, 0,22% e 0,30% nas fêmeas, citados na mesma ordem.

PALAVRAS-CHAVES: Braford, couro, órgãos, rúmen, sexo.

ABSTRACT

The objective of the experiment was to study the body factors related to the variation of dressing percentage in castrated males or non-pregnant females, slaughtered at fourteen months of age. The animals were finished with energetic supplementation on cultivated pasture. Twelve contemporary animals of each sex were used, all crossbred Nellore (3/8) x Hereford (5/8) from the same herd. Farm live weight, slaughterhouse live weight and hot carcass weight were superior in males, being 365.8; 350.4 and 203.4 kg, respectively, while the females showed 310.3; 294.5; and 168.6 kg, in the same order. Males also showed higher hot carcass dressing percentage in relation to farm live weight (55.6 vs 54.4%) and in relation to slaughterhouse weight (58.1 vs 57.2%) than females. The lower female dressing percentage was a result of the higher hide (9.03 vs 7.96%), inguinal fat in the udder of heifers or cod fat of steers (1.02 vs .67%), full digestive tract (19.35 vs 16.84%), empty rumen plus reticulum (2.34 vs 1.91%) and empty intestine (2.54 vs 2.11%) percentages. There was no significant difference between sexes in heart, liver, lungs, kidneys and spleen percentages, being, respectively, 0.40, 0.93, 1.01, 0.22 and 0.35% in males and 0.41, 0.98, 1.02, 0.22 and 0.30% in females, cited in the same order.

KEY WORDS: braford, hide, organs, rumen, sex.


INTRODUÇÃO

Atualmente, existem dois fatores marcantes no segmento da pecuária de corte brasileiro: o primeiro diz respeito à modernização e intensificação dos sistemas produtivos; e o segundo é a crescente demanda por carne de melhor qualidade. A intensificação dos sistemas tem aumentado as taxas de natalidade e reduzido a idade de abate dos animais, resultando, assim, em animais abatidos em idade jovem, com bom acabamento e carne de excelente qualidade (RESTLE & VAZ, 1997).
As pesquisas que analisam a viabilidade de machos bovinos inteiros ou castrados, terminados com menos de dezoito meses de idade, mostram bons resultados econômicos (PACHECO et al., 2006b; RESTLE et al., 2007). Também a terminação de novilhas jovens, embora com resultados econômicos levemente inferiores (COUTINHO FILHO et al., 2006), tem sido indicada como estratégia dos sistemas produtivos que atingem altas taxas de natalidade, constituindo, dessa forma, uma opção a mais para melhorar a qualidade da carne oferecida ao consumidor.
Em outros países que já atingiram altos índices de produtividade na pecuária de corte, a terminação de novilhas jovens é prática comum desde longa data (KROPF & GRAF, 1959). Dado que os frigoríficos começam a vislumbrar crescimento na demanda de carne bovina para exportação, e aumenta a exigência de mercado interno para qualidade de carne, lentamente ocorre a redução da última barreira a essas categorias, relacionada ao peso de carcaça de animais jovens.
VAZ & RESTLE (2000) salientam aos produtores que o uso de categorias precoces, embora mais leves ao abate, traz benefícios no que diz respeito à melhor eficiência alimentar dos animais. No entanto, para os mesmos autores citados, a terminação de animais jovens exige trabalhar com altos níveis nutricionais, o que pode ser conseguido mediante pastagens cultivadas, principalmente quando estas estão aliadas à suplementação energética.
PAULINO et al. (2008) demonstraram que as fêmeas jovens possuem eficiência alimentar na transformação de alimento em peso de carcaça superior ao de machos inteiros e semelhante ao dos machos castrados. Entretanto, os produtores comercializam seus produtos tomando por base o rendimento de carcaça. Assim sendo, se o rendimento de carcaça das novilhas for menor que o rendimento dos machos castrados, o investimento em alimentação dos animais terá sido menos eficiente. Além disso, na maioria dos casos, por ocasião da comercialização de novilhas jovens, os produtores recebem dos frigoríficos a mesma remuneração paga por quilograma de carcaça de vacas velhas de descarte.
A explicação para isso está no fato de existir conhecimento sobre os rendimentos de machos e fêmeas adultos (DI MARCO, 1994; VAZ et al., 2002). No entanto, ainda são escassas as informações a respeito dos rendimentos de carcaça e de subprodutos de fêmeas jovens comparadas a machos castrados, da mesma idade.
O rendimento de subprodutos é muito importante para as indústrias frigoríficas, pois, a partir de um bom aproveitamento de subprodutos, pode ser viabilizada uma melhor remuneração para animais jovens. Estes geralmente possuem melhor qualidade do couro, por estarem expostos por menos tempo aos fatores depreciantes, além de apresentarem melhor sanidade, resultando em menor condenação de miúdos.
O objetivo deste trabalho é comparar as características de carcaça, rendimento de subprodutos e outros fatores correlacionados com o rendimento de carcaça de fêmeas e machos mestiços Nelore x Hereford jovens, visando alicerçar conhecimentos sobre a produção de bovinos de ambos os sexos para a produção de carcaças de qualidade superior, usando a suplementação em pastagem cultivada.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi desenvolvido no Setor de Bovinocultura de Corte do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria, utilizando doze machos e doze fêmeas, mestiços Nelore (3/8) x Hereford (5/8), contemporâneos, oriundos do mesmo rebanho e mantidos nas mesmas condições de manejo e alimentação. Ao abate, os animais possuíam idade média de quatorze meses.
Após o desmame aos oito meses, os animais permaneceram em pastagem cultivada de Avena strigosa + Lolium multiflorum de julho até outubro, e após foram mantidos em uma área cultivada com Pennisetum purpureum, onde permaneceram até o abate, em dezembro do mesmo ano. Desde julho até o abate, em dezembro, suplementaram-se os animais na quantidade equivalente a 1% do peso vivo com grão de aveia ou de sorgo, triturados, oferecidos duas vezes ao dia, tanto na pastagem de inverno como na pastagem de verão.
O abate dos animais ocorreu em abatedouro comercial. Pesaram-se os animais na fazenda antes do embarque, após um jejum de sólidos de doze horas, e posteriormente no frigorífico, após duas horas de viagem.
O abate dos animais obedeceu ao fluxo normal do matadouro comercial. À medida que os animais eram abatidos, foram sendo removidos e pesados todos os órgãos, externos e internos, tão logo ocorria a eviscerção de cada carcaça. Além das vísceras, também as carcaças foram pesadas logo após o abate e antes da lavagem, obtendo-se o peso de carcaça quente.
Depois de pesadas, identificaram-se as carcaças, sendo resfriadas por 24 horas a -2º C. Depois, foram retiradas da câmara fria e novamente pesadas, obtendo-se o peso de carcaça fria dos animais. A partir dos pesos de carcaça quente e fria, calcularam-se os rendimentos em função do peso vivo de fazenda e na chegada ao frigorífico. Os pesos dos órgãos, pesados ainda quentes, foram ajustados para o peso de carcaça quente dos animais, visando facilitar a discussão dos resultados.
As avaliações de área do músculo Longissimus dorsi na altura da 12ª costela, conforme a metodologia sugerida por MÜLLER (1987), foi realizada após o resfriamento das carcaças por 24 horas a 0°C. calcularam-se os percentuais de músculo, de osso e de gordura, segundo a metodologia proposta por HANKINS & HOWE (1946).
Utilizou-se o delineamento experimental inteiramente casualizado, com doze repetições por tratamento, correspondentes ao sexo dos animais, conforme o modelo estatístico:
Yij = µ + αi + εij
sendo, Yij = o valor observado no i-ésimo sexo, na j-ésima repetição; µ = a média geral da variável; αi = o efeito do i-ésimo sexo; εij = o efeito aleatório associado a cada observação, pressuposto NID (0; σ² ).
Depois de coletados e tabulados, os dados foram submetidos à análise de variância e teste t de Student ao nível de 5% de probabilidade de erro (SAS, 1990).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela 1 se observa que o peso do úbere das novilhas foi significativamente maior (P<0,001) do que o peso da graxa existente sobre o púbis dos machos, chamado popularmente de “graxa da capadura”. OWENS et al. (1993) também relataram alto teor de gordura no úbere de fêmeas, atribuindo tal fato ao alto nível de suplementação em pastagem durante a terminação.
Em bovinos abatidos antes dos dois anos de idade, como no presente trabalho, COUTINHO FILHO et al. (2006) verificaram maiores valores para o peso (257 vs 202 kg) e o rendimento de carcaça (55,6 vs 52,8%) nos machos não castrados Santa Gertrudis. Já as fêmeas da mesma raça mostraram mais gordura renal-pélvica-inguinal (7,66 vs 5,88 kg), embora não tenha sido observada diferença para espessura de gordura subcutânea entre novilhos e novilhas.
Observou-se similaridade (P>0,05) nos percentuais de orelhas e de vassoura da cola (Tabela 1), que podem ser afetados por fatores raciais europeu x zebu. Também as representatividades percentuais dos pesos da cabeça e das patas foram similares (P>0,05) entre os dois grupos (Tabela 1), talvez pelo fato de os animais serem jovens, em idade na qual o dimorfismo sexual está menos pronunciado. Com o avanço do dimorfimso sexual, espera-se uma alteração do calibre e tamanho das estruturas ósseas (BERG & BUTTERFIELD, 1976; DI MARCO, 1994), principal componente nas pesagens da cabeça e das patas.
Removida a gordura presente na capadura dos novilhos ou no úbere das novilhas, observa-se que a graxa de toalete não diferiu (P>0,05) entre os dois grupos sexuais (Tabela 1). Na comparação de sexos usando bovinos Marchigiana x Nelore, observou-se que as aparas de gordura foram menores nos machos, mas não houve diferença quanto a retalhos magros, ossos e na quebra durante o processo de desossa, na comparação entre sexos (JUNQUEIRA et al., 1998).
Todas as características apresentadas na Tabela 1 são de interesse econômico para a indústria. A remoção da carne de cabeça gera 0,69% do peso de carcaça de carne magra usada para embutidos e carne moída. As patas geram tendões que são destinados à exportação para a Ásia, além de óleo e ossos usados para sopas. A graxa de toalete e a gordura de capadura são transformadas em sebo e biodiesel. Os pelos da vassoura da cola são usados para fabricação de escovas e vassouras e os pelos da orelha pra pincéis (CEZAR et al., 2005). Entretanto, de todas as características listadas na Tabela 1, a maior representatividade econômica está no couro, que recebe remuneração variável conforme as exportações de estofados, vestuário e calçados de couro.
O percentual de couro foi significativamente maior (P<0,038) nas fêmeas em relação aos machos, fator que também interfere no rendimento de carcaça dos animais. TERRY et al. (1990) compararam novilhas e novilhos de raças britânicas e mestiços zebu, verificando nos novilhos, respectivamente, 8,19 e 8,94% de couro, e para as novilhas, 7,54 e 7,99%, citados na mesma ordem.
Um maior percentual de couro nas fêmeas poderia ser reflexo de um maior trato digestivo, com maior arqueamento de costelas, o que permitiria à fêmea consumir uma quantidade de forragem suficiente para manter a gestação/lactação e a mantença/crescimento. Existindo maior arqueamento de costelas, seria necessária uma maior quantidade de couro para envolver o corpo.
Estudando as partes não integrantes da carcaça de novilhos abatidos em três diferentes estágios de maturidade, RESTLE et al. (2005) verificaram que o percentual de couro em relação ao peso de abate e em relação ao peso de corpo vazio é semelhante à medida que aumenta o estádio de maturidade de novilhos mestiços Nelore x bos taurus.
Ainda com respeito ao arqueamento de costelas, VAZ et al. (2002) comentam que este é fator preponderante no rendimento de carcaça de novilhos. Em vacas de descarte o arqueamento de costelas talvez possua ainda maior representatividade, já que vacas que passaram por, no mínimo, uma gestação precisam desenvolver as costelas, visando criar espaço no ventre para suportar o crescimento fetal (BERG & BUTTERFIELD, 1976). Essa teoria foi suportada por RESTLE et al. (2001), ao verificarem que, em fêmeas Charolês, o rendimento de carcaça fria foi mais alto em novilhas (51,1%) do que em vacas (48,9%); entretanto, novilhas e vacas 3/4 Charolês 1/4 Nelore apresentaram rendimento de carcaça similar.
O comentário anterior de que as novilhas pos­suíam maior conteúdo no trato digestivo que os novilhos foi confirmado na Tabela 2. O conteúdo do trato digestivo foi mais representativo nas novilhas do que nos novilhos. Embora o peso vivo das novilhas fosse bem inferior ao dos machos, como será visto mais adiante (Tabela 5), o conteúdo do trato digestivo pesou apenas 3 kg a menos (P>0,05). Em valores percentuais, o trato digestivo cheio foi superior nas novilhas, sendo de 19,35% contra 16,84% (P<0,042).
O peso vazio do rúmen + retículo foi superior nas novilhas (P<0,005), justificando o maior peso relativo do conteúdo do trato digestivo verificado nesses animais. Esses resultados mostram que as fêmeas, mesmo jovens, possuem maior capacidade de ingestão de alimentos, característica evoluída a partir da necessidade que esse sexo possui de ingerir uma maior quantidade de alimentos em determinadas fases de sua vida, visando atender não somente a requerimentos de manutenção corporal e de ganho de peso, como os machos, mas também a necessidades nutricionais para a lactação e/ou gestação. Para a indústria frigorífica, o rendimento dos estômagos é importante fonte de renda na comercialização de subprodutos, em função da boa remuneração e do peso que representa por animal abatido.
Por outro lado, observando os dados de KUSS et al. (2007a), o conteúdo do trato digestivo, em percentagem do peso de abate e em percentagem do peso de corpo vazio, foi maior nas fêmeas mais leves. PACHECO et al. (2005) compararam machos mestiços Charolês x Nelore abatidos com 15,2 ou 22,8 meses de idade e com peso de abate uniforme (430 kg), verificando que os animais mais jovens apresentaram maiores percentuais de rúmen + retículo vazios e de omaso vazio, embora não tenham observado diferença significativa entre as idades de abate nos percentuais de abomaso vazio e de intestinos vazios. Essas diferenças se comportaram de forma similar, tanto em relação ao peso de abate como em relação ao peso de corpo vazio dos novilhos.
Assim como o rúmen + retículo, também o peso do intestino vazio foi superior nas fêmeas em relação aos machos (P<0,027). TERRY et al. (1990) verificaram percentual de intestino delgado em relação ao peso vivo de 2,22% e 1,98%, respectivamente, para fêmeas e machos mestiços europeu x zebuíno com menos de 50% Bos indicus. Já o percentual de intestino grosso foi de 3,93% e 3,49%, citados na mesma ordem.
Além do sexo, o crescimento do trato digestivo e, principalmente dos estômagos, responde principalmente ao teor de fibra na dieta ingerida. Entretanto, o intestino responde não somente a isso, mas também ao tipo de dieta e também aos suplementos (SAINZ & BENTLEY, 1997; MACITELLI et al., 2005).
Na comparação entre novilhos mestiços Nelore x Charolês, abatidos aos 15,2 ou 22,8 meses de idade, PACHECO et al. (2005) observaram menores valores nos primeiros para o peso do conjunto trato digestivo vazio ajustado para peso de corpo vazio (7,71 vs 6,77%), efeito do peso vazio dos intestinos (r = 0,80), do peso vazio do rúmen + retículo (r = 0,54) e do omaso (r = 0,52). Entretanto, no mesmo trabalho, os novilhos de 15,2 meses foram superiores aos novilhos de 22,8 meses no total de gorduras internas. KUSS et al. (2007b) observaram que, em vacas adultas, o peso do rúmen + retículo relativo ao corpo vazio cresceu quando as vacas passaram de 465 para 507 kg, mas decresceu quando esses animais atingiram 566 kg de peso vivo.
BUCKLEY et al. (1990) usaram fêmeas Hereford, Charolês e Simental, observadas do nascimento aos quatorze meses de idade, para estudar os conteúdos teciduais das carcaças em quatro frações: carcaça, couro + cabeça + patas, trato digestivo com gordura e vísceras + sangue, verificando que o teor de água decresceu de 73% para 51% e o teor de proteína de 20% para 18%. Já o teor de cinzas passou de 4,3% para 3,5%, enquanto o teor de gordura aumentou de 3% para 28%.
Existe uma correlação positiva e alta entre peso dos órgãos internos e o peso de corpo vazio e a massa muscular de bovinos. No entanto, para bovinos com idade e peso similar, o fígado seria o melhor indicador da massa muscular corporal, por apresentar as melhores correlações com os pesos vivo e de corpo vazio (KRAYBILL et al., 1954). Assim, poderia ser esperado maior percentual de fígado nos machos em relação às novilhas. Essa tendência, porém, não foi verificada (Tabela 2), observando-se valores de 0,98% e 0,93%, respectivamente, para fêmeas e machos (P>0,05).
Os resultados de composição física da carcaça mostram que a percentagem de costilhar foi superior nas fêmeas (Tabela 3). A maior percentagem de costilhar está bastante associada à espessura de gordura que os animais apresentam (RESTLE et al., 1999a). Em relação aos demais cortes, observa-se que estes foram similares entre os dois grupos de animais.
A percentagem de serrote foi 50,5% nos machos e 50,4% nas fêmeas (P>0,830). Se forem observados os pesos de abate e de carcaça, verifica-se que os animais ainda estavam em fase de crescimento, o que pode ser comprovado não só pela idade dos animais, mas pelos reduzidos pesos de abate e de carcaça que eles apresentavam, conforme será apresentado mais adiante (Tabela 5). Esse fato torna-se importante, na medida em que, pela ordem normal de crescimento dos bovinos, as diferenciações musculares nos quartos posteriores começam a ser salientadas a partir de idades mais avançadas (BERG & BUTTERFIELD, 1976), alterando o percentual de serrote de machos e fêmeas.
Também com animais de um ano de idade, mas da raça Santa Gertrudis, COUTINHO FILHO et al. (2006) verificaram maior percentual de serrote (50,0% contra 48,1%) e de costilhar (14,3% contra 13,3%) nas fêmeas em relação aos machos inteiros, os quais apresentaram maior percentagem de dianteiro (38,6% contra 35,7%) do que as novilhas. Em animais adultos, VAZ et al. (2002) observaram similaridade nos pesos e percentuais de serrote e de dianteiro entre novilhos e vacas, mas estas últimas mostraram maior peso (16,9 contra 14,9 kg) e percentual de costilhar (15,3% contra 14,2%) do que os novilhos.
Em se tratando de animais com um ano de idade ao abate, os dois sexos apresentaram espessura de gordura adequada, sendo 4,06 mm nos machos e 5,07 mm nas fêmeas. A discussão a respeito da cobertura de carcaça dos animais foi publicada por VAZ et al. (2009), mostrando que, mesmo leves, as novilhas de descarte podem produzir carcaça com adequado acabamento aos quatorze meses de idade. CHIZZOTTI et al. (2007) pesquisaram as exigências nutricionais de machos e fêmeas mestiços zebu x europeu, verificando que as fêmeas são mais leves que os machos castrados e depositam gordura mais cedo, com variações observadas também nas exigências de energia e proteína para crescimento de 0,75 e 1,5 kg por dia, respectivamente. Os dados de composição física da carcaça mostram as variações entre machos castrados e fêmeas observadas neste trabalho (Tabela 4).
A percentagem de gordura da carcaça foi superior nas fêmeas (P<0,004) em relação aos machos, sendo que a diferença de 4,8 pontos percentuais representa 25% a mais de gordura na carne das fêmeas. Essa diferença acentuada pode ser resultado do fato de os animais serem mestiços, com 5/8 de uma raça britânica, considerada bastante precoce, como é o caso da raça Hereford (BERG & BUTERFIELD, 1976). Em animais Santa Gertrudis, raça mais tardia, COUTINHO FILHO et al. (2006) observaram que animais com a mesma idade que estes do presente trabalho, confinados por 109 dias com alto nível energético na dieta, apresentaram valores semelhantes de espessura de gordura, entre machos não castrados (7,07 mm) e para fêmeas (7,29 mm). Os mesmos autores verificaram que as fêmeas mostraram maior peso de gordura renal mais pélvica mais inguinal (7,66 vs 5,88 kg) e maior percentual de aparas de gordura (4,30 vs 3,21%) durante o processo de desossa do traseiro especial, em relação aos machos.
Em novilhas e novilhos Hereford, JOHNSON (1994) verificou maior percentagem de músculo em detrimento a gordura e ossos nos machos. Aplicando equações de regressão, o autor observou o mesmo peso de ossos entre os sexos, mas verificou haver 3 kg a mais de músculo e 3,5 kg a menos de gordura nos novilhos em relação às fêmeas.
O valor para a área de Longissimus dorsi ajustado para o peso de carcaça dos animais foi superior para as fêmeas (30,7 contra 28,4 cm²) em relação aos novilhos. O valor da área de Longissimus dorsi observada nos machos do presente trabalho foi similar ao observado por RESTLE et al. (1997), estudando machos da raça Hereford, abatidos aos quatorze meses de idade. COUTINHO FILHO et al. (2006) observaram similaridade na área de Longissimus dorsi ajustada entre machos não castrados e fêmeas.
Os dados referentes às características peso de fazenda, peso de carcaça quente e rendimento de carcaça quente em relação ao peso de fazenda foram publicados por VAZ et al. (2010) em artigo que discute a qualidade da carcaça dos animais. Esses dados são mostrados na Tabela 5, por serem fundamentais à discussão do rendimento de carcaça de frigorífico.
Os machos apresentaram maior peso vivo de frigorífico (P<0,01) do que as fêmeas (Tabela 5), reflexo do maior ímpeto de crescimento causado pelos hormônios androgênicos, principalmente a testosterona (DANNER et al., 1980; DI MARCO, 1994). Segundo BERG & BUTTERFIELD (1976), os menores pesos das novilhas em relação aos novilhos se deve ao fato de estas começarem a depositar gordura mais cedo, diminuindo a velocidade de crescimento.
Embora o peso de carcaça quente e o rendimento de carcaça quente em relação ao peso vivo na fazenda tenham sido maiores nos machos (VAZ et al., 2009), houve similaridade (P>0,05) no rendimento de carcaça em relação ao peso de frigorífico dos animais, indicando que a diferença de rendimento de fazenda foi afetada pelo enchimento dos animais no momento da pesagem ainda na origem, embora os animais tenham sido pesados após jejum de sólidos de doze horas.
Menor rendimento de carcaça nas fêmeas (56,8%) em relação aos machos (58,9%) é relatado por JUNQUEIRA et al. (1998). PAULINO et al. (2008) observaram maior ganho de peso diário em deposição de carcaça e em deposição de corpo vazio em machos inteiros, se comparados com fêmeas, ficando os animais castrados com valores intermediários, sem diferença significativa. Entretanto, no mesmo trabalho, os autores constataram que as novilhas foram mais eficientes em conversão de alimento em peso de carcaça do que os machos inteiros. A mesma tendência é citada por CHIZZOTTI et al. (2007).
PACHECO et al. (2006a) calcularam as correlações entre as características de carcaça em animais mestiços Charolês x Nelore abatidos aos 24 meses de idade, verificando que o rendimento de carcaça fria possui correlação negativa com o peso do couro (r = -0,45), peso do abomaso (r = -0,52) e peso das gorduras inguinal (r = -0,46), renal (r = -0,43), de toalete (r = -0,68) e gordura ruminal + intestinal (r = -0,72).

CONCLUSÕES

Novilhos são mais pesados ao abate, refletindo um maior ímpeto de crescimento e uma melhor resposta animal com a suplementação em pastagem cultivada.
O maior rendimento de carcaça dos novilhos é em função do menor peso relativo do couro, rúmen vazio, do conteúdo do trato digestivo e da gordura depositada sobre o púbis em relação ao úbere das novilhas.
Novilhas apresentam maior percentual de gordura e maior percentagem de costilhar dos que os novilhos, bem como maior área de Longissimus dorsi ajustada para 100 kg de carcaça do que os machos.

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 Protocolado em: 23 jul. 2009.  Aceito em: 18 nov. 2009.