A população de raças caprinas
naturalizadas e Sem Raça Definida (SRD) do Nordeste do Brasil é pouco
caracterizada, apesar da importância que se tem dado aos estudos de
recursos genéticos em animais domésticos. Com o objetivo de estudar o
polimorfismo do gene da αS1-caseína em DNA genômico de cabras Moxotó e
SRD provenientes do Semiárido do Nordeste brasileiro, por meio da
técnica de PCR-RFLP (Polymerase Chain Reaction-Restriction Fragment
Lenght Polymorfism), foram genotipadas 215 cabras pertencentes aos
grupos genéticos Moxotó e SRD, provenientes dos estados de Pernambuco,
Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Com base na frequência alélica
das raças estudadas, não se observou diferença significativa (p>
0,05) entre as populações de cada Estado e entre animais Moxotó e SRD.
Diante da maior frequência observada do alelo B (forte) do gene da
αS1-caseína nos animais estudados, admite-se a possibilidade de que
fenotipicamente esses animais venham a exibir a característica de uma
forte produção de proteínas, característica importante para o leite
destinado à produção de queijos, favorecendo a caprinocultura da região.
PALAVRAS-CHAVES: DNA, leite, PCR-RFLP.
The population of native and
mixed-breeds (MB) goats from the Northeast of Brazil is little
characterized, despite the importance given to studies of genetic
resources in domestic animals. With the objective of studying the
polymorphism of the αS1-casein gene in genomic DNA of Moxotó and
mixed-breed goats from the semi-arid of Brazilian Northeast, by the
PCR-RFLP (Polymerase Chain Reaction-Restriction Fragment Lenght
Polymorfism) technique, 215 Moxotó and mixed-breeed goats, which came
from the Brazilian states of Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte
and Ceará, were used. Based on the allelic frequency from the breeds
studied, there was no significant difference (p> 0.05) among the
populations of each studied state and between Moxotó and mixed-breed
animals. In face of the detection of a highest presence of allele B
(strong) from the αS1-casein gene in the animals studied, it is
admitted the possibility that, phenotypically, these animals present
the characteristic of a strong production of proteins, an important
feature for the milk destined to cheese production, favoring the goat
raising in the region.
KEYWORDS: DNA, milk, PCR-RFLP.
INTRODUÇÃO
A importância econômico-social dos caprinos criados no Nordeste do
Brasil reside na produção de leite e de carne, para alimentação das
populações de média e baixa renda, como fonte de proteína animal de
baixo custo. No entanto, a população das raças caprinas naturalizadas
desta região e dos animais Sem Raça Definida (SRD) é pouco
caracterizada, apesar da importância que se tem dado aos estudos de
recursos genéticos em animais domésticos (SILVA & ARAÚJO, 2000).
Existem grupos de pesquisadores empenhados em estudar as raças nativas,
buscando subsídios para a conservação desse material genético tão
importante para a subsistência da população nordestina. No entanto,
ainda são poucos os estudos relacionados com as variantes genéticas das
caseínas em caprinos no Brasil, destacando-se os trabalhos de MARINI
et al. (2007), com cabras Saanen da região Sudeste, e SILVA
et al. (2007), com animais da raça Moxotó e Alpina Americana em Pernambuco.
O leite dos ruminantes contém seis proteínas que podem ser
classificadas em dois grupos: caseínas (αS1, αS2, β e ĸ) e proteínas do
soro (β lactoglobulina e α lactoalbumina). As quatro caseínas são os
principais componentes, totalizando 76%-86% do total das proteínas
lácteas (MARTIN
et al.,
2002). A alta concentração de αS1-caseína parece estar relacionada com
a intolerância apresentada por algumas pessoas ao leite bovino, o que
tem caracterizado o leite caprino como menos alergênico, por ter uma
concentração menor desta caseína (HAENLEIN, 2004). Por outro lado,
altos níveis de αS1- caseína estão associados a elevado nível de
proteína total e micelas menores, contendo menos cálcio, apresentando
maior potencial na fabricação de queijos e coalho firme (CLARK &
SHERBON, 2000).
A fração de caseína é codificada por quatro genes ligados e é
organizada como um agrupamento em um segmento de DNA genômico de 250Kb,
na seguinte ordem: αS2-caseína (CSN1S2), αS1-caseína (CSN1S1),
β-caseína (CSN2) e ĸ-caseína (CSN3) (THREADGILL & WOMACK, 1990). O
gene CSN1S1 caprino apresenta o maior grau de variabilidade de todos os
genes de caseína de ruminantes estudados, e já foram identificados
alelos associados com diferentes níveis de expressão de αS1- caseína no
leite, sendo estes níveis designados “alto”, “médio”, “baixo” e “nulo”
(MARTIN
et al., 1999).
A identificação dos alelos da caseína do leite, mediante o emprego da
biologia molecular, pode contribuir para o ajuste de programas de
melhoramento animal, direcionando o leite produzido para a tecnologia
de produtos mais apropriada.
Diante do exposto, objetivou-se caracterizar o genótipo da αS1-caseína
de cabras naturalizadas Moxotó e SRD da Região do Semiárido do Nordeste
do Brasil, através da técnica PCR-RFLP (Polymerase Chain
Reaction-Restriction Fragment Lenght Polymorfism), para aplicação como
ferramenta de seleção quanto à característica do leite, nesses animais.
MATERIAL E MÉTODOS
Amostras
Foram utilizadas 215 cabras adultas da raça Moxotó (n =126) e SRD
(n=89), clinicamente sadias, criadas de maneira extensiva, provenientes
da região do Semiárido do Nordeste do Brasil, nos estados do Ceará
(n=51), Pernambuco (n=61), Paraíba (n=77) e Rio Grande do Norte (n=26).
O DNA genômico foi extraído a partir dos leucócitos, através da técnica fenol-clorofórmio modificado (MANIATIS
et al., 1989) e estocado a -20°C. realizou-se a quantificação do DNA em espectrofotômetro (Bionate 3- ThermoScientífic).
PCR-RFLP da αS1-caseína
O éxon nove do gene da αS1- caseína foi amplificado usando a Reação de
Polimerase em Cadeia (PCR). Desenvolveu-se a reação conforme
RAMUNNO
et al. (2000).
O fragmento amplificado com 230 pb foi digerido em volume final de 15
µL, contendo: 5 µL do produto de PCR, 8,4 µL de água pura, 1,5 µL de
tampão da enzima, 1,0 U da enzima XmnI (New England – Biolabs), por
quatro horas a 37 ºC; em seguida, inativação da enzima a 65 ºC por
vinte minutos. Analisaram-se os fragmentos digeridos em gel de agarose
2% corado com brometo de etídeo.
Os dados foram tratados de forma descritiva, calculando-se a frequência
das bandas alélicas encontradas, na forma de percentis (%), para se
estabelecer a ocorrência dos alelos encontrados em cada raça e em cada
Estado envolvido no estudo. Realizou-se também a verificação das
heterozigosidades observadas e esperadas. Assumindo que existe um
estado ideal de equilíbrio Hardy-Weinberg (EHW), ele foi verificado
utilizando o teste exato de Fischer, que consiste em possíveis
frequências genotípicas para um determinado lote de frequências
alélicas, rejeitando-se a hipótese de EHW cujas frequências sejam
incomuns. O teste exato de Fisher trata do cálculo não enviesado da
probabilidade de EHW, usando-se o método em cadeia de Markov, com 1.000
interações (GUO & THOMPSON, 1992). Utilizou-se a opção excesso de
heterozigoto. As análises foram realizadas pelo programa GENEPOP
(versão 1.2), sendo o nível de significância padronizado para 0,05
(RAYMOND & ROUSSET, 1995).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A amplificação do éxon nove do gene da αS1-caseína ocorreu em todos os
animais estudados apresentando o mesmo padrão com 230 pares de bases
(pb). O resultado da digestão enzimática (endonuclease XmnI) produziu
dois padrões de fragmentos, sendo duas bandas (65 + 165 pb) para
o alelo B e somente uma banda de 230 pb para o alelo D (
Figura 1).
O gene CSN1S1 caprino apresenta a maior variabilidade de todos os genes
de caseína de ruminantes já estudados e até dezesseis alelos são
conhecidos nesse lócus (BEVILACQUA
et al., 2002). Os dois alelos observados neste trabalho (B e D) já haviam sido relatados por RAMUNO
et al. (2000) e SILVA
et al. (2007).
Na
Tabela 1
encontram-se as frequências alélicas e genotípicas do loco estudado,
onde se observou uma maior frequência do alelo B em relação ao alelo D
em todas as populações estudadas. O alelo D é considerado um alelo de
nível fraco quanto à produção da proteína no leite, indicando que o
leite com baixo teor de caseína é uma importante opção, quando o
indivíduo apresenta alergia, se exposto demasiadamente a esse tipo de
proteína (MARINI
et al.,
2007). A predominância do genótipo BB em todas as populações analisadas
indica o genótipo característico de maior produção de caseína no leite.
De acordo com GROSCLAUDE
et al.
(1994), os alelos A, B1, B2, B3, B4, C e M (3,6 g/L), H (4,2 g/L) e L
(3,6 g/L) estão relacionados com a elevada presença de αS1- caseína no
leite. Observou-se baixa frequência de heterozigosidade em todas as
populações, principalmente nas populações da Paraíba, Pernambuco e Rio
Grande do Norte. A análise das frequências não demonstrou desvios para
o EHW seja nas raças ou nos Estados estudados em relação ao loco
analisado, o que pode ser verificado nos níveis de heterozigoto
observados, que apresentaram valores acima quando comparados aos de
heterozigotos esperados. Tampouco foi observada diferença significativa
entre as proporções de cada raça ou Estado (P>0,05), não se
observando desvios para o EHW (
Tabela 1).
O alelo B da αS1-caseína foi observado, com maior frequência, na raça
nativa francesa Poitevine, embora o alelo E tenha predominado em outros
caprinos nativos das montanhas dos Pirineus (Aldudes, Arette Lourdios,
Aspe Pau-Aquitaine, Soulor, Bigorre, Nistos Ariège, Chèvres e Boucs)
(RICORDEAU
et al., 1996). Do mesmo modo, caprinos indianos apresentaram, pela técnica de PCR /RFLP, alelos A e B em maior proporção (KUMAR
et al.,
2007). O alelo B (forte) também foi encontrado em maior frequência
entre caprinos leiteiros húngaros nativos, do que nas raças importadas,
Alpina e Saanen (KUSZA
et al., 2007).
A concentração total de caseína no leite caprino está positivamente
correlacionada com os alelos da αS1-caseína, sendo maior nos animais
que apresentam os alelos A, B e C (GROSCLAUDE
et al., 1987).
Não houve um alto polimorfismo na população estudada, sendo verificada
uma alta frequência gênica do alelo B. Essa frequência elevada pode
sugerir uma proximidade genética desses animais, o que não pode ser
confirmado com base nos resultados de apenas um éxon.
SILVA
et al. (2007),
realizando a genotipagem de cabras criadas no Sertão, Agreste e Zona da
Mata do Estado de Pernambuco, constataram que os alelos B e D foram
predominantes para a raça naturalizada Moxotó e animais SRD, e os
alelos C e D, para a raça Alpina Americana, concluindo que existem
variações genéticas para o gene da αS1-caseína do leite das raças
caprinas estudadas.
Apesar de ser encontrado, em menor frequência, o alelo D ocorreu nas
três populações SRD e em uma Moxotó. Este fato poder ser devido à
introdução de outras raças caprinas, que carregam este alelo em sua
composição genética como, por exemplo, a Alpina Americana, conforme
resultados de SILVA
et al. (2007), obtidos pelo mesmo grupo de pesquisa deste trabalho.
Em outro estudo, foi constatado que os genótipos das raças Moxotó e SRD
se identificaram com os da raça Canária da Espanha, nas quais os alelos
fortes A e B foram mais frequentes (JORDANA
et al., 1996).
CONCLUSÕES
Os resultados demonstraram que não houve um alto polimorfismo nas
populações estudadas, sendo verificada maior frequência do alelo
B, admitindo-se a possibilidade de que fenotipicamente esses animais
venham a exibir a característica de uma forte produção de proteínas,
característica importante para o leite destinado à produção de queijos,
favorecendo a caprinocultura da região.
AGRADECIMENTOS
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Pernambuco (FACEPE), pelo
apoio financeiro, e a Laura Leandro da Rocha, pelo auxílio na análise
estatística deste trabalho.
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Protocolado
em: 4 maio 2009. Aceito em: 25 mar.
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