A partir de ensaios in vitro, em
ambiente controlado e a campo, foi avaliada a atividade do inseticida
tiametoxam em populações de Musca domestica
provenientes da colônia do Laboratório de Doenças Parasitárias do
Departamento de Epidemiologia e Saúde Pública da Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro e do aterro sanitário do Município de
Seropédica, RJ. Para a técnica in vitro o ativo utilizado foi
previamente diluído em acetona, obtendo-se as concentrações de 5; 7,5;
10; 12,5; 15; 17,5; 20; 22,5; 25; 27,5 e 30 mg/ml. Em seguida, discos
de papel-filtro foram impregnados com 1 ml de cada uma dessas diluições
e realizaram-se testes com estas em moscas adultas acondicionadas em
placas de Petri, sendo que os discos do grupo-controle foram
impregnados apenas com acetona. Para técnica em ambiente controlado e
em nível de campo, empregaram-se iscas com o ativo e placebo para o
grupo-controle. O valor calculado da dose letal 50 (DL50),
utilizando-se a técnica in vitro, para tiametoxam em M. domestica
foi de 0,2612 mg/cm². A eficácia das iscas com tiamethoxan no ensaio em
ambiente controlado e em nível de campo foi de 94,06 % e 98,09 %,
respectivamente.
PALAVRAS-CHAVES: Iscas, Musca domestica, neonicotinoides, tiametoxam
The activity of the insecticide thiamethoxam on populations of
Musca domestica
was assessed through in vitro tests, controlled environment and field
conditions. The flies were gathered from a colony maintained by the
Laboratory of Parasitic Diseases, Department of Epidemiology and Public
Health, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, and from the
landfill of the city of Seropédica-RJ, Brazil. Regarding the in vitro
assay, thiamethoxan was previously diluted in acetone, resulting in
concentrations of 5, 7.5, 10, 12.5, 15, 17.5, 20, 22.5, 25, 27, 5 and
30 mg/ml. Then, filter paper discs were impregnated with 1 ml of each
of these dilutions. Thus, the test was conducted with adult flies
maintained in Petri dishes. For the controlled environment and field
conditions, trial baits were used with the active or a placebo (control
group). The lethal concentration 50 (LC50) of thiamethoxam on
M. domestica
found in the in vitro assay was 0.2612 mg / cm ². The efficacy of
thiamethoxan baits on the controlled environment and field conditions
trials was 94.06 % and 98.09 %, respectively.
KEYWORDS: Baits,
Musca domestica, neonicotinoids, thiamethoxam.
INTRODUÇÃO
A espécie
Musca domestica
(Linnaeus, 1758), conhecida mundialmente como mosca doméstica, é um
inseto cosmopolita e está em associação muito estreita com o homem e
seu alimento, bebidas e lixo. Pelo seu hábito de regurgitar e depositar
suas fezes no alimento, ela está relacionada com a transmissão de
diversas doenças (HEWITT, 1914). Dentre elas são citados, na
literatura, a febre tifoide, o cólera, o tracoma, lepra, conjutivites,
o vírus da poliomielite, protozooses tais como
Giardia duodenalis e
Entamoeba coli (FREITAS
et al., 1978; FOEDAR, 2001). Atua também como hospedeiro intermediário de alguns endoparasitos como
Habronema muscae e
Draschia megastoma nos equinos (COLLOBERT-LAUGIER, 2000),
Raillietina sp. nas aves (HORSFALL, 1938) e como vetor forético de ovos de
Dermatobia hominis (RIBEIRO, 1985).
Em função de sua importância, diversas medidas de controle têm sido
implantadas, sendo o controle químico, através de formulações de
inseticidas, o mais utilizado (NEVES & NOGUEIRA, 1996). O controle
nesta espécie constitui um grande problema em saúde pública,
principalmente pela elevada resistência aos inseticidas químicos
(CHAPMAN
et al., 1993).
Os neonicotinoides são amplamente utilizados no controle de pragas de
importância na agricultura (KAGABU, 1997). Estes apresentam uma boa
atividade contra populações de pragas resistentes a outras classes de
inseticidas como os organofosforados, os carbamatos, os piretroides, e
muitas outras classes de compostos (NAUEN
et al.,
2003). Os neonicotinoides recebem essa denominação por se ligarem
agonisticamente aos receptores nicotínicos pós-sinápticos de
acetilcolina, afetando as sinapses no sistema nervoso central dos
insetos (KAGABU, 1997). Eles representam uma classe promissora de
inseticidas com excelentes propriedades químicas e biológicas (WAKITA
et al.,
2005). A segurança e a eficácia dos neonicotinoides têm sido
atribuídas, em parte, à alta seletividade desses compostos pelos
receptores nicotínicos de acetilcolina dos insetos quando comparados
aos dos mamíferos (TOMIZAWA & CASIDA, 2003).
Recentemente, KIRIYAMA (2002) realizou os primeiros estudos com o dinotefuran, em
M. domestica,
apresentando resultados eficazes no controle químico além de ser uma
forma auxiliar para o controle desses insetos resistentes a diferentes
grupamentos químicos.
Os estudos envolvendo a ação do tiametoxam sobre
M. domestica
são escassos. No entanto, KRISTENSEN & JESPERSEN (2008), em seus
estudos, obtiveram a dose letal 50 (DL50) do tiametoxam. VAN-HERK
et al. (2008), ao empregarem esse inseticida no controle do coleóptero
Agriotes obscurus, também obtiveram o valor da DL50.
O presente trabalho teve por objetivo avaliar a eficácia in vitro de
diferentes concentrações de tiametoxam no controle de adultos de
M. domestica,
calcular a dose letal 50 a partir dos resultados obtidos no teste in
vitro, e avaliar uma formulação de tiametoxam na apresentação de isca
mosquicida em ambiente controlado e em nível de campo.
MATERIAL E MÉTODOS
A manutenção da colônia de
M. domestica,
o teste in vitro e os testes em ambiente controlados foram realizados
no Laboratório de Quimioterapia Experimental em Parasitologia
Veterinária (LQEPV), do Departamento de Parasitologia Animal (DPA),
Instituto de Veterinária (IV), da Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro (UFRRJ). Realizaram-se os testes em nível de campo no aterro
sanitário do Município de Seropédica, RJ.
Adquiriram-se exemplares de
M. domestica
no Laboratório de Epidemiologia e Saúde Pública (DESP), (IV) da UFRRJ.
As moscas foram mantidas no LQEPV em gaiolas medindo 28,5 cm de altura,
27,5 cm de largura e 32 cm de profundidade. A dieta para a
manutenção de adultos foi a base de uma mistura contendo leite em pó e
açúcar na proporção de 1:1, disponibilizada no interior da gaiola, além
de água, embebida em algodão em placas de Petri, colocada diariamente
no interior da gaiola. Como substrato de oviposição e dieta para as
larvas utilizou-se uma mistura de ração de coelho e farelo de trigo na
proporção de 1:1 umedecidas com água, distribuída em recipientes de
plástico e alocada diariamente no interior da gaiola para obtenção de
novas posturas. Após 24 horas, os recipientes foram retirados das
gaiolas e transferidos para o interior de uma estufa climatizada com
demanda bioquímica de oxigênio com temperatura constante de 27 ± 1 ºC e
umidade relativa de 80 ± 10 %. Após a emergência dos adultos,
colocaram-se os recipientes em novas gaiolas. Repetiu-se esse
procedimento até a obtenção da quarta geração (F4), sendo esta
selecionada para a realização dos testes.
Como princípio ativo selecionou-se o neonicotinoide tiametoxam. A
metodologia empregada para o cálculo da DL50 foi a do resíduo em papel
de filtro (SHEPPARD & HINKLE, 1987). Prepararam-se as diluições a
partir de 25; 37,5; 50; 62,5; 75; 87,5; 100; 112,5; 125; 137,5 e 150 mg
de tiametoxam em 5,0 ml de acetona, com a obtenção das concentrações de
5; 7,5; 10; 12,5; 15; 17,5; 20; 22,5; 25; 27,5 e 30 mg/ml.
Com auxilio de micropipeta de volume fixo, 36 discos de papel-filtro
foram impregnados com as diferentes concentrações. Para cada disco,
empregou-se um mililitro (1,0 ml) de cada diluente, sendo três
repetições para cada concentração. No grupo-controle, impregnaram-se
três discos com um mililitro de acetona. Cada disco, com área de
aproximadamente 63,585 cm², foi colocado no interior de cada placa de
Petri, e, após este procedimento, foram mantidos em temperatura
ambiente por um período de 24 horas, para evaporação da acetona.
Após esse período, retiraram-se as moscas das gaiolas com auxílio de um
aspirador de pó tipo industrial, sendo posteriormente imobilizadas com
dióxido de carbono para separação de machos e de fêmeas. Em cada
repetição foram colocadas dez moscas, cinco fêmeas e cinco machos, nas
placas de Petri com os discos impregnados e, a partir daí, deu-se
início ao desafio em ambiente com temperatura e umidade controladas. Os
tempos de avaliação da atividade do tiametoxam foram inicialmente de
dez e trinta minutos e posteriormente de uma, duas, três, 12, 24, 36 e
48 horas.
Para o cálculo da dose letal 50, foi utilizado o programa Analyst Soft BioStat 2007 – Statistical Analysis Program.
Para avaliar uma formulação de tiametoxam na apresentação de isca
mosquicida, foram realizados dois ensaios: um em ambiente controlado e
um em nível de campo, seguindo a metodologia proposta pelo Regulamento
Técnico para Licenciamento e/ou Renovação de Licença de Produtos
Antiparasitários de Uso Veterinário da Portaria nº 48, de 12 de maio de
1997, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA,
1997).
Para esses ensaios, separaram-se dois gramas de isca mosquicida com
tiametoxam a 1 % e dois gramas de isca sem o ativo (placebo) em placas
de Petri. Cada placa foi mantida no centro de uma superfície de cor
branca (cartolina), com uma área de um metro quadrado.
No teste controlado, através de imobilização por dióxido de carbono,
separaram-se e acondicionaram-se duzentas moscas em recipiente
provisório até o início do desafio. Em uma sala de alvenaria, com uma
área de aproximadamente oito metros quadrados, devidamente telada,
foram colocadas as duas superfícies de papel cartolina e, no centro
dessas, uma placa com a isca, e em outra a placa com o placebo, com
dois metros de distância aproximadamente entre cada placa. Em seguida,
as moscas foram soltas na sala, e teve início o ensaio. A cada trinta
minutos, realizou-se a contagem do número de moscas mortas na área
delimitada tratada e não tratada, e em seguida procedeu-se à troca da
posição das superfícies (papel cartolina) com a isca tratada e a com
placebo, repetindo-se esse procedimento por quatro vezes. Durante todo
o ensaio, mensuraram-se a temperatura e a umidade.
Para a avaliação da isca mosquicida em nível de
campo, foi seguida a metodologia descrita anteriormente. O experimento
foi realizado no período mais quente do dia, ou seja, por volta do
meio-dia, no aterro sanitário situado no Município de Seropédica, RJ,
com a população de moscas oriunda do local.
O cálculo da eficácia foi realizado através da seguinte fórmula: [(soma
das moscas mortas na área tratada - soma das moscas mortas na área não
tratada) / soma das moscas mortas na área tratada] X 100 (MAPA, 1997).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No teste in vitro o número de moscas – nas tomadas de tempos de dez
minutos, trinta minutos, uma hora, duas horas, três horas, doze horas,
24 horas, 36 horas e 48 horas – afetadas por efeito de
hiperexcitabilidade após expostas ao produto foi de 11, 56, 66, 81, 87,
98 171, 232 e 311, respectivamente. O número de moscas mortas nas
tomadas de tempos citadas acima foi respectivamente de 0, 13, 18, 41,
53, 56, 79, 212, 253 de um total de 330 exemplares expostos ao produto (
Tabelas 1 e
2).
O valor encontrado para DL50 em M. domestica foi de 0,2612 mg/cm² com
intervalo de confiança (95%) de 0,0078 a 8,7573 mg/cm². Calculou-se a
dose com base na tomada de tempo de 36 horas, na qual ocorreu alta taxa
de mortalidade no grupo tratado. No grupo testemunha não havia nenhuma
mosca morta.
KRISTENSEN & JESPERSEN (2008), em seus experimentos, calcularam a DL50 do tiametoxam, sob forma de iscas, em
M. domestica,
encontrando o valor de 1,7 μg em cada grama de isca utilizada. Embora,
na metodologia utilizada, a forma de apresentação do produto ser
diferente, cabe salientar que os resultados obtidos revelam eficácia do
tiametoxan sobre
M. domestica, corroborando os resultados encontrados no presente trabalho.
Diversos compostos inseticidas, na formulação spray, foram testados
para cálculo da DL50, em uma espécie de coleóptero, Agriotres obscurus,
dentre eles o neonicotinoide tiametoxam. Para este inseticida, o valor
encontrado neste inseto foi de 0,17 %, correspondendo a 1,7 mg em cada
mililitro de produto (VAN-HERK
et al.,
2008). Apesar de se tratar de um inseto diferente, é apreciável se
considerar que pertencem à mesma Classe, Insecta, portanto, apresentam
fisiologia semelhante. Diante disso, assim como no presente trabalho, é
mais uma vez comprovada a eficácia do tiametoxam em insetos.
No ambiente controlado, expondo duzentas moscas à isca com ativo,
o total de moscas mortas foi de 38, no período de duas horas (
Tabela 3).
No teste efetuado em campo, o número de moscas mortas foi de 254
exemplares, com registros de temperatura durante o período variando de
26 a 27°C e umidade relativa de 80% (
Tabela 4).
Observou-se que, nas posições em que as iscas ficavam em área com maior
iluminação, ocorreu maior taxa de mortalidade. Trata-se de resultado
que reforça a recomendação do MAPA quanto à mudança de posições entre o
grupo-controle e o grupo-tratado.
A eficácia das iscas utilizadas no ambiente controlado e em campo foi
respectivamente de 94,74 % e 98,03%. A recomendação do MAPA (1997) é
que a eficácia mínima seja de 80% para produtos mosquicidas.
õe à proliferação de populações de diversos insetos, inclusive M.
domestica. Existem poucos estudos empregando-se o tiametoxam no
controle deste díptero, que tantos prejuízos provocam à saúde de homens
e animais. Os resultados obtidos poderão contribuir com o sucesso do
seu controle, proporcionando bem-estar e melhores condições de saúde,
uma vez que as moscas são responsáveis pela veiculação de diversos
patógenos.
CONCLUSÃO
A isca utilizada de tiametoxan nos ensaios foi eficaz no controle de
M. domestica tanto em ambiente controlado quanto em nível de campo.
A determinação da DL50 para
M. domestica,
com o tiametoxam, utilizando-se papel-filtro impregnado com este
composto, possibilitará o monitoramento periódico de possível
desenvolvimento de focos de resistência da mosca doméstica a esta nova
classe dos neonicotinoides.
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Protocolado
em: 13 mar. 2009. Aceito em: 15 abr.
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