Resumo
O plasma rico em plaquetas autólogo é importante no processo cicatricial de cirurgias reconstrutivas, auxiliando na estimulação da angiogênese; no entanto, o plasma heterólogo mostrou-se mais eficaz. Utilizou-se 24 coelhos da raça Nova Zelândia, com idade de 12 meses, com peso corporal cerca de 3,0 kg. Os animais foram separados em quatro grupos de igual número e submetidos a remoção de pele na linha média dorsal torácica (ferida tratada) e lombar (ferida controle). Nas tratadas, foi aplicado plasma rico em plaqueta de equino e pomada contendo gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A e, nas do grupo controle, somente a pomada. Nos do grupo I, foi coletado tecido cutâneo para a avaliação histológica com três dias de pós-operatório, nos do grupo II com sete dias, nos do grupo III com 14 dias e, nos do grupo IV, com 21 dias. Decorrido o período de avaliação de cada grupo, foi coletado fragmento de pele para avaliação histológica. O uso associado do plasma rico em plaquetas heterólogo de equino com a pomada contendo gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A, em feridas de pele induzidas cirurgicamente acelera o processo cicatricial.
Palavras-chave: cicatrização, fatores de crescimento, pele, plasma rico em plaquetas
Abstract
Autologous platelet-rich plasma (PRP) is beneficial in the healing process of reconstructive surgeries, contributing to the stimulation of angiogenesis; however, heterologous plasma has been shown to be more effective. The objective of this study was to verify, by macro- and microscopic evaluation, whether PRP accelerates the healing process as compared to a commercial ointment containing gentamicin, sulfanilamide, sulfadiazine, urea, and vitamin A (study ointment). This study used 24 white New Zealand rabbits, aged 12 months, and each weighing approximately 3 kg. The animals were separated into 4 equal groups and underwent wound induction through skin removal in the thoracic (study wound) and lumbar (control wound) dorsal midline. Study wounds were co-treated with equine PRP and the study ointment. Control wounds were treated with only the study ointment. Group I underwent histological evaluation 3 days after the skin removal procedure, group II after 7 days, group III after 14 days, and group IV after 21 days. A skin fragment was collected from each animal for histological evaluation. The co-treatment with heterologous equine PRP and the study ointment accelerated the healing process in the surgically induced skin wounds, confirming the acceleratory effect of PRP on wound healing.
Keywords: healing, skin, growth factors, platelet rich plasma.
Seção: Medicina Veterinária
Recebido
13 de dezembro de 2018.
Aceito
27 de novembro de 2019.
Publicado
22 de abril de 2020.
www.revistas.ufg.br/vet
Como citar - disponível no site, na página do artigo.
Introdução
A cicatrização é um processo que restaura a integridade física externa das estruturas corporais e envolve integrações complexas entre células e vários outros fatores. É um processo dinâmico e complexo, composto pelas fases de inflamação do tecido, proliferação e remodelação(1,2). O processo de cicatrização compreende a matriz extracelular, citocinas, células sanguíneas e fatores de crescimento(1,3,2).
Fatores de crescimento são proteínas que estimulam e ativam a proliferação celular por ativação da angiongênese, mielogênese e genetranscrição, entre outras reações, que ativam e aceleram o processo de cicatrização(2). Entre os fatores de crescimento, os mais importantes para a cicatrização de feridas incluem o de crescimento epitelial (EGF), de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), crescimento transformador beta (TGF-b) e de crescimento endotelial vascular (VEGF)(4).
Estudos sobre o plasma rico em plaquetas (PRP) estão voltados à avaliação de seus fatores de crescimento, os quais são importantes no reparo das feridas e que são liberados a partir da degranulação plaquetária. A secreção ativa desses fatores tem início 10 minutos após a coagulação plaquetária, em que mais de 95% são secretados dentro de uma hora(1,2). Quando em contato com seus receptores nucleares respectivos, estimulam a angiogênese, replicação dos tecidos, cicatrização e crescimento de novas estruturas orgânicas(1,3). A vantagem do uso de PRP produzido a partir do sangue equino, em relação ao soro autólogo, é que este plasma contém maior concentração de vitaminas e de fatores de crescimento, além disso, como as plaquetas permanecem intactas, podem aderir-se à superfície tecidual, atuando de forma biológica e mecânica(3).
O processo de reparação pode ser avaliado mediante técnica de coloração com hematoxilina-eosina (HE), utilizando diversos indicadores, como exsudato neutrofílico, edema intersticial, necrose de mucosa, necrose transmural, deposição de fibrina, congestão vascular, infiltrado monomorfonuclear, atividade regenerativa da mucosa, proliferação fibroblástica, neoformação vascular, processo granulomatoso e fibrose intersticial(1,5,6).
Objetivou-se com o presente trabalho verificar se o plasma rico em plaquetas acelera o processo cicatricial em comparação à pomada comercial contendo gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A por meio de avaliação macro e microscópica.
Material e métodos
O experimento foi aprovado pelo comitê de ética em experimentação animal da Universidade de Uberaba, ofício CEEA no 034/2016, para utilização de 24 coelhos brancos da raça Nova Zelândia, machos hígidos, com idade média de 12 meses e peso corporal de cerca de 3,0 kg. Os animais foram separados em quatro grupos de igual número (n=6) e considerados hígidos após avaliações clínicas, exames laboratoriais de hemograma e coproparasitológico direto.
Os coelhos foram submetidos a remoção de pele na região da linha média dorsal torácica e lombar, uma vez que o acesso do animal a estas regiões é limitada, não interferindo no processo cicatricial. Dessa forma, foram induzidas em cada coelho duas feridas, sendo a torácica considerada a ferida tratada (FT) e a lombar a ferida controle (FC). As feridas torácicas foram tratadas com plasma rico em plaquetas de equino e pomada contendo gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A. As lombares foram tratadas com a referida pomada. Dos animais do grupo I foi coletado tecido cutâneo para a avaliação histológica com três dias de pós-operatório (PO), os do grupo II com sete dias, os do grupo III com 14 dias e os do grupo IV com 21 dias de PO, totalizando para cada grupo de observação seis feridas tratadas e seis feridas controles. Os coelhos foram mantidos durante todo o período do experimento em gaiolas individuais com ração e água potável à vontade.
Para a produção do plasma rico em plaquetas foi utilizado um equino macho, da raça quarto de milha, hígido, pesando 550Kg e com idade aproximada de 12 anos. O equino foi considerado saudável após avaliações clínicas, exame laboratorial de hemograma e contagem de ovos por grama de fezes (OPG), permanecendo alojado em piquete com gramínea de tifton 85 (Cynodon spp) com água potável e suplementação mineral à vontade.
Para obtenção do plasma rico em plaquetas coletou-se, diariamente, 40 mL de sangue da veia jugular externa de um equino. O sangue foi distribuído em tubos de 4,0 mL contendo citrato de sódio a 3,2%. O material foi centrifugado, em centrífuga celm série 4161, durante 20 minutos a 2.220 rpm (400G), para a separação celular através de gradiente de concentração. Foi pipetada a fração de plasma e plaquetas contidas na parte superior do tubo e armazenada em recipiente sem anticoagulante. A porção retirada foi novamente centrifugada durante 10 minutos a 2.220 rpm (400G). Dois terços do componente superior do soro foi removido por se tratar de plasma pobre em plaquetas e um terço restante, no fundo do frasco, foi considerado o plasma rico em plaquetas. Antes da ativação do PRP com cloreto de cálcio a 5%, o plasma foi avaliado para verificar a viabilidade plaquetária e a contagem total de células. A contagem manual das plaquetas foi efetuada em câmara de Neubauer e, para ser ativado e considerado PRP, a contagem foi superior (1.158,750±202.723) a pelo menos quatro vezes a contagem plaquetária inicial (250.000±180.000), portanto, para cada 0,5 mL do PRP foi adicionado 0,25 mL de cloreto de cálcio a 5%. A solução foi homogeneizada e mantida em repouso em caixa térmica com gelo por aproximadamente 10 minutos para transporte até o local onde os curativos foram realizados(7).
Os animais foram submetidos a jejum hídrico e de alimentos sólidos por seis horas e anestesiados com quetamina (35 mg/Kg, IM), (cloridrato de cetamina 10%, Vetinil, Brasil) e sedanew (5,0 mg/Kg, IM), (xilazina 2%, Vetnil, Brasil) e submetidos a tricotomia da linha média dorsal torácica ao longo da região interescapular e ilíaca. Após antissepsia tópica do campo cirúrgico com clorexidina degermante 2% e clorexidina alcoólica 0,5%, foram realizadas na linha média dorsal torácica duas incisões de pele em formato circular, com um molde circular de metal com 3,0 cm de diâmetro, equidistantes uma da outra em aproximadamente 10,0 cm, formando-se as feridas torácica (tratada) e lombar (controle). Para controle da dor, os coelhos foram medicados com tramadol (0,5mg/Kg, IM), (cloridrato de tramadol, 50 mg/mL, união química farmacêutica nacional S/A, Brasil), duas vezes ao dia durante três dias.
Diariamente, o primeiro curativo foi realizado às oito horas, ambas as feridas foram irrigadas com solução de cloreto de sódio a 0,9% e posteriormente higienizadas com gaze. Em seguida foi aplicado nas feridas tratadas 0,2 mL de concentrado de plasma rico em plaquetas de equino em concentração média de 1.578.750 plaquetas/mm³ (±202.723), produzidas no mesmo dia e ativadas com cloreto de cálcio a 5% no momento do procedimento. Nas feridas controles, foi aplicado 1,5 g de Vetaglós (gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A, Vetnil, Brasil). O segundo curativo foi realizado às 20 horas, aplicado em ambas as feridas, após irrigadas com solução de cloreto de sódio a 0,9%, 1,5 g de Vetaglós.
Os coelhos foram mantidos em gaiolas individuais e, durante o primeiro curativo às oito horas, as feridas foram avaliadas atribuindo escores, para coloração (1-vermelha leve, 2-rósea, 3-pálida, 4-cianótica, 5-vermelha intensa), presença de exsudato (0-ausente, 1-seroso, 2-sanguinolento, 3-purulento), granulação (0-ausente, 1-presente), crosta (0-ausente, 1-presente), hiperemia (0-ausente, 1-presente) e edema (0-ausente, 1-presente)(8).
As feridas foram mensuradas com paquímetro digital 150 mm (modelo Mtx 316119), nos sentidos crânio-caudal e látero-lateral para determinação da área (cm2) e do potencial de contração da ferida (%). Os dados obtidos foram registrados em planilha individual para cada animal. Para cálculo da área das feridas, utilizou-se a fórmula: A= π x R x r, (A= área, π = 3,14, R= raio maior e r = raio menor da ferida). Para o potencial de contração da ferida empregou-se a fórmula: PC= (Ai – Af)/Ai x100, em que PC= potencial de contração, Af= área final e Ai= área inicial da ferida(7).
Decorridos os períodos de observação dos grupos, os coelhos foram submetidos à eutanásia para remoção de cerca de 3,0cm das bordas e do leito das feridas. Para eutanásia, foram usados a associação acepran 0,2% (0,05 mg/kg), (maleato de acepromazina 200mg/100mL, Vetnil, Brasil), quetamina 10% (30 mg/kg) e dormium 0,5% (0,5 mg/kg), (midazolam 15mg/3mL, união química farmacêutica nacional S/A, Brasil) por via intramuscular; após entrar em plano anestésico, os coelhos foram canulados para a administração de cloreto de potássio 19,1% (cloreto de potássio 191mg/mL, Isofarma, Brasil) por via intravenosa. As amostras foram fixadas durante 48 horas em formol comum a 10%, desidratadas em solução de concentrações crescentes de etanol (70% a 100%) e incluídas em parafina. O material foi seccionado em micrótomo Leica, modelo 2145, com 6,0µm de espessura para ser confeccionado as lâminas histológicas.
Os cortes de pele foram corados pela hematoxilina e eosina e montados entre lâmina e lamínula com resina sintética e avaliadas em microscopia óptica (microscópio Nikon eclipse, modelo E200), atribuindo escores para a epiderme para alterações como necrose e reepitelização e para a derme em relação a edema, hemorragia, neovascularização, fibrose, hiperemia ativa e infiltrado inflamatório. Para cada região histológica avaliada, os escores foram atribuídos após exame de nove campos microscópicos, sendo considerado escore 0 na ausência da alteração, 1 alteração leve (repetição da alteração de um a três campos microscópicos), 2 alterações moderadas (repetição da alteração de quatro a seis campos microscópicos) e escore 3 alterações acentuadas (repetição da alteração de sete a nove campos microscópicos)(8, 9).
A comparação entre os grupos (GI, GII, GIII e GIV) em relação às variáveis morfométricas (cor, granulação, crosta, hiperemia, edema e exsudato) e variáveis histológicas (necrose, reepitelização, hiperemia ativa, edema, hemorragia, neovascularização, fibrose e infiltrado inflamatório), foi realizada mediante o teste de Wilcoxon (dados não paramétricos), sendo que, para os valores de "P" iguais ou inferiores a 0,05, as diferenças entre os grupos foram consideradas significativas. Para a comparação entre os grupos em relação a área e potencial de contração cicatricial (dados paramétricos), utilizou-se o teste Tukey, em que valores de "P" iguais ou menores a 0,05 foram considerados significativos. Também foi realizada análise de correlação linear de Pearson entre as variáveis morfométricas e histológicas das feridas controle e tratada nos diferentes grupos de observação considerando nível de significância de 5%. Para todas as análises, foi utilizado programa estatístico R.
Resultados e discussão
A contagem de plaquetas após a obtenção do PRP apresentou-se maior do que quando comparada com a contagem inicial (250.000±180.000), apresentando média de 1.578.750 plaquetas/mm³ (± 202.723). Trabalho mostra resultados semelhantes com média de 1.176.933 plaquetas/mm³(10). A contagem plaquetária deve apresentar valores superiores a 1.000.000 de plaquetas/mm³(11), no entanto, outros pesquisadores obtiveram resposta terapêutica em concentrações superiores a 300.000 plaquetas/mm³(12). Os resultados obtidos neste estudo foram condicentes com os observados por Pazzini et al.(8), uma vez que em plasma com concentração plaquetária superior a 1.500.000 plaquetas/mm³ alcançou os efeitos terapêuticos desejados.
A avaliação macroscópica das feridas de pele induzidas experimentalmente e tratadas com plasma rico em plaquetas heterólogo de equino, associado à pomada de gentamicina, apresentou características morfométricas distintas em relação às feridas controle (Tabela 1). Na comparação das variáveis morfológicas, pôde-se notar em todos os grupos uma diferença significativa entre as feridas controle e tratada (P<0,05) em relação à presença do exsudato de característica serosa, com maior escore para a ferida tratada. Entretanto, essa observação não foi referida por Barrionuevo et al.(9) na cicatrização de feridas em que o PRP autólogo foi utilizado como método terapêutico. O fato pode ser justificado pela reação tecidual mediante o uso de um plasma heterólogo, provocando assim uma resposta imunológica mais intensa.
No grupo II, sete dias de pós-operatório, a presença de granulação e edema foi observada com maiores escores nas feridas controle (P<0,05), (Tabela 1). Em trabalhos semelhantes, nos grupos de pós-operatório mais precoce, na fase inicial do processo inflamatório foram observados edemas discretos ao redor das feridas tratadas com gel de PRP heterólogo, com total desaparecimento nas avaliações subsequentes(3). O edema inflamatório da ferida controle, observado no grupo II, pode ser justificado pelo processo traumático pós-operatório e devido ao não uso do PRP, que tem características anti-inflamatórias, uma vez que essa variável foi observada com maior frequência nas feridas controle do que nas tratadas.
Na comparação das variáveis morfométricas entre os diferentes grupos, a cor da ferida controle e a cor da ferida tratada do grupo I diferem das cores dos demais grupos de observação (P<0,05), apresentando coloração vermelha leve nas feridas do grupo I e rósea nos demais grupos (Tab. 1). Em trabalhos semelhantes, essa característica também foi relatada, permanecendo de coloração rósea durante todo o período de avaliação da ferida(13,14,3,8). Essa variação pode ser atribuída ao PRP, uma vez que este é capaz de favorecer a microcirculação local. Este achado também corrobora com as evidências de Vendramin et al.(15), que relatam o uso de PRP em enxertos cutâneos em membro pélvico de humano sendo capaz de reduzir o tamanho da lesão, promovendo maior quantidade de tecido de granulação e apresentando aspecto rosado da pele quando comparado com pacientes que não receberam o produto.
O comportamento do parâmetro crosta não diferiu entre as feridas controles (P>0,05), (Figura 2:B,D,F,H). Já nas feridas tratadas (Figura 2:A,C,E) diferiram entre os grupos I e II e os grupos II e III (P<0,05), confirmando que o uso do PRP induziu de forma mais precoce a formação desses elementos nas feridas tratadas em comparação com as do grupo controle (Tabela 1). Foi referido por Abegão et al.(3) o aparecimento de crosta e granulação mais precocemente nas feridas controles do que nas tratadas com o PRP, iniciando em médias 10 dias após o procedimento cirúrgico. Dessa forma, pode-se presumir que a utilização do PRP resultou em melhor cicatrização, resultados que podem ser observados na Tabela 3, que evidencia uma intensa correlação linear positiva e significativa (P<0,01) entre as variáveis granulação e crosta (r=0,83).
Na avaliação da área e do potencial de contração cicatricial notou-se uma correlação linear negativa e significativa (P<0,05) entre essas duas variáveis (r= -0,12), como pode ser visualizado na Tabela 3. Em todos os grupos avaliados houve redução da área e do potencial de contração cicatricial com diferença significativa (P<0,05) em relação às feridas controle e tratada (Figura 1: C,D,E,F,G,H), excetuando as feridas do grupo I (Figura 1: A,B). Para a ferida controle, a redução da área foi mais expressiva a partir do grupo III, enquanto para a ferida tratada foi mais precoce, sendo observada já a partir do grupo II (Tabela 1). Comportamento semelhante foi observado para o potencial de contração cicatricial, uma vez que existiu uma correção linear negativa entre as duas variáveis morfológicas (Tabela 3). Foi verificado por Ito et al.(16); Abegão et al.(3) e Chang et al.(17) decréscimo significativo tanto nas feridas tratadas quanto nas feridas controles ao longo do período de observação, no entanto, a comparação entre as feridas não evidenciou o efeito do gel de PRP heterólogo na redução da área com relação ao tratamento feito com soro fisiológico. A diferença nos resultados pode estar relacionada à área onde a lesão foi induzida, uma vez que regiões menos vascularizadas podem apresentar retardo do processo cicatricial, além da qualidade e da viabilidade do PRP produzido.
Neste estudo foram verificadas características de necrose tecidual, com maior escore nas feridas do grupo I, no entanto, sem diferença significativa entre as feridas controles e tratadas nos quatro grupos (P>0,05), (Tabela 2). Igual observação foi encontrada em experimentos de reconstituição tecidual a partir de enxertos cutâneos associados ao gel de PRP, no entanto, esta observação foi significativamente maior nas feridas controle em comparação com as tratadas(18,19,20,8). As variáveis referentes à viabilidade de enxertos cutâneos se encontram relacionadas ao leito vascular do receptor e não somente ao uso do PRP, o que não é observado no presente estudo, em que a necrose ocorreu em todos os grupos independente do uso do PRP.
A reepitelização tecidual foi observada a partir do grupo III (Figura 2: E,F), no entanto, sem diferença significativa entre as feridas controle e tratada, com a tratada sendo a possuidora do maior escore, somente no grupo IV a diferença de reepitelização foi significativa entre as feridas (P<0,05), sendo a ferida tratada (Figura 2: G) a que mais reepitelizou-se (Tabela 2). Em outros estudos que compararam fontes diferentes de PRP a presença de reepitelização ocorreu independente do uso do plasma(21,22,23,9). No entanto, é importante avaliar outros fatores que podem estar relacionados aos resultados não significativos, como o número de plaquetas por microlitro de sague e o período decorrido da ativação do PRP e a sua administração na ferida.
A hiperemia ativa foi observada em todos os grupos, assim como o edema (Figura 2: D) e a hemorragia leve; no entanto, essas variáveis tiveram maior escore no grupo I, não existindo diferença entre as feridas controle e tratada (P>0,05), (Tabela 2). Outros estudos demonstram que o PRP aumenta significativamente os sinais da inflamação, contribuindo para a cicatrização tecidual(24), o que não foi observado neste estudo, possivelmente devido ao efeito anti-inflamatório verificado no PRP.
A neovascularização tecidual iniciou-se a partir do grupo II; no entanto, somente no grupo IV observou-se diferença significativa (P<0,05) entre as feridas controle e tratada. Igual comportamento foi observado para a fibrose, que iniciou em ambas as feridas a partir do grupo II, mas com um maior escore em todas as observações para a ferida tratada, principalmente no grupo III e no grupo IV, no qual ocorreu diferença significativa (P<0,05), (Tabela 2). Pôde também se observar correlação linear positiva e significativa (P<0,01) entre a neovascularização e a fibrose (r=0,57) e neovascularização e inflamação (r=0,32). A mesma correlação positiva e significativa (P<0,01) também pode ser observada na comparação entre reepitelização e neovascularização (r=0,40) e reepitelização e fibrose (r=0,33), (Tabela 3). A intensa proliferação vascular presente nas feridas tratadas com PRP pode-se correlacionar com os fatores de crescimento presentes nas plaquetas, responsáveis em atuar na fase inicial da cicatrização como o fator de crescimento de endotélio vascular e fator de crescimento epitelial, estimulando a angiogênese, mitogênese e a permeabilidade vascular e induzem o crescimento do tecido epitelial(8). Os resultados encontrados neste estudo podem indicar que a proliferação vascular ocorre pelos fatores presentes nas plaquetas, os quais promovem suprimento de oxigênio e nutrição para a ferida, favorecendo o processo cicatricial.
Observou-se presença de infiltrado inflamatório em todos os grupos de observação, sendo o maior escore nas feridas controles do que nas feridas tratadas, no entanto, com diferença significativa apenas no grupo IV (P<0,05), (Tabela 2). Outros trabalhos relatam presença de infiltrado com células mononucleares e polimorfonucleares, porém sem diferenças significativas entre os grupos experimentais(25,8). O PRP tem um papel importante para a liberação de mediadores indutores da neovascularização e da fibroplasia, auxiliando no processo de cicatrização. No entanto, caso a inflamação ocorra de maneira intensa, a cicatrização pode ser prejudicada, portanto o PRP heterólogo foi capaz de modular essa resposta inflamatória estimulando o recrutamento de células para a ferida.
Também foi observada uma correlação linear negativa significativa (P<0,05) entre a inflamação e a presença de fibrose (r= -0,14), (Tabela 3), fato não observado em trabalhos com metodologia semelhantes(26,27,28,29,30), portanto, este experimento demonstrou que o PRP estimula a angiogênese e a reepitelização, no entanto, sem gerar um processo inflamatório intenso, que poderia prejudicar a cicatrização.
Conclusão
A associação do plasma rico em plaquetas heterólogo de equino com a pomada contendo gentamicina, sulfanilamida, sulfadiazina, ureia e vitamina A, em feridas cutâneas em coelhos, acelera o processo cicatricial.
O PRP heterólogo associado à pomada diminuiu o edema na fase inicial do processo cicatricial e promoveu ação anti-inflamatória.
Aos 21 dias de PO nas feridas tratadas com PRP associado a pomada, ocorre aumento da neovascularização e da fibrose com diminuição do infiltrado inflamatório.
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