DOI: 10.5216/cab.v11i4.5575

OCORRÊNCIA DE Anaplasma bovis (DONATIEN & LESTOQUARD, 1936, DUMLER ET AL. 2001) NA REGIÃO DE BOM JESUS DO ITABAPOANA, RJ


Orlando Augusto Melo Junior,1 Antonio Peixoto Albernaz,2 José Tarcisio de Lima Thiebaut,2
Farlen Jose Bebber Miranda,2 Josias Alves Machado2 e Antonio Carlos Faber da Silva3

1. Universidade Estadual do Norte Fluminense. E-mail: melojr@uenf.br
2. Universidade Estadual do Norte Fluminense
3. Prefeitura Municipal de Bom Jesus do Itabapoana, RJ, Brasil.




RESUMO

Tendo em vista a pesquisa de hemoparasitos, no presente trabalho foram realizados exames microscópicos de quatrocentas extensões sanguíneas delgadas, preparadas com sangue capilar coletado da orelha e da cauda de duzentos bovinos. Baseou-se o diagnóstico na pesquisa direta, visualizando-se as inclusões do agente etiológico. Onze bovinos (5,5%) foram considerados infectados por Anaplasma bovis, confirmando a presença deste hemoparasito no município de Bom Jesus do Itabapoana, o primeiro da região noroeste fluminense a relatar tal ocorrência.

PALAVRAS-CHAVES: Anaplasma bovis, bovino, hemoparasito, ocorrência.


ABSTRACT

OCCURRENCE OF Anaplasma bovis (DONATIEN E LESTOQUARD, 1936) DUMLER ET AL.
(2001) IN THE REGION OF BOM JESUS DO ITABAPOANA, RJ

In the present study, 400 capillary blood smears collected from the ear and the tail of 200 bovines were microscopically examined for the presence of hemoparasites. The diagnosis was based on the direct research, semonstrating the etiologic agent inclusions.  Eleven bovines (5.5%) were considered infected by Anaplasma bovis, confirming the presence of this hemoparasite in the city of Bom Jesus do Itabapoana, the first city of the northwesten region of the state of Rio de Janeiro to register such occurrence.

Keywords: Anaplasma bovis, bovine, hemoparasite, occurrence.


INTRODUÇÃO

A erliquiose bovina tem como importante constituinte um hemoparasito rickettsial monocítico cujo agente etiológico denominou-se inicialmente Ehrlichia bovis (DONATIEN & LESTOQUARD, 1936). Entretanto, alterou-se a posição taxonômica recentemente, pois o gênero Ehrlichia foi reorganizado em outros gêneros, baseando-se nas análises de similaridade genética entre os parasitos. Dessa forma, algumas espécies de Ehrlichia foram unificadas com o gênero Anaplasma, incluindo a Ehrlichia bovis, que passou a ser designada Anaplasma bovis (DUMLER et al., 2001).
Morfologicamente, as inclusões intracitoplasmáticas do parasito caracterizam-se como um agrupamento de microrganismos em colônias circulares, poligonais ou elípticas, com bordos arredondados e dimensões que medem até 11 µm nas colônias maiores e de 1 a 2 µm nas colônias menores. Essas inclusões coram-se em vermelho, lilás ou azul púrpura, de acordo com a fase de desenvolvimento em que estão, podendo ser observadas em esfregaços sanguíneos periféricos corados por Giemsa, May-Grunwald-Giemsa ou pelo corante Panótico® (SANTOS & CARVALHO, 2006).
Epidemiologicamente, sabe-se que A. bovis está presente em várias regiões do mundo, sendo transmitido por carrapatos como Hyaloma sp., Amblyomma cajennense e Amblyomma variegatum. Recentemente, também foi diagnosticado A. bovis em uma fazenda na ilha de Okinawa, Japão (OOSHIRO et al., 2008), e na América do Norte, na ilha de Nantucket, Massachusetts. Neste último caso, tal hemoparasito foi descrito em coelhos selvagens introduzidos no ambiente nos anos de 1920 e 1930. Demonstrou-se que A. bovis tem capacidade de infectar carrapatos de várias espécies, como Haemaphysalis leporispalustris, Ixodes dentatus e I. dammini. No entanto, H. leporispalustris foi considerado naquela região como o principal vetor, pois se encontrou A. bovis em todos os estágios evolutivos, havendo, inclusive, transmissão entre estágios (GOETHERT & TELFORD , 2003).
No Brasil, o primeiro relato de A. bovis foi realizado por MASSARD & MASSARD (1982), que diagnosticaram o hemoparasito em esfregaços sanguíneos corados com Giemsa, no citoplasma de células mononucleares de onze bovinos com idade inferior a um ano. Posteriormente, a doença foi diagnosticada pelos mesmos autores em bovinos clinicamente sadios, que provavelmente apresentavam a forma crônica da doença, e em associação com Babesia bigemina, Babesia bovis e/ou Anaplasma marginale.
No Estado do Rio de Janeiro, reportou-se A. bovis inicialmente no município de Itaguaí, posteriormente surgiu em várias localidades da Região Sul Fluminense e Serrana. Recentemente, foi encontrada na Região Norte Fluminense, com destaque para a microrregião de Campos dos Goytacazes (SANTOS & CARVALHO, 2006).
A erliquiose bovina determina uma série de alterações de ordem hematológica e clínica. As alterações clínicas mais observadas são febre, infartamento de linfonodos e alterações do estado geral do animal (DONATIEN & LESTOQUARD, 1936; GIRARD & ROSSELOT, 1945; SREEKUMAR et al., 2000). Já as alterações hematológicas mais comuns são leucocitose, eosinopenia e monocitose, com grande número de monócitos com citoplasma vacuolados (GIRARD & ROUSSELOT, 1945; SANTOS & CARVALHO, 2006).
O diagnóstico de A. bovis em esfregaços sanguíneos é confirmado quando existem inclusões em forma de grânulos cocoides, arredondados ou ovais, agrupados em colônias, geralmente localizadas em vacúolos no citoplasma da célula hospedeira. A coloração observada pode ser ligeiramente diferente da do núcleo da célula, em tonalidade azul púrpura, lilás ou vermelho (MASSARD & MASSARD, 1982; SANTOS & CARVALHO, 2006).
As técnicas de diagnóstico têm evoluído constantemente, pois, recentemente, A. bovis foi descrito em Massachusetts, EUA, por GOETHERT & TELFORD (2003), empregando a metodologia de PCR, também utilizada por OOSHIRO et al. (2008), para detectar o mesmo hemoparasito na ilha de Okinawa, Japão. Levando-se em consideração a facilidade de execução, os baixos custos envolvidos e a fidedignidade do exame de esfregaço sanguíneo periférico, esta técnica foi escolhida para o presente estudo.
Com o presente trabalho visou-se observar a frequência e a probabilidade de ocorrência de A. bovis, tendo em vista a importância dessa doença, que pode acarretar quadros clínicos importantes, principalmente quando associado a outros hemoparasitos, com prejuízos econômicos e à sanidade animal.

MATERIAL E MÉTODOS

Para o presente trabalho, utilizaram-se amostras de sangue periférico de duzentos bovinos girolandos de até um ano de idade, relacionados ao acaso nos distritos rurais da cidade de Bom Jesus do Itabapoana, RJ. Extensões sanguíneas foram preparadas a partir da primeira gota de sangue capilar obtida por leve perfuração da superfície interna da orelha e da extremidade da cauda, visando pesquisa de hemoparasitos.  Confeccionaram-se quatrocentas extensões sanguíneas periféricas, conforme BÖHM et al. (2006), sendo encaminhadas ao Setor de Patologia Clínica do Hospital Veterinário da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), onde foram coradas pelo Panótico (New Prov®) e avaliadas ao microscópio de luz para a pesquisa do referido hemoparasito.
Após a consolidação dos dados, fez-se análise estatística, sendo utilizado o método da amostragem simples ao acaso, em proporções ou porcentagem no nível de 5% de significância. As comparações foram feitas com base na sobreposição ou não dos intervalos de confiança (probabilidade de conter a proporção na população igual a 95%), após dimensionamento da amostra para uma população infinita de ocorrências, considerando-se α= 0,05 e um desvio em torno da proporção amostral de 10%  (d= 0,10 * p). O programa estatístico utilizado foi o SAEG (UFV, 2007).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos duzentos animais avaliados, onze bovinos (5,5%) foram considerados parasitados por A. bovis (Figura 1), diagnosticando-se, pela primeira vez, o hemoparasito na referida cidade do Noroeste Fluminense. O índice de parasitismo dos bovinos em Bom Jesus do Itabapoana, RJ, foi superior aos 3,31% encontrados por SANTOS & CARVALHO (2006) na microrregião de Campos dos Goytacazes, Região Norte Fluminense. Uma micrografia de um monócito parasitado pode ser observada na Figura 2.
Considerando-se a amostra representativa de uma população infinita de animais, o intervalo de confiança para a porcentagem de lâminas em que ocorreu o diagnóstico de A. bovis foi de 3,0 ± 1,67%. Na avaliação dos pontos anatômicos de coleta, obtiveram-se intervalos de confiança cujos valores foram 2,5 ± 2,17% e 3,5 ± 2,55%, respectivamente, para orelha e extremidade caudal (Figura 3). A partir destes dados, pode-se considerar que a ocorrência do hemoparasito nas lâminas confeccionados com sangue periférico coletado na orelha é estatisticamente igual à ocorrência das lâminas oriundas da coleta na extremidade caudal.
As alterações clínicas observadas nos animais parasitados por A. bovis foram linfoadenomegalia pré-escapular, anorexia, mucosas pálidas, pelos eriçados e pirexia. Estes achados são condizentes com os observados por outros trabalhos (DONATIEN & LESTOQUARD, 1936; GIRARD & ROSSELOT, 1945; SREEKUMAR et al., 2000; SANTOS & CARVALHO, 2006) e são em parte oriundos das características inflamatórias observadas nas erliquioses monocíticas, em decorrência de citocinas produzidas (BITSAKTSIS & WINSLOW, 2006).

CONCLUSÕES

O parasito Anaplasma bovis ocorre no rebanho bovino da região de Bom Jesus do Itabapoana, RJ. Trata-se do primeiro município da região noroeste fluminense a relatar tal ocorrência.
Não houve diferença significativa na observação de A. bovis entre as extensões sanguíneas confeccionadas a partir de sangue da orelha e da extremidade caudal. Conclui-se que ambos são ideais para coleta de sangue periférico para pesquisa do hemoparasito, entretanto, o manejo destes animais deve ser levado em consideração. Sendo assim, sugere-se a cauda como ponto de coleta para minimizar os possíveis riscos de acidente durante o manuseio dos animais, principalmente se forem adultos.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Gustavo de Castro Xavier (UENF/CCT/LECIV), pelo auxílio na elaboração dos gráficos estatísticos que foram utilizados neste trabalho, e ao técnico agrícola Júlio Cezar de Meirelles (UENF/CCTA/LEAG), pelo auxílio prestado. 

REFERÊNCIAS

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Universidade Federal de Viçosa – UFV. SAEG – Sistema de análises estatísticas e genéticas: Versão 9.0. Viçosa: Editora UFV, 1997. 150 p.


Protocolado em: 18 fev. 2009.  Aceito em: 26 abr. 2010.