Resumo
Neste trabalho, objetivou-se avaliar a composição química e a degradação in situ das gramíneas do gênero Panicum Massai, Mombaça e Tanzânia nas idades 22, 34 e 46 dias pós-rebrota. Quantificou-se os teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA). Na avaliação da degradabilidade in situ foram pesadas 4 g de amostra em sacos de náilon incubados no rúmen de um bovino fistulado, nos tempos 6, 24 e 72 h. Adotou-se delineamento inteiramente casualizado para composição química e em parcela subdividida para degradação in situ, com médias comparadas pelo teste de Tukey a 5%. Houve aumento nos teores de MS (+1,69%) e FDN (+5,06%) (P<0,05) das gramíneas nas maiores idades de corte com redução da fração PB. A degradação potencial (DP) da MS, FDN e PB apresentou redução com o aumento da idade das gramíneas, com o aumento no tempo de colonização (0,69 h) e a taxa de degradação da FDN (1,14%/h). O aumento da idade pós-rebrota das gramíneas Massai, Mombaça, e Tanzânia eleva os teores de fibra em detergente ácido e reduz a proteína bruta, com efeito negativo na degradação da MS, PB e FDN, sendo indicado manejo desses cultivares aos 22 e 34 dias pós-rebrota para se obter forragem com melhor valor nutricional.
Palavras-Chave: Capim massai; Composição química; Degradação in situ.
Abstract
The objective was to evaluate the chemical composition and in situ degradation of Maasai, Mombasa and Tanzania grasses belonging to the genus Panicum, at 22, 34 and 46 days after regrowth. The contents of dry matter (DM), crude protein (CP), neutral detergent fiber (NDF) and acid detergent fiber (ADF) were determined. For the evaluation of ruminal degradation, 4 g sample were placed in nylon bags and incubated in the rumen of a fistulated animal, for 6, 24 and 72 h. The experiment had a completely randomized design for chemical composition analysis and a split-split plot completely randomized design for in situ degradation, with means compared by Tukey test at 5%. There was an increase in the contents of DM (+ 1.69%) and NDF (+ 5.06%) (P <0.05) of the grasses at the highest cutting ages with reduction in the CP fraction. The potential degradation (PD) of DM, NDF and CP decreased with advancing age of grasses, with an increase in colonization time (0.69 h) and NDF degradation rate (1.14%/h). The increase in the post-regrowth age of the Massai, Mombasa, and Tanzania grasses increases the acid detergent fiber content and reduces the crude protein content, with a negative effect on the degradation of DM, PB and NDF. The management of these cultivars is indicated at 22 and 34 days post-regrowth to obtain forage with better nutritional value.
Keywords: Massai grass; chemical composition; in situ degradation
Seção: Zootecnia
Recebido
01 de novembro de 2018.
Aceito
28 de janeiro de 2020.
Publicado
16 de junho de 2020.
www.revistas.ufg.br/vet
Como citar - disponível no site, na página do artigo.
Introdução
Nos atuais sistemas de alimentação de ruminantes em pastagens são necessárias informações relativas ao valor nutricional e às suas taxas de degradação e aproveitamento no sistema digestivo, com o objetivo de equilibrar a disponibilidade de energia e nitrogênio no rúmen, maximizando a eficiência microbiana. Contudo, nas regiões tropicais, em razão das condições climáticas, as plantas forrageiras apresentam acentuada sazonalidade, com alta disponibilidade e bom valor nutritivo somente no período chuvoso, fenômeno determinado, principalmente, pelas limitações de luz, disponibilidade de água e temperatura do período seco(1). Assim, a busca por gramíneas tropicais com alta produtividade em matéria seca e adequado valor nutricional é um desafio para a produção de ruminantes.
No Brasil, gramíneas do gênero Panicum maximum são um dos grupos de forrageiras mais importantes para a produção de ruminantes, possuindo: bom valor nutritivo; tolerância a altas temperaturas e sombreamento; adequadas respostas a tratos culturais mais intensivos; grande produção de matéria seca; fácil estabelecimento, mesmo em períodos de déficit hídrico e possibilidade de uso em sistemas de consórcios(2, 3), entretanto, existem poucas informações sobre sua composição química e valor nutritivo.
A cultivar Massai é um híbrido entre Panicum maximum e P. infestum, e tem como característica o crescimento formando touceiras com altura média de 60 cm, a média tolerância ao frio e a boa resistência ao fogo, adaptando-se às condições de baixa fertilidade do solo(2, 5). O Panicum maximum CV Mombaça apresenta elevada produção de matéria seca, sendo exigente em nutrientes, com boas respostas quando manejado sob adubação nitrogenada(5). O capim-tanzânia (Panicum maximum cv. Tanzânia) é uma alternativa para áreas de solo com maior fertilidade, apresentando boa resistência à cigarrinha-das-pastagens e maior produção foliar com adequado valor nutricional(15).
Dentre os fatores relacionados ao manejo dessas forrageiras, o intervalo entre cortes é um fator que afeta tanto a produção quanto a qualidade. Reduções nos períodos de corte promovem menor massa de forragem, no entanto, elevam a relação folha/colmo, proporcionando maior valor nutricional. Com o avançar da idade, há uma maior lignificação da parede celular, dificultando a ação dos microrganismos ruminais e resultando em menor degradabilidade da fração fibrosa(26).
Nesse sentido, avaliar as frações potencialmente degradáveis no rúmen podem determinar o melhor ponto de corte para a colheita da planta, associado ao adequado valor nutricional. A metodologia de degradabilidade in situ é uma técnica adequada para essa avaliação e permite quantificar o desaparecimento dos nutrientes ao longo do tempo, considerando as condições reais do ambiente ruminal(19, 21). Objetivou-se, com esta pesquisa, determinar a composição química e a degradabilidade in situ de gramíneas do gênero Panicum em três idades pós-rebrota.
Material e métodos
A pesquisa foi realizada no Departamento de Zootecnia do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Piauí, Campus Teresina, a 05°05'21"S, 42°48'07"W e altitude 74,4 m, com clima do local – segundo a classificação de Köppen, do tipo Aw, tropical e chuvoso (megatérmico), com inverno seco e verão chuvoso. As análises químicas foram determinadas no Laboratório de Nutrição Animal (LANA/CCA/UFPI).
Foram avaliadas as gramíneas Massai (Panicum maximum Jacq. cv. Massai), Tanzânia (Panicum maximum Jacq. cv. Tanzânia) e Mombaça (Panicum maximum Jacq. cv. Mombaça), divididas em parcelas, submetidas ao corte de uniformização a 30 cm do solo e adubação NPK nas proporções de 100; 80 e 50 kg/ha respectivamente. As parcelas foram irrigadas por sistema de aspersão convencional, com aspersores distanciados em 12 metros, com vazão 7,3 mm/h e turno de rega de quatro dias, adequando a lâmina d'água para repor a evapotranspiração média mensal do período de realização do experimento (138,6 mm)(23).
As gramíneas foram colhidas a 30 cm do solo nas idades pós-rebrota de 22, 34 e 46 dias, identificadas, pesadas e levadas à estufa de pré-secagem 55 ºC por 72 horas para posterior moagem em moinho tipo Willey a partículas de 1 mm. Determinaram-se os teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB) e matéria mineral (MM)(6) e os teores de fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA)(7).
Na determinação da degradação ruminal, pesou-se 4 g de amostra em sacos de náilon de 12x8 cm e porosidade 50 µm(8). Os sacos foram incubados nos tempos 6, 24 e 72 h(9) no rúmen de dois bovinos adultos, com peso médio de 450 kg, fistulados, alimentados previamente com dieta composta por 80% de volumoso (capim elefante emurchecido e picado) e 20% de concentrado (milho e farelo de soja) duas vezes ao dia (8 e 16 horas), com sal mineral e água à vontade. Utilizaram-se 4 sacos por tratamento em cada tempo de incubação, totalizando 288 sacos, distribuídos nos dois animais. A fração solúvel foi obtida por imersão de sacos não incubados em banho-maria a 39 °C por uma hora. Após a retirada do rúmen, os sacos foram imersos em água gelada, lavados e acondicionados em estufa com circulação forçada de ar a 55 ºC por 72 h para quantificação dos teores de MS, PB e FDN.
Os parâmetros de degradação in situ (a, b e c) e a degradabilidade potencial da MS e PB foram estimados pelo modelo: DP = A – Be-c×t e a degradabilidade efetiva estimada pela fórmula DE = a + [(b c)/(c + k)] nas taxas de passagem de 2,5 e 8%(10), com o objetivo de determinar a que melhor se ajusta às gramíneas. Os parâmetros de degradação da FDN foram determinados segundo Mertens & Loften(11): Rt = B.e-ct + I, com padronização das frações, conforme Waldo, Smith & Cox(12).
Adotou-se delineamento inteiramente casualizado em esquema fatorial 3x3 (três idades de corte x três forrageiras) para composição química, enquanto para a determinação da degradabilidade in situ da MS, PB e FDN adotou-se o modelo em parcela subdividida, com os tratamentos representando as parcelas e os tempos de incubação, as subparcelas. Para a obtenção das médias e desvio padrão foi adotado o PROC MEANS, e para a obtenção dos parâmetros de degradação o PROC NLIN do SAS (Statistical Analysis System, versão 8). Aplicou-se o teste de Tukey a 5% de probabilidade para a comparação das médias de composição química.
Resultados e discussão
Houve aumento médio de 1,69% nos teores de MS (P<0,05) das forrageiras quando da maior altura de corte (46 dias), o que se relaciona à incorporação de constituintes fibrosos na estrutura celular vegetal, associados à MS, com espessamento da parede e elevação da lignificação dos tecidos, o que se evidencia pelo aumento no teor de FDN e FDA nessa idade de pós-rebrota (Tabela 1). A elevação no percentual de FDN e FDA, com o decorrer do período de corte, indica redução na proporção de nutrientes passíveis de serem digeridos pelo animal e reflete diretamente no consumo de MS e metabolismo microbiano ruminal(26).
A elevação da proporção de constituintes fibrosos está associada ao rápido espessamento e lignificação da parede celular com o avanço da idade da planta, principalmente pelo aumento da proporção e espessura de colmo em relação às folhas. Esse comportamento está de acordo com os resultados obtidos para gramíneas do gênero Panicum por Pereira et al.(13), Carvalho et al.(14) e Garcez et al.(26), corroborando a elevação nas concentrações de carboidratos estruturais com o avançar da idade da planta para maior sustentação em sua fase vegetativa. No entanto, as variações na composição química de gramíneas tropicais dependem também do tipo de cultivar, da presença de perfilhos laterais e da intensidade luminosa, o que não torna a relação folha:colmo um determinante exclusivo do valor nutricional dessas espécies (15).
Houve decréscimo de 43,78, 26,45 e 31,51% nos teores de PB na maior idade de corte para as gramíneas Massai, Mombaça e Tanzânia, respectivamente. A redução nos teores desse constituinte com o avançar da idade da forrageira está associada à maior complexação de compostos nitrogenados à fração lignocelulósica da parede celular. No entanto, mesmo na maior idade de corte, o teor de PB encontra-se acima do mínimo de 6-8% na MS, recomendado para a manutenção de 8 mg de N-NH3.dL-1 no líquido ruminal e para a eficiente degradação ruminal, com incremento na produção de proteína microbiana(24), sendo esses valores equivalentes aos obtidos para gramíneas tropicais(1, 5).
O decréscimo na proporção de PB nas forrageiras torna-se o primeiro fator limitante ao consumo, como resultado da menor atividade dos microrganismos no rúmen por causa da baixa disponibilidade de substrato nitrogenado para síntese de proteína microbiana, especialmente os celulolíticos, que reduzem sua taxa de crescimento levando à menor degradação das frações fibrosas, com consequente redução na taxa de passagem da digesta ruminal e efeitos negativos na digestibilidade dos demais componentes da dieta(7).
A DP e a fração potencialmente degradável da matéria seca decresceram com o avançar da idade de corte, associada à elevação da fração FDA, de baixa degradabilidade nas forrageiras (Tabela 2). As menores taxas de degradação são justificadas ao espessamento da parede celular e ao aumento da proporção de ligninas das folhas. O colmo tem, na maior parte da sua composição, tecidos lignificados que dificultam o acesso microbiano à fração degradável da fibra, promovendo menores taxas de degradação ruminal e limitando a geração de energia oriunda da glicose presente nesses polissacarídeos(16).
À medida que a gramínea se aproxima de sua maturidade fisiológica e da fase de florescimento ocorrem mudanças nas proporções dos componentes de sua estrutura(17), com aumento dos componentes da parede celular, associado à diluição dos componentes de seu conteúdo (ácidos orgânicos e amido solúvel) que possuem elevada digestibilidade(27), impactando de forma negativa a degradação da MS pelos microrganismos ruminais.
Observou-se elevada fração potencialmente degradável para a PB, com redução à medida que se elevou a idade de corte (Tabela 3), o que influencia a degradação dos demais componentes da MS por disponibilizar menos N para o ambiente ruminal. Mesmo com maiores idades, os valores de DP dessa pesquisa para as forrageiras com até 34 dias de pós-rebrota foram superiores aos obtidos por Guadayo et al.(18) para cultivares de Panicum maximum (61,47%) e Brachiaria mutica (64,39%) aos 28 dias pós-rebrota, e por Pinheiro et al.(19) para capim Tanzânia com 24 dias de idade (63,3%).
Reduções na taxa de degradação de frações nitrogenadas a partir de 34 dias podem diminuir a quantidade de nitrogênio amoniacal disponível para os microrganismos ruminais, que o utilizam para síntese de aminoácidos, estruturas celulares e crescimento(25), o que impacta negativamente a degradabilidade da MS (Tabela 2). Em gramíneas tropicais, a redução na taxa de degradação da proteína é esperada com o avançar da idade, associado a fatores como o clima, disponibilidade hídrica e temperatura, com incorporação dessa fração nos componentes de menos solubilidade da forragem(1, 13).
O grau de degradabilidade ruminal da PB pode ser variável entre diferentes espécies forrageiras, o que determina a disponibilidade de nitrogênio amoniacal no rúmen e a proporção de aminoácidos, oriundos da dieta e da proteína microbiana, que chegam ao intestino, sendo direcionados à síntese proteica tecidual(25). A concentração de proteína bruta é maior nos estádios vegetativos das espécies forrageiras e declinam na fase de florescimento, podendo variar em função de diferenças entre espécies, nível inicial de proteína na planta, proporções de colmo e folha, teor de componentes fibrosos na parede celular e temperatura ambiente(15, 21).
Foi observada elevação da fração indegradável da FDN (Ip) com o avançar da idade das gramíneas, o que pode justificar as variações negativas na degradação potencial e efetiva da MS das mesmas, pois a FDN representa mais de 70% de sua composição (Tabela 4). Uma menor degradação da FDN em gramíneas tropicais com maiores idades pós-rebrota é comum em regiões tropicais, uma vez que rapidamente atingem a maturidade fenológica, incorporando estruturas de sustentação representadas por fibra lignificada(20).
Os resultados obtidos para a fração degradável da FDN nas menores idades de corte foram em média 12% inferiores aos obtidos por Costa et al.(4) para capim Mombaça (80,41%) e Tifton-85 (80,06%) com 21 dias de pós-rebrote. A composição da parede celular varia de acordo com a espécie forrageira, o solo, a temperatura ambiente, a resiliência da planta e suas características fenológicas, sendo esta última importante em gramíneas tropicais que atingem o estado de maturação mais cedo, podendo apresentar reduções da degradação das frações fibrosas em menores intervalos de tempo.
O tempo de colonização da FDN (lag) (0,69 h) aumentou, gerando uma redução da taxa de passagem (1,14%/h) nas maiores idades de corte das gramíneas. O tempo de colonização da fração fibrosa representa o tempo entre o início da incubação e a degradação ruminal e está associado à capacidade de aderência dos microrganismos ruminais às partículas(21), aumentando quando há maior proporção de parede celular lignificada na forrageira, o que dificulta a adesão dos microrganismos. Associado a esse efeito ocorre redução na degradação ruminal da fração fibrosa, como observado nessa pesquisa, o que pode afetar a taxa de passagem ruminal e implicar negativamente o consumo de MS.
Quanto ao tempo de colonização (lag), os valores médios foram elevados e superiores aos encontrados para gramíneas, com elevação no avançar da idade das forrageiras. Esse efeito pode estar associado à dissolução dos carboidratos solúveis e componentes proteicos que, apesar de estarem em menor proporção nas espécies, apresentaram maior disponibilidade para degradação microbiana (Tabelas 1 e 2) em idades mais tenras, consequentemente, com maior competição por estes substratos, afetando o lag time da parede celular pelas bactérias fibrolíticas(22).
A degradablidade da FDN e a taxa de passagem da digesta estão diretamente associadas ao consumo de forragem, que também depende da taxa de degradação dos componentes nutricionais presentes na dieta. Assim, as características das folhas e dos colmos de possuírem diferentes tempos de retenção ruminal, por causa da maior resistência à degradação dos colmos, resultam em modificações na ingestão de alimentos, com decréscimo da mesma no aumento da maturidade da planta, em função das características químicas decorrentes da parede celular que se torna mais espessa e lignificada; fator determinante no processo digestivo de ruminantes(20).
Conclusões
O aumento da idade pós-rebrota das gramíneas Massai, Mombaça e Tanzânia eleva os teores de fibra em detergente ácido e reduz a proteína bruta, com efeito negativo na degradação da MS, PB e FDN, sendo indicado o manejo desses cultivares aos 22 e 34 dias pós-rebrote para se obter forragem com melhor valor nutricional .
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