DOI: 10.1590/1809-6891v21e-50566


Topografia e morfometria do timo em aves (Gallus gallus domesticus) da linhagem Ross 308 AP (AP95)

Topography and morphometry of timo in fowl (Gallus domesticus) from Ross 308 AP LINEAGE (AP95)


Adriana Garcia de Freitas1* , Cheston Cesar Honorato Pereira2 , Kênia Cristina Calábria3 , Marina Carla Bezerra da Silva3 , Frederico Ozanam Carneiro e Silva3

1Instituto Federal do Triângulo Mineiro, Uberlândia, MG, Brasil.
2Universidade de Rio Verde, Rio Verde, GO, Brasil.
3Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil.
*Correspondente - adrianagarcia@iftm.edu.br

Resumo
Objetivou-se descrever a topografia e morfometria do timo em 30 aves domésticas da linhagem Ross 308 AP (AP95), 15 machos e 15 fêmeas, com idade de 14 a 16 semanas e massa corporal média de 2,1 kg e 1,7 kg, respectivamente nos machos e fêmeas. Após a fixação em solução aquosa de formol a 10%, as peças foram dissecadas. Os lobos tímicos localizavam-se desde o terço cranial do pescoço até os ossos claviculares, de forma linear, longitudinal e lateralmente no pescoço, paralelos ao nervo vago, veia jugular externa e artéria comum do nervo vago. Os lobos apresentaram formatos ovalados e triangulares e o número foi de quatro a oito. Agrupando os lobos de acordo com a localização no pescoço, nos terços cranial, médio e caudal, as médias de comprimento x largura x espessura variaram, nessa ordem, de 1,93 a 52,1 mm, 0,98 a 23,15 mm e 0,32 a 8,52 mm. O timo das aves AP95 apresentou características topográficas e morfológicas similares àquelas de outras linhagens, porém, quanto à morfometria, foram observadas características singulares.
Palavras-chave: anatomia; galináceo; órgão linfoide primário; tecido linfoide.

Abstract
The objective of this study was to describe the topography and morphometry of the thymus in 30 domestic fowl of the Ross 308 AP (AP95) lineage, 15 males and 15 females, with an approximate age of 15 weeks and a mean weight of 2.1 kg for males and 1.7 for females. After fixation in 10 % formalin aqueous solution, the specimens were dissected. The thymic lobes were located from the cranial third of neck to clavicular bones, linearly, longitudinally and laterally in neck, parallel to the vagus nerve, external jugular vein and common vagus nerve artery. The lobes presented oval and triangular shapes and the number varies from four to eight. Grouping the thymic lobes according to the location in neck in cranial, middle or caudal thirds, the averages of length x widths x thickness varied from 1.93 to 52.1 mm, 0.98 to 23.15 mm and 0.32 to 8.52 mm. The thymus of AP95 chicken presented topographic and morphological characteristics similar to those of other strains, but, regarding morphometry, unique characteristics were observed.
Keywords: anatomy; glands; chicken; primary lymphoid organ; lymphoid tissue.



Seção Medicina Veterinária

Recebido
20 de dezembro de 2017.
Aceito
5 de novembro de 2019.
Publicado
22 de abril de 2020

www.revistas.ufg.br/vet
Como citar - disponível no site, na página do artigo.



Introdução

A avicultura surgiu como atividade industrial no Brasil na década de 1960, com a importação dos primeiros lotes de matrizes(1), destinadas à produção de frangos de corte e à produção de ovos – as matrizes pesadas e de postura, respectivamente. As galinhas da linhagem comercial Ross 308 AP (AP95) são matrizes pesadas, geneticamente melhoradas para ganho de peso.
Desde então, numerosos trabalhos investigativos, nas diversas áreas do conhecimento, à procura de melhores condições de criação e de resultados produtivos crescentes, têm sido realizados. Técnicas de manejos sanitários, nutricionais e de criação propriamente dita, associadas aos avanços na área genética, aliam-se às pesquisas em saúde animal, fisiologia e morfologia para potencializar os resultados.
A exploração zootécnica impulsiona a intensa seleção genética, com o objetivo de desenvolver animais com maior produtividade e rusticidade, ou seja, capazes de produzirem bem, mesmo quando submetidos a condições adversas. Portanto, as adaptações morfofisiológicas são essenciais para o desenvolvimento de linhagens de aves mais resistentes. Tais adaptações geram variações anatômicas e, por conseguinte, justificam as diversas pesquisas morfológicas(2); dentre elas, aquelas referentes aos órgãos ligados à defesa do organismo, por exemplo, o timo, importante órgão linfoide, cujo estudo é prioridade em diversos grupos de pesquisas em aves.
O timo é um órgão epitelial derivado da terceira bolsa faríngea, apresenta-se formado por lobos contendo grupos frouxos de células epiteliais e cobertos por cápsula de tecido conjuntivo. Este órgão é de suma importância nas aves e mamíferos e, por ser colonizado por linfócitos timodependentes, torna-se o principal local de produção destas células(3,4).
Em aves é um órgão par, composto por vários lobos separados por tecido linfoide, situado no pescoço, próximo à veia jugular externa e ao nervo vago e é mais ativo em aves jovens e regride com a maturidade sexual(5).
No timo, os linfócitos são diferenciados a partir de células tronco linfoides e, em seguida, tornam-se imunocompetentes(6). Considerando o alto grau de exigência fisiológica a que as aves de produção são submetidas, a manutenção da integridade da saúde dos plantéis é condição fundamental para alcançar os índices de produtividade desejados.
Além disso, o timo das aves permanece ativo por um período maior que nos mamíferos, entretanto, as informações sobre as mudanças que ocorrem nesse órgão, relacionadas à idade das aves, são escassas, fragmentadas e heterogêneas(7). Tais argumentos fundamentam o aprofundamento do estudo anatômico do timo.
Assim sendo, objetivou-se fornecer dados referentes às características anatômicas do timo, especificamente sobre a sua topografia e morfometria em aves domésticas (Gallus gallus domesticus) da linhagem Ross 308 AP (AP95).

Material e métodos

O projeto foi aprovado pelo comitê de ética na utilização de animais da Universidade de Rio Verde – Goiás e obteve o parecer favorável com o protocolo CEUA/UniRV N° 012/16.
Foram utilizados 30 reprodutores de aves domésticas (Gallus gallus domesticus), 15 fêmeas e 15 machos da linhagem Ross 308 AP (AP95), com idade de 14 a 16 semanas, com média de massa corporal de 2,1 kg para machos e 1,7 kg para fêmeas. Os espécimes foram disponibilizados, depois de constatada a morte natural e descartada a possibilidade de doença infecciosa, por uma granja comercial de reprodutoras pesadas situada no município de Uberlândia – Minas Gerais.
A massa corporal de cada animal foi determinada com o uso de uma balança eletrônica (Digitron®, Zona Franca de Manaus, Brasil). Em seguida, os exemplares foram congelados e enviados ao laboratório de anatomia dos animais domésticos da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Neste local, após o descongelamento total em água corrente, foi realizada a fixação de cada exemplar em solução aquosa de formol a 10% (Labsynth – Produtos para Laboratório Ltda, São Paulo, Brasil), por meio de injeção subcutânea, intramuscular profunda e intracavitária. Logo em seguida, as peças foram imersas e mantidas em igual solução, onde permaneceram conservadas para posterior dissecação.
Em cada ave, descreveu-se a localização do timo e sua sintopia e, em seguida, o comprimento total do pescoço foi determinado, tendo como referência os ossos atlas, cranialmente e clavículas, caudalmente. Logo após, as regiões cranial, média e caudal do pescoço foram delimitadas para, então, realizar a contagem dos lobos tímicos por região e em cada antímero. Posteriormente, obteve-se a morfometria do órgão, precisando-se o comprimento (eixo longitudinal), a largura (eixo laterolateral) e a espessura (eixo dorsoventral) de cada lobo tímico. Todas as mensurações foram realizadas com o auxílio de paquímetro digital (Starret Indústria e Comércio Ltda, São Paulo, Brasil).
Após a dissecação, para identificação histológica, coletaram-se fragmentos do órgão que foram fixados em formol a 10% e encaminhados ao laboratório de Patologia da UFU, onde se sucedeu o processamento do material de acordo com o protocolo de rotina de inclusão em parafina. Confeccionaram-se lâminas histológicas com dois cortes de cada amostra, as quais foram coradas pela técnica usual para hematoxilina-eosina (HE) para que fossem observadas ao microscópio óptico com lentes objetivas de 10x e 40x. As imagens das lâminas foram digitalizadas em microscópio Leica DM500 acoplado à câmera Leica ICC50, ligada a um computador PC contendo o software para captura e análise de imagem Leica LAS EZ.
Tabularam-se os dados obtidos e realizaram-se as análises estatísticas por meio do programa Biostat 5.3. Após averiguação da normalidade e das variâncias, empregaram-se os testes de Mann-Whitney para amostras independentes e de Wilcoxon para amostras relacionadas. Para comparações das medidas dos pescoços e dos lobos tímicos, do número de aves e do número de lobos, entre os sexos e para cada antímero e região cervical, utilizou-se o Teste de Mann-Whitney. Para confrontar os dados obtidos em relação ao número e às mensurações dos lobos tímicos, em cada sexo e região do pescoço entre os antímeros, aplicou-se o teste de Wilcoxon. Todos os testes tiveram nível de significância (α) de 5% e confiança (1 - α) de 95%(8,9).
Fotografaram-se as estruturas em questão e a nomenclatura utilizada foi pautada na Nomina Anatomica Avium(10).

Resultados

As análises dos cortes histológicos permitiram evidenciar que o parênquima do timo das aves AP95 divide-se em córtex e medula, com estruturas bem definidas, sendo possível identificar os corpúsculos tímicos na região medular (Figuras 1 e 2).



Os lobos tímicos foram identificados, em ambos os antímeros, na região ventrolateral do pescoço e estendiam-se desde a região cervical cranial até o limite cranial da cavidade toracoabdominal. Tinham coloração rosa claro e formatos variados, alongados, ovalados e triangulares, sendo que a maioria apresentou forma alongada no sentido craniocaudal (Figura 3).
Topograficamente, os timos direito e esquerdo posicionavam-se lateral e paralelamente ao feixe vásculo-nervoso, que contém o nervo vago, a veia jugular externa e a artéria comum do nervo vago, (Figura 3). No antímero direito, os lobos tímicos relacionavam-se caudalmente com a glândula tireoide e ventralmente com o esôfago e o inglúvio (Figura 3-AD). No antímero contralateral, a face medial dos lobos, nos terços cranial e médio do pescoço estava em contato com a musculatura cervical e no terço distal com a face lateral esquerda da traqueia, caudalmente localizava-se a glândula tireoide esquerda (Figura 3-AE).
O pescoço das aves apresentou comprimento total médio de 13,77 cm e 13,87 cm para fêmeas e machos, respectivamente (Tabela 1).



O número de lobos tímicos variou de quatro a oito, sendo quatro o mais frequente em fêmeas e cinco o mais frequente em machos, tanto no antímero direito como no esquerdo. Uma fêmea (6,66%) apresentou oito lobos no antímero esquerdo (Tabela 2 e 3).




Em relação ao número de lobos tímicos, a região média do pescoço apresentou a maior e a região cranial exibiu a menor média, nos antímeros direito e esquerdo e em ambos os sexos. Em fêmeas, observou-se uma maior média no timo esquerdo e em machos, no direito (Tabela 4).

As medidas médias das dimensões dos lobos tímicos de ambos os antímeros indicaram diferenças significativas entre machos e fêmeas na região caudal do pescoço. Nos antímeros direito e esquerdo, as diferenças foram observadas em relação à largura e à espessura, além disso, no esquerdo constatou-se também quanto ao comprimento (Tabelas 5 e 6).



Levando-se em consideração as regiões do pescoço, comparou-se as médias de cada dimensão dos lobos entre os antímeros direito e esquerdo, em aves do mesmo sexo. Em fêmeas, detectaram-se diferenças quanto à largura e espessura, nas regiões cervicais média e cranial, respectivamente. Nos machos, foram notadas na região caudal, em relação ao comprimento (Tabelas 7 e 8).



Discussão

A análise dos cortes histológicos dos lobos tímicos mostrou que as regiões cortical e a medular do órgão encontram-se nítidas, sendo que, na medula, notou-se o corpúsculo tímico, o que é condizente com o que foi relatado por Nickel et al.(11), Bódi et al.(12) e Kannan et al.(13).
Os lobos tímicos apresentaram formatos variados, desde ovalados, triangulares e alongados no sentido craniocaudal, com coloração rosa claro, assim como foi descrito por Nickel et al. e Getty(11,20). Dispunham-se ventrolateralmente, de forma linear longitudinal, estendendo-se desde a região cranial do pescoço até o limite cranial da cavidade toracoabdominal, ao nível das clavículas. Havia estreita relação dos lobos, direitos e esquerdos, com o feixe vásculo-nervoso (nervo vago, veia jugular externa e artéria comum do nervo vago) correspondente, ao qual se posicionava lateral e paralelamente. Tais achados vão ao encontro dos de Pereira, Baumel, Nickel et al., Pereira, Santana et al., Santana et al.(2,10,11,14-26). No antímero direito, os lobos tímicos se relacionavam caudalmente com a glândula tireoide e ventralmente com o esôfago e o inglúvio. No outro antímero, a face medial dos lobos estava em contato com a musculatura cervical, nos terços cranial e médio do pescoço e no terço distal com a face lateral esquerda da traqueia(9,11,14-25).
Os pescoços apresentaram comprimentos médios de 13,77 cm e 13,87 cm, respectivamente, em fêmeas e machos, não havendo diferença entre os sexos. Nickel et al.(11) relataram que esses valores corroboram com os valores do tamanho do timo de galinhas que atingem o máximo desenvolvimento entre 4 e 17 semanas. Esse dado não foi observado nos trabalhos realizados com outras aves domésticas, no entanto, tratou-se de um dado relevante no presente estudo, já que foi referência para a determinação das regiões cervicais e posterior contagem do número de lobos tímicos(11,14-26).
Tomando-se como base o comprimento total do pescoço de cada ave e subdividindo-o em três regiões (cranial, média e caudal) de tamanhos iguais, verificou-se que a ocorrência de lobos tímicos no terço mais cranial é menor, quando comparada aos terços médio e caudal(20).
As aves apresentaram de quatro a oito lobos tímicos individualizados, independente do antímero e sexo(19,20), diferindo do número de seis a oito, citado por alguns autores(11,20,27), sendo que os lobos completamente individualizados não ocorrem em aves jovens(11,20).
Em aves da linhagem Bovans Goldline, descreveu-se de dois a seis, com predomínio de cinco e três lobos, para os antímeros direito e esquerdo, respectivamente(24); nas aves Paraíso Pedrês, o número variou de dois a 10 lobos para o antímero esquerdo e de três a oito lobos para o antímero direito, não ocorrendo diferença estatística significante para os dados correlacionados entre machos e fêmeas(17); em Hubbard, o número de lobos oscilou de três a treze(14); para aves Master Gris Cou Plumé encontrou-se de quatro a 11 lobos tímicos, por antímero(25); uma variação de três a cinco lobos foi constatada em aves reprodutoras pesadas Cobb, com idades entre cinco e seis semanas(23). Por fim, em galinhas caipiras, o número de lobos tímicos descritos foi de quatro a oito por antímero(26), os dados obtidos no presente estudo corroboram com estes últimos dados.
O número de lobos tímicos foi maior no antímero direito do que no esquerdo, independente do sexo(24), entretanto, pode ser menor(23). Porém, os dados encontrados para as aves desta pesquisa, mostraram que as médias para os antímeros direito e esquerdo, respectivamente, são 4,87 e 5,13 em fêmeas e 5,47 e 5,13 em machos, não se verificando diferenças entre os antímeros, tampouco entre os sexos.
Em relação às dimensões, nas fêmeas, somente a espessura dos lobos localizados no terço cranial do antímero esquerdo apresentou-se maior que os localizados no direito e, naqueles da região média esquerda, a largura foi superior ao antímero oposto. Nos machos, a média do comprimento dos lobos localizados no terço caudal esquerdo foi maior do que no antímero direito e as demais medidas não se diferenciaram.
Em aves jovens, as medidas dos lobos tímicos variaram de 8 a 15 mm de comprimento, 7 a 9 mm de largura e de 2 a 5 mm de espessura(11). Em galinhas da linhagem Paraíso Pedrês, de 11 semanas de idade, os lobos mediram em média 5,4 mm de largura, 12,4 mm de comprimento e 0,23 mm de espessura, em ambos os antímeros, não havendo diferença estatística para os dados correlacionados entre machos e fêmeas(17). Tais dados diferem dos encontrados neste estudo, pois foram detectados valores maiores nas larguras e espessuras, dos lobos situados no terço cervical caudal de machos em relação às fêmeas.

Conclusão

O timo das aves AP95 apresentou características topográficas e morfológicas similares àquelas de outras linhagens, porém, quanto à morfometria, foram observadas características singulares.

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