DOI: 10.1590/1089-6891v20e-49037
MEDICINA VETERINÁRIA


EFEITO IN VITRO E IN VIVO DE EXTRATOS DE Eugenia uniflora EM NEMATÓDEOS GASTRINTESTINAIS DE OVINOS

IN VITRO AND IN VIVO EFFECT OF Eugenia uniflora EXTRACTS ON GASTROINTESTINAL NEMATODE OF SHEEP



Luciana Laitano Dias de Castro1* ORCID - http://orcid.org/0000-0002-9173-3650
Lew Kan Sprenger2 ORCID - http://orcid.org/0000-0003-4236-9837
Isabel Martins Madrid1 ORCID - http://orcid.org/0000-0002-98866050
Fernando Caetano de Oliveira1 ORCID - http://orcid.org/0000-0002-5191-9901
Plíno Aguiar de Oliveira1 ORCID - http://orcid.org/0000-0002-9326-5299
Leonardo Mortagua de Castro1 ORCID - http://orcid.org/0000-0002-5705-6748
Maria Elisabeth Aires Berne¹ ORCID - http://orcid.org/0000-0003-4444-1134
Fábio Pereira Leivas Leite¹ ORCID - http://orcid.org/0000-0003-0941-7286


¹Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
²Faculdades Integradas do Vale do Iguaçu, União da Vitória, PR, Brasil.
*Autora para correspondência - lu.ldcastro@gmail.com


Resumo
Este estudo avaliou a ação in vitro e in vivo de extratos de Eugenia uniflora em nematódeos gastrintestinais de ovinos. No teste de inibição da eclodibilidade dos ovos, extratos aquosos e hidroalcoólicos foram testados nas concentrações de 40 a 1,25 mg/mL. O efeito citotóxico foi mensurado através do ensaio de MTT em células VERO nas concentrações de 4000 a 1,95 µg/mL. A composição química foi analisada através da marcha fitoquímica qualitativa. No teste in vivo, foram administrados 100 mg/kg, por via oral, do extrato hidroalcoólico por três dias em ovinos naturalmente infectados e realizada coleta de fezes para estimar a redução de ovos por grama de fezes (OPG). Diferentes extratos de E. uniflora inibiram a eclodibilidade dos ovos, com percentual de inibição variando de 14,56 a 99,75%, sendo os hidroalcoólicos mais promissores que os aquosos. Na marcha fitoquímica, compostos com ação anti-helmíntica comprovada foram observados, como flavonoides, saponinas, taninos e triterpenos. Nas condições testadas, os extratos apresentaram citotoxicidade nula a moderada. In vivo, a redução do OPG foi observada apenas no grupo controle (anti-helmíntico). Os extratos de E. uniflora mostraram-se promissores com ação in vitro, necessitando estudos que avaliem outras concentrações e formas de administração in vivo.
Palavras-chave: planta medicinal; Haemonchus contortus; ruminantes; anti-helmíntico; pitangueira.

Abstract:
This study evaluated the in vitro and in vivo action of Eugenia uniflora extracts on sheep gastrointestinal nematode. In the egg hatchability inhibition assay, aqueous and hydroalcoholic extracts were tested in the concentrations ranging from 40 to 1.25 mg/mL. The cytotoxic effect was measured using the MTT assay on VERO cells at concentrations ranging from 4000 to 1.95 µg/mL. The chemical composition was analyzed through the qualitative phytochemical screening. In the in vivo test, 100 mg/kg of the hydroalcoholic extract was administered orally for three days in sheep naturally infected and fecal collection was performed to estimate the egg count per gram of faeces (EPG). Different extracts of E. uniflora inhibited hatchability of eggs with a percentage of inhibition ranging from 14.56 to 99.75%, being the hydroalcoholic most effective than the aqueous. In phytochemical analysis, compounds with anthelmintic action were observed, such as flavonoids, saponins, tannins and triterpenes. Extracts showed moderate to null cytotoxicity under the conditions tested. Reduction of EPG was observed only in control group (anthelmintic). The extracts of E. uniflora proved promising with in vitro action, requiring studies that assess other concentrations and forms of in vivo administration.
Keywords: medicinal plants; Haemonchus contortus; ruminants; anthelmintic; Brazilian cherry.


Recebido em: 28 de Agosto de 2017
Aceito em 09 de julho de 2018.

Introdução


A produção brasileira de pequenos ruminantes tem grande importância econômica, gerando renda a milhares de pequenos e médios produtores. Contudo, o manejo sanitário incorreto é o principal entrave para a saúde e o bem-estar desses animais(1). A infecção por Haemonchus contortus é a principal doença parasitária nacional, causando anorexia, apatia, aumento da conversão alimentar, comprometimento da função reprodutiva e perda de peso em animais infectados(2).

A principal medida de controle adotada para minimizar as perdas geradas pelos nematódeos é a utilização de anti-helmínticos, porém, o uso abusivo e errôneo desses fármacos acelerou o desenvolvimento de parasitos resistentes a essas drogas(3). Estudos afirmam que esse problema se encontra em diferentes regiões do Brasil(4) e também é disseminado mundialmente(5,6). Além disso, os riscos decorrentes de resíduos de anti-helmínticos ou seus metabólitos em alimentos derivados de animais reforçam a necessidade da descoberta de compostos ativos seguros e acessíveis através das plantas(7). Para solucionar esse problema, muitas tecnologias estão sendo desenvolvidas, sendo que a fitoterapia tem demonstrado bons resultados(8). O Brasil possui a mais diversa flora do mundo, e o uso desses medicamentos está amplamente difundido na população(9).

Eugenia uniflora (Myrtaceae) é uma árvore tropical e subtropical amplamente distribuída nos países sul-americanos, principalmente Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai(10). As suas folhas são utilizadas na medicina popular na forma de infusão para o tratamento de febre, reumatismo, distúrbios gástricos e hipertensão(11). Outros estudos relatam que a planta tem propriedades anti-inflamatórias, antifúngicas e anti-helmíntica(12,13). Ao avaliarem a ação in vitro no desenvolvimento de larvas de nematódeos gastrintestinais de ovinos, Hassum e colaboradores(13) observaram efeito do extrato hidroalcoólico de E. uniflora na redução desse desenvolvimento, tendo uma baixa contagem de larvas infectantes quando comparado ao grupo controle. Devido aos escassos estudos, o objetivo do presente trabalho foi avaliar a ação anti-helmíntica in vitro, através do teste de inibição da eclodibilidade, e in vivo de diferentes extratos de Eugenia uniflora em face de nematódeos gastrintestinais de ovinos.


Material e métodos



O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal da Universidade Federal de Pelotas (CEEA 3897).

Folhas frescas da planta Eugenia uniflora (pitangueira) foram coletadas na zona rural de Canguçu, Rio Grande do Sul, Brasil, em dezembro de 2012. E. uniflora foi identificada pela Prof.ª Raquel Lüdtke e depositada no acervo do Herbário PEL, Departamento de Botânica da Universidade Federal de Pelotas, sob o número voucher 25.872. A planta foi desidratada em estufa com circulação de ar a 35°C, por três dias. As folhas secas foram trituradas e estocadas em frascos fechados e protegidos da luz até o momento da produção dos extratos.

A partir das folhas secas da planta, foram produzidos dois extratos aquosos e três hidroalcoólicos utilizando como solvente álcool de cereais 70º GL, sempre na concentração de 10%. Após a metodologia, todos os extratos foram liofilizados e armazenados a 20°C negativos.

O extrato aquoso por decocção (EA/DEC) foi preparado a partir da ebulição da planta em água destilada a 100°C em frasco fechado por 10 minutos. Após, a amostra foi filtrada para eliminação de resíduos sólidos e congelada a -75°C. Para produção do extrato aquoso em banho-maria (EA/BM), a solução permaneceu sob agitação constante em frasco fechado imerso em óleo na temperatura de 65°C por uma hora. Após este período, o material foi filtrado e o mesmo procedimento repetido por mais duas vezes com a mesma planta, as três partidas foram congeladas a -75°C.

O extrato hidroalcoólico em banho-maria (EHA/BM) foi produzido através da mesma metodologia citada para o EA/BM, porém, antes de o material ser congelado, o solvente foi extraído em evaporador rotativo a 55°C sob 600 mm/hg de pressão negativa. Para a produção do extrato hidroalcoólico por ultrassom (EHA/US), a extração foi realizada em sonicador com frequência de 500 kHz e amplitude de 40% por 15 minutos em temperatura ambiente. Após este período, o material permaneceu 24h sob refrigeração a 4°C e posteriormente foi filtrado, o solvente evaporado e congelado a -75°C. O extrato hidroalcoólico por maceração (EHA/MA) foi preparado a partir de uma tintura que permaneceu em maceração sob agitação diária por sete dias em temperatura ambiente. Após este período, a solução foi filtrada, o solvente extraído em evaporador rotativo e o extrato mantido a -75°C.

A marcha fitoquímica qualitativa de todos os extratos foi realizada conforme protocolo descrito por Matos(14), com o objetivo de verificar a presença de metabólitos secundários (antraquinonas, catequinas, esteróis, fenóis, flavonoides, resinas, saponinas, taninos, triterpenos).

O efeito citotóxico dos extratos foi avaliado através do ensaio de MTT (brometo tiazoli azul de tetrazólio), descrito por Mosmann(15) com modificações. Células VERO foram cultivadas em RPMI 1640 suplementado com soro fetal bovino 10%, em uma atmosfera com 5% de CO2 a 37°C. Uma suspensão de células contendo 2 x 105 cel/mL foi semeada em microplacas de 96 poços e incubada por 24h nas condições citadas acima. Posteriormente, 100 μL de cada extrato em 12 concentrações sucessivas de 4000 a 1,95 µg/mL foram adicionados à microplaca, a qual permaneceu por 48h a 37°C em atmosfera de 5% de CO2. O teste foi acompanhado por controle de crescimento celular, utilizando RPMI 1640, e cada concentração dos extratos foi testada em triplicata. Após este período, 50 μL de MTT (2,5 mg/mL) foram adicionados a cada poço e incubados durante duas horas e trinta minutos, posteriormente foram removidos e 50 μL de DMSO (dimetilsulfóxido) foram acrescidos sob agitação durante cinco minutos para solubilizar os cristais de formazan formados pelas células viáveis que metabolizaram o MTT. A absorbância das amostras foi mensurada através de espectrofotômetro de microplaca em comprimento de onda de 540 nm. Os resultados foram expressos através do percentual de células viáveis relativa às células do controle (considerado como 100%).

Os ovos foram obtidos através da coleta de fezes diretamente da ampola retal de dois ovinos naturalmente infectados por nematódeos gastrintestinais (NGI). Os animais foram mantidos sem tratamento anti-helmíntico por no mínimo 60 dias antes da coleta e com a contagem de ovos por grama de fezes (OPG), realizada pela técnica de Gordon e Whitlock(16), acima de 2000. Para a recuperação dos ovos, foi utilizada a técnica de Hubert e Kerboeuf(17) adaptada, sendo as fezes maceradas, diluídas em água destilada e passadas através de quatro tamises, dispostas em ordem decrescente de abertura de malha (1 mm; 105 μm; 55 μm; 25 μm). Os ovos foram recuperados do tamis de 25 μm, lavados através de centrifugações, diluídos em água destilada e quantificados em triplicata. O gênero das larvas dos nematódeos presentes nas fezes foi determinado através da técnica de coprocultura descrita por Roberts e O`Sullivan(18).

O teste foi realizado em placa de microcultivo de 24 poços com quatro repetições, segundo a técnica de Coles(19). Em cada poço foi colocado aproximadamente 150 ovos e o extrato a ser testado em seis concentrações sucessivas de 40 a 1,25 mg/ml. Como controles, foram utilizados tiabendazol na concentração de 0,025 mg/ml e água destilada estéril. As placas foram incubadas em estufa B.O.D a 28°C com umidade relativa de 80% por 24h para a posterior quantificação de ovos e larvas de primeiro estádio em microscópio invertido. Os resultados foram expressos pela média percentual da inibição da eclodibilidade da quadruplicata, sendo a eficácia de cada tratamento no teste de eclosão determinada conforme a equação descrita por Camurça-Vasconcelos(20):

% de inibição da eclodibilidade = [número de larvas (número de larvas + número de ovos)-1]100.

Foram utilizados 24 ovinos da raça corriedale, com 8 a 10 meses de idade, de ambos os sexos, naturalmente infectados por nematódeos gastrintestinais e divididos em grupos de oito animais cada um. Os animais estavam no mínimo há 60 dias sem receber tratamento anti-helmíntico e foram distribuídos homogeneamente nos grupos conforme a carga parasitária estimada pela contagem de OPG. Durante o período experimental, os animais permaneceram em pastagem nativa recebendo água ad libitum. O grupo controle positivo recebeu anti-helmíntico comercial (moxidectina, via subcutânea, 0,2 mg/kg) e o controle negativo água. Para o grupo tratamento, o extrato hidroalcoólico por maceração de E. uniflora (EHA/MA) na concentração de 100 mg/Kg foi administrado diariamente, por via oral, durante três dias consecutivos. Para avaliar a eficácia do tratamento, foi realizada a coleta individual de fezes diretamente da ampola retal nos dias 0, 3, 7, 10 e 14 após o início do tratamento para a contagem de OPG e coprocultura. Para a determinação do percentual de redução do OPG, utilizou-se a fórmula descrita por Coles(19): % Redução = (1 – [Dia pós tratamento/Dia zero]100.

Os resultados dos testes de citotoxicidade, de inibição da eclodibilidade e do teste in vivo foram analisados utilizando ANOVA e as médias comparadas através do teste de Tukey (p≤0,05), usando o software Statistix® 9.0. Para a análise dos dados do teste in vivo, os resultados foram normalizados através da transformação por Log10.


Resultados



Os resultados da marcha fitoquímica qualitativa estão descritos na Tabela 1, sendo que foram semelhantes aos observados em estudo desenvolvido com óleo essencial de E. uniflora(21). Verificando a composição fitoquímica dos extratos, observou-se diferença entre a composição dos extratos aquosos em relação aos extratos hidroalcoólicos, sendo que os extrato EHA/BM e EHA/MA demonstraram maior quantidade de compostos, com relação aos demais pesquisados.

No teste de citotoxicidade, os diferentes extratos testados apresentaram graus variáveis de toxicidade em células VERO de acordo com a concentração, apresentando um efeito dose-dependente positivo. Ao analisar os diferentes extratos dentro da mesma concentração, observou-se que a ação tóxica não apresentou diferença acentuada na maioria das concentrações, sendo que para todos os extratos o percentual de células viáveis variou de 51,23 a 100% (Tabela 2).


No teste in vitro de inibição da eclodibilidade, os diferentes extratos de E. uniflora apresentaram ação anti-helmíntica sobre NGI de ovinos com percentual médio de inibição entre 14,56 e 76,04% para os extratos aquosos (Figura 1) e de 20,35 a 99,75% para os hidroalcoólicos (Tabela 3). Na maior concentração testada (40 mg/mL), verificou-se diferença estatística na atividade ovicida entre os extratos aquosos e hidroalcoólicos, os quais apresentaram média de 99% de inibição da eclodibilidade (p≤0,05). Os controles com água destilada e anti-helmíntico demonstraram inibição de 8,91 e 98,58%, respectivamente. O resultado das coproculturas revelou a presença dos gêneros Haemonchus (97%) e Trichostrongylus (3%).




Os valores de inibição do extrato aquoso por decocção variaram de 22,04 a 76,04%, sendo que, a partir da concentração de 5 mg/mL, essa atividade permaneceu abaixo de 30%. O extrato aquoso por banho-maria demonstrou menor atividade anti-helmíntica quando comparado aos demais extratos, com 65,39% de atividade na maior concentração testada (40 mg/mL). Nas concentrações seguintes, verificou-se diferença significativa nos percentuais de inibição, sendo este efeito diretamente proporcional à concentração (p≤0,05). Os dois extratos aquosos não apresentaram resultados semelhantes ao controle com anti-helmíntico, porém, apesar da baixa atividade, todos diferiram do controle com água destilada (p≤0,05).

O percentual médio de inibição do extrato hidroalcoólico por banho-maria (EHA/BM), na concentração de 20 e 40 mg/mL, foi 97,42 e 99,75%, respectivamente, não diferindo estatisticamente entre si e do controle com anti-helmíntico (p˃0,05). A partir dessas concentrações, a atividade anti-helmíntica apresentou um decréscimo gradual até atingir 20,35% de inibição na concentração de 1,25 mg/mL. Os resultados do extrato hidroalcoólico por ultrassom (EHA/US) demonstraram inibição da eclodibilidade superior a 88% em todas as concentrações testadas. A ação permaneceu acima de 98% nas concentrações de 10, 20 e 40 mg/mL, as quais não diferiram estatisticamente entre si e nem do controle com anti-helmíntico (p˃0,05). Resultado semelhante foi observado no extrato hidroalcoólico por maceração (EHA/MA), que apresentou atividade de 97,02 a 99,73%, sendo que todas as concentrações testadas não apresentaram diferença estatística do controle com anti-helmíntico (p˃0,05).

Na avaliação in vivo, o percentual de redução do OPG variou de 70,29% a 94,06% para o grupo controle positivo, sendo que a máxima redução foi sete dias após a administração do anti-helmíntico. Para os grupos tratamento e controle negativo, não foi observada redução na contagem do OPG (Tabela 4). Durante o experimento, todos os animais apresentavam 99% de infecção por Haemonchus contortus e 1% por Trichostrongylus spp.


Discussão


No teste de citotoxicidade, os resultados revelaram ação tóxica de moderada a nula dos extratos aquosos e hidroalcoólicos de E. uniflora nas concentrações testadas. Pesquisas avaliando a toxicidade celular in vitro de E. uniflora são escassas, no entanto, Santos et al.(22) , ao avaliarem a citotoxicidade de extrato etanólico de E. uniflora em macrófagos, observaram baixo efeito citotóxico na concentração de 100 µg/mL. Outro estudo analisou a citotoxicidade dos frutos da planta Eugenia dysenterica na forma de extrato etanólico e verificou ausência de efeito citotóxico até a concentração de 300 µg/mL(23). O presente estudo apresentou citotoxicidade semelhante aos trabalhos citados anteriormente, visto que na concentração de 250 µg/mL todos os extratos apresentaram o percentual de células viáveis, variando de 72,07 a 90,29%.

Pesquisas acerca da toxicidade in vivo de extrato hidroalcoólico de folhas de E. uniflora realizados em camundongos Balb/C demonstraram ausência de efeitos tóxicos em doses até 4200 mg/kg, quando administrado por via oral, e dose letal 50% de 220 mg/kg, quando administrado por via intraperitoneal(24). Em outro estudo desenvolvido por Auricchio e Bacchi(25), a dose letal para 50% das cobaias foi de 5930 mg/kg. Esses trabalhos demonstram a segurança da utilização dos extratos em animais experimentais, pois apresentam valores mais elevados ao utilizado no presente estudo para a realização do teste in vivo.

Os resultados observados no teste in vitro indicam que E. uniflora apresenta efeito ovicida diferenciado em Haemonchus contortus, conforme a extração utilizada, visto que, na concentração de 40 mg/mL, o percentual médio de inibição da eclodibilidade foi de 99% para os extratos EHA/BM, EHA/US e EHA/MA, de 76,04% para o EA/DEC e 64,99% para o EA/BM. Esses resultados evidenciam a superioridade da ação anti-helmíntica in vitro dos extratos hidroalcoólicos quando comparados aos aquosos. Essa diferença sugere que os extratos têm componentes ativos diferentes, devido às metodologias utilizadas, mas principalmente devido ao tipo de solvente utilizado, conforme observado na análise fitoquímica.

Na análise fitoquímica qualitativa, observou-se que todos os extratos tinham na sua composição catequinas, fenóis, saponinas e taninos, porém, apenas os hidroalcoólicos continham antraquinonas, esteroides, flavonoides e triterpenos, confirmando a maior diversidade de compostos com esse tipo de solvente. Estudos compravam que a presença e a maior concentração de compostos como taninos, flavonoides, triterpenos e saponinas têm ação anti-helmíntica(26, 27, 28, 29), sendo que, no presente estudo, apenas os extratos com melhor atividade biológica (EHA/BM e EHA/MA) apresentaram flavonoides e triterpenos na sua composição.

Dentro os compostos encontrados nos extratos avaliados no presente estudo, as saponinas interferem na integridade da membrana dos nematódeos, alterando sua permeabilidade e facilitando a entrada de moléculas por diferença de osmolaridade(30). Os flavonoides têm um mecanismo de ação indireto sobre os helmintos, pois são os principais responsáveis pela atividade antioxidante do vegetal, melhorando a imunidade do hospedeiro e reduzindo o turnover celular, sendo comum plantas com ação medicinal apresentarem altos níveis dessa substância(31). Os taninos têm atividade antiparasitária, devido à redução da taxa metabólica dos nematódeos, diminuindo a disponibilidade de nutrientes(27). Kabasa et al.(32) relatam que esses compostos também podem causar decréscimo da fertilidade e ovipostura das fêmeas adultas. Outro fator importante é a redução na taxa de motilidade das larvas, o que reduz o índice de contaminação da pastagem(33). A ação ovicida observada no presente estudo pode estar relacionada à presença desses compostos, porém, sugere-se que os esteroides, flavonoides e triterpenos obtiveram maior influência, visto que foram encontrados apenas nos extratos com maior percentual de inibição da eclodibilidade.

Estudos científicos avaliando o potencial anti-helmíntico da pitangueira são escassos, entretanto, Furtado(34), ao pesquisar a atividade do extrato hidroalcoólico de E. uniflora na concentração de 108,4 mg/mL sobre trichostrongilideos, verificou taxa de inibição da eclodibilidade dos ovos superior a 80%. O presente estudo demonstrou ação semelhante em todos os extratos hidroalcoólicos, porém, essa atividade foi obtida em concentrações cerca de dez vezes inferiores à testada por Furtado(34). Hassum et al.(13), ao avaliarem a ação do extrato hidroalcoólico de E. uniflora na concentração de 200 mg/mL, observaram uma inibição de 90,5% no desenvolvimento de larvas do primeiro ao terceiro estágios de nematódeos gastrintestinais, especialmente H. contortus e Trichostrongylus spp.. Embora nosso estudo tenha avaliado outra fase de desenvolvimento dos nematódeos, os resultados de inibição obtidos foram semelhantes, entretanto, em concentrações muito inferiores (40 mg/mL).

Estudos avaliando o potencial antiparasitário de plantas do gênero Eugenia, como extrato aquoso de E. aquea, demonstraram ação de 65,12% na inibição da eclodibilidade dos ovos de H. contortus(35), resultados semelhantes aos obtidos com os extratos aquosos do presente estudo, na concentração de 20 mg/mL. Em teste in vivo, Gaspar et al.(36) observaram a redução de 81% na contagem de ovos por grama de fezes após 14 dias da administração junto à ração de folhas secas de E. dysenteriae e Caryocar brasiliense, na proporção de 1,2 g/Kg, em ovinos parasitados por H. contortus.

Apesar da eficácia observada no teste in vitro, o extrato hidroalcoólico por maceração de E. uniflora não demonstrou efeito anti-helmíntico no experimento in vivo, nas condições em que foi testado. Diferenças entre os percentuais de eficácia dos testes in vitro e in vivo têm sido registradas, as quais podem ser justificadas pela influência de fatores ambientais e pela metodologia experimental, incluindo dose e período de administração do extrato(37). Além disso, nos testes in vitro, os extratos permanecem em condições ideais em contado direto com o parasito, diferente do que ocorre no teste in vivo(38). A microbiota ruminal pode ser responsável por variações na eficácia dos compostos bioativos, pois pode alterar a estrutura química do componente, o mecanismo de ação de alguns nutrientes, ou medicamentos administrados por via oral(39).

Conclusão


Os diferentes extratos de Eugenia uniflora inibiram, in vitro, a eclodibilidade de Haemonchus contortus, sendo os extratos hidroalcoólicos as formas mais promissoras. Na marcha fitoquímica, foram observados nos extratos hidroalcoólicos importantes compostos com ação anti-helmíntica, como taninos, flavonoides, triterpenos e saponinas. Quanto à toxidade celular, os resultados sugerem que os extratos têm ação tóxica de moderada a nula nas condições testadas. Os resultados do teste in vivo demonstram que o extrato hidroalcoólico por maceração, na concentração testada, não apresentou eficácia significativa. Assim, os resultados do presente estudo revelaram que os extratos de E. uniflora mostraram-se promissores com ação in vitro, necessitando estudos que avaliem outras concentrações e formas de administração in vivo para obter eficácia na sua administração aos animais.

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