RESUMO
Com objetivo de identificar as características relacionadas aos
sistemas de criação caprina e ovina na Microrregião de Patos-PB,
semi-árido da Paraíba, foram analisadas 90 propriedades de nove
municípios da região do Sertão do Estado da Paraíba. Foram aplicados
questionários visando a obter informações relacionadas aos sistemas de
criação caprina e ovina, envolvendo aspectos sanitários, nutricionais,
produtivos e reprodutivos. Os resultados mostraram que o sistema
extensivo é predominante e, associado às práticas de manejo nutricional
e reprodutivo deficientes, tem contribuído para baixos índices de
produção.
____________
PALAVRAS-CHAVE: semi-árido; caprinos; ovinos; sistemas produtivos.
ABSTRACT
SANITARY AND MANAGEMENT ASPECTS OF GOAT AND OVINE FARM IN THE MICRO-REGION OF PATOS IN THE SEMI-ARID AREA OF PARAIBA STATE
The aim of this study was to identify several characteristics related
to the systems of goat and ovine production in the region of Patos-PB.
A total of 90 properties located in the semi-arid region of the Paraiba
State were analyzed, by means of questionnaires aiming at getting
information related to the systems of goat and ovine production,
involving sanitary, nutrition, productive and reproductive aspects. It
could be concluded that the extensive management is predominant with
unsatisfactory nutrition and reproductive aspects leading to low
production rates.
____________
KEYWORDS: semi-arid; goat; ovine; production systems.
INTRODUÇÃO
O Nordeste do Brasil possui 1.560.000 km² de superfície, representando
18% da área total do país. Destes, 75% estão inseridos na região
Semi-árida, o que representa 9,5% da área geográfica nacional,
totalizando 850.000 Km², com grande concentração de rebanhos caprinos e
ovinos que desempenham importante papel sócio-econômico (IBGE, 2006).
Os sistemas de produção caprina e ovina na região têm se caracterizado
por apresentar baixos índices produtivos em decorrência,
principalmente, de práticas de manejo inadequado, más condições
sanitárias, baixa capacidade de investimento, irregularidades na
disponibilidade de alimentos ao longo do ano, baixa capacidade de
absorção tecnológica pelas propriedades, entre outras (PINHEIRO
et al., 2000).
Apesar desse quadro desfavorável, a introdução de animais
especializados para leite e carne, verificada na região nos últimos
vinte anos, tem despertado um interesse maior por essas espécies,
associado à valorização de determinadas raças que vem se expandindo do
Nordeste para todo o Brasil, a exemplo da raça ovina Santa Inês
(NOGUEIRA, 2007) e a expansão da caprinocultura de leite no Cariri
paraibano (RODRIGUES & QUINTANS, 2007).
A produção de carne e pele de ovinos e caprinos no Brasil apresenta um
horizonte de crescimento muito significativo e sem precedentes em outra
cultura do agronegócio, pois tanto o mercado interno é extremamente
ávido por seus produtos e derivados, como o mercado externo é altamente
comprador de carne e de peles (SEBRAE, 2007).
A caprinovinocultura nos últimos anos vem despontando no agronegócio
brasileiro como opção de diversificação da produção, gerando, assim,
oportunidades de emprego, renda e fixação do homem no campo,
demonstrando seu importante papel no contexto da pecuária brasileira.
No entanto, ainda é precário o nível de desfrute, produtividade,
gerenciamento e articulação do setor primário da cadeia produtiva em
questão, dificultando melhorias de competitividade e remuneração dos
próprios produtores, ameaçando o pleno desenvolvimento e a
sustentabilidade da atividade (SEBRAE, 2007). Ainda segundo esse autor,
na ótica do desenvolvimento sustentável, é fundamental a implantação e
estruturação de um planejamento estratégico, construído de forma
conjunta, na discussão de temas e propostas que possibilitem aos
diversos atores da cadeia produtiva novos conhecimentos e tecnologias
de produção e gestão dos seus negócios.
BANDEIRA
et al. (2007b)
afirmaram que as mudanças nas relações comerciais com abertura dos
mercados propiciaram à atividade agropecuária uma otimização das suas
unidades produtivas, tornando-as mais competitivas, fazendo com que
alguns produtores de caprinos fossem estimulados a buscar maior
eficiência produtiva para atender à demanda regional e internacional.
Diversos trabalhos têm mostrado os aspectos de manejo, sanidade e
nutrição aplicados aos sistemas de produção caprina e ovina em
diferentes regiões do Nordeste (PINHEIRO
et al., 2000; PEDROSA
et al., 2003; BANDEIRA
et al., 2007a; BANDEIRA
et al., 2007b; SEBRAE 2007; COSTA
et al., 2008).
Os estudos sobre as condições de criação nas diversas regiões são
importantes para analisar as particularidades que cada região
apresenta, possibilitando, assim, estabelecer ações que visem à
melhoria das mesmas e, de acordo com NOGUEIRA (2007), ter uma mudança
de paradigmas no enfoque da realidade das especificidades do
semi-árido.
Nesse contexto, com o presente trabalho, objetivou-se analisar as
características sanitárias e produtivas dos sistemas de produção
caprina e ovina em municípios que compõem a Microrregião de Patos-PB.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram coletados dados de propriedades de nove municípios que integram a
Microrregião de Patos, mesorregião do sertão paraibano. Os municípios
estudados foram: Areia de Baraúnas, Cacimba de Areia, Mãe D’Água,
Passagem, Quixabá, Patos, Santa Terezinha, São José das Espinharas e
São José do Bonfim. Os municípios abrangem uma superfície de 2269,11Km².
No período compreendido entre julho e dezembro de 2007, dez
propriedades de cada município integrante da microrregião foram
selecionadas aleatoriamente, num total de 90 propriedades. A coleta de
informações foi feita utilizando-se um questionário contendo 100
perguntas relacionadas com o manejo geral e com o manejo sanitário,
nutricional e reprodutivo.
A seleção das propriedades foi realizada por meio das recomendações de
REIS (2003) usando-se a amostragem por área. Os dados foram coletados
através de entrevista direta com o proprietário ou responsável e em
visitas às propriedades rurais previa e aleatoriamente selecionadas a
partir de cadastro de órgãos de assistência técnica e fomento. Os dados
coletados foram tabulados e analisados separadamente. Para
caracterização das formas de produção das criações de caprinos e
ovinos, utilizaram-se as respostas obtida nas entrevistas com os
produtores e realizada a distribuição de freqüências das principais
características relacionadas com o produtor, propriedade e rebanho, a
saber: práticas de manejo reprodutivo adotadas, tipo de vacina e número
de vacinações utilizadas, principais medidas sanitárias e principais
problemas sanitários nos rebanhos relatados pelo produtor.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A frequência das atividades de manejo geral nas propriedades esta apresentada na
Tabela 1.
Verifica-se que a atividade de identificação dos animais é baixa,
situando-se em níveis abaixo de 35% das propriedades, o que reflete
diretamente o grau de organização encontrado na região, já que a
escrituração zootécnica constitui uma das ações fundamentais para a boa
prática administrativa das propriedades, possibilitando com isso um
manejo adequado, um melhor controle dos animais e uma seleção
eficiente. Na região Norte e Nordeste de Minas Gerais, em dados
publicados em ANÁLISE DA OVINOCAPRINOCULTURA... (2004), foram
encontrados valores semelhantes aos obtidos no presente trabalho.
NOGUEIRA & MELLO (2005) verificaram baixo percentual de
escrituração zootécnica em criações de caprinos na região Sudoeste do
Estado de São Paulo. Esses resultados vêm a corroborar as observações
de COSTA
et al. (2008) que,
num estudo na região do Cariri paraibano, observaram falta de
escrituração zootécnica nos rebanhos. Quanto à prática de pesagem dos
animais, os valores observados neste trabalho são considerados muito
baixos, uma vez que menos de 5% das propriedades realizavam essa
prática após o nascimento dos animais.
Com relação à utilização de práticas de manejo de animais, verificou-se
que em menos de 22% das propriedades nenhuma prática era aplicada,
deixando-se os animais em regime extensivo. Ao analisar a separação dos
animais por categoria (jovens e adultos), os percentuais aqui
observados (22,5%) foram superiores àqueles verificados na região Norte
(15,7%) e Nordeste (5,3%) do Estado de Minas Gerais, dados publicados
em ANÁLISE DA OVINOCAPRINOCULTURA... (2004). Verificou-se que, na
região, o manejo aplicado aos rebanhos reflete diretamente a
predominância do sistema de criação extensivo com poucas atividades de
manejo, o que contribui para a apresentação dos baixos índices de
produtividade observados. Essas observações coincidem com os resultados
de PINHEIRO
et al. (2000) e PEDROSA
et al. (2003) na região Nordeste e NOGUEIRA & MELLO (2005) no estado de São Paulo. Já MAGALHÃES
et al.
(1985), ao analisarem rebanhos nos estados de Rio de Janeiro e Minas
Gerais, observaram valores maiores de criações com regime intensivo
(54,2%).
Na
Tabela 2
verifica-se que os níveis de suplementação com concentrado (45%),
mineralização (74,15%), fenação (18%) e silagem (14,6%) foram
inferiores aos observados por BANDEIRA
et al.
(2007a). É necessário salientar a importância do manejo nutricional
para os sistemas de produção caprina e ovina no semi-árido, conforme
sugerem PEREIRA
et al.
(2007), que enfatizam que o desenvolvimento de sistemas de criação no
semi-árido deve considerar ações que levem em conta a fragilidade do
bioma caatinga quando manejado inadequadamente, as adversidades
edafoclimáticas e a necessidade de conservação de recursos naturais.
As categorias animais (jovens e adultos) eram suplementadas de maneira diferente em 18% das propriedades. O sistema de
creep-feeding,
que consiste no fornecimento de suplementação alimentar em comedouro
seletivo na fase de cria, permitindo somente a entrada das crias, era
realizado em 12,35% das propriedades.
As pastagens nativas eram utilizadas em 100% das propriedades, e destas
18% usavam pastagens cultivadas, percentual inferior às observações de
BANDEIRA
et al. (2007a), que verificaram níveis aproximados de 65% das criações utilizando pastagens cultivadas.
As pastagens encontradas nas 90 propriedades estudadas foram bem
diversificadas. Dentre elas pode-se destacar: Capim Andrequicé (
Ichnanthus bambusiflorus), Capim Buffel (
Cenchrus ciliaris), Capim Corrente (
Urochloa mosambicensis), Capim Elefante (
Pennisetum purpureum), Capim Paraíso (
P. hybridum), Capim Tifton (
Cynodon spp.) entre outros, além de gramíneas como as Braquiárias (
Brachiaria
sp). A grande maioria dos produtores (84,25%) utiliza o sistema de
pastoreio contínuo enquanto uma pequena parcela (15,75%) utiliza o
pastoreio rotacionado.
A presença de plantas da caatinga com princípios tóxicos foi bem
representativa nas propriedades estudadas, com 52,8% de ocorrência,
sendo as mais encontradas o Tingüí (
Mascagnia rígida), Pereiro (
Aspidosperma pyrifolium), Maniçoba (
Manihot spp.), Anil (
Indigofera suffruticosa), Salsa (
Ipomoea asarifolia), Angico (
Piptadenia macrocarpa), Chocalho-de-cascavel (
Crotalaria retusa), Aveloz (
Euphorbia tirucalli L.) e Favela (
Cnidoscolus phyllacanthus, Euphorbiaceae).
Apenas dois (2,25%) proprietários utilizavam a técnica de flushing que, segundo OLIVEIRA
et al.
(2008), consiste numa dieta nutricionalmente mais rica, muito utilizada
com o objetivo de aumentar a taxa de ovulação, sendo fornecida em média
30 dias antes do início da estação reprodutiva.
De forma geral, observou-se que as práticas de manejo nutricional
verificadas na região não estão em sintonia com a demanda de produção
necessária para a obtenção de desempenho produtivo e reprodutivo
satisfatórios. Isso está em concordância com as observações de LOPES
JUNIOR (2007), que reafirmou a dificuldade de produção de alimentos no
semi-árido onde esta realidade é ainda mais marcante e implica cuidados
especiais no planejamento alimentar, assim como com as observações de
COSTA
et al. (2008), que
verificaram a falta de manejo alimentar adequado para atender as
exigências nutricionais dos animais no Cariri paraibano. No Sudoeste de
São Paulo, NOGUEIRA & MELLO (2005) também constataram que as
práticas alimentares nas criações de caprinos e ovinos eram
consideradas inadequadas, acarretando um desempenho produtivo
insatisfatório.
A
Tabela 3 mostra
as atividades relacionadas às práticas da reprodução aplicadas nas
propriedades. A maioria dos proprietários não utiliza práticas
reprodutivas e a frequência observada para algumas práticas de manejo e
uso de biotecnologias estava relacionada às propriedades com nível
tecnológico médio e elevado. De forma geral, observa-se que o uso de
práticas de manejo reprodutivo é baixo, coincidindo com as afirmações
de LOPES JUNIOR (2007) e COSTA
et al.
(2008), que relacionaram a baixa produtividade da exploração de
caprinos e ovinos à falta de práticas de manejo produtivo e
reprodutivo, provocando uma significativa redução do retorno financeiro
ao produtor. Da mesma forma, observações feitas acerca de dados
publicados em ANÁLISE DA OVINOCAPRINOCULTURA... (2004) demonstraram
que, na região Nordeste de Minas Gerais, cerca de 90% das criações não
apresentam práticas reprodutivas efetivas, o que concorre para diminuir
o desempenho produtivo dos caprinos e ovinos.
Os aspectos clínicos apontados como os que mais acometeram as criações
de caprinos e ovinos, segundo as respostas obtidas, são descritos na
Tabela 4. Essas observações mostram um percentual de mortalidade mais elevado que os observados por PEDROSA
et al.
(2003) que realizaram estudos no Rio Grande do Norte e encontraram taxa
de mortalidade de 18,4% e 6,4% para animais jovens e para adultos,
respectivamente, PINHEIRO
et al.
(2000) que verificaram taxas de 22,8% para animais jovens e 4,6% para
adultos e RODRIGUES (2005) que encontrou valores de 9% e 66% entre
animais adultos e jovens.
A alta frequência de verminoses aqui verificada coincide com a maioria
dos trabalhos publicados – MAGALHÃES (1985) no Rio de Janeiro e em
Minas Gerais e PINHEIRO
et al.
(2000) no Ceará –, mas difere das observações de BANDEIRA (2007b) no
Cariri paraibano, que relatou que isso não foi observado em seu estudo,
além de os sinais relacionados à verminose, como diarréia e pneumonia,
não serem considerados importantes pelos criadores; devido a isso, esse
autor considerou o aborto (65%), a mamite (60%), a linfadenite caseosa
(51,7%) e a ceratoconjuntivite (50%) como as enfermidades de maior
relevância, destacando-se as duas primeiras por estarem relacionadas
diretamente com a produção de leite.
Quanto a outras doenças, há variações nas suas frequências, mas algumas
são comuns: pneumonias, pododermatite e alterações nervosas.
O percentual de propriedades com uso de algum tipo de vacinação é verificado na
Tabela 5.
O número de estabelecimentos que realizavam vacinação (78,65%) pode ser
considerado satisfatório quando comparado às observações de RODRIGUES
et al.
(2005), que realizaram estudos no Sudoeste Paulista e verificaram que
pouco mais de 50% das propriedades realizavam vacinações contra algum
tipo de doença. Estudos realizados por CALDAS
et al.
(1989) no Estado da Bahia revelaram índices abaixo de 10% de
propriedades com vacinações, demonstrando uma situação menos favorável.
Observou-se que os dados da Microrregião de Patos apresentam valores
superiores aos obtidos nas regiões citadas, embora ainda sejam
considerados valores baixos para a prática profilática. A vacina contra
raiva era a mais frequentemente utilizada (71,91%), seguida pela da
febre aftosa (39,32%) e clostridioses (23,6%). Já as observações de
BANDEIRA
et al. (2007b)
mostraram que a mais frequente foi a vacina contra clostridioses
(95,3%), seguida da raiva (65,1%) e linfadenite caseosa (30,2%).
Quanto à prática da vermifugação, os dados aqui verificados (
Tabela 5)
são menores do que os relatados por PEDROSA et. al. (2003) que
observaram que 100% dos proprietários usavam anti-helmínticos na região
Noroeste do Rio Grande do Norte. Da mesma forma, a frequência da
vermifugação anual foi menor no presente estudo. Já as observações de
MAGALHÃES (1985) assemelham-se aos do estudo apresentado.
CONCLUSÃO
Concluiu-se que na região semi-árida da Paraíba, ou seja, na região de
Patos, as condições de criação dos caprinos e ovinos apresentavam
características semelhantes às de outras regiões do Nordeste com
predominância de sistemas de manejo de criação extensiva do rebanho em
desenvolvimento, condições sanitárias deficientes e uma precariedade na
disponibilidade alimentar com reflexos diretos na produtividade das
criações. Para essa consolidação faz-se necessária a implantação de
ações que melhorem a produtividade das criações caprina e ovina e uma
ação mais efetiva dos órgãos responsáveis constituídos para propiciar
melhor assistência técnica na região.
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