A frequente ocorrência de isolados
fúngicos resistentes aos fármacos antifúngicos estimulou os avanços das
técnicas de antifungigrama com a padronização das técnicas pelo CLSI.
Porém, os métodos são ineficientes e com pouca praticidade na execução
em laboratórios clínicos. Nesse contexto surgiram as técnicas
comerciais, como o ETEST, que, dentre outras vantagens, demonstra maior
facilidade na sua execução em relação às técnicas preconizadas pelo
CLSI. O estudo utilizou o ETEST e o método de microdiluição em caldo
realizado de acordo com o CLSI, para determinar a suscetibilidade de
isolados de Sporothrix schenckii
com o itraconazol. O CLSI emprega o meio RPMI 1640 e a leitura da CIM
após o período de incubação de 72h a 35ºC. No estudo, foi determinada a
CIM pelo ETEST utilizando o meio ágar Sabouraud dextrose e realizando a
leitura após 72 horas de incubação a 35ºC. A análise de variância feita
pelo teste de T pareado não demonstrou diferenças estatísticas
entre os valores das CIMs obtidos pela técnica de microdiluição em
caldo (MIC entre 0,219 e 0,875 µg/mL) e o ETEST (MIC entre 0,032 e 2,0
µg/mL), porém o coeficiente de correlação (R) foi negativo,
provavelmente pelo pequeno número de amostras. Esses resultados
estimulam mais estudos que confirmem a aplicação do ETEST para avaliar
a suscetibilidade do S. schenckii com o itraconazol.
Palavras-chaves: Esporotricose, microdiluição em caldo, Sporothrix schenckii, suscetibilidade.
The frequent occurrence of resistant
isolated fungi against antifungal drugs stimulated advances in the
antifungigram techniques, which were standardized by CLSI. However, the
methods have been inefficient and impractical to be executed in
clinical laboratories. Within this context, commercial techniques have
been developed, being ETEST one of them. ETEST has proved to be easier
to execute when compared to the techniques approved by the CLSI. This
study used the ETEST and the microdilution method, performed according
to CLSI, for determining the in vitro susceptibility of isolates of Sporothrix schenckii
against itraconazole. The CLSI uses RPMI 1640 medium and the reading of
MIC after the period of incubation of 72h at 35ºC. MIC was determined
by the ETEST, being Sabouraud dextrose agar used as medium, and the
reading performed after 72 hours of incubation at 35ºC. The variance
analysis, analyzed by T-paired test, did not demonstrate statistical
differences among the CIM values obtained by the microdilution
technique in broth (MIC among 0.219 and 0.875 µg/mL) and ETEST (MIC
among 0.032 and 2.0 µg/mL). However, the correlation coefficient (R)
was negative, probably because of the small number of samples. These
results show the necessity of further studies to assess the application
of ETEST to evaluate the susceptibility of S. schenckii against the itraconazol.
KeyWords: Broth microdiluition, sporotrichosis, Sporothrix schenckii, susceptibility.
A esporotricose, micose subcutânea causada pelo fungo dimórfico
Sporothrix schenckii,
acomete o homem e várias espécies de animais. O felino doméstico está
frequentemente envolvido nos relatos zoonóticos da micose, sendo que
estudos demonstram que o homem adquire a micose através de arranhadura,
mordedura ou pela contaminação por solução de continuidade cutânea
preexistente de animais afetados. A transmissão é facilitada pela
grande quantidade de células leveduriformes presentes nas lesões
cutâneas dos felinos com esporotricose (BARROS
et al., 2004).
O tratamento da esporotricose em felinos é realizado, frequentemente,
com itraconazol, sendo este considerado atualmente o fármaco de eleição
para as formas cutâneas e linfocutâneas da micose em humanos. Porém,
devido ao seu uso indiscriminado, têm sido frequentes os relatos de
isolados resistentes ao fármaco, levando consequentemente a falhas
terapêuticas e remissão da micose tanto nos homens como em animais
(ROCHETTE
et al., 2003; SCHUBACH
et al., 2004).
Os crescentes relatos de isolados resistentes aos fármacos antifúngicos
impulsionaram o avanço das técnicas de suscetibilidade antifúngica e,
com base nos documentos descritos pelo Clinical and Laboratory
Standards Institute (CLSI), foi possível padronizar a execução de
testes de antifungigrama. Porém, as técnicas preconizadas pelo CLSI
apresentam como desvantagens a complexidade na execução e a
variabilidade inter e intralaboratoriais nos valores dos CIMs (CORMICAN
& PFALLER, 1996; ESPINELINGROF, 1996).
Nesse contexto, surgiram as provas comerciais com vantagens em relação
à metodologia descrita pelo CLSI, entre elas a de oferecer resultados
mais rápidos e praticidade na sua execução. Em especial o ETEST,
técnica baseada na difusão do agente em ágar, consiste numa fita de
papel com um gradiente de concentração do antifúngico, a qual é
colocada na superfície do meio de cultivo para a obtenção da
concentração inibitória mínima (CIM). Esse método já foi utilizado em
várias espécies de leveduras como
Candida spp. e
Cryptococcus neoformans (COLOMBO
et al., 1995; KOÇ
et al., 2000), porém não há estudos que avaliem a suscetibilidade do
S. schenckii através dessa técnica.
Considerando o itraconazol como um dos fármacos mais intensamente
utilizados na clínica veterinária de pequenos animais, assim como a
importância de detectar a suscetibilidade de isolados de
S. schenckii
com o fármaco de forma mais rápida e com maior facilidade de execução
da técnica de antifungigrama, o estudo tem como objetivo avaliar o
ETEST e a técnica de microdiluição em caldo na determinação da
suscetibilidade do
S. schenckii com o itraconazol.
MATERIAL E MÉTODOS
Utilizaram-se cinco isolados clínicos de
S. schenckii
provenientes de casos clínicos de esporotricose felina e humana, os
quais foram mantidos na sua fase miceliana e leveduriforme através de
subculturas para tubos com meio ágar Sabouraud dextrose, com
cloranfenicol acrescido de cicloheximida, sendo mantidas sob
refrigeração em temperatura média de 4ºC. Estudaram-se os isolados na
fase leveduriforme quanto à suscetibilidade com o itraconazol (Janssen
Pharmaceutical) através da técnica de microdiluição em caldo descrita
no documento CLSI e pelo ETEST.
A técnica de microdiluição em caldo foi executada de acordo com o
documento CLSI, em que, a partir da solução-mãe do itraconazol nas
concentrações de 1.600 µg/mL, foram realizadas nove diluições seriadas
em DMSO alcançando uma concentração final dos antifúngicos de 3 µg/mL.
Diluíram-se essas concentrações a 1% cada em meio RPMI 1640 (GIBCO),
estabelecendo concentrações com intervalos de 16 µg/mL a 0,03 µg/mL, as
quais foram distribuídas em microplacas no sentido das colunas em
volume de 100µL.
Os inóculos fúngicos utilizados para o emprego da técnica de
microdiluição em caldo foram preparados a partir de colônias com até 48
horas de incubação da fase leveduriforme de
S. schenckii,
sendo ressuspendidas em tubos contendo solução salina estéril depois de
homogeneizada em agitador e ajustada a turbidez em 0,5 da escala de
MacFarland. Essa suspensão fúngica foi diluída em solução salina
(diluição 1:50) homogeneizada em agitador e submetida à diluição em
meio RPMI 1640 (diluição 1:20). Esse inóculo foi então distribuído no
sentido das linhas das microplacas.
O teste de microdiluição em caldo foi realizado em duplicata, sendo uma
coluna da microplaca para o controle positivo, preenchida com meio
RPMI1640 e inoculo fúngico, e outra coluna referente ao controle
negativo, contendo o meio RPMI1640. Realizou-se a interpretação dos
resultados pela visualização da turvação, referente à multiplicação do
microrganismo comparada a controles positivos e negativos, sendo a
menor concentração capaz de produzir proeminente inibição do
crescimento da levedura em relação ao poço controle positivo
identificada como a concentração inibitória mínima (CIM) do fármaco
para o
S. schenckii.
Executou-se a técnica do ETEST (AB BIODISK, Salna, Sweden) de acordo
com as normas do fabricante da fita. Uma amostra da colônia
leveduriforme de
S. schenckii de
48 horas de incubação foi ressuspendida em 5mL de solução fisiológica
estéril, com a posterior homogeneização em Vortex e ajustada na
turbidez a 0,5 da escala de McFarland. Com o auxílio de um swab
estéril, o inoculo foi semeado na superfície de placas de Petri
contendo ágar Sabouraud dextrose, acrescido de cloranfenicol
(DifcoLaboratórios, Detroit, Mich.), com a aplicação da fita do ETEST
após quinze minutos. Incubou-se a placa a 35ºC por 72 horas, período
suficiente para delimitar o halo de crescimento. A CIM foi obtida a
partir do valor da escala onde a elipse de inibição intercepta a fita.
Os valores dos CIMs, obtidos a partir da execução dos testes de
suscetibilidade antifúngica (ETEST e microdiluição em caldo), foram
analisados estatisticamente através da análise de variância pelo teste
T pareado e pelo cálculo do coeficiente de correlação (R).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os valores da CIM para o itraconazol utilizando o ETEST variaram de
0,032 a 2.0 µg/mL e pela técnica de microdiluição em caldo de 0,219 a
0,875 µg/mL (
Tabela 1).
As médias de variância não demonstraram diferenças estatisticamente
significativas entre os valores das CIMs conforme as técnicas de
suscetibilidade empregadas (p=0,78), porém foi observado um coeficiente
de correlação (R) negativo entre os testes, provavelmente devido ao
pequeno número de amostras estudadas. Outras análises que utilizaram o
ETEST para avaliar a suscetibilidade de leveduras como
Candida spp. e
Cryptococcus neoformans
com os azóis resultaram numa boa correlação entre os resultados de CIM
com o método de microdiluição em caldo (Espinel-Ingrof, 1996). Porém
estudos comparando as técnicas frente a leveduras de interesse médico e
várias espécies de fungos filamentosos mostraram discordância entre os
valores das CIMs do itraconazol obtidos através da técnica de
microdiluição em caldo e o ETEST (SZEKELEY
et al., 1999; CHANG
et al., 2001).
As técnicas comerciais podem ser utilizadas na determinação da
suscetibilidade antifúngica se os valores da CIM dessas provas forem de
acordo com os resultados obtidos a partir das técnicas recomendadas
pelo CLSI. Porém, as provas de suscetibilidade empregadas para os
fungos dimórficos ainda não são confiáveis, sendo que na fase
filamentosa desses agentes se observa dificuldade na padronização do
inóculo, enquanto que, na fase leveduriforme, o tempo de crescimento
pode ser mais lento em comparação às bactérias ou às outras leveduras,
dificultando a execução da técnica (Espinel-Ingroff, 1996).
O estudo adaptou o ETEST para a aplicação da fase leveduriforme de um
fungo dimórfico, utilizando como meio de cultivo o meio ágar Sabouraud
dextrose (
Figura 1). NASCENTE
et al. (2003) observaram que a
Malassezia pachydermatis
não resultava em um bom crescimento no meio RPMI 1640, optando pelo
meio ágar Sabouraud dextrose para a execução dos testes de
suscetibilidade do agente. Existe um desacordo sobre a eleição do meio
mais apropriado para a execução dos testes de antifungigrama devido às
diferenças metabólicas entre fungos filamentosos e leveduriformes,
sendo que já foi demonstrado que as leveduras não crescem bem no meio
preconizado pelo CLSI, o meio RPMI 1640, assim como determinados fungos
filamentosos (REX
et al., 2001).
CONCLUSÃO
O estudo ressalta a necessidade de padronização de testes de
suscetibilidade para fungos dimórficos, considerando a importância
crescente dessa classe de microrganismos na medicina animal. Ainda
considera as vantagens do uso de provas comerciais como o Etest para
determinar a sensibilidade do
S. schenckii.
Os resultados obtidos geram a necessidade de maiores estudos que
consigam determinar as reais vantagens do uso do ETEST como teste
rotineiro e recomendado para a avaliação da suscetibilidade do
S. schenckii com o itraconazol.
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