DOI: 10.5216/cab.v11i1.4051
PERFIL SANITÁRIO DOS REBANHOS CAPRINOS E OVINOS NO SERTÃO DE PERNAMBUCO


Sylvana Pontual Alencar,1 Rinaldo Aparecido Mota,2 Maria Cristina Oliveira Cardoso Coelho,2
Sergio Alves Nascimento,3 Silvio Romero de Oliveira Abreu4 e Roberto Soares Castro2

1. Médica veterinária do Departamento de Medicina Veterinária-UFRPE. E-mail: spalencar@bol.com.br
2. Docente do Departamento de Medicina Veterinária, UFRPE
3. Biólogo do Departamento de Medicina Veterinária, UFRPE
4. Docente da Faculdade de Medicina Veterinária, CESMAC/AL.




RESUMO

Objetivou-se descrever o perfil sanitário da caprinovinocultura do sertão de Pernambuco, sendo visitadas 150 propriedades e descritas as características das instalações, as práticas sanitárias e os achados clínicos mais frequentes. Os resultados mostraram que predominam as instalações com piso de terra batida (74,8%) e descobertas (61,7%) e reservatórios de água abertos (83%). Em apenas 3,4% das propriedades a água era tratada. O registro das ocorrências era realizado por apenas 26% dos produtores e 47,6% tratavam o umbigo dos recém-nascidos com iodo. No que diz respeito às carcaças, 31,8% dos proprietários davam destino adequado a elas. A higiene diária das instalações era realizada em apenas 14% das propriedades e a desinfecção em 16,9%. A vermifugação foi a prática mais difundida (88,2%) e apenas 6,2% dos produtores dispunham de assistência técnica contínua. Os principais achados clínicos foram sugestivos de doenças infecciosas e parasitárias. Conclui-se que a caprinovinocultura do Sertão de Pernambuco é desenvolvida em instalações modestas, o manejo sanitário é deficiente e as tecnologias disponíveis são pouco utilizadas, impossibilitando a prevenção e controle de doenças, principalmente as de origem infecciosa e parasitária.

PALAVRAS-CHAVES: Brasil, epidemiologia, manejo sanitário, sanidade animal, semiárido.


ABSTRACT

SANITARY PROFILE OF THE GOAT AND SHEEP BREEDING OF THE HINTERLAND OF PERNAMBUCO

The objective of this study was to describe the sanitary profile of the caprine-ovineculture from the Hinterland of Pernambuco State. In total 150 properties were visited and the characteristics of the installations, the sanitary practices and the most frequent clinical findings were described. The results show that the installations with beaten soil (74.8%) and uncovered soil predominated (61.7%); the water reservoirs were open (83%) and in only 3.4% of the properties the water was treated; the register of the occurrences of the flocks was carried out by only 26% of the producers, and 47.6% treated the new-born navels with iodine; only 31.8% of the producers gave adequate destination to the dead animals carcass; the daily cleaning of the installations was done in only 14% of the properties and the disinfection in 16%; the vermifugation was the most known practice (88.2%) and only 6.1% of all breeders used continuous technical assistance. The main clinical findings suggested infectious and parasitic illnesses. In conclusion, the caprine-ovineculture from the Hinterland of Pernambuco State is developed in simple installations, the sanitary management is deficient and the available technologies are scarcely used, inhibiting the prevention and control of illnesses, mainly the ones of infectious and parasitic origin.

KEY WORDS: Brazil, epidemiology, sanitary management, animal health, semiarid region.


INTRODUÇÃO

A caprinovinocultura se reveste de especial importância social e econômica para os ecossistemas do semiárido brasileiro, dadas as poucas alternativas econômicas para a região (LIMA & BAIARDI, 2007). Porém as altas taxas de morbidade e mortalidade presentes em propriedades no Nordeste ocasionam sérios prejuízos econômicos aos produtores, chegando a inviabilizar a atividade pecuária (PINHEIRO et al., 2000; GOUVEIA, 2003; MEDEIROS et al., 2005; NÓBREGA JÚNIOR et al., 2005).
Baixas taxas de desfrute em virtude de falhas no manejo, principalmente sanitário, são relatadas há décadas em vários Estados, como Pernambuco (LIMA, 1979; SOUZA NETO, 1987), e vêm se mantendo com um dos grandes entraves que limitam o desenvolvimento da caprinovinocultura, ainda que haja o crescimento da demanda por produtos de origem caprina e ovina.
Segundo GOUVEIA (2003), a caprinovinocultura brasileira divide-se em dois segmentos distintos: o tradicional, de grande importância social, e o tecnificado, de importância econômica, mais moderno e produtivo, mostrando-se como uma possibilidade de agronegócio para produção de carne, leite e pele. Embora devam ser abordados de forma diferenciada, os dois segmentos apresentam características comuns, tais como a falta de conhecimento sobre manejo sanitário e nutricional.
Em estudo realizado por PINHEIRO et al. (2000) no Ceará, chegou-se à conclusão de que o manejo sanitário dos caprinos é precário. Independente do tipo de exploração ou regime de criação, a mortalidade de animais, principalmente de jovens, é considerada alta e mesmo nos criatórios com exploração leiteira não existe uma preocupação rigorosa com higiene e qualidade do leite, confirmando o quanto são amplas as perdas ocasionadas por problemas sanitários.
Nesse contexto, o primeiro passo na busca de soluções é descrever o perfil sanitário dos rebanhos, buscando o entendimento dos fatores que influenciam a baixa produtividade, construindo um referencial que possa auxiliar na elaboração de estratégias capazes de mudar a realidade atual da caprinovinocultura em Pernambuco. Portanto, o objetivo deste estudo foi descrever o perfil sanitário da caprinovinocultura do Sertão de Pernambuco.

MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo foi viabilizado pelo projeto interinstitucional denominado Diagnóstico da Sanidade Caprina e Ovina de Pernambuco, coordenado pelo Departamento de Medicina Veterinária (DMV) da Universidade Federal Rural de Pernambuco em parceria com o Sebrae/PE, Secretaria de Produção Rural e Reforma Agrária de Pernambuco, Federação da Agricultura de Pernambuco (FAEPE), prefeituras municipais, associações e cooperativas de caprinovinocultores.
O Estado de Pernambuco localiza-se na região Nordeste do Brasil, possui área de 98.311,616 km2 e população estimada de 8.413.593 habitantes (IBGE, 2005). Divide-se geograficamente em três sub-regiões: Litoral/Mata, Agreste e Sertão. Esta última está subdividida em duas mesorregiões (Sertão Pernambucano e São Francisco Pernambucano), localizadas no semiárido e correspondendo a dois terços do território estadual, onde se encontra a maior parte dos municípios do semiárido pernambucano, cuja densidade demográfica é baixa.
A mesorregião Sertão Pernambucano foi representada neste estudo pelos municípios de Custódia e Sertânia, na microrregião do Moxotó, e municípios de Araripina e Granito, na microrregião de Araripina. A mesorregião do São Francisco Pernambucano foi representada pelas microrregiões Petrolina e Itaparica, com a participação dos municípios de Petrolina e Floresta, respectivamente. Esses municípios somam 428.466 cabeças de caprinos e 160.382 cabeças de ovinos, que correspondem a 32,27% e 19,33%, respectivamente, dos rebanhos do Estado.
A região estudada caracteriza-se por apresentar clima tropical semiárido, solos com pouca capacidade de retenção de água, pobres em matéria orgânica e vegetação tipo Caatinga.  
Para determinar o tamanho da amostra (número de propriedades), utilizou-se a fórmula recomendada por THRUSFIELD (2004),

em que:
p = q = são os parâmetros da proporção para obter “n”máximo (50%);
z = nível de significância (95%);
d = erro amostral (± 8,0% de p, correspondendo ao intervalo de 46% a 54%);
n = tamanho da amostra.

O tamanho total da amostra calculada foi de 147 unidades produtivas, sendo trabalhadas 25 propriedades por município, totalizando 150 propriedades. 
A inexistência de uma listagem representativa dos criadores de caprinos e ovinos nos municípios tornou impossível a amostragem aleatória. Assim, utilizou-se a amostragem probabilística por conveniência para selecionar os produtores. Em cada município, as propriedades foram distribuídas equitativamente em cada um dos quatro pontos cardinais (norte, sul, leste e oeste) e região central.
Durante as visitas, aplicaram-se questionários abordando informações sobre o proprietário, a propriedade, o rebanho e os manejos nutricional, sanitário e reprodutivo. O estudo compreendeu a criação de um banco de dados, para realização de análise tabular associada ao estudo descritivo, agrupando-se todas as propriedades visitadas e formando um único conjunto denominado Sertão de Pernambuco. Com isso pôde-se elaborar o perfil sanitário dos rebanhos, com auxílio do programa Excell.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As características das instalações e as fontes de água encontradas nas propriedades visitadas estão descritas na Tabela 1.
Predominaram, nas propriedades, instalações rústicas com piso de terra batida (74,8%) e descobertas (61,7%). Trata-se de dados que se aproximam daqueles relatados por BANDEIRA (2005), em investigação da caprinocultura no Sertão do Cariri na Paraíba, tendo encontrado piso de terra batida em 55% das propriedades. No entanto, estão distantes dos 36% relatados por LUCENA et al., (2006), em estudo detalhado da tipologia dos apriscos para caprinos no Cariri paraibano. Esses autores consideram que instalações adequadas otimizam a relação homem–animal–ambiente, facilitando e reduzindo a mão de obra e favorecendo o manejo e controle de doenças.
No sertão de Pernambuco, há basicamente dois tipos distintos de instalações que abrigam caprinos e ovinos: chiqueiro e aprisco. Chiqueiro é a denominação dada à instalação rústica cuja finalidade é reunir os animais durante a noite. Essa instalação não possui divisões internas e pode ou não conter cochos. Seu piso é geralmente de terra batida, podendo ser parcialmente cimentado e coberto. O bode ou carneiro reprodutor é identificado como “pai de chiqueiro”. Aprisco é a instalação mais elaborada, que se destina geralmente à criação intensiva e possui divisões internas, comedouros, bebedouros, saleiros, piso ripado ou cimentado e cobertura.
O chiqueiro com piso de terra batida e parcialmente coberto, quando bem planejado com base em recomendações técnicas considerando local de construção, orientação, tamanho, divisões, comedouros, bebedouros e saleiros, utilizando arame liso, higienizado e desinfetado regularmente, pareceu atender às necessidades das criações na maioria das propriedades visitadas.
O quarentenário, a área de isolamento e a esterqueira, além de terem sido encontrados em poucas propriedades, não apresentavam condições satisfatórias em termos de qualidade.  Trata-se de realidade que não diverge significativamente das realidades relatadas por PINHEIRO et al. (2000) no Ceará, PINHEIRO et al. (2003) e FARIA et al. (2004) em Minas Gerais. Todos esses estudos tiveram em comum o fato de terem sido realizados no semiárido, cujas características socioeconômicas se assemelham, independentemente do Estado (SUDENE, 2009). As áreas de isolamento e quarentenário podem ser consideradas um dos principais meios para se evitar a introdução e disseminação de doenças nos rebanhos (PINHEIRO et al., 2000). O uso de esterqueiras não apenas contribuiu na prevenção e controle de doenças, mas também participa na preservação do meio ambiente (FARIA et al., 2004).
Os poços e/ou açudes (83%) foram o principal meio utilizado para captar e reservar a água utilizada na produção de caprinos e ovinos. Esses reservatórios são abertos e em apenas 3,4% deles a água sofre algum processo de tratamento. O Sertão de Pernambuco, assim como todo semiárido, é caracterizado pelos baixos índices pluviométricos, com concentração das chuvas em períodos curtos e solos que dificultam a captação de água. Por isso, há necessidade da aplicação de tecnologias que viabilizem o armazenamento da água obtida durante o período chuvoso, para suprir a demanda da produção animal durante a maior parte do ano. FARIA et al. (2004), em estudo da ovinocaprinocultura desenvolvida no semiárido mineiro, observaram que as fontes de águas de superfície (rios, córregos, açudes, nascente e minas) eram mais utilizadas no Norte do Estado, enquanto os poços rasos e artesianos mais comuns no Nordeste.
AMARAL et al. (2004), ao investigarem a qualidade da água em propriedades leiteiras, concluí­ram que a água utilizada em propriedades pode ser veículo de microrganismos patogênicos, fazendo-se necessária sua desinfecção e controle com o objetivo de minimizar os riscos à saúde humana e animal. A desinfecção da água de bebida deve ser feita com substâncias atóxicas, de amplo espectro de ação, com boa atividade na presença de matéria orgânica e ação residual. Dentre as substâncias utilizadas, o mais comum é o cloro, e o intervalo entre as desinfecções não deve ser superior a seis meses (VITAGLIANO, 2002).
Com base nos resultados e nas afirmações dos autores citados, observa-se que não apenas a quantidade, mas também a qualidade da água repercute na produção animal e que no caso das propriedades do Sertão de Pernambuco pouco tem sido feito no sentido de melhorar a oferta e qualidade da água utilizada.
A Tabela 2 apresenta informações sobre o manejo sanitário aplicado nos criatórios amostrados no estudo.
Dos produtores que identificavam seus animais (66%), 47,4% realizavam essa prática mediante cortes nas orelhas das crias, conforme descrito por MEDEIROS et al. (1994). Uma vez que esse tipo de identificação não permite a individualização dos animais, inviabiliza-se o registro de ocorrências específicas como ganho de peso, parto ou cobertura, diferentemente de outros métodos, como uso de brincos, tatuagens e coleiras numeradas, que facilitam o manejo e o acompanhamento personalizado do desempenho animal, presentes em propriedades mais organizadas. Os resultados relatados por FARIA et al. (2004), referentes à ovinocaprinocultura do Norte e Nordeste de Minas Gerais, são ainda menos favoráveis, uma vez que abaixo de 20% dos produtores identificam seus animais.
O registro das ocorrências dos rebanhos, que neste estudo é realizado por apenas 26% dos produtores, é uma prática básica no gerenciamento de qualquer criação, repercutindo diretamente no nível tecnológico de uma propriedade. A prática de registrar os dados de uma criação, embora pareça simples, depende de um indivíduo capacitado e bem informado, que não só proceda ao registro, mas que os converta em informações que subsidiem o planejamento administrativo do rebanho (QUIRINO et al., 2004).
HOLANDA JÚNIOR & CAMPOS (2003) chamam a atenção para a ineficiência do gerenciamento que não planeja e não contabiliza suas receitas e custos. FARIA et al. (2004), por sua vez, comentam a necessidade de atualização dos produtores que gerem seus próprios negócios.
A separação dos animais de um rebanho em lotes de acordo com a idade e sexo, observado neste estudo em apenas 20,8% dos rebanhos, além de facilitar o manejo, também previne ocorrências indesejáveis como coberturas e disseminação de doenças.
O tratamento do umbigo dos recém-nascidos com iodo, realizado por 47,6% dos produtores, juntamente com a administração do colostro, são reconhecidos como práticas para a manutenção da saúde dos animais jovens. Entretanto, a substituição do iodo por substâncias não antissépticas, como é o caso dos repelentes, que eram utilizados por 24,5% dos criadores, não produz resultados satisfatórios, devendo, por isso, ser combatida. PINHEIRO et al. (2000) verificaram, no Ceará, que apenas 37% dos produtores realizam o tratamento do umbigo, seja com iodo ou repelente. NOGUEIRA et al. (2007) observaram que, na região de Araçatuba, 76% dos criadores de ovinos efetuavam o tratamento do umbigo e FARIA et al. (2004) encontraram resultados mais significativos, em Minas Gerais, em que mais de 90% dos caprinovinocultores tratavam o umbigo das crias.
O destino adequado dado à carcaça dos animais mortos (31,8%) reflete o nível de conscientização dos produtores com relação à necessidade de se manter o ambiente livre de agentes infecciosos. Entretanto, as práticas de queimar e enterrar as carcaças devem seguir recomendações técnicas para que se possa alcançar o objetivo desejado. Os resultados obtidos por FARIA et al. (2004) referem-se a percentuais médios próximos a 10% dos produtores mineiros que enterram ou queimam e enterram as carcaças dos caprinos e ovinos. Os mesmos autores orientam sobre a incineração completa e o enterro profundo associado à utilização de cal virgem sobre as carcaças. Outra alternativa é a construção de fossas sépticas onde são depositados os cadáveres, porém deve-se ter cuidado especial com a contaminação de lençóis freáticos (VITAGLIANO, 2002).
A limpeza diária das instalações citada por apenas 14% dos produtores entrevistados consistia, na maioria das vezes, em remoção seca de detritos acumulados nas instalações por meio de varredura. A prática da limpeza úmida, utilizando água fria sem pressão e detergentes, era realizada raramente. Essa prática sanitária fácil e pouco dispendiosa encontra sua principal dificuldade nos hábitos culturais dos criadores e deve ser seguida pela desinfecção.
A desinfecção das instalações, observada em 16,9% das propriedades, objetiva eliminar os agentes infecciosos resistentes ao processo de limpeza. O tipo de piso presente nas instalações pode ou não facilitar a limpeza e desinfecção ambiental, sendo que o piso de chão batido é o que apresenta menos viabilidade na aplicação dessas técnicas. Nas propriedades cujas instalações eram construídas com piso de chão batido realizava-se a limpeza apenas com a varredura e utilizava-se a cal virgem com o propósito de diminuir a umidade do solo e reduzir a contaminação ambiental. Entretanto, VITAGLIANO (2002) indica, para a prática de desinfecção com substâncias à base de amônia quaternária, clorados e fenóis, entre outros. Essas duas práticas são complementares e indispensáveis para a manutenção da saúde do rebanho.
Dentre as práticas de manejo sanitário, a vermifugação dos animais foi a mais difundida, sendo verificada em mais de 88,2% dos criadores entrevistados. Dos animais adquiridos, a vermifugação era realizada por 51,7% dos criadores antes de sua introdução ao rebanho. Esse resultado está próximo ao encontrado por PINHEIRO et al. (2000) no Ceará, onde 95% dos caprinocultores vermifugam seus animais, mas aquém do relatado de SOUZA NETO (1987), em que 96% de caprinocultores de leite de Pernambuco realizavam essa prática. Na região de Araçatuba, NOGUEIRA et al. (2007) relataram a adoção dessa prática por 100% dos ovinocultores e, no sudoeste paulista, 77% dos caprinocultores vermifugam seus rebanhos (RODRIGUES et al., 2005). Porém, AMARANTE (2005) afirma que o controle parasitário estará fadado ao fracasso se for baseado apenas no uso de drogas anti-hemínticas e, assim, recomenda que o uso dessas drogas seja acompanhado por medidas indicadas para preservar sua atividade e eficácia. Com isso, evita-se o surgimento de resistência e, simultaneamente, implantam-se alternativas para o controle das infecções com base na epidemiologia dos parasitas, na seleção de animais resistentes e na redução da contaminação ambiental.
A prevenção de doenças através da prática de vacinar o rebanho era realizada por 69,2% dos criadores. As vacinas mais utilizadas foram a antirrábica (45,5%) e contra febre aftosa (16,8%), salientando-se que esta última não é recomendada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Há semelhanças entre estes relatos e os de BANDEIRA (2005) na Paraíba. Os achados de PINHEIRO et al. (2000), no Ceará, e RODRIGUES et al. (2005), no sudoeste paulista, mostram frequências menores. Um dado importante apresentado por BANDEIRA (2005) é o considerável percentual de utilização da vacina contra clostridioses (95,3%) entre os criadores que vacinavam os caprinos na Paraíba.
A raiva é considerada uma das mais importantes zoonoses para saúde pública e sua evolução letal acarreta enormes custos sociais e econômicos, razão por que seu controle é respaldado por ações de prevenção, vigilância e controle. Assim, o Programa Nacional de Controle da Raiva dos Herbívoros (PNCRH) recomenda que, nas áreas de ocorrência, a vacinação antirrábica para bovídeos e equídeos seja sistemática e anual, deixando a critério dos médicos-veterinários a indicação da vacinação nas outras espécies (MAPA, 2002). O Nordeste foi a região brasileira onde mais se registraram casos de raiva humana entre os anos de 1986 e 2006 e em Pernambuco foram registrados numerosos casos de raiva em morcegos hematófagos, raposas e bovinos nos anos de 2004 e 2005 (MONTEBELLO, 2009), o que explica a elevada frequência da vacinação antirrábica pelos produtores de caprinos e ovinos.
As infecções e toxinfecções causadas por bactérias anaeróbicas do gênero Clostridium têm evolução de caráter agudo e tratamento difícil. São responsáveis por consideráveis perdas nos diferentes sistemas de produção de caprinos e ovinos e, como praticamente são impossíveis de serem erradicadas, devem ser prevenidas. No Brasil não há dados oficiais da ocorrência desses agentes, porém há vários relatos de surtos de clostridioses em rebanhos caprinos e ovinos, inclusive no Nordeste (LIMA et al., 2006; LOBATO et al., 2008b; LOBATO et al., 2008c), havendo em alguns casos alertas das autoridades e explícitas indicações para o uso da vacina, sendo esta a principal estratégia preventiva (ADEAL, 2009). A preocupação com os prejuízos decorrentes das clostridioses se reflete na produção brasileira anual de cerca de 140 milhões de doses de vacinas clostridiais, comprovando a grande utilização desses imonógenos (LOBATO et al., 2004; LOBATO et al., 2007; LOBATO et al., 2008a).
Segundo o Programa Nacional de Erradicação e Prevenção da Febre Aftosa (PNEFA), as estratégias de vacinação contra febre aftosa são definidas considerando-se a situação epidemiológica da região.  Em regiões onde se faz necessária a vacinação, ela deve ser sistemática e obrigatória em bovinos e bubalinos de todas as idades, entretanto, é proibida nas demais espécies susceptíveis, como caprinos, ovinos e suínos, salvo em situações especiais com aprovação do Ministério da Agricultura (MAPA, 2007). Passa a ser uma preocupação a manutenção da prática de vacinação contra febre aftosa entre os pequenos ruminantes, contrariando a determinação oficial.
Dos criadores que tinham acesso à assistência médico-veterinária, apenas 6,1% dispunham desse recurso continuamente e 38,1% recebiam assistência esporádica. Por essa razão, é possível dizer que 93,8% dos caprinovinocultores do Sertão de Pernambuco não tinham acesso à assistência técnica realizada por médico veterinário. Assinale-se que se trata de fato que já vem sendo abordado há pelo menos vinte anos por SOUZA NETO (1987), que em estudo sobre a caprinocultura leiteria de Pernambuco concluiu pela necessidade real de assistência técnica para os pequenos produtores.
Em alguns Estados brasileiros a caprinocultura familiar tem tido mais acesso à assistência técnica. É o que relatam RODRIGUES et al. (2005), em estudo sobre a caprinocultura familiar no Sudoeste Paulista, observando que 29% dos criadores contam com orientação médico-veterinária. Achados interessantes foram descritos por CAMPOS (2003), após investigar os caprinovinocultores do Ceará, onde aproximadamente 54% recebiam assistência técnica. Em Goiás, DIAS et al. (2004) encontraram resultados ainda mais satisfatórios. Segundo esses autores, 60% dos médios e grandes ovinocultores contam com assistência técnica, fazem escrituração do rebanho e utilizam programas de gerenciamento dos rebanhos. Porém, é a caprinocultura da Paraíba que apresenta o registro mais promissor, com acesso de 93,3% dos produtores à assistência técnica, sendo que 76,8% dessa ocorria semanal ou quinzenalmente (BANDEIRA, 2005).
A observação de abscessos cutâneos que sugerem a presença de linfadenite caseosa, doença infectocontagiosa citada por SOUZA NETO (1987) como a mais comum nos rebanhos caprinos em Pernambuco, mostra que não houve progresso na mudança dessa realidade, nem mesmo com pesquisas que resultaram na produção de vacinas ou o conhecimento dos fatores de risco responsáveis pela introdução e disseminação da doença nos rebanhos, que poderia contribuir no controle ou prevenção.
A polêmica existente entre os autores sobre o descarte dos animais infectados e o tratamento com drenagem cirúrgica dos abscessos cutâneos de animais em bom estado geral de saúde deve ser resolvida, levando em consideração a prevalência da doença no rebanho e região. Além disso, deve ser tratada a possibilidade de implantação de medidas de biosseguridade que garantam a diminuição progressiva da ocorrência no rebanho até seu controle e erradicação.
Diarreia, anemia e edema submandibular são sinais e sintomas frequentes de endoparasitoses que acometem caprinos e ovinos. Os danos à saúde atribuídos principalmente aos helmintos e coccídeos são reconhecidos por muitos autores como uma das principais causas da baixa produtividade dos rebanhos. Apesar das informações sobre controle e tecnologias disponíveis para combate aos endoparasitas, os produtores continuam sofrendo os prejuízos que ocorriam há décadas.
As ectoparasitoses foram citadas frequentemente pelos criadores entrevistados, sendo as miíases a principal delas (85,7%), seguida pela ocorrência de piolho (60,5%) e inflamação cutânea/coceira sugestivas de sarna (42,5%). A prevenção e controle dessas doenças dependem da execução de várias medidas de manejo sanitário, com atenção para o tratamento do umbigo de recém-nascidos, higienização e desinfecção das instalações e isolamento dos animais infectados até plena recuperação.
Os abortos (82,3%), as secreções vaginais e a demora na eliminação da placenta acompanhada de odor fétido citados pelos proprietários podem ter etiologia variada, porém, segundo PEREIRA (2006), os abortos encontrados nas regiões do agreste e zona da mata de Pernambuco têm como causas frequentes as infecções por Chlamydophila sp. e Toxoplasma gondii.
A ocorrência de alterações oculares como lacrimejamento, fotofobia e/ou opacidade de córnea, sugestivos de ceratoconjuntivite (77,6%); alterações da glândula mamária e/ou do leite, sugestivas de mastite (76,7%); crostas ao redor da boca e/ou narinas, sugestivas de ectima contagioso (66,0%); catarro nasal (63,3%) e tosse (59,2%), sugestivos de problemas respiratórios; alterações no casco acompanhada de claudicação, sugestivas de pododermatite (49,2%); e alterações no umbigo (37,4%), sugestivas de onfalite, apontaram para falhas no manejo sanitário como causas predisponentes para enfermidades infecciosas e parasitárias (Tabela 3).
Estudos sobre os aspectos sanitários dos rebanhos caprinos e ovinos foram realizados nesta década nos Estados do Ceará (PINHEIRO et al., 2000), Paraíba (BANDEIRA, 2005; MEDEIROS et al., 2005; NÓBREGA JÚNIOR et al., 2005), Minas Gerais (GOUVEIA, 2003), Rio Grande do Norte (PEDROSA et al., 2003) e São Paulo (RODRIGUES et al., 2005; NOGUEIRA et al., 2007). Essas pesquisas indicaram as doenças e alterações clínicas mais frequentes, possibilitando a confrontação de dados publicados em diferentes épocas, para esclarecer a evolução do processo produtivo e mostrar que de modo geral os produtores não têm tido acesso aos resultados das pesquisas e às informações técnicas.
São necessários estudos sobre caracterização zoossanitária nos rebanhos brasileiros, estudos epidemiológicos que determinem a incidência e prevalência das principais enfermidades, desenvolvimento e uso de métodos moleculares para identificação e tipagem dos patógenos, técnicas para diagnóstico diferencial e quantificação dos prejuízos oriundos dos problemas sanitários (PINHEIRO et al., 2003).

CONCLUSÕES

Conclui-se que os caprinovinocultores do Sertão de Pernambuco, em sua maioria, possuem instalações com piso de terra batida e descobertas para abrigar seus animais e que seu manejo sanitário é deficiente, em virtude do baixo nível de adoção das tecnologias disponíveis ou seus usos inadequados, dificultando a prevenção e controle de doenças. 
O baixo percentual de acesso à assistência técnica, que influencia diretamente a adoção tecnológica, necessita de atenção especial e mostra urgência no desenvolvimento de ações de extensão rural que permitam o desenvolvimento do potencial da caprinovinocultura em Pernambuco.
Dentre as práticas de manejo sanitário mais utilizadas estão a vermifugação e a vacinação do rebanho. As menos realizadas são a limpeza e a desinfecção das instalações. Preocupa o pequeno índice de assistência técnica.
A alta frequência de achados clínicos nos rebanhos investigados demonstra o elevado nível de contaminação por agentes infecciosos e parasitários que interferem na produtividade.


AGRADECIMENTOS

Ao Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae/PE) e à Secretaria de Produção Rural e Reforma Agrária do Pernambuco, pelo apoio à realização deste estudo.

REFERÊNCIAS

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Protocolado em: 12 jun. 2008.  Aceito em: 6 maio 2009.