Procurou-se estabelecer o período
para sexar fetos caprinos pela ultrassonografia transretal
visibilizando-se as estruturas da genitália externa, sendo que para tal
foi monitorado o dia do posicionamento final do tubérculo genital (TG),
bem como o dia em que o pênis, a bolsa escrotal, o clitóris e as tetas
foram visibilizados. Foram monitorados fetos das raças Boer (n = 36),
Parda Alpina (n = 31) e Anglo-nubiana (n = 27), do 40º ao 60º dia de
gestação, usando-se transdutor linear de 6,0 e 8,0 MHz. O
posicionamento final do TG ocorreu no período de 47,11 ± 1,45 dias, nos
machos, e 45,62 ± 1,36 dias, nas fêmeas, e a visibilização das
estruturas da genitália externa no período de 49,42 ± 2,20 dias para a
bolsa escrotal; 49,37 ± 2,19 dias para o pênis; 49,23 ± 1,75 dias para
as tetas e 49,98 ± 2,52 dias para o clitóris. A migração do TG no feto
fêmea foi mais precoce (P < 0,05) do que no macho, enquanto a
visibilização da bolsa escrotal e pênis foi mais precoce (P < 0,05)
do que das tetas e clitóris, não havendo diferença (P > 0,05) entre
as estruturas referentes ao mesmo sexo. Conclui-se que apesar da
sexagem de fetos caprinos poder ser efetuada antes do 55º dia de
gestação, recomenda-se realizá-la somente após a visibilização das
estruturas da genitália externa para uma maior segurança na
identificação do sexo.
PALAVRAS-CHAVES: Bolsa escrotal, clitóris, pênis, sexagem, tetas.
The aim of this study was to
establish the period for sexing caprine fetuses by transrectal
ultrasonography through viewing the structures of the external
genitalia, monitoring of the final positioning of the genital tubercle,
and the day that the penis, scrotum, clitoris and nipples were seen.
Fetuses of Boer (n = 36), Brownscale Alpine (n = 31) and Anglo-nubian
(n = 27), breeds in the 40th-60th day of gestation, were tracked using
linear transducer of 6.0 and 8.0 MHz. The final positioning of the
genital tubercle occurred in the period from 47.11 ± 1.45 days in males
and 45.62 ± 1.36 days in females. The visualization of structures of
the external genitalia was in the period from 49.42 ± 2.20 days for
scrotum; 49.37 ± 2.19 days for penis; 49.23 ± 1.75 days for nipples and
49.98 ± 2.52 days for clitoris. The migration of female genital
tubercle in the fetus occurred earlier (P < 0.05) than in males, and
the visualization of penis and scrotum was earlier (P < 0.05) than
the nipples and clitoris, there was no difference (P > 0.05) among
the structures of the same sex. In conclusion, although the sexing of
caprine fetuses can be done before the 55th day of pregnancy, it is
recommended to perform it only after the visualization of the
structures of the external genitalia for a greater security in the sex
identification.
A caprinocultura no Nordeste do
Brasil ocupa uma posição de destaque, por possuir um rebanho efetivo
estimado em 9.543.000 de animais, representando 92,5% do rebanho
nacional (IBGE, 2005). Nos últimos anos a atividade vem perdendo o
rótulo de subsistência, passando a ser encarada como uma alternativa de
agronegócio. No entanto, apesar dessa situação, particularmente a
exploração para corte ainda contribui muito pouco para colocar, na mesa
do brasileiro, carne e derivados de qualidade com constância na oferta.
Ressalte-se, também, a importância do segmento pele-coureiro para os
mercados interno e externo. Com este foco, possivelmente, justifica-se
a importação de animais, geneticamente provados, bem como de sêmen e
embriões visando acelerar o melhoramento dos rebanhos e atender às
exigências dos mercados (BANDEIRA
et al., 2004).
A profissionalização da caprinocultura, bem como o uso de práticas
adequadas de manejo e a incorporação de novas tecnologias ao processo
produtivo são fundamentais para o aumento do desempenho reprodutivo dos
rebanhos. Nesse contexto, a ultrassonografia tem-se mostrado eficiente
para diagnosticar precocemente a gestação e o sexo fetal, bem como para
avaliar a função reprodutiva (SANTOS
et al., 2004).
Dentre as técnicas de abordagem ultrassonográficas, o exame transretal
é o mais comum nas espécies domésticas, em função de sua praticidade e
da estreita proximidade entre o trato reprodutivo e a parede retal,
propiciando imagens detalhadas das estruturas avaliadas (GRIFFIN &
GINTHER, 1992; GINTHER & KOT, 1994; PADILLA & HOLTZ, 2000).
Contudo, diversos modelos de transdutores têm sido usados pelas vias
transabdominal, transvaginal e transretal (ISHWAR, 1995).
A determinação do dia em que o tubérculo genital (TG) alcança seu
posicionamento final era uma das principais limitações da sexagem fetal
nos pequenos ruminantes domésticos (SANTOS
et al., 2006a). Entretanto, estudos desenvolvidos por SANTOS
et al.
(2005b; 2006b; 2007a,b,c,d,e,f,g; 2008) contribuíram, positivamente,
para que a sexagem de fetos caprinos e ovinos fosse realizada
considerando apenas o posicionamento final do TG. Na espécie caprina
está bem estabelecido que a migração do TG inicia após o 40º dia de
gestação, podendo estender-se até próximo do 55º dia (SANTOS
et al.,
2005a,b; 2006b; 2007b,c,d,f,g; 2008). No entanto, não se tem
conhecimento aprofundado de quando sexar fetos caprinos com base na
visibilização das estruturas da genitália externa e tampouco do tempo
que o TG, após seu posicionamento final, se diferencia em pênis e
clitóris.
A carência de informações mais detalhadas tem limitado a difusão da
sexagem fetal pela ultrassonografia no Brasil, especialmente, na Região
Nordeste. Diante do abordado, objetivou-se estabelecer o período para
sexar fetos caprinos pela ultrassonografia transretal, visibilizando-se
as estruturas da genitália externa, sendo que, para isso,
monitoraram-se o dia do posicionamento final do TG, bem como o dia em
que o pênis, a bolsa escrotal, o clitóris e as tetas foram
visibilizados.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi desenvolvido em duas Estações Experimentais da
Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba S.A. (EMEPA - PB):
a Fazenda Benjamim Maranhão, localizada no Município de Campo de
Santana, altitude de 168 m, precipitação pluviométrica média anual de
580 mm3 e temperatura média anual de 24 ºC, e a Fazenda Pendência,
situada no Município de Soledade, altitude de 521 m, precipitação
pluviométrica média anual de 300 mm³, temperatura média anual de 27 ºC.
As matrizes da raça Boer (n = 23) encontravam-se na Estação Benjamin
Maranhão, onde os exames foram realizados no período de dezembro a
janeiro, correspondendo à época seca. As das raças Parda Alpina (n =
20) e Anglo-nubiana (n = 18) estavam na Fazenda Pendência, onde os
exames foram efetuados entre abril e maio, período correspondente à
época chuvosa.
As matrizes com idade de dois a cinco anos e escore de condição
corporal entre 3 e 4, numa escala de 1 a 5 (GONZALEZ-STAGNARO, 1991),
eram mantidas semintensivamente. Eram soltas pela manhã para pastoreio
na vegetação da caatinga arbustiva, com predominância de marmeleiro (
Cynodia vulgaris), jurema-preta (
Mimosa nigra, Hub.), mororó (
Bauhinia cheilanta, Steud.), jurema-de-embira (
Pithecolobium diversiffolium, Benth.) e pastagem cultivada com capim-buffel (
Cenchrus ciliaris). No final da tarde retornavam naturalmente ao aprisco, para serem suplementadas com silagem de sorgo (
Sorghum bicolor, Moench.) e palma forrageira (
Napolea cochenillifera, Salm-Dick), além de água e sal mineral ad libitum.
Diariamente, examinaram-se 94 fetos, do 40º ao 60º dia de gestação,
sendo 36 da raça Boer, 31 da Parda Alpina e 27 da Anglo-nubiana. O dia
do posicionamento final do tubérculo genital (TG) e os primeiros dias
de visibilização da bolsa escrotal, pênis, tetas e clitóris foram
identificados usando-se transdutor linear de dupla frequência (6,0 e
8,0 MHz).
Os exames foram realizados com as fêmeas contidas em posição de
estação, pela via transretal, usando aparelho ultrassonográfico, modelo
240 Parus (Esaote Pie Medical – Maastricht/Holanda). Esse aparelho era
equipado com um transdutor linear, adaptado a um suporte de PVC, para
facilitar a manipulação no reto do animal (OLIVEIRA
et al., 2004), além de uma impressora, modelo VP/1200 (Sony/Seikosha, Tóquio, Japão).
Avaliou-se como feto macho aquele em que o TG migrava no sentido
caudocranial e posicionava-se caudalmente ao cordão umbilical. E como
fêmea, avaliou-se aquele em que o TG migrava no sentido craniocaudal
para posicionar-se abaixo da cauda. Considerou-se como diferenciação do
TG em pênis e clitóris quando a estrutura bilobular se uniu e se tornou
bastante ecogênica. Para avaliação do início do desenvolvimento da
bolsa escrotal, visualizaram-se três pontos hiperecoicos entre os
membros pélvicos do feto. E para o aparecimento das tetas,
observaram-se dois pontos hiperecoicos entre os membros pélvicos.
No exame, foram observados os planos longitudinal, transversal e
sagital, alterando-se a posição do transdutor de acordo com os
movimentos espontâneos do feto. Para observar o plano longitudinal,
colocou-se o transdutor numa posição em que a cabeça, os membros
dianteiros, o cordão umbilical, os membros posteriores e a cauda fossem
visibilizados numa mesma perspectiva. No plano transversal, observou-se
a inserção do cordão umbilical ao corpo do feto. No sagital, o feto foi
avaliado longitudinalmente, para se visibilizar a área entre os membros
posteriores (MOURA, 1993; ALI, 2004). O plano longitudinal ventral foi
utilizado para visibilizar e diferenciar as estruturas do sexo fetal
(AZEVEDO, 2007).
Avaliaram-se os resultados pela ANOVA e compararam-se as médias pelo teste de Tukey, ao nível de significância de 5%.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O TG alcançou seu posicionamento final entre o 43º e o 51º (46,43 ±
1,79) dia de gestação nos fetos da raça Boer. Nos da raça Parda Alpina,
o TG completou a migração entre o 44º e o 50º (46,60 ± 1,50) dia e nos
da raça Anglo-nubiana entre o 44º e o 48º (45,92 ± 1,35) dia, não
havendo diferença (P > 0,05) entre os valores médios das três raças (
Tabela 1).
Ampla variação no período de migração do TG foi também observada nas
raças Boer (43 a 54 dias), Anglo-nubiana (44 a 49), Saanen (45 a 55
dias), Alpina Americana (41 a 51 dias), Mestiça (45 a 53 dias),
Toggenburg (41 a 51 dias), Moxotó (40 a 50 dias) e Savana (45 a 55
dias) por SANTOS
et al.
(2005a; 2006b; 2007a,b,d,e,g; 2008). Essas variações levaram os autores
a recomendarem sexar fetos da espécie caprina quando for considerada,
apenas, a presença do TG a partir do 55º dia de gestação, para ser
evitado que fetos machos não sejam equivocadamente sexados como fêmeas.
A completa migração do TG, segundo SANTOS
et al.
(2005a; 2006b; 2007a,b,d,e,g; 2008), ocorre nos dias 47,4 ± 2,5 (Boer),
45,2 ± 1,3 (Anglo-nubiana), 48,9 ± 1,8 (Saanen), 46,4 ± 2,1 (Alpina
Americana), 48,9 ± 2,0 (Mestiça), 47,4 ± 2,1 (Toggenburg), 47,2 ± 2,2
(Moxotó) e 48,7 ± 1,7 (Savana), portanto, em períodos similares aos
encontrados neste trabalho.
Por outro lado é possível observar (
Tabela 1)
que o feto macho (47,11 ± 1,45 dias) completa a migração do TG mais
tardiamente (P < 0,05) do que a fêmea (45,62 ± 1,36 dias), resultado
que corrobora os achados de SANTOS
et al.
(2005a,b; 2006b; 2007a,d) e suporta a hipótese de que este fato ocorre
em virtude da maior distância a ser percorrida pelo TG no feto macho em
relação ao feto fêmea. Ainda é possível verificar que a completa
migração do TG no feto fêmea das raças Parda Alpina e Anglo-nubiana é
mais precoce (P < 0,05) do que no da Boer, não havendo diferença (P
> 0,05) entre os fetos machos.
O período médio para visibilização da bolsa escrotal, pênis e clitóris
foi mais tardio (P < 0,05) nos fetos da raça Boer, não havendo
diferença (P > 0,05) entre os fetos das raças Parda Alpina e
Anglo-nubiana (
Tabela 2).
No que concerne à visibilização das tetas, houve diferença (P <
0,05) somente entre os fetos das raças Boer e Anglo-nubiana. O retardo
na visibilização dessas estruturas nos fetos da raça Boer,
possivelmente, possa ser creditado à baixa qualidade nutricional das
forragens, da caatinga e cultivada, na Estação Experimental onde
estavam os animais da raça Boer. Apesar de serem suplementados com
volumoso à base de silagem de sorgo, palma forrageira e suplementação
mineral durante a execução do experimento, possivelmente, as
necessidades de manutenção não foram devidamente atendidas,
desencadeando o atraso no desenvolvimento da genitália externa dos
fetos da raça Boer. Além disso, a época da seca com predominância de
temperatura alta pode ter provocado desconforto aos animais e, em
consequência, redução do consumo de alimentos, fato que também deve ter
contribuído para o desenvolvimento tardio dessas estruturas. De acordo
com RHIND
et al. (2001),
fatores ambientais e nutricionais podem alterar o desenvolvimento do
eixo hipotalâmico-hipofisário, a fisiologia e a estrutura gonadal do
feto, incluindo número de células, sistema enzimático e produção
hormonal. Ainda, segundo esses autores, estes efeitos são
particularmente marcantes durante o rápido desenvolvimento e
diferenciação das gônadas.
A
Tabela 3
contém as médias relativas ao período de tempo de diferenciação do TG
em pênis e clitóris, bem como ao tempo em que foram visibilizadas a
bolsa escrotal e as tetas depois da completa migração do TG. Apesar de
o posicionamento final do TG no feto macho ser mais tardio que no feto
fêmea, a diferenciação em pênis e a visibilização da bolsa escrotal são
mais rápidas do que a diferenciação em clitóris e a visibilização das
tetas.
Nos fetos da raça Boer, a diferenciação do TG em pênis e clitóris,
assim como da visibilização da bolsa escrotal, foi mais tardia (P <
0,05) em relação aos das raças Parda Alpina e Anglo-nubiana. No que se
refere às tetas, não houve diferença (P > 0,05) entre as raças,
sendo possível acreditar que o desenvolvimento das tetas estaria menos
susceptível às condições nutricionais adversas em que se encontravam as
cabras Boer. Em contrapartida, nas cabras Parda Alpina e Anglo-nubiana
foi constatado que o período de tempo entre o final da migração do TG e
a visibilização da bolsa escrotal e pênis foi mais curto (P < 0,05)
em relação à migração do TG e a visibilização das tetas e clitóris.
Neste trabalho e nos de SANTOS
et al.
(2005a; 2006b; 2007a,b,d,e,g; 2008) ficou evidente que a eficiência da
técnica depende fortemente da experiência do operador (VIANA &
MARX, 1994) e é eficaz na identificação precoce do sexo de fetos
caprinos.
CONCLUSÃO
Apesar de a sexagem de fetos caprinos poder ser efetuada antes do 55º
dia de gestação, recomenda-se realizá-la somente após a visibilização
das estruturas da genitália externa, para uma maior segurança na
identificação do sexo.
AGRADECIMENTOS
À Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba (EMEPA), pelo
suporte técnico e por disponibilizar os animais necessários à execução
deste experimento.
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em: 29 maio 2008. Aceito em: 31 mar.
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