UTILIZAÇÃO DO TESTE DE VOGES-PROSKAUER E DA COAGULASE PARA O DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DE Staphylococcus aureus ENVOLVIDOS NA EPIDEMIOLOGIA DA MASTITE BOVINA


Luiz Francisco Zafalon,1 Juliana Rodrigues Pozzi Arcaro,2 Antônio Nader Filho3
e Luciano Menezes Ferreira4

1. Pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, Área de Sanidade Animal. E-mail: zafalon@cppse.embrapa.br
2. Pesquisadora do Instituto de Zootecnia, Área de Qualidade do Leite
3. Professor titular – FCAV/UNESP
4. Médico veterinário, Instituto Aequitas.



RESUMO

Estudaram-se as características diagnósticas do teste de Voges-Proskauer (VP) na identificação de Staphylococcus aureus isolados de leite de quartos mamários de vacas com mastite, óstios dos tetos e insufladores dos conjuntos de ordenha, perante diferentes graus de coagulação apresentados pelas cepas na prova de coagulase lenta com plasma de coelho e com distintos níveis de chuvas ocorridas na região da propriedade à qual os animais pertenciam. Os testes de VP e de coagulase foram realizados após o isolamento das amostras bacterianas em ágar sangue, visualização de lâminas após a realização da coloração de Gram e a verificação da produção de catalase. Todas as cepas isoladas foram confirmadas por meio da amplificação de fragmentos de DNA cromossômico específico de S. aureus. Identificou-se um total de 329 amostras como S. aureus, das quais 167 isoladas a partir do leite, 117 originaram-se de óstios e 45 de insufladores dos conjuntos de ordenha. Dentre as amostras isoladas, 85,0%, 71,1% e 69,2% de S. aureus que se originaram de leite, insufladores e óstios, respectivamente, apresentaram coagulação completa à prova de coagulase. Encontraram-se especificidades reduzidas para o teste de VP, para os diferentes graus de coagulação identificados, tanto no período com menos chuvas como no de maiores níveis pluviométricos. As sensibilidades diagnósticas identificadas para o teste de VP mostraram-se superiores em período com menor quantidade de chuvas para todas as fontes e graus de coagulação, exceto em amostras isoladas em óstios, que apresentaram coagulação incompleta, e em amostras oriundas de insufladores, que apresentaram coagulação completa. Recomenda-se o teste de VP como uma boa ferramenta diagnóstica para a identificação de S. aureus em conjunto com outros testes como o de coagulase, principalmente em amostras de leite oriundas de quartos mamários com mastite e em períodos com menor ocorrência de chuvas.

PALAVRAS-CHAVES: Bacteriologia, diagnóstico, leite, sanidade animal.

ABSTRACT

VOGES-PROSKAUER AND COAGULASE TESTS TO THE LABORATORIAL DIAGNOSTIC OF
Staphylococcus aureus INCLUDED IN THE EPIDEMIOLOGY OF BOVINE MASTITIS

Diagnostic characteristics of acetoin production to the Staphylococcus aureus isolated from milk of mammary quarters of cows with mastitis, orifices of teats and mouthpieces of the liners were studied, in agreement to different coagulation grades presented by strains in the tube coagulase test with rabbit plasma and different rain levels in the environment of the herd. The production of acetoin and the coagulase test were performed after growth on blood agar base supplemented with sheep blood, Gram staining and catalase production. All strains were confirmed by molecular identification at species level by species-specific PCR. Among 329 samples identified, 167 were isolated from milk, 117 from teat orifices and 45 from mouthpieces of the liners. Among these samples, 85.0%, 71.1% and 69.2% strains originated from the milk, mouthpieces and orifices, respectively, presented whole coagulation in the coagulase test. Reduced specificities were obtained to the acetoin production to different coagulation grades on the few rains period as well as on the many rains period. Sensitivities to the acetoin production were higher on the few rains period to all sources and coagulation grades, except to strains from orifices with incomplete coagulation and strains from mouthpieces with complete coagulation. It is recommended the acetoin production test how a good diagnostic strategy to the S. aureus identification, combined with other tests how coagulase, mainly in the milk samples originated from mastitic mammary quarters and on periods with little occurrence of rains.

KEY WORDS: Animal health, bacteriology, diagnosis, milk.


INTRODUÇÃO

Os esforços para o controle da mastite bovina dependem em grande parte do diagnóstico laboratorial dos agentes responsáveis pela doença. Nesse sentido, o laboratorista lança mão de um arsenal de testes que, mesmo assim, podem trazer resultados inconclusivos. Um teste diagnóstico deve ser utilizado para reduzir ao máximo o grau de incerteza da identificação microbiológica. O teste ideal seria aquele no qual a sensibilidade e a especificidade atingissem 100%. Entretanto existe um equilíbrio entre essas duas propriedades ao ponto de, quando uma delas aumenta, a outra diminui (MEDRONHO & PEREZ, 2002).
Dentre as espécies de estafilococos coagulase-positivas, as de maior ocorrência na etiologia infecciosa da mastite bovina são S. intermedius, S. hyicus e S. aureus, esta última a de maior importância, pela elevada prevalência e por causar riscos à saúde pública. Talvez por este fato, existem indicações de que o microrganismo pode ser identificado após os testes de coagulase, com a classificação das cepas coagulase-positivas como S. aureus. Apesar disso, o Conselho Nacional de Mastite dos Estados Unidos recomenda o teste de Voges-Proskauer (VP) como um meio adicional para a diferenciação de S. aureus das outras cepas positivas à prova da coagulase (CUNHA NETO et al., 2002).
A produção da coagulase por S. aureus constitui um importante determinante fenotípico, uma vez que está associada à virulência desses microrganismos. Segundo CUNHA NETO et al. (2002), há estudos para correlacionar a produção de enterotoxinas com a presença de enzimas como a coagulase. Em estudo dos aspectos ambientais referentes à cadeia epidemiológica da mastite bovina, ZAFALON et al. (2008) concluíram que os riscos de infecção por S. aureus aumentaram diante de índices pluviométricos mais elevados e que microrganismos isolados a partir do leite mostraram grau de reação na prova da coagulase classificado como mais forte, quando comparados com os isolados a partir de insufladores e óstios, o que poderia levar a interpretações diferentes no diagnóstico do agente nesses sítios, de acordo com o protocolo adotado.
A reação de Voges Proskauer (VP) ou teste de produção de acetoína testa a formação do acetilmetilcarbinol, também conhecido como acetoína, a partir da glicose. Em presença de oxigênio atmosférico e hidróxido de potássio a 40%, a acetoína é convertida à diacetila e o alfa-naftol atua como catalisador para produzir um complexo de cor vermelha. As cepas de S. aureus apresentam elevada (90%) produção de acetoína, quando comparadas às cepas de S. intermedius  e S. hyicus (KONEMAN et al., 2001).
Dada a possibilidade de resultados atípicos com as provas diagnósticas em função da origem das cepas, objetivou-se estudar as características diagnósticas do teste de VP após a confirmação molecular de isolados do leite de vacas com mastite, dos óstios dos tetos e de insufladores de teteiras durante a ordenha, diante de diferentes graus de coagulação e índices pluviométricos, como forma de colaborar na identificação de S. aureusS. aureus na cadeia epidemiológica da mastite bovina. 

MATERIAL E MÉTODOS

Os animais faziam parte do rebanho de fazenda experimental pertencente ao Centro de Bovinos de Leite do Instituto de Zootecnia de Nova Odessa, Estado de São Paulo, sob ordenha mecânica realizada duas vezes ao dia, em sistema com circuito fechado. Durante a colheita das amostras de leite, a mediana de 52 animais das raças Holandesa e Pardo-Suíça permaneceu em lactação (mínimo de 40 e máximo de 66 animais). Realizaram-se as aferições dos índices pluviométricos mensalmente, de agosto de 2005 até dezembro de 2006 (CIIAGRO, 2006). A estação seca foi assim denominada quando a precipitação média no espaço de tempo (trinta dias) compreendido entre duas colheitas de amostras foi igual a 27,9 mm, e a estação chuvosa aquela em que a média de chuvas foi igual a 113,6 mm.
Fez-se o diagnóstico da mastite subclínica a partir da realização mensal do california mastitis test (CMT) em todas as vacas lactantes do rebanho. Também foram investigados animais com quadro clínico de mastite por meio do teste da caneca telada, durante os dezessete meses de estudo. Animais que estavam nos primeiros dez dias de lactação e nos trinta dias anteriores à secagem não foram investigados. Além da colheita das amostras de leite realizou-se, paralelamente, a colheita de amostras dos óstios papilares e dos insufladores dos conjuntos de ordenha.
Realizaram-se as colheitas das amostras de leite para o isolamento microbiológico de acordo com os procedimentos recomendados pelo National Mastitis Council (HARMON et al., 1990). Após a limpeza do óstio papilar com álcool etílico 70% (v/v), utilizaram-se tubos de ensaio esterilizados para amostras individuais de 2 a 5 mL de leite, em duplicatas, de cada quarto mamário positivo ao CMT, antes do início da ordenha. Essas amostras foram acondicionadas em recipientes com gelo e levadas ao laboratório para isolamento e identificação bacterianos. Classificaram-se como resultados positivos ao teste de CMT quaisquer graus de viscosidade observados após a mistura de leite com a solução, em raquete de leitura utilizada para o exame.
Imediatamente após a antissepsia anterior à ordenha, feita com solução à base de cloro, colheram-se amostras oriundas dos óstios papilares de animais positivos ao CMT, independentemente de todos os quartos mamários terem sido reagentes ao teste, com o auxílio de suabe estéril e a realização de movimentos circulares sobre os óstios (INGAWA et al., 1992). Suabes estéreis também foram friccionados em movimentos circulares na porção final de cada um dos insufladores (quatro por cada conjunto de ordenha), em todos os conjuntos da ordenhadeira durante e após as ordenhas, conforme recomendação de McDONALD et al. (1993). O material foi transportado em tubos de ensaio individuais contendo água peptonada estéril.
Isolaram-se 167 cepas de S. aureus a partir das amostras de leite dos quartos mamários, após a semeadura direta em placas de Petri com ágar sangue de ovino a 5% por meio do auxílio de alça de platina padronizada (0,01mL). Obtiveram-se 117 isolados originados a partir dos óstios papilares e 45 dos insufladores dos conjuntos de ordenha após a semeadura direta com os suabes utilizados na colheita das amostras. Todas as amostras permaneceram incubadas por 18 a 24 horas, a 37˚C. As colônias foram submetidas à coloração de Gram, com posterior realização das provas de catalase e coagulase lenta com plasma de coelho para os cocos Gram-positivos, seguidas pela verificação da produção de acetoína (HOLMBERG, 1973; HOLT et al., 1994).
As leituras da prova da coagulase foram rea­lizadas uma, duas, três, quatro e 24 horas após a incubação à temperatura de 37˚C em banho-maria. Os resultados classificados como coagulase “4” foram aqueles em que houve coagulação completa nos tubos, e os demais graus variaram desde coágulos pequenos e desorganizados até coágulos grandes organizados, mas sem coagulação completa (GARCIA et al., 1980).
Realizaram-se as leituras dos testes para a verificação da produção de acetoína após a semea­dura de um tubo com caldo VM/VP com um cultivo puro de S. aureus. Os tubos foram incubados por 24 horas a 35˚C. Adicionou-se primeiramente 0,6 mL de alfa-naftol a 5% e, a seguir, 0,2 mL de KOH a 40 %. Procedeu-se a uma agitação suave dos tubos para a exposição do meio ao oxigênio atmosférico, deixando-se em repouso por quinze minutos, sendo logo a seguir efetuada a leitura, que foi repetida após 45 minutos. Resultados positivos foram indicados pelo desenvolvimento de cor vermelha quinze e sessenta minutos após a agitação (KONEMAN et al., 2001).
Após a extração do DNA bacteriano, procedeu-se à confirmação molecular dos isolados de S. aureus para a identificação da espécie, a partir da amplificação de fragmentos de DNA cromossômico específico de S. aureus, de acordo com o protocolo descrito por MARTINEAU et al. (1998). As reações compreenderam volume final de 20 μL com 20 mM Tris-HCl (pH 8,4), 50 mM KCl, 2,5 mM MgCl2, 0,2 mM de cada dNTP, 0,4 μM de cada oligonucleotídeo iniciador Sa442-1 (5’- AAT CTT TGT CGG TAC ACG ATA TTC TTC ACG- 3’) e Sa442-2 (5’- CGT AAT GAG ATT TCA GTA GAT AAT ACA ACA- 3’), e 0,5 U de Taq polimerase em amplificação do tipo host-start. As misturas de PCR foram submetidas à desnaturação por três minutos a 94°C e, posteriormente, a trinta ciclos de um segundo a 95°C, e trinta segundos a 55°C para pareamento e extensão dos oligonucleotídeos iniciadores. Dez microlitros do produto amplificado foram visualizados após eletroforese em gel de agarose em concentração de 2%, corado com brometo de etídio. Utilizou-se marcador de tamanho molecular 100 pb como padrão de peso molecular.
Estudaram-se as características diagnósticas do teste de VP, definindo-se a sensibilidade do teste como a proporção dos verdadeiros positivos entre todos os resultados positivos após o diagnóstico, e a especificidade como a proporção dos verdadeiros negativos entre todos os resultados negativos. Determinou-se a eficiência do teste de VP pela proporção de resultados verdadeiros que o teste foi capaz de identificar (MEDRONHO & PEREZ, 2002). Consideraram-se as provas moleculares como “padrão-ouro”, comparando-se as características do teste de acordo com os resultados obtidos na prova de coagulase lenta com plasma de coelho em diferentes condições pluviométricas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela 1 estão apresentados os valores referentes à quantidade de amostras de S. aureus isoladas a partir de leite, óstios e insufladores dos conjuntos de ordenha, com os seus respectivos graus de coagulação na prova de coagulase lenta com plasma de coelho, de acordo com a quantidade de chuvas ocorridas durante o período de estudo.
Observou-se que houve uma menor quantidade de isolados com graus de coagulação inferiores a “4” nas três fontes estudadas, tanto no período com uma quantidade superior de chuvas como naquele com menores níveis pluviométricos. De um total de 329 amostras identificadas como S. aureus, 167 (50,8%) foram isoladas no leite de quartos mamários com mastite, 117 (35,6%) originaram-se de óstios pertencentes a quartos mamários sadios e 45 (13,6%) foram oriundas dos insufladores dos conjuntos de ordenha. Dentre as amostras isoladas a partir do leite, 142 (85,0%) apresentaram coagulação completa. Esse grau de coagulação foi encontrado em 81 (69,2%) e 32 (71,1%) amostras isoladas em óstios e insufladores, respectivamente.
O exame bacteriológico do leite, obtido a partir de um único quarto ou de amostras compostas, é o procedimento padrão para o estabelecimento da infecção mamária (ELVINGER & NATZKE, 1992). Nos casos de surtos de mastite clínica em um rebanho ou em casos isolados, especialmente em vacas de alto valor zootécnico, o isolamento do agente etiológico é o método diagnóstico de eleição. Dessa maneira, a cultura do leite de vacas do rebanho é útil no monitoramento da prevalência e dos agentes etiológicos presentes (SEARS et al., 1993).
Existe uma gama de testes laboratoriais que podem ser utilizados para a identificação de S. aureus. Citem-se a utilização concomitante do teste da coagulase e de termonuclease, o crescimento em ágar Baird Parker suplementado com acriflavina, atividade da β-galactosidase, teste de hemólise em ágar chocolate, além da prova de DNAse, teste do manitol em anaerobiose e a fermentação de açúcares (KONEMAN et al., 2001). SILVA & GANDRA (2004) chamam a atenção para a análise de resultados em conjunto para a discriminação das espécies. Porém, uma identificação rápida, confiável e não excessivamente onerosa de colônias de S. aureus em culturas de amostras de leite é fundamental para o controle da mastite por esse microrganismo.
Métodos de sequenciamento genético permitem a identificação de vários patógenos bacterianos. Porém, na contramão da necessidade de testes de baixo custo, esses métodos ainda são relativamente caros, trabalhosos e, na maioria das vezes, não estão na rotina diagnóstica de laboratórios especializados na área veterinária. A maior parte das amostras originadas de casos de mastite é analisada de acordo com critérios financeiros, e testes simples podem permitir a identificação da etiologia infecciosa da doença, como a combinação de aspectos referentes à hemólise apresentada no meio de cultivo e a verificação da produção de coagulase, por exemplo. Por sua vez, o teste da coagulase com quatro horas de incubação parece não apresentar adequada sensibilidade diagnóstica. Recomenda-se, diante desse período de tempo para a leitura da prova, a utilização concomitante de outros testes, como a verificação da produção de beta-hemólise, por exemplo, em que se verificou a elevação da sensibilidade diagnóstica de 60,4% para 99,4% (BOERLIN et al., 2003).
No presente trabalho, os microrganismos isolados que não apresentaram coagulação do plasma de coelho não foram submetidos à confirmação molecular, apesar da possibilidade de, segundo SOUTO (2006), isolados de infecções intramamárias apresentarem características atípicas, não demonstrando comportamento bioquímico clássico, como, por exemplo, reação de coagulase positiva. SILVA et al. (2000) também mencionaram o aparecimento de colônias atípicas de S. aureusS. aureus em ágar Baird Parker (39,4%) em que 94,4% eram oriundas do leite.
SILVA et al. (2000) verificaram que a intensidade da reação na prova da coagulase variou com a origem das amostras. S. aureus originados das máquinas de ordenha e mãos de ordenhadores eram 3 ou 4 cruzes. E 17,1% dentre os oriundos do leite apresentaram reações 1 ou 2 cruzes, ou seja, de menor intensidade. O estudo de cepas de S. aureus oriundas de diferentes fontes é de importância para o acompanhamento da epidemiologia da mastite, uma vez que parece existir especificidade das amostras isoladas em humanos e animais. A determinação da origem de amostras identificadas como responsáveis pela mastite bovina pode contribuir para o estabelecimento de medidas de controle contra a doença. Segundo FAGUNDES & OLIVEIRA (2004), deve ser ressaltada a importância do homem como reservatório de S. aureus.
Há tempos que os estafilococos vêm sendo analisados em alimentos com base na habilidade ou não de coagular o plasma sanguíneo, já que é referenciada a relação intrínseca entre a produção de coagulase e a disponibilidade de S. aureus, de produzir enterotoxinas. O procedimento do teste da coagulase passa por diferentes critérios de interpretação, desde a consideração de quaisquer graus de coagulação até a consideração de somente o grau máximo de coagulação (PEREIRA et al., 2000).
No diagnóstico da mastite bovina por S. aureus, alguns protocolos não consideram reações fracas na prova da coagulase como resultados positivos, o que influencia na sensibilidade e especificidade do teste. Colônias atípicas podem ser isoladas em quaisquer sítios de localização, de modo que a inclusão de provas adicionais pode elevar o número de amostras identificadas corretamente. Além disso, o estudo dos resultados de testes laboratoriais, diante das condições climáticas anteriores às colheitas, das amostras pode colaborar no levantamento de fatores intervenientes dos resultados. A dificuldade em manter condições higiênicas adequadas em períodos mais chuvosos, com condições de umidade e temperatura favoráveis à multiplicação de microrganismos, pode fazer com que haja uma maior dispersão de amostras bacterianas no ambiente com distintas características fenotípicas.
Na Tabela 2 constam as características diagnósticas do teste de VP na identificação de S. aureus em diferentes fontes envolvidas com a epidemiologia da mastite bovina, de acordo com os graus de coagulação das cepas bacterianas, durante a estação classificada como “seca”.
Na estação seca verificou-se que a eficiência do teste de VP para identificar S. aureus foi inferior para aqueles microrganismos que apresentaram graus de coagulação incompleta, tanto para os isolados do leite como para aqueles originados de óstios e insufladores. Encontrou-se uma eficiên­cia superior (87,1%) para S. aureus oriundos do leite de quartos mamários com mastite e que apresentaram coagulação completa na prova da coagulase lenta com plasma de coelho, quando comparada com as eficiências de outros graus de coagulação e das demais fontes. Sensibilidades elevadas durante a estação classificada como “seca” foram encontradas. Porém, em isolados de óstios com coagulação não completa, a sensibilidade do teste foi inferior às demais fontes e graus de coagulação (75%). A capacidade do teste de VP em identificar amostras negativas para S. aureus mostrou-se baixa quando os resultados das provas de confirmação diagnóstica se mostraram negativos (10,0% a 22,2%).
Na Tabela 3 encontram-se os resultados referentes às características diagnósticas do teste de VP, na identificação de S. aureus em diferentes fontes envolvidas com a epidemiologia da mastite bovina, de acordo com os graus de coagulação das cepas em estação classificada como “chuvosa”.
Em períodos mais chuvosos, encontraram-se eficiências inferiores para o teste de VP quando os isolados eram provenientes de óstios e insufladores e apresentavam coagulação incompleta (38,9% e 33,3%, respectivamente), diferentemente que o apresentado pelas amostras originadas de leite (82,4%). Verificou-se que o teste de VP apresentou uma sensibilidade superior em épocas com quantidade inferior de chuvas, exceto para os isolados originados de insufladores quando os microrganismos apresentaram grau “4” de coagulação (coagulação completa), apesar de próxima da encontrada para os isolados dessa fonte na época “seca” (90,9% e 87,5%, respectivamente) e para microrganismos oriundos de óstios sem coagulação completa. Verificaram-se especificidades superiores para as amostras isoladas nas chuvas, quando comparadas com a estação “seca”, exceto em óstios com isolados que não apresentaram coagulação completa e para insufladores, em que não foi possível o cálculo pela pequena quantidade de amostras.
BRITO et al. (2002), ao identificarem 38 amostras como S. aureus, verificaram que 81,6% produziram acetoína e classificaram o teste de VP como de fácil execução e com baixo custo, além de o considerarem como uma característica-chave para S. aureus, apesar do tempo de incubação considerado prolongado. Em levantamento anterior, dentre 55 amostras de S. aureus não produtoras de betagalactosidase que cresceram em ágar Baird-Parker suplementado com acriflavina, algumas apresentaram resultados variados em outros testes: 13 amostras produziram pigmentos carotenoides, 36 fermentaram a maltose aerobicamente, 47 fermentaram o manitol de forma anaeróbica e 40 apresentaram atividade hemolítica em ágar sangue, e 46 (83,6%) produziram acetoína (GANDRA et al., 2005). Resultados semelhantes foram relatados por CAPURRO et al. (1992) e ROBERSON et al. (1992), que observaram altas porcentagens (94% e 98%, respectivamente) de amostras positivas no teste de VP.
Quanto menor o número de testes hábeis para a identificação de S. aureus, mais fácil será para o técnico na rotina laboratorial, principalmente quando sistemas automatizados de diagnóstico não estão disponíveis. Em sistemas com automação, o custo de tempo de incubação para a identificação estafilocócia parece não ser adequado. Além disso, muitas vezes pode existir um grande número de amostras atípicas, assim como as relatadas por IORIO et al. (2007), que encontraram 55,6% de amostras de estafilococos atípicos em pelo menos um teste utilizado. Com relação a S. aureus, uma amostra (5,6%) apresentou comportamento atípico em prova que verificou a produção de acetoína.
Há evidências de variação clonal de S. aureus dentro de rebanhos individuais (YOUNG et al., 2001). O aspecto crônico das mastite por S. aureus faz com que haja a possibilidade de vacas adquirirem diferentes cepas da bactéria que permanecem corresidentes dentro do úbere e que podem suprimir a resposta imunológica do hospedeiro e permitir, consequentemente, a persistência da infecção. Pelos resultados apresentados neste trabalho, sugere-se que em épocas mais chuvosas um número superior de variantes do microrganismo esteja presente, o que pode reduzir a eficiência de testes fenotípicos como o de produção de acetoína, por exemplo, espelhando a possível necessidade de testes adicionais para a identificação de S. aureus.

CONCLUSÕES

O teste de produção de acetoína apresentou adequada sensibilidade para identificar S. aureus em fontes ligadas à cadeia epidemiológica da mastite bovina, em conjunto com a coagulase, principalmente em períodos com menor ocorrência de chuvas, independentemente do grau de coagulação apresentado. Dada a possível variabilidade que pode ser encontrada entre as amostras, não é recomendado o uso unicamente do teste de VP em conjunto com a prova de coa­gulase lenta com plasma de coelho, principalmente em épocas de maior ocorrência de chuvas, em que a sensibilidade do teste para amostras de leite de quartos mamários com mastite pode apresentar-se inferior, quando comparada com a sensibilidade da prova apresentada em período menos chuvoso.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP, Processo no 05/53856-3).

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Protocolado em: 12 maio 2008.  Aceito em: 1º maio 2009.