Ricardo Zanella,¹ Carlos Bondan,² Julio Cesar Mendes Soares,² Eraldo Lourenso Zanella² e
Marina Ragagnin de Lima³
1. Médico veterinário, doutorando da Washington State University, Department of Animal Science Pullman WA, 99163.
E-mail: zanellar@wsu.edu
2. Médicos veterinários, professores da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, Curso de Medicina Veterinária,
Universidade de Passo Fundo
3. Médica veterinária autônoma, Caçapava do Sul, RS.
Progestágenos para a sincronização de
estro têm sido utilizados como rotina em propriedades com melhor
controle reprodutivo. A produção de radicais livres, estresse
oxidativo, está relacionada com os níveis de progesterona circulante. O
estresse oxidativo é responsável pela agressão à membrana celular,
causando lise e a formação de lipoperóxidos. Neste trabalho,
buscou-se avaliar o efeito compensatório de antioxidantes (vitaminas C
e E) associados ao implante de progesterona exógena (P4), utilizada em
protocolos de sincronização de estro em fêmeas bovinas. Vinte e cinco
fêmeas bovinas foram divididas aleatoriamente em cinco grupos: 1)
controle sem implante de P4; 2) implante de P4; 3) implante de P4 +
vitamina C e E; 4) implante de P4 + vitamina E; 5) implante de P4 +
vitamina C. Avaliaram-se a lipoperoxidação lipídica, através da
mensuração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS), e
a enzima glutationa peroxidase (GSHpx), nos dias zero e sete do
protocolo de sincronização de estro. A utilização de vitamina E, neste
experimento, apresentou uma maior taxa de prenhez; entretanto, existe a
necessidade de validar esses resultados, antes que seu uso seja
preconizado em fêmeas bovinas sincronizadas com P4.
PALAVRAS-CHAVES: Antioxidantes, estresse oxidativo, progesterona, taxa de prenhez, vacas.
USE OF ANTIOXIDANTS TO IMPROVE THE PREGNANCY RATE IN BEEF CATTLE SUBMITTED TO A SYNCHRONIZATION PROTOCOL WITH PROGESTERONE (P4)
Estrus synchronization with
progesterone is commonly used in farms with better reproductive
control. Free radicals production, i.e. oxidative stress, is associated
with progesterone levels. The oxidative stress is responsible for
aggression to the cellular membrane, leading to a lise and lipoperoxide
formation. In this work, the antioxidant compensatory effect (Vitamins
C and E) associated with the exogenous progesterone implant (P4), used
in estrus synchronization protocols in cattle, was evaluated.
Twenty-five cows were randomly selected in 5 different groups: 1)
control without P4, 2) control with P4, 3) P4 + vitamin C and E, 4) P4
+ vitamin E, 5) P4 + vitamin C. The lipid lipoperoxidation was measured
trough Thiobarbituric acid reactive substances (TBA-RS) and Glutatione
Peroxidase enzyme (GSHpx) at days 0 and 7 of the estrus synchronization
protocol. The use of vitamin E, in this experiment, showed a better
pregnancy rate, however, the results must be validated before orienting
the use of the vitamin in cows synchronized with P4.
KEYWORDS: Antioxidants, cows, oxidative stress, pregnancy rate, progesterone.
O desenvolvimento e o uso de
biotécnicas reprodutivas, sincronização e indução de estro, em gado de
corte, são de importância fundamental para o sistema de produção
brasileira. A concentração das atividades de cobertura com bons índices
de concepção permite uma boa concentração de parto das fêmeas nos
momentos mais adequados do ano (BAYARD
et al.,
2002). Pesquisas demonstram que os níveis do sucesso da sincronização
de estro variam de acordo com o protocolo utilizado, mas geralmente são
efetivos. Porém, o grau de fertilidade animal, com a utilização de
implantes com progesterona exógena, é reduzido, como foi descrito por
AINSWORTH & SHRESTHA (1983). Trabalhos recentes de sincronização de
estro apresentaram taxas de prenhez entre 37,68% e 57,6% (CÂMARA
et al., 2006; BORGES
et al., 2009).
Na bovinocultura, falhas de manejo, como a identificação do estro, é um
dos grandes problemas, podendo levar a uma baixa taxa de prenhez no
rebanho. Por esse motivo, o uso da hormonioterapia com a intenção de
sincronizar o estro e a inseminação artificial em tempo fixo (IATF) têm
sido de grande interesse (BARROS
et al.,
1995). A progesterona (P4) exógena, o estrogênio (E2), o gonadotrofina
coriônica equina (eCG) e GnRH têm sido amplamente utilizados em
protocolos de sincronização do estro e da ovulação, inclusive em
animais em anestro (ROCHE
et al., 1992; JOLLY
et al., 1995; MORAES & JAUME, 1997; CÂMARA
et al., 2006; BORGES
et al.,
2009). A utilização desses hormônios visa mimetizar o ciclo estral, bem
como estimular o eixo hipotálamo-hipofisário-gonadal da fêmea e as
células dessas estruturas (GONZALEZ-PADILHA
et al., 1975; TROXEL
et al., 1993; KESLER & FAVERO, 1996; WILTBANK
et al., 1996; BAYARD
et al., 2002). LUCY
et al.
(2001) citam que a taxa de prenhez de vacas sincronizadas com pessário
intravaginal apresentou índices superiores ao grupo-controle, sem
pessário. Já SIMONETTI
et al.
(1999), em experimento realizado em ovinos, obtiveram 92,86% de estro,
mas somente 50,43% de prenhez. Os baixos índices de eficiência
reprodutiva foram relacionados com a utilização de progestágenos como
moduladores do estro, porém os motivos ainda não são totalmente
conhecidos.
O aumento nos níveis de P4 circulante está diretamente relacionado com
a elevação dos níveis de ácido tiobarbitúrico (TBA-RS) (MÁRQUEZ
et al., 1997). O E2, em contrapartida, tem um efeito contrário ao da P4, inibindo os processos de estresse oxidativo (EJIMA
et al., 1999; CHENG
et al.,
2006). Os níveis de TBA-RS são indicativos de danos à membrana celular,
em decorrência da produção de espécies reativas ao oxigênio (EROs), que
pode ter efeito deletério para os óvulos e embriões. O efeito negativo
das espécies reativas ao oxigênio (EROs) no metabolismo e saúde de
vacas leiteiras foi documentado por MILLER &
BRZEZINSKA-SLEBODZINSKA (1993). Porém esses efeitos podem ser
neutralizados ou diminuídos, pelos mecanismos antioxidantes enzimáticos
e não enzimáticos.
Neste trabalho, utilizou-se um protocolo de sincronização da ovulação
com pessários intravaginais contendo medroxiprogesterona (MAP),
associado a aplicações intramusculares de benzoato de estradiol,
prostaglandina e gonadotrofina coriônica equina (eCG) para
sincronização do estro e ovulação. Concomitantemente, foram
administradas vitaminas antioxidantes, com a intenção de se avaliar o
efeito destas em relação aos níveis de oxidação e taxa de prenhez em
bovinos de corte. A hipótese deste trabalho é que a utilização de P4
exógena como método de sincronização aumente a peroxidação lipídica em
foliculos preovulatórios, levando a problemas no desenvolvimento do
oócito, acarretando, assim, baixa taxa de prenhez.
MATERIAL E MÉTODOS
Para este experimento, utilizaram-se vacas cruzadas Nelore X Angus
solteiras (n=25), da Agropecuária Zanella, no município de Paim Filho,
pertencente à região norte do estado do Rio Grande do Sul.
Classificaram-se os animais quanto ao seu escore de condição corporal
(ECC) de 1 a 5, sendo 1 considerada magra e 5 obesa (GRAHAM, 1982). Os
animais foram separados aleatoriamente em cinco diferentes grupos, cada
grupo composto por cinco animais: (1) grupo-controle, sem implante de
P4; (2) implante de P4; (3) implante de P4 e administração de vitaminas
C e E; (4) implante de P4 e administração de vitamina E; (5) implante
de P4 e administração de vitamina C. O protocolo de sincronização de
estro foi realizado conforme descrito por BAYARD
et al.
(2002), com a aplicação de medroxiprogesterona na forma de
pessário intravaginal (MAP 250mg) por sete dias e no dia zero
(d0) uma injeção intramuscular de 2,5 mg de benzoato de estradiol; no
sexto dia, aplicaram-se eCG (100mg) via intramuscular (IM) e PGF2a (25
mg) via mucosa vulvar. Aplicaram-se também vitamina C 3,0 mL
(150 mg/mL; Laboratórios BRAVET, RJ) e vitamina E 5,0 mL (100 mg/mL;
Laboratórios BRAVET, RJ), via IM, no dia zero. Todos os procedimentos
realizados estão de acordo com os princípios éticos na experimentação
animal recomendados pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal
(COBEA).
Coletaram-se amostras sanguíneas por venopunção da veia jugular após
antissepsia, utilizando-se agulhas descartáveis e tubos de ensaio
esterilizados. O sangue coletado heparinizado foi conservado sob
refrigeração 4°C e utilizado para análise, logo após a coleta, para
mensuração dos níveis de lipoperóxidos, nos dias zero e sete do
protocolo de sincronização.
Procedeu-se à quantificação da lipoperoxidação celular mediante a
técnica de mensuração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico
(TBA-RS). As amostras heparinizadas foram centrifugadas em 2.000 g por
cinco minutos e o sobrenadante descartado e substituído por solução
fisiológica de NaCl 0,9% em igual volume. Desenvolveu-se esse
procedimento duas vezes e, após, o concentrado de hemácias foi
ressuspenso com um hematócrito de 50%. Após a lavagem dos eritrócitos
com NaCl 150 mM, as amostras foram precipitadas com ácido acético 40%
na proporção 1:2 e centrifugadas em 2.000 g para a separação do
sobrenadante. Determinou-se a peroxidação lipídica de acordo com o
método de formação de espécies reativas ao ácido tiobarbitúrico
(TBA-RS), utilizado por OHKAWA
et al.
(1979), e de grupamentos sulfidris não proteicos (NPSH), por ELLMANS
(1959). Sessenta dias após a inseminação dos animais, efetuou-se
detecção de prenhez dos animais por palpação transretal. Os valores de
produção de TBA-RS e de GSHpx foram submetidos à ANOVA teste, seguida
do teste de TUKEY, considerando-se as diferenças significativas quando
p<0.05.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A hormonioterapia é uma ferramenta indispensável para a manipulação e
melhorias do uso de biotecnologias no gado bovino. O maior desafio para
o uso dessas biotecnologias é a obtenção de melhores índices
reprodutivos em bovinos de corte na produção pecuária. Diversas
alternativas têm sido utilizadas para tentar concentrar as atividades
de sincronização de estro, ovulação e, consequentemente, o período de
parto em um pequeno intervalo de tempo, como é o caso da utilização de
P4. No entanto, as taxas de prenhez com a utilização desses
métodos está aquém da expectativa esperada, dado o aumento do custo de
produção animal.
Neste experimento, de forma geral, a taxa de prenhez foi de 52%. Esse
índice é compatível com os resultados observados por BORGES
et al.
(2009), que obtiveram 57,6 % de taxa de prenhez. Deve-se levar em
consideração que no trabalho ora descrito foram utilizadas vacas
solteiras, ou seja, sem terneiro ao pé, ao passo que no trabalho citado
empregaram-se vacas no pós-parto com a retirada dos terneiros por um
período de quatro dias. Além disso, o número de vacas no experimento
foi pequeno, quando comparado com o experimento citado.
A taxa de prenhez nos grupos-controle (com e sem P4) foi de 40%. Os
níveis de produção de TBA-RS no grupo-controle, com o protocolo de
sincronização com P4 e sem P4, foram maiores no dia sete, em comparação
com o dia zero (p<0.0002) no mesmo grupo, confirmando, assim, a ação
da progesterona exógena e endógena, com a produção de EROs, já descrita
por MÁRQUEZ
et al. (1997).
Consequentemente, ocorreu aumento proporcional na produção da enzima
GSHpx, sugerindo um mecanismo compensatório, para inibir a ação dos
EROs (p<0.0002).
A taxa de prenhez no grupo tratado com vitamina C foi de 40%. Neste
grupo com vitamina C, os níveis de produção de TBA-RS foram menores no
dia sete, quando comparados com os do dia zero (p<0.05), podendo
sugerir um efeito antioxidante da vitamina C ou que os animais estavam
no período do ciclo estral entre o dia sete e dezoito na primeira
coleta, quando ocorre uma maior produção de progesterona endógena. Esse
resultado coincidiu com a descrição de MÁRQUEZ
et al.
(1997), em que na presença de um corpo lúteo funcional e maduro são
encontrados elevados níveis de progesterona, o que está diretamente
relacionado com o aumento nos níveis de substâncias reativas ao ácido
tiobarbitúrico (TBA-RS). Com o corpo lúteo maturo, existe um aumento
significativo do estresse oxidativo, coincidindo com os altos níveis de
progesterona (P4), quando comparado com o corpo lúteo em regressão,
observando-se baixos níveis de TBA-RS e progesterona sérica (MÁRQUEZ
et al.,
1997). Mesmo com níveis de TBA-RS reduzidos no dia sete, os níveis de
GSHpx não estavam maiores, em comparação com o dia zero. Apesar de esse
aumento não ser significativo, pode, no entanto, sugerir um mecanismo
compensatório contra a produção de EROs.
A associação das vitaminas C e E provocou um aumento na produção de
TBA-RS no dia sete quando comparado com o dia zero, sugerindo efeito
pró-oxidante da vitamina C e E. Neste caso, mais uma vez a enzima GSHpx
teve uma ação compensatória para manter um balanço entre na produção de
EROs. Entretanto, mesmo com o efeito pró-oxidante, a taxa de prenhez
não foi diferente quando comparada com os grupos-controle e tratados
com vitamina C e vitamina C e E, ficando em 40%. Elevadas doses de
vitaminas antioxidantes podem causar efeitos deletérios no organismo
animal. Por exemplo, é possível o ascorbato (vitamina C) agir como um
pró-oxidante, acarretando a produção do radical hidroxila, que é
altamente reativo, vindo a causar danos oxidativos à membrana celular.
No grupo tratado com vitamina E os níveis de TBA-RS e GSHpx foram
maiores no dia sete, quando comparados com os do dia zero,
demonstrando, assim, o efeito compensatório dessa enzima à produção de
EROs. A taxa de prenhez do grupo com vitamina E foi de 100%,
demonstrando a eficiência da associação dessa vitamina ao protocolo
(p<0.05). A utilização da vitamina E como fonte antioxidante
resultou em uma maior taxa de prenhez. Trata-se de dados que estão de
acordo com resultados previamente publicados por LAFLAMME &
HIDIROGLOU (1991) e RICHARDSON
et al. (2008), quando foi observado aumento significativo na taxa de prehez em novilhas e vacas suplementadas com vitamina E.
O mecanismo de interação entre vitaminas antioxidantes e redução em
perdas embrionárias ainda é desconhecido. No entanto, associações entre
vitamina E e saúde uterina têm sido observadas. Tais resultados são
congruentes com os relatados por EVANS & BISHOP (1922), que
administraram vitamina E em ratas e observaram redução em perdas
embrionárias e absorção fetal. Os achados deste experimento
suportam a hipótese de associação inibitória das vitaminas
antioxidantes com os níveis de peroxidação libídica. Conclui-se, assim,
que a associação de vitamina E ao protocolo de sincronização de estro
com a utilização de P4 é benéfica para a obtenção de bons resultados
reprodutivos. Sugere-se a realização de futuros experimentos com um
maior número de animais para melhor avaliação desses resultados.
AGRADECIMENTOS
Aos proprietários da Agropecuária Zanella, Sr. Ipenor Zanella e Sra.
Nair Zuleika Zanella, por disponibilizarem os animais para este estudo.
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Protocolado em: 30 abr. 2008. Aceito em: 23 nov. 2009.