DOI:10.5216/cab.v11i3.3848
USO DE ANTIOXIDANTES PARA MELHORAR A EFICIÊNCIA REPRODUTIVA DE REBANHO BOVINO SUBMETIDO A PROTOCOLO DE SINCRONIZAÇÃO COM PROGESTERONA (P4)


Ricardo Zanella,¹ Carlos Bondan,² Julio Cesar Mendes Soares,² Eraldo Lourenso Zanella² e
Marina Ragagnin de Lima³

1. Médico veterinário, doutorando da Washington State University, Department of Animal Science Pullman WA, 99163.
E-mail: zanellar@wsu.edu
2. Médicos veterinários, professores da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, Curso de Medicina Veterinária,
Universidade de Passo Fundo
3. Médica veterinária autônoma, Caçapava do Sul, RS.




RESUMO

Progestágenos para a sincronização de estro têm sido utilizados como rotina em propriedades com melhor controle reprodutivo.  A produção de radicais livres, estresse oxidativo, está relacionada com os níveis de progesterona circulante. O estresse oxidativo é responsável pela agressão à membrana celular, causando lise e a formação de lipoperóxidos.  Neste trabalho, buscou-se avaliar o efeito compensatório de antioxidantes (vitaminas C e E) associados ao implante de progesterona exógena (P4), utilizada em protocolos de sincronização de estro em fêmeas bovinas. Vinte e cinco fêmeas bovinas foram divididas aleatoriamente em cinco grupos: 1) controle sem implante de P4; 2) implante de P4; 3) implante de P4 + vitamina C e E; 4) implante de P4 + vitamina E; 5) implante de P4 + vitamina C. Avaliaram-se a lipoperoxidação lipídica, através da mensuração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS), e a enzima glutationa peroxidase (GSHpx), nos dias zero e sete do protocolo de sincronização de estro. A utilização de vitamina E, neste experimento, apresentou uma maior taxa de prenhez; entretanto, existe a necessidade de validar esses resultados, antes que seu uso seja preconizado em fêmeas bovinas sincronizadas com P4.

PALAVRAS-CHAVES: Antioxidantes, estresse oxidativo, progesterona, taxa de prenhez, vacas.


ABSTRACT

USE OF ANTIOXIDANTS TO IMPROVE THE PREGNANCY RATE IN BEEF CATTLE SUBMITTED TO A SYNCHRONIZATION PROTOCOL WITH PROGESTERONE (P4)

Estrus synchronization with progesterone is commonly used in farms with better reproductive control. Free radicals production, i.e. oxidative stress, is associated with progesterone levels. The oxidative stress is responsible for aggression to the cellular membrane, leading to a lise and lipoperoxide formation. In this work, the antioxidant compensatory effect (Vitamins C and E) associated with the exogenous progesterone implant (P4), used in estrus synchronization protocols in cattle, was evaluated. Twenty-five cows were randomly selected in 5 different groups: 1) control without P4, 2) control with P4, 3) P4 + vitamin C and E, 4) P4 + vitamin E, 5) P4 + vitamin C. The lipid lipoperoxidation was measured trough Thiobarbituric acid reactive substances (TBA-RS) and Glutatione Peroxidase enzyme (GSHpx) at days 0 and 7 of the estrus synchronization protocol. The use of vitamin E, in this experiment, showed a better pregnancy rate, however, the results must be validated before orienting the use of the vitamin in cows synchronized with P4. 

KEYWORDS: Antioxidants, cows, oxidative stress, pregnancy rate, progesterone.



INTRODUÇÃO

O desenvolvimento e o uso de biotécnicas reprodutivas, sincronização e indução de estro, em gado de corte, são de importância fundamental para o sistema de produção brasileira. A concentração das atividades de cobertura com bons índices de concepção  permite uma boa concentração de parto das fêmeas nos momentos mais adequados do ano (BAYARD et al., 2002). Pesquisas demonstram que os níveis do sucesso da sincronização de estro variam de acordo com o protocolo utilizado, mas geralmente são efetivos. Porém, o grau de fertilidade animal, com a utilização de implantes com progesterona exógena, é reduzido, como foi descrito por AINSWORTH & SHRESTHA (1983). Trabalhos recentes de sincronização de estro apresentaram taxas de prenhez entre 37,68% e 57,6% (CÂMARA et al., 2006; BORGES et al., 2009).
Na bovinocultura, falhas de manejo, como a identificação do estro, é um dos grandes problemas, podendo levar a uma baixa taxa de prenhez no rebanho. Por esse motivo, o uso da hormonioterapia com a intenção de sincronizar o estro e a inseminação artificial em tempo fixo (IATF) têm sido de grande interesse (BARROS et al., 1995). A progesterona (P4) exógena, o estrogênio (E2), o gonadotrofina coriônica equina (eCG) e GnRH têm sido amplamente utilizados em protocolos de sincronização do estro e da ovulação, inclusive em animais em anestro (ROCHE et al., 1992; JOLLY et al., 1995; MORAES & JAUME, 1997; CÂMARA et al., 2006; BORGES et al., 2009). A utilização desses hormônios visa mimetizar o ciclo estral, bem como estimular o eixo hipotálamo-hipofisário-gonadal da fêmea e as células dessas estruturas (GONZALEZ-PADILHA et al., 1975; TROXEL et al., 1993; KESLER & FAVERO, 1996; WILTBANK et al., 1996; BAYARD et al., 2002). LUCY et al. (2001) citam que a taxa de prenhez de vacas sincronizadas com pessário intravaginal apresentou índices superiores ao grupo-controle, sem pessário. Já SIMONETTI et al. (1999), em experimento realizado em ovinos, obtiveram 92,86% de estro, mas somente 50,43% de prenhez. Os baixos índices de eficiência reprodutiva foram relacionados com a utilização de progestágenos como moduladores do estro, porém os motivos ainda não são totalmente conhecidos. 
O aumento nos níveis de P4 circulante está diretamente relacionado com a elevação dos níveis de ácido tiobarbitúrico (TBA-RS) (MÁRQUEZ et al., 1997). O E2, em contrapartida, tem um efeito contrário ao da P4, inibindo os processos de estresse oxidativo (EJIMA et al., 1999; CHENG et al., 2006). Os níveis de TBA-RS são indicativos de danos à membrana celular, em decorrência da produção de espécies reativas ao oxigênio (EROs), que pode ter efeito deletério para os óvulos e embriões. O efeito negativo das espécies reativas ao oxigênio (EROs) no metabolismo e saúde de vacas leiteiras foi documentado por MILLER & BRZEZINSKA-SLEBODZINSKA (1993). Porém esses efeitos podem ser neutralizados ou diminuídos, pelos mecanismos antioxidantes enzimáticos e não enzimáticos.
Neste trabalho, utilizou-se um protocolo de sincronização da ovulação com pessários intravaginais contendo medroxiprogesterona (MAP), associado a aplicações intramusculares de benzoato de estradiol, prostaglandina e gonadotrofina coriônica equina (eCG) para sincronização do estro e ovulação. Concomitantemente, foram administradas vitaminas antioxidantes, com a intenção de se avaliar o efeito destas em relação aos níveis de oxidação e taxa de prenhez em bovinos de corte. A hipótese deste trabalho é que a utilização de P4 exógena como método de sincronização aumente a peroxidação lipídica em foliculos preovulatórios, levando a problemas no desenvolvimento do oócito, acarretando, assim, baixa taxa de prenhez. 

MATERIAL E MÉTODOS

Para este experimento, utilizaram-se vacas cruzadas Nelore X Angus solteiras (n=25), da Agropecuária Zanella, no município de Paim Filho, pertencente à região norte do estado do Rio Grande do Sul. Classificaram-se os animais quanto ao seu escore de condição corporal (ECC) de 1 a 5, sendo 1 considerada magra e 5 obesa (GRAHAM, 1982). Os animais foram separados aleatoriamente em cinco diferentes grupos, cada grupo composto por cinco animais: (1) grupo-controle, sem implante de P4; (2) implante de P4; (3) implante de P4 e administração de vitaminas C e E; (4) implante de P4 e administração de vitamina E; (5) implante de P4 e administração de vitamina C. O protocolo de sincronização de estro foi realizado conforme descrito por BAYARD et al. (2002), com a aplicação de  medroxiprogesterona na forma de pessário intravaginal (MAP 250mg) por sete dias e  no dia zero (d0) uma injeção intramuscular de 2,5 mg de benzoato de estradiol; no sexto dia, aplicaram-se eCG (100mg) via intramuscular (IM) e PGF2a (25 mg) via  mucosa vulvar. Aplicaram-se também vitamina C 3,0 mL (150 mg/mL; Laboratórios BRAVET, RJ) e vitamina E 5,0 mL (100 mg/mL; Laboratórios BRAVET, RJ), via IM, no dia zero. Todos os procedimentos realizados estão de acordo com os princípios éticos na experimentação animal recomendados pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA).
Coletaram-se amostras sanguíneas por venopunção da veia jugular após antissepsia, utilizando-se agulhas descartáveis e tubos de ensaio esterilizados. O sangue coletado heparinizado foi conservado sob refrigeração 4°C e utilizado para análise, logo após a coleta, para mensuração dos níveis de lipoperóxidos, nos dias zero e sete do protocolo de sincronização.
Procedeu-se à quantificação da lipoperoxidação celular mediante a técnica de mensuração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS). As amostras heparinizadas foram centrifugadas em 2.000 g por cinco minutos e o sobrenadante descartado e substituído por solução fisiológica de NaCl 0,9% em igual volume. Desenvolveu-se esse procedimento duas vezes e, após, o concentrado de hemácias foi ressuspenso com um hematócrito de 50%. Após a lavagem dos eritrócitos com NaCl 150 mM, as amostras foram precipitadas com ácido acético 40% na proporção 1:2 e centrifugadas em 2.000 g para a separação do sobrenadante. Determinou-se a peroxidação lipídica de acordo com o método de formação de espécies reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS), utilizado por OHKAWA et al. (1979), e de grupamentos sulfidris não proteicos (NPSH), por ELLMANS (1959). Sessenta dias após a inseminação dos animais, efetuou-se detecção de prenhez dos animais por palpação transretal. Os valores de produção de TBA-RS e de GSHpx foram submetidos à ANOVA teste, seguida do teste de TUKEY, considerando-se as diferenças significativas quando p<0.05.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A hormonioterapia é uma ferramenta indispensável para a manipulação e melhorias do uso de biotecnologias no gado bovino. O maior desafio para o uso dessas biotecnologias é a obtenção de melhores índices reprodutivos em bovinos de corte na produção pecuária. Diversas alternativas têm sido utilizadas para tentar concentrar as atividades de sincronização de estro, ovulação e, consequentemente, o período de parto em um pequeno intervalo de tempo, como é o caso da utilização de P4.  No entanto, as taxas de prenhez com a utilização desses métodos está aquém da expectativa esperada, dado o aumento do custo de produção animal.
Neste experimento, de forma geral, a taxa de prenhez foi de 52%. Esse índice é compatível com os resultados observados por BORGES et al. (2009), que obtiveram 57,6 % de taxa de prenhez. Deve-se levar em consideração que no trabalho ora descrito foram utilizadas vacas solteiras, ou seja, sem terneiro ao pé, ao passo que no trabalho citado empregaram-se vacas no pós-parto com a retirada dos terneiros por um período de quatro dias. Além disso, o número de vacas no experimento foi pequeno, quando comparado com o experimento citado.
A taxa de prenhez nos grupos-controle (com e sem P4) foi de 40%. Os níveis de produção de TBA-RS no grupo-controle, com o protocolo de sincronização com P4 e sem P4, foram maiores no dia sete, em comparação com o dia zero (p<0.0002) no mesmo grupo, confirmando, assim, a ação da progesterona exógena e endógena, com a produção de EROs, já descrita por MÁRQUEZ et al. (1997). Consequentemente, ocorreu aumento proporcional na produção da enzima GSHpx, sugerindo um mecanismo compensatório, para inibir a ação dos EROs (p<0.0002).
A taxa de prenhez no grupo tratado com vitamina C foi de 40%. Neste grupo com vitamina C, os níveis de produção de TBA-RS foram menores no dia sete, quando comparados com os do dia zero (p<0.05), podendo sugerir um efeito antioxidante da vitamina C ou que os animais estavam no período do ciclo estral entre o dia sete e dezoito na primeira coleta, quando ocorre uma maior produção de progesterona endógena. Esse resultado coincidiu com a descrição de MÁRQUEZ et al. (1997), em que na presença de um corpo lúteo funcional e maduro são encontrados elevados níveis de progesterona, o que está diretamente relacionado com o aumento nos níveis de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS). Com o corpo lúteo maturo, existe um aumento significativo do estresse oxidativo, coincidindo com os altos níveis de progesterona (P4), quando comparado com o corpo lúteo em regressão, observando-se baixos níveis de TBA-RS e progesterona sérica (MÁRQUEZ et al., 1997). Mesmo com níveis de TBA-RS reduzidos no dia sete, os níveis de GSHpx não estavam maiores, em comparação com o dia zero. Apesar de esse aumento não ser significativo, pode, no entanto, sugerir um mecanismo compensatório contra a produção de EROs.
A associação das vitaminas C e E provocou um aumento na produção de TBA-RS no dia sete quando comparado com o dia zero, sugerindo efeito pró-oxidante da vitamina C e E. Neste caso, mais uma vez a enzima GSHpx teve uma ação compensatória para manter um balanço entre na produção de EROs. Entretanto, mesmo com o efeito pró-oxidante, a taxa de prenhez não foi diferente quando comparada com os grupos-controle e tratados com vitamina C e vitamina C e E, ficando em 40%. Elevadas doses de vitaminas antioxidantes podem causar efeitos deletérios no organismo animal. Por exemplo, é possível o ascorbato (vitamina C) agir como um pró-oxidante, acarretando a produção do radical hidroxila, que é altamente reativo, vindo a causar danos oxidativos à membrana celular.
No grupo tratado com vitamina E os níveis de TBA-RS e GSHpx foram maiores no dia sete, quando comparados com os do dia zero, demonstrando, assim, o efeito compensatório dessa enzima à produção de EROs. A taxa de prenhez do grupo com vitamina E foi de 100%, demonstrando a eficiência da associação dessa vitamina ao protocolo (p<0.05). A utilização da vitamina E como fonte antioxidante resultou em uma maior taxa de prenhez. Trata-se de dados que estão de acordo com resultados previamente publicados por LAFLAMME & HIDIROGLOU (1991) e RICHARDSON et al. (2008),  quando foi observado aumento significativo na taxa de prehez em novilhas e vacas suplementadas com vitamina E.
O mecanismo de interação entre vitaminas antioxidantes e redução em perdas embrionárias ainda é desconhecido. No entanto, associações entre vitamina E e saúde uterina têm sido observadas. Tais resultados são congruentes com os relatados por EVANS & BISHOP (1922), que administraram vitamina E em ratas e observaram redução em perdas embrionárias e absorção fetal.  Os achados deste experimento suportam a hipótese de associação inibitória das vitaminas antioxidantes com os níveis de peroxidação libídica. Conclui-se, assim, que a associação de vitamina E ao protocolo de sincronização de estro com a utilização de P4 é benéfica para a obtenção de bons resultados reprodutivos. Sugere-se a realização de futuros experimentos com um maior número de animais para melhor avaliação desses resultados.

AGRADECIMENTOS

Aos proprietários da Agropecuária Zanella, Sr. Ipenor Zanella e Sra. Nair Zuleika Zanella, por disponibilizarem os animais para este estudo.

REFERÊNCIAS

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Protocolado em: 30 abr. 2008. Aceito em: 23 nov. 2009.