Caprinos e ovinos apresentam uma
diversidade de ectoparasitos que podem resultar perdas consideráveis na
produtividade desses animais. Visitaram-se quinze assentamentos de
reforma agrária, com o objetivo de identificar ectoparasitos de
caprinos e ovinos, procedendo-se à realização de raspados, exames
diretos e coletas de exsudato do pavilhão auricular. Dos 494 caprinos
examinados, 89,87% apresentaram ectoparasitos, e dos 232 ovinos,
76,72%. Os artrópodes identificados em caprinos foram: Bovicola caprae (80,76%), Rhipicephalus microplus (1,01%), larvas de Cochliomyia hominivorax (0,6%), Psoroptes cuniculi (0,4%), além de Ctenocephalides felis (3,23%), Amblyomma parvum (1,01%) e Linognathus stenopsis (0,2%), sendo pela primeira vez descritos no Nordeste brasileiro. Identificaram-se, também, parasitismo misto de B. caprae com R. microplus (0,46%) e P. cuniculi com B. caprae (0,23%). Em ovinos, identificaram-se B. ovis (74,5%), R. microplus (0,86%), larvas de C. hominivorax (0,43%) e A. parvum (0,43%), registrados pela primeira vez, nessa espécie, no Nordeste do Brasil, além da associação de B. ovis com R. microplus
(0,56%). No que concerne ao sexo e à idade, não houve associação
(P>0,05). Torna-se importante o desenvolvimento de estudos para
avaliar a importância desses ectaparasitas como fator limitante à
produção animal.
PALAVRAS-CHAVES: Caprinos, ectoparasito, ovinos.
Goats and sheeps present an
ectoparasite diversity that may result in considerable losses in these
animals productivity. Fifteen agrarian reform settlements were visited,
with the purpose of identifying ectoparasites in goats and sheeps, in
which scraping, direct exams, and auricle exsudate collections were
carried out. From the 494 examined goats, 89.87% had ectoparasites, as
well as 232 sheeps, 76.72%. The arthropods identified in the goats
were:
Bovicola caprae (80.76%),
Rhipicephalus microplus (1.01%),
Cochliomyia hominivorax larvae (0.6%),
Psoroptes cuniculi (0.4%), and
Ctenocephalides felis (3.23%),
Amblyomma parvum (1.01%) and
Linognathus stenopsis (0.2%) which were described for the first time in Brazilian northeast. Mixed parasitism of
B. caprae with
R. microplus (0.46%) and
P. cuniculi with
B. caprae (0.23%) was also identified. In sheeps,
B. ovis (74.5%),
R. microplus (0.86%),
C. hominivorax larvae (0.43%) and
A. parvum (0.43%) were the ones registered for the first time, in this species, in Brazilian northeast, besides the association of
B. ovis with
R. microplus
(0.56%). There was no association between gender and age (P>0.05).
The development of studies to evaluate the ectoparasite importance as a
limiting factor to animal production becomes important.
KEY WORDS: Goats, ectoparasite, sheeps.
INTRODUÇÃO
O Nordeste brasileiro concentra 90% e quase 40% do plantel nacional de
caprinos e ovinos, respectivamente. A exploração desses animais, apesar
de ser desenvolvida de forma extensiva, destaca-se como atividades
agropecuárias alternativas na produção de carne, leite, produtos de
elevado valor biológico, na comercialização de animais vivos, pele e de
esterco. Esses segmentos estão predispostos a doenças de origens
diversas, destacando-se as parasitárias, as quais ocorrem durante todo
o ano e acarretam baixa produtividade nos rebanhos do Nordeste
(CAMPELLO, 2005).
No entanto, é possível perceber o potencial de crescimento desses
rebanhos e sua importância socioeconômica, dadas as diversas
tecnologias que surgiram. Trata-se de tecnologias não totalmente
adaptadas e utilizadas pela maioria dos pequenos produtores, pelas
dificuldades de acessá-las, em virtude da sua pouca capacidade de
investimento. Por essa razão, os animais são criados de maneira
informal, isolados uns dos outros, com profunda desarticulação entre os
diferentes segmentos da cadeia produtiva, abate em idades avançadas e
em precárias condições sanitárias (LÔBO, 2005).
Dentre as ectoparasitoses causadas por ácaros e insetos, as mais
importantes a cometer os caprinos e ovinos são a pediculose, a sarna e
a miíases. A pediculose causada por piolhos mastigadores é a mais
frequente. Apesar dos progressos tecnológicos para seu controle, a
pediculose tem aumentado o risco de comprometimento da qualidade do
couro, pela intensa descamação da pele e possibilidade de parasitismo
misto, pelos tipos hematófagos (SANTOS
et al., 2006c).
A maioria das notificações sobre ectoparasitos em animais de interesse
na medicina veterinária é tratada de maneira superficial pelos
pesquisadores, com poucas referências sobre a biologia e importância
econômica na industria animal, além de estarem primariamente mapeadas
nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. No Nordeste, os primeiros estudos
envolvendo ectoparasitos de pequenos ruminantes foram realizados em
Pernambuco e Bahia (TORRES, 1945), posteriormente no Ceará (COSTA &
VIEIRA, 1984), na Paraíba (SANTOS & FACCINI, 1996a), no Piauí
(FACCINI & PADILHA, 1980) e no Maranhão (BRITO
et al., 2005).
Em virtude da escassa literatura específica sobre a ocorrência desse
tipo de fauna parasitária nos caprinos e ovinos do Rio Grande do Norte,
desenvolveu-se o presente trabalho para determinar a ocorrência dos
ectoparasitos, identificando as principais espécies de artrópodes
parasitos que afetam a saúde dos caprinos e ovinos criados nas
condições do município de Mossoró.
MATERIAL E MÉTODOS
Durante o período de agosto de 2005 a novembro de 2006, foram
realizadas coletas mensais em quinze (37,5%) dos quarenta assentamentos
de reforma agrária cadastrados, procedentes do município de Mossoró,
estado do Rio Grande do Norte. Em todos havia rebanhos de caprinos e
ovinos, sem padrão racial definido, em regime de criação extensivo, com
número de animais por assentamento variado de acordo com o seu tamanho
e sem haver nenhuma suspeita prévia da ocorrência de alguma espécie de
ectoparasito.
Foram inspecionados 494 caprinos e 232 ovinos para pesquisa dos
ectoparasitos, procedendo-se a observações manuais de 10% dos animais,
para cada espécie, separando-os por sexo e por idade (avaliados pelo
exame da arcada dentária): fêmea adulta (> 1 ano), macho adulto
(> 1 ano) e jovem (< 1 ano). Cada animal foi observado uma única
vez, sem retorno aos locais observados.
Realizaram-se as coletas de acordo com o tipo de ectoparasito, através
de raspados, exame direto da pele e swabs do pavilhão auricular. Os
espécimes coletados por inspeção manual foram acondicionados em frascos
individuais, por hospedeiro amostrado, contendo álcool a 70°GL como
líquido conservador. Acondicionaram-se os raspados entre lâminas e os
swabs feitos com contonetes, dentro de pequenos sacos devidamente
separados e identificados.
Realizou-se a identificação no Laboratório de Parasitologia Animal da
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), onde os carrapatos
foram examinados em estereomicroscópio e identificados segundo ARAGÃO
& FONSECA (1961) e BARROS-BATTESTI
et al.
(2006). Montaram-se os piolhos entre lâminas e lamínulas, sendo
examinados em microscópio óptico e identificados conforme WALL &
SHEARER (1997). Também as pulgas foram montadas diferidas, conforme
BICHO & RIBEIRO (1998) e LINARDI & GUIMARÃES (2000). Para a
montagem e identificação dos ácaros utilizou-se metodologia proposta
por GUIMARÃES
et al. (2001).
Examinaram-se as larvas de moscas em estereomicroscópio, sendo
diferidas pela morfologia das placas peritremáticas e espiráculos
respiratórios segundo GUIMARÃES & PAPAVERO (1999) e GUIMARÃES
et al. (2001).
No período citado os dados meteorológicos obtidos registraram
temperatura mais alta no mês de janeiro (36,0°C) de 2006 e mais baixa
em julho (21,3°C) do mesmo ano. Em relação à precipitação pluvial,
foram registradas chuvas escassas ou inexistentes, com predomínio dos
meses “secos”, apresentando precipitação total de 916,4 mm3..
Avaliaram-se os dados, quando necessário, pelo teste de qui-quadrado com nível de significância de 5%.
RESULTADOS
Dos 494 caprinos examinados, 444 (89,87%) tiveram infestação por
ectoparasitos, e dos 232 ovinos, 178 (76,72%) animais apresentaram
positividade. Quando se comparou a infestação entre caprinos e ovinos,
a ocorrência independeu das espécies pesquisadas (P>0,05).
Os espécimes coletados nos caprinos foram: larvas causadoras de miíases da espécie
Cochliomyia hominivorax; piolhos mastigadores
Bovicola caprae e hematófagos da espécie
Linognathus stenopsis; carrapatos
Rhipicephalus microplus e
Amblyomma parvum; ácaros da espécie
Psoroptes cuniculi e pulgas
Ctenocephalides felis, somente nos animais jovens (
Figura 1). Nos ovinos, coletaram-se larvas de moscas da espécie
C. hominivorax; piolhos mastigadores
B. ovis e carrapatos
R. microplus e
A. parvum (
Tabela 1).
Dos espécimes coletados em caprinos e ovinos, constatou-se uma diferença significativa na ocorrência dos piolhos mastigadores
B. caprae e
B. ovis entre as duas espécies animais, sendo os caprinos significativamente mais infestados (P<0,05) (
Tabela 1). Houve associação parasitária em caprinos de ácaro com
Phthiraptera (0,23%) e de ixodídeo com
Phthiraptera (0,46%). Entre os ovinos, a única associação encontrada foi de
Phthiraptera com ixodídeo (0,56%) (
Tabela 2).
Distribuição corpórea dos ectoparasitos: o piolho B. ovis, em todas as
regiões pilosas do corpo, com uma concentração maior no glúteo; B.
caprae, em todas as regiões com pelos do animal, concentrando-se no
pescoço e principalmente na lateral dos membros posteriores; P.
cuniculi, dentro do conduto auditivo; larvas de C. hominivorax, em
poucas quantidades, no úbere, vulva e região caudal, porém em grandes
proporções na face de um caprino, em que parte do tecido já havia sido
destruída; R. microplus, nas bordas da face interna e externa da
orelha, lateral da face, úbere e testículo.
A. parvum foi encontrado na face e no pavilhão auricular e o
L. stenopsis na região ventral e escapular. E o
C. felis na região ventral de caprinos jovens.
Em relação à sintomatologia clínica, naqueles que apresentavam piolho
mastigador, observaram-se um prurido ocasional e pelos sem brilho,
grossos e quebradiços, com áreas de alopecia. No caso das pulgas, os
animais mostravam-se com intenso prurido, inquietos e apáticos; nos
animais com miíase, foram verificadas apatia, anorexia e inflamação do
local acometido. Em relação aos carrapatos, aos ácaros e aos piolhos
hematófagos, aparentemente não se observou nenhum sintoma.
DISCUSSÃO
O ectoparasitismo tem sido relatado em diversas regiões do mundo. No Brasil, é citado desde a região Sul (BRANCO
et al., 2006) até o Nordeste do país (FACCINI & PADILHA, 1980; COSTA & VIEIRA, 1984; SANTOS & FACCINI, 1996a; BRITO
et al., 2005).
A ocorrência de ectoparasitos, no município de Mossoró, em caprinos
(89,87%), foi maior do que nos ovinos (76,72%), o que está de acordo
com BRITO
et al. (2005), que,
ao examinarem rebanhos na microrregião do Alto do Mearim e Grajaú,
Maranhão, observaram infestações em 54,3% dos caprinos e 17% nos
ovinos. As infestações por ectoparasitos nos ruminantes domésticos e as
consequentes perdas na produtividade dos animais têm sido reportadas
com uma maior frequência no semiárido nordestino, dadas as criações em
sistema predominantemente rústico e as condições de manejo precárias
(SANTOS
et al., 2006c).
Na distribuição de ectoparasitos em relação ao sexo do hospedeiro, de
acordo com o teste do qui-quadrado, não houve diferença estatística
entre os caprinos e ovinos, disconcordando dos resultados de SANTOS
et al.
(2006), que, pesquisando ectoparasitos em caprinos no sertão paraibano,
demonstraram que existe uma prevalência de ácaros nos caprinos machos
(84%) em relação às fêmeas (66%). Porém, resultados diferentes foram
obtidos em estudos realizados no estado da Paraíba, com 278 caprinos,
sendo observada uma predominância nas fêmeas (SANTOS & FACCINI,
1996), e no estado do Ceará (COSTA & VIEIRA, 1984), prevalência
maior nos reprodutores (91,7%).
Quando analisada a idade dos animais parasitados, não houve associação,
concordando com COSTA & VIEIRA (1984), que atribuem manejo
inadequado como a principal causa de não haver diferença estatística
entre jovens e adultos.
Em relação à espécie de ectoparasito encontrado, observaram-se, nos caprinos, parasitismos pelos piolhos mastigadores
B. caprae,
o que está em consonância com os achados de COSTA & VIEIRA (1984)
no Ceará, SANTOS & FACCINI (1996a) na Paraíba, CARDOSO &
OLIVEIRA (1993) em Porto Alegre, SANTOS
et al. (2006a) no sertão paraibano, SANTOS
et al. (2006c) na Paraíba e SANTOS
et al. (2006b) no Rio de Janeiro. Em ovinos, a espécie
B. ovis foi a mais prevalente. Trata-se de resultado que está de acordo com os relatados por BRANCO
et al. (2006) no Rio Grande do Sul e MADEIRA
et al. (2000) em São Paulo, que em estudos com ovinos encontraram a mesma espécie.
Ao exame clínico dos caprinos e ovinos com pediculose por
B. caprae e
B. ovis em Mossoró, foi observado principalmente prurido ocasional. Esse resultado está em consonância com o descrito por SANTOS
et al. (2006b), que relataram inquietação, prurido, anorexia, alopecia e escoriações.
L. stenopsis foi identificado
em caprinos jovens, como relatado também por FREIRE (1967), que
identificou esse ectoparasito em caprinos no Rio Grande do Sul. Em caso
de altas infestações, esses piolhos hematófagos podem causar quadros
anêmicos, edema de membros, sobretudo em cabritos, podendo levá-los a
óbito (MACIEL
et al., 2006), sintomas esses não observados nesses estudos.
Larvas de
C. hominivorax
ocorreram tanto nos caprinos como nos ovinos, tendo como principais
fatores predisponentes ferimentos simples, que variam desde arranhões
até castrações, marcações e descornas (GUIMARÃES
et al., 2001), servindo como porta de entrada para postura dos ovos, com posterior eclosão e instalação das miíases (BRITO
et al.,
2005). No Ceará, os rebanhos caprinos e ovinos também apresentaram
miíases causadas por essa espécie de mosca, estando relacionadas
principalmente à época chuvosa do ano (COSTA & VIEIRA, 1984). Em
São Paulo, foi observado como o ectoparasito mais frequente, atingindo
72,5% do rebanho ovino, tendo a tosa como principal fator predisponente
(MADEIRA
et al., 2000).
Em relação às pulgas, a espécie
C. felis
foi observada em dezesseis caprinos jovens (3,6%). O conhecimento desse
fato é extremamente importante para a formulação de programas adequados
de manejo e controle. Por serem hematófagas, eles causam ação
irritativa, inflamatória e espoliativa, além de desempenharem o papel
na veiculação de doenças ao homem ou na manutenção de epizootias entre
os animais (LINARDI & GUIMARÃES, 2000).
O ácaro relatado no município de Mossoró em caprinos foi o
P. cuniculi,
concordando com os achados no Ceará, onde se verificou a presença desse
ácaro em cabras (36,2%), reprodutores caprinos (41,7%) e cabritos
(34,2%) (COSTA & VIEIRA, 1984).
Nenhum dos animais positivos para
P. cuniculi,
em Mossoró, evidenciou sintomatologia clínica, fato esse coincidente
com as observações de CARDOSO & OLIVEIRA (1993) na grande Porto
Alegre, RS, divergindo, porém, de SANTOS
et al. (2000b), que verificaram quadros de otite clínica em caprinos (15%) na microrregião de Patos, Paraíba.
O carrapato
R. microplus foi encontrado nos caprinos e ovinos, o que está de acordo com o relatado por BRITO
et al.
(2005), em caprinos (37,71%) e ovinos (68,96%) no estado do Maranhão.
Entretanto, GUERRA & BRITO (2004) não encontraram nenhuma espécie
de carrapato parasitando ovinos na ilha de São Luis, Maranhão, entre
1.372 exemplares adultos de ectoparasitos coletados de sete espécies de
animais domésticos diferentes.
Outro relato de suma importância foi a observação de
A. parvum
em caprinos e ovinos, sendo descrito pela primeira vez nestes
hosdepeiros na região do Nordeste. É uma espécie comum de vários
animais, incluindo cavalo, boi, cão, preguiça, tamanduá, mocó e até no
homem (GUIMARÃES
et al., 2001), o que justifica estudos mais detalhados desse ectoparasito.
Foi observada dupla associação parasitária em caprinos e ovinos. Em
consonância com esses resultados, no estado do Maranhão relatou-se
dupla associação somente nos caprinos (BRITO
et al., 2005) e, em São Paulo, tripla associação em ovinos (larva de
C. hominivorax + larvas de
Dermatobia +
R. microplus-12,8%) (MADEIRA
et al., 2000).
CONCLUSÃO
As principais espécies de ectoparasitos identificados nos pequenos
ruminantes, criados nas condições do município de Mossoró, foram
Bovicola caprae,
Rhipicephalus microplus, larvas de
Cochliomyia hominivorax, Psoroptes cuniculi, Ctenocephalides felis, Amblyomma parvum e
Linognathus stenopsis em caprinos e
B. ovis,
R. microplus, larvas de
C. hominivorax e
A. parvum em ovinos.
AGRADECIMENTOS
À Associação de Caprinos e Ovinos de Mossoró e Região Oeste (ASCCOM) e
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER, RN).
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