EFEITO DA SALINOMICINA
NA PREVENÇÃO DA ACIDOSE LÁCTICA RUMINAL
EXPERIMENTAL EM OVINOS
Adaucides
Câmara1, José Augusto Bastos Afonso2, Carla Lopes
Mendonça2, Aerlem Cynnara Silva Vieira3
RESUMO
Este
trabalho teve por objetivo estudar a eficácia da salinomicina na
acidose
láctica induzida em ovinos, analisando os seus efeitos sobre o quadro
clínico e
as características físico-químicas do fluido ruminal. Para tal, foram
utilizados 14 animais ovinos da raça Santa Inês, com peso médio de
--------------------------
PALAVRAS-CHAVE: Distúrbios fermentativos; ionóforos; pequenos ruminantes.
SALINOMYCIN
EFFECT ON THE PREVENTION OF RUMINAL LACTIC ACIDOSIS IN SHEEP
ABSTRACT
The objective of this work
was to study the effectiveness of salinomycin against the lactic
acidosis
induced in sheep, by analyzing its effects on the clinical situation,
and the
physico-chemical characteristics of the ruminal fluid. We used 14
crossbred
Santa Ines sheep, weighing 30 Kg. They were rumen-fistulated and
subdivided
into two groups of 7 animals each: the control group and the group that
received the drug in the diet at a concentration of 30 mg/Kg of food
for 42
days. We established the clinical and laboratory values of the ruminal
samples
during this phase of the experiment. At the end of the adaptation
period, both
groups were challenged in a process of sucrose-induced lactic acidosis,
at a
dose of 10 g/Kg body weight. The clinical and laboratory observations
were
accomplished at intervals of 4h, 8h, 12h, 16h, 24h, 32h e 48h
post-induction
(PI). Control and treated sheep showed clinical signs of ruminal
acidosis
within eight hours after induction, associated with laboratory
alterations with
varied intensity between the studied groups. In the animals that
received
salinomycin, the magnitude of the process was minimized and the time of
clinical recovery was shortened in relation to the control group.
--------------------------
KEYWORDS: fermentation disorder; ionophores; small ruminants.
INTRODUÇÃO
A
ovinocultura nacional vem
apresentando, nos últimos anos, destaque devido ao crescimento
expressivo no
meio agropecuário, onde grandes investimentos estão sendo aplicados. O
rebanho
ovino no Brasil é estimado em 17.662.201 de cabeças, das quais
10.110.352
encontram-se no Nordeste (IBGE, 2012). O impacto econômico e social que
esse
tipo de atividade representa para a região é de grande relevância,
principalmente na produção de carne.
Apesar desse incremento na ovinocultura, existem
alguns fatores que são considerados limitantes na sua exploração, como
inadequações no manejo, melhoramento, sanidade, nutrição, entre outros.
No que
diz respeito à nutrição, a necessidade de um modelo de produção
intensivo, com
o intuito de se obter em curto prazo metas excessivas de ganho de peso,
tem
gerado modificações nos hábitos alimentares que podem acarretar o
surgimento de
distúrbios digestivos e metabólicos relacionados aos diferentes tipos
de dietas
empregadas. Dentre eles, destaca-se a acidose lática ruminal, por ser
um
entrave na criação de ovinos, limitando o crescimento, devido às perdas
econômicas provocadas (MACKIE et al., 1978; BARROS et al., 1999; LEAN
et al.,
2007).
A acidose láctica é uma doença metabólica,
cuja evolução, na maioria dos casos, é aguda, causada pela ingestão
súbita de
grãos ou outros alimentos ricos em carboidratos altamente fermentáveis,
em
grandes quantidades, caracteriza-se por perda do apetite, depressão e
morte. É
também conhecida por sobrecarga ruminal, indigestão aguda, compactação
aguda do
rúmen ou indigestão por carboidratos (AFONSO et al., 2000; MIRANDA NETO
et al.,
2005; WALKER, 2006).
Vários
são os trabalhos
publicados enfocando as práticas de medidas preventivas para o controle
da
acidose ruminal, desde o fornecimento adequado da dieta, até o uso de
tamponantes e antibióticos, incluindo nessa categoria os ionóforos;
contudo, há
poucos relatos do seu emprego em animais com esse objetivo (McGUFFEY et
al.,
2001; AFONSO et al., 2002a; MIRANDA NETO et al., 2011). Portanto, o
propósito
deste trabalho foi avaliar clínica e laboratorialmente a eficácia do
emprego da
salinomicina na prevenção da acidose lática ruminal induzida em ovinos.
Os
ovinos foram subdivididos
em dois grupos de sete animais; um grupo controle e o outro que recebeu
a
salinomicina[1]
administrada diretamente no
rúmen, através da fístula, na dose diária de 30 mg/kg da dieta, por
animal, no
decorrer de 42 dias (MERCHEN & BERGER, 1985). Após a recuperação
cirúrgica
dos animais, dois dias antes da indução, avaliaram-se os parâmetros
clínicos e
coletou-se o fluido ruminal. O exame físico e a colheita das amostras
para os
exames laboratoriais foram realizados, com a finalidade de se
estabelecer os
valores médios do padrão fisiológico (momento controle – 0h) para as
variáveis
estudadas. Após o período inicial de adaptação, a aplicação do
antibiótico foi
mantida e a acidose foi induzida fornecendo-se como substrato 10g de
sacarose/kg de peso corpóreo, através da fístula ruminal, às oito horas
da
manhã, antes da alimentação matinal (DELAK & ADAMIC, 1959). As
observações
clínicas no decorrer do experimento e a colheita das amostras do fluido
ruminal
foram efetuadas em intervalos de 4h, 8h, 12h, 16h, 24h, 32h, e 48h
pós-indução
(PI), a fim de que fosse observado o surgimento das alterações clínicas
e
laboratoriais indicativas de acidose lática, de acordo com as
recomendações de
KEZAR & CHURCH (1979) e RADOSTITS et al. (2007).
As
amostras do conteúdo
ruminal foram obtidas por meio de uma bomba de sucção a vácuo, acoplada
a uma
sonda plástica flexível inserida através da cânula ruminal.
Aproximadamente 200
mL de líquido ruminal foram colhidos em cada amostra, em frascos de
vidro, para
serem processadas no laboratório. O início da realização das provas não
ultrapassou o tempo máximo de 15 minutos após a colheita.
A
análise dos aspectos
físicos cor, odor, consistência, pH, bem como as provas de redução do
azul de
metileno (PRAM), acidez titulável (ATT) e o teor de cloretos foram
realizados
de acordo com as técnicas descritas por VIEIRA et al. (2007).
A
observação da porcentagem
de vivos, densidade e motilidade dos infusórios além da avaliação da
flora
bacteriana foram realizadas pelo exame direto em lâmina, empregando-se
o modelo
proposto por DIRKSEN (1993). Na contagem dos infusórios, utilizou-se a
técnica
recomendada por DEHORITY (1977).
Os
valores obtidos foram
analisados ao longo dos momentos, comparando-se os efeitos dos sete
momentos PI
com o momento controle e entre grupos, empregando-se nas variáveis –
frequência
cardíaca, frequência respiratória, temperatura retal e teor de cloretos
do
fluido ruminal – o método estatístico da análise de variância, com realização dos contrastes entre médias
pelo método de Tukey e a estatística F calculada considerada
significativa a
5%. Para a análise das variáveis porcentagem de protozoários
vivos,
contagem, densidade, motilidade, pH, prova de redução do azul de
metileno e
acidez total titulável do fluido ruminal, obteve-se a mediana como
medida de
tendência central e utilizou-se o método analítico não paramétrico de
Friedman
para amostras dependentes e o método de Mann Whitney para amostras
independentes, usando o X2 e calculando-se a dms para alfa
igual a
0,05, com o intuito de verificar se existiam diferenças significativas
entre os
valores (SAMPAIO, 2010).
RESULTADOS
As
alterações da cor, odor e
consistência do suco ruminal dos ovinos com acidose ruminal
iniciaram-se a
partir de 4h PI com maior intensidade 8h PI.
A
cor modificou-se de
verde-oliva ou castanha para amarela leitosa, mantendo-se alterada até
as 16
PI. A partir desse momento, o fluido começou a voltar à coloração
normal,
restabelecendo-se no grupo controle às 32h PI; todavia, no grupo da
salinomicina,
o tempo de recuperação dessa variável foi mais precoce, tendo seu
retorno às 24
horas PI na maior parte dos animais.
O
odor aromático tornou-se
adocicado, chegando a ácido, entre os momentos 8h e 16h PI no grupo
salinomicina; contudo, no momento 32h PI ainda encontrava-se alterado
na
maioria dos animais do grupo controle e apenas 48h PI a recuperação foi
praticamente total. Vale salientar que em apenas um animal do grupo
controle,
no momento 16h PI, foi detectado odor pútrido.
A
consistência modificou sua
característica tornando-se aquosa, entre os momentos 8h e 16h PI.
Entretanto, o
restabelecimento foi observado a partir de 24horas PI em ambos os
grupos
analisados.
A
indução provocou nos grupos
controle e da salinomicina uma redução progressiva nos valores do pH do
fluido
ruminal, de maneira mais expressiva às 8 horas PI, obtendo-se valores
de 6,06 e
6,07, respectivamente, havendo diferença significativa (P<0,05) em
relação
ao momento controle (0 hora). Com a evolução do processo fermentativo,
verificou-se
que os índices de pH elevaram-se, alcançando, no último momento de
observação,
valores próximos aos da normalidade. Há de se relatar que não existiram
diferenças significativas (P>0,05) entre os grupos nos diferentes
momentos
de observação. Todavia, constatou-se que os animais do grupo da
salinomicina
tiveram recuperação mais precoce nos momentos seguintes de observação,
em
relação aos do grupo controle (Figura 2).
Nos
ovinos estudados, a
acidose ruminal causou alteração nos valores da acidez titulável do
fluido
ruminal, em relação aos valores de 0h e, durante essa manifestação
clínica,
ocorreu elevação significativa (P<0,05) desta variável a partir das
4h PI,
alcançando o valor máximo de 48°UC às 4h PI no grupo da salinomicina e
às 8h PI
no grupo controle (Figura 3). Não foram verificadas diferenças
significativas
(P>0,05) entre os grupos para esta variável ao longo dos momentos
analisados.
O
teor de cloreto no fluido
ruminal dos ovinos com acidose láctica apresentou redução dos seus
valores ao
longo do tempo de observação. Constataram-se os menores valores de
17,78 e
19,08 mEq/L 12h PI para os grupos da salinomicina e controle,
respectivamente.
Não houve diferença significativa (P>0,05) entre os grupos nos
diferentes
momentos de observação. Ao final ocorreu o restabelecimento desta
variável aos
valores iniciais em ambos os grupos.
Os
valores obtidos na PRAM
demonstraram que, após a indução da acidose láctica ruminal, ocorreu
elevação
no tempo de redução da prova, observando-se que não foi significativa
no grupo
da salinomicina, às 8h PI, e no grupo controle, às 16h PI, quando
comparados
com o momento controle (0h). Entretanto, observou-se que ocorreu uma
recuperação da atividade da flora bacteriana mais precoce nos animais
que
receberam a salinomicina em relação ao controle a partir das 12 horas
PI.
Após
a indução da acidose,
constatou-se haver alteração quantitativa na contagem de infusórios no
fluido
ruminal dos ovinos. Verificou-se a ocorrência de um declínio
significativo
(P<0,05) no número de infusórios logo nos primeiros momentos, às 4h
PI, no
grupo controle, que se manteve em todos os momentos de observação,
quando
comparado ao momento inicial (0h); já o grupo da salinomicina
apresentou
alterações significativas (P<0,05) entre 12h e 16h PI, em relação ao
momento
inicial. Quando comparados os dois grupos nos diferentes momentos de
observação, não houve diferença significativa (P>0,05). Em todos os
animais,
antes da indução, existiu uma maior prevalência de pequenos infusórios,
em
torno de 60%, e o restante era composto pelos médios e grandes. Vale
ressaltar
que, durante a fase da acidose, surgiram modificações na população dos
infusórios, constatando-se predomínio dos pequenos (80%) em relação aos
médios
e grandes, que se mostraram mais sensíveis às alterações ocorridas no
ambiente
ruminal.
Os resultados observados na porcentagem de infusórios vivos
foram de queda
mais acentuada nos momentos das 8h e 12h PI, quando não foi observado
nos
grupos nenhum infusório viável, apresentando alterações significativas
(P<0,05), em relação ao momento controle 0h em todos os momentos de
observação. Não foi constatada diferença significativa (P>0,05)
entre os
grupos nos diferentes momentos de observação. Entretanto, verificou-se
restabelecimento
gradual dessa característica no fluido ruminal a partir das 16h PI no
grupo da
salinomicina em relação ao grupo controle; neste segundo grupo os
infusórios
tiveram restabelecimento gradual a partir das 48h PI.
Após
a indução da acidose,
verificou-se diminuição significativa (P<0,05) na densidade da
microfauna,
que atingiu valores mínimos a partir das 8h PI até o último momento de
observação no grupo controle e das 8h até 12h no grupo da salinomicina.
Vale
ressaltar que não houve ausência dos infusórios, que ficaram apenas
escassos,
com a densidade considerada como um. Não houve diferença significativa
(P>0,05) entre os grupos nos diferentes momentos de observação.
Com
o início do distúrbio
fermentativo constatou-se uma diminuição da motilidade, com diferenças
significativas (P<0,05) em todos os momentos do grupo controle,
quando
comparado ao momento 0h; todavia, no grupo da salinomicina houve
diferença
significativa (P<0,05) apenas no momento 8h PI. Não foi constatada
diferença
(P>0,05) entre os grupos ao longo dos momentos.
A indução, apesar de ter provocado um quadro clínico de
acidose branda,
modificou o padrão morfo-tintorial da população bacteriana do fluído
ruminal
nos animais dos grupos estudados, sendo que a alteração mais evidente
no grupo
da salinomicina foi o predomínio de bactérias Gram-positivas (60-70%)
no
período das 8h PI, quando observaram-se estruturas de cocos e
cocobacilos,
enquanto no grupo dos animais controle essa manifestação foi mais
intensa e
duradoura, observada nos momentos
Em
relação ao apetite, o
grupo controle apresentou maior número de animais com apetite diminuído
e/ou
ausente de 8h PI até 32h PI, enquanto no grupo salinomicina, o
comprometimento
do apetite só ocorreu entre os momentos 12h e 32h PI e em menor número
de
animais. Isso demonstra o aspecto favorável do uso da salinomicina no
grupo
tratado frente aos efeitos deletérios da acidose láctica quando
comparado aos
animais que não receberam o ionóforo, concordando com os relatos de
KEZAR &
CHURCH (1979), AFONSO et al. (2002b), MIRANDA NETO et al. (2005) e LEAN
et al.
(2007), que correlacionam a recuperação da ingestão normal de alimentos
com um
ambiente ruminal favorável, em que o pH seja maior que seis, não haja
ácido
lático em níveis detectáveis ou sua concentração seja mínima, e que as
concentrações dos ácidos graxos voláteis (AGV) apresentem valores acima
de
50mM.
Quanto
ao tempo de
recuperação clínica, os animais do grupo do ionóforo iniciaram o
retorno à
normalidade de forma mais precoce, quando comparado ao grupo controle,
que
necessitou de um intervalo de tempo maior para o restabelecimento,
semelhante
às observações de BEED & FARLIN (1977), AFONSO et al. (2000) e
MIRANDA NETO
et al. (2011), exceto quanto ao intervalo de tempo no surgimento das
manifestações clínicas, em relação aos picos máximos dos índices baixos
de pH e
lactato ruminal após a indução, provavelmente devido ao modelo
experimental e
variações da espécie utilizada, além do tipo de indução diferente.
As
modificações das
características físicas do fluido ruminal observadas foram marcantes
durante o
período de acidose ruminal nos ovinos, como a cor, tornando-se pouco
leitosa a
leitosa, a consistência aquosa e o odor de pouco adocicado a ácido.
Esses
achados condizem com os encontrados por alguns autores que relacionam
as
alterações com a diminuição do pH no rúmen, causada pela excessiva
elevação na
concentração do ácido lático e AGV, que aumenta a osmolaridade do meio,
tornando-o hipertônico em relação ao plasma, provocando maior fluxo de
água dos
compartimentos intra e extracelulares para o interior do trato
digestivo,
principalmente ao rúmen (JUHÁSZ & SZEGEDI, 1968; DOUGHERTY et al.,
1975 e
BRAUN et al., 2010). Essas mudanças iniciaram-se a partir de 8h PI e
foram
semelhantes às manifestações observadas em caprinos e ovinos com
acidose
ruminal estudadas por HUBER (1971), CAO et al. (1987), LEAN et al.
(2007) e
ALMEIDA et al. (2008). O restabelecimento dessas características
acompanhou a recuperação
do pH aos valores anteriores à indução.
Quanto
ao declínio nos
valores do pH ruminal no início do processo, devido à administração da
sacarose
e sua rápida fermentação, há relatos, como os de JUHÁSZ & SZEGEDI
(1968),
OWENS et al. (1998) e BROSSARD et al. (2003), que atribuem esses
achados às
modificações da microflora ruminal, em que as bactérias Gram-negativas,
sensíveis à acidez do meio, são substituídas pelas Gram-positivas,
principalmente o S. bovis e o Lactobacillus sp., que
são as
principais produtoras do ácido lático, nas formas L(+) e D (-), o qual
é
considerado como um ácido forte, por possuir uma pKa muito
baixa.
Apesar
de não ter havido
diferença significativa entre os grupos, notou-se que o grupo da
salinomicina
teve recuperação mais precoce em relação ao grupo controle, fato também
relatado por NAGARAJA et al. (1981) e NAGARAJA et al., (1982), que, ao
usarem
lasalocida ou monensina na prevenção da acidose láctica, verificaram
uma
diminuição dos AGV’s, bem como do lactato D(-) e L(+), elevando o pH do
meio,
que foi o motivo para sua prevenção, justificando a eficácia pela ação
do
antibiótico sobre a população de bactérias Gram-positivas, produtoras
de ácido
lático, e o favorecimento da flora Gram-negativa (GOAD et al., 1998;
McGUFFEY
et al., 2001; GUO et al., 2010). Criando-se uma melhoria no ambiente
ruminal,
principalmente quanto ao pH, favorecendo dessa maneira o retorno do
apetite,
melhorou-se o tamponamento e a restauração da população microbiana,
facilitando
a recuperação clínica.
Os
valores da acidez total
apresentaram-se elevados nos animais induzidos, corroborando os achados
de
DIRKSEN (1993), que cita índices de
As
alterações no teor de
cloretos ocorreram já nos momentos iniciais, provavelmente, pelo
decréscimo do
pH no fluido ruminal, notado a partir da administração da sacarose.
Essa
diminuição foi verificada após 8h de indução, coincidindo com as
observações
dos trabalhos realizados por HUBER (1971), em ovinos, e por CAO et al.
(1987),
MIRANDA NETO et al. (2005) e MIRANDA NETO et al., 2011) em caprinos
induzidos a
ter acidose com diferentes substratos. Esses autores a ocorrência dessa
alteração
devido ao aumento do gradiente osmótico, que acarretou o sequestro de
líquido
da corrente sanguínea para o interior do rúmen, causando uma diluição
exacerbada do fluido ruminal e, com isso, reduziu a concentração desse
íon.
Entretanto, no decorrer do experimento, observou-se que a concentração
de
cloretos sofreu elevação, fato que provavelmente está relacionado com o
menor
volume de líquido em relação à matéria seca do conteúdo ruminal
daqueles
animais que tiveram sinais clínicos de diarréia e desidratação. Um
fator
complicador para essa ocorrência, segundo OWENS et al. (1998), é que a
alta
osmolaridade do fluido ruminal durante a acidose provoca também
hipertonicidade
do abomaso, tornando-o distendido, diminuindo o trânsito do bolo
alimentar e
dificultando a remoção do fluido e dos ácidos do rúmen. O refluxo do
conteúdo
abomasal, devido à sua inércia, foi citado por BRAUN et al. (1992) como
sendo a
causa do aumento nas concentrações de cloreto (>25mmol/l) no fluido
ruminal,
em 42% dos ovinos e caprinos diagnosticados com acidose ruminal aguda.
O
comprometimento da flora
ruminal, observado no tempo de redução da prova do azul de metileno, em
alguns
animais, durante a manifestação da acidose, foi semelhante aos
relatados por
BASAK et al. (1993) e QUIROZ-ROCHA & BOUDA (2000), que justificaram
essa
alteração devido à inativação da flora normal, que fica com metabolismo
comprometido, quando as condições do meio estão adversas. A restauração
do
ambiente ruminal nos ovinos foi mais uma vez determinante para que essa
variável retornasse aos valores normais estabelecidos inicialmente, de
forma
mais precoce no grupo da salinomicina. Uma condição que contribui para
esse
processo foi descrita por AFONSO et al. (2002b), em que o uso de
monensina
inibe a maioria das bactérias ruminais produtoras de lactato, mas não
as
bactérias que fermentam.
As
alterações na fauna
microbiana do fluido ruminal dos ovinos estudados com relação à
diminuição da
viabilidade, densidade, motilidade e contagem dos infusórios ocorreram
em momentos
distintos, com intensidade variada, mostrando um grau de recuperação
maior nos
animais do grupo da salinomicina. Essas alterações foram citadas por
AFONSO et
al. (2002b), que constataram, em trabalho realizado com ovinos, que a população de protozoários diminuiu
extensivamente com o aumento da acidez no rúmen, chegando a ocorrer
defaunação,
diferindo dos nossos achados em relação à intensidade do processo
fermentativo.
De acordo com HUNGATE et al. (1952), os protozoários perdem a sua
atividade
quando o pH cai para valores entre 5,5 e 5,0, desintegrando-se ou
sofrendo lise
no rúmen quando ocorre uma elevação da acidez do meio, e o pH alcança
valores
inferiores a 5,0. AHUJA et al. (1990) relataram, ainda, que o aumento
da
pressão osmótica no ambiente ruminal causa alterações na população de
protozoários. Ao final das observações, verificou-se que, em alguns dos
ovinos
que receberam a salinomicina, ocorreu o reaparecimento da fauna e o
restabelecimento de suas funções, o que condiz com as informações de
BASAK et
al. (1993), que relataram essa manifestação sincronizada com a melhoria
do pH
no rúmen.
Como
foi observada, a
modificação qualitativa no padrão morfotintorial da população
bacteriana
ocorreu devido à diminuição do pH. Com isso, a flora predominantemente
Gram-negativa foi parcialmente substituída, em alguns dos momentos, por
bactérias Gram-positivas, como relatado por OWENS et al. (1998) e
MIRANDA NETO
et al. (2005), que afirmaram que, com a evolução da enfermidade, há uma
alteração na população microbiana, caracterizada pelo rápido
crescimento das
bactérias produtoras de ácido láctico, que se acumula em quantidades
suficientes para reduzir o pH ruminal a valores bem críticos (pH <
5,0).
Nesse ambiente, a concentração e a atividade de muitas bactérias
fisiologicamente importantes são bastante reduzidas, provocando um
predomínio
das bactérias Gram positivas sobre as Gram negativas.
O
retorno à normalidade da
população microbiana no fluido ruminal ocorreu, de forma gradual com o
subsequente crescimento da flora Gram negativa, especialmente pequenos
cocos,
que prevaleceram no meio. Essas alterações manifestaram-se,
principalmente, de
forma mais antecipada, no grupo que recebeu o ionóforo e isso se deve
provavelmente ao fato de a salinomicina exercer um efeito inibitório
sobre as
bactérias Gram positivas, sendo que esse achado coincide com o
intervalo de
tempo em que a produção do ácido láctico diminuiu e o pH se elevou no
fluido
ruminal (NAGARAJA et al., 1982; NAGARAJA et al., 1985; AFONSO et al.,
2002b).
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