PARTICIPAÇÃO DOS Staphylococcus
spp NA ETIOLOGIA DAS MASTITES EM BOVINOS LEITEIROS NO ESTADO DE PERNAMBUCO
(BRASIL)
Rinaldo
Aparecido Mota1, Elizabeth Sampaio de Medeiros2, Marcos
Veiga dos Santos3, José Wilton Pinheiro Júnior1, Andrea
Paiva Botelho Lapenda Moura1, Luciana Cavalcanti Arruda Coutinho4
RESUMO
Objetivou-se
com este trabalho estimar a ocorrência de bactérias do gênero Staphylococcus na etiologia da mastite
bovina no estado de Pernambuco. Foram coletadas 1080 amostras de leite
procedentes de 15 propriedades situadas em municípios da Região Metropolitana
do Recife, Agreste e Zona da Mata do Estado de Pernambuco. Alíquotas de leite
foram semeadas em ágar base enriquecido com 5% de sangue ovino e incubadas a
37ºC, realizando-se leituras após 24, 48 e 72 horas. Para identificação
bacteriana foram observadas as características morfológicas das colônias além
das características morfotintorias à técnica do Gram. Foram realizadas provas
bioquímicas como produção de coagulase livre, DNase, catalase, provas de produção de acetoína, fermentação
da glicose (anaerobiose) e do manitol (aerobiose e anaerobiose). Das 1080
amostras analisadas, 740 (68,5%) foram positivas ao exame microbiológico e 340
(31,5%) foram negativas. Das amostras positivas, isolaram-se bactérias do
gênero Staphylococcus em 291 (39,3%),
das quais 170 (58,4%) foram classificadas como Staphylococcus coagulase negativa (SCN), 84 (28,9%) como Staphylococcus aureus (S.aureus) e 37(12,7%) como Staphylococcus coagulase positiva (SCP).
Os resultados obtidos neste estudo demonstram a elevada participação do gênero Staphylococcus na epidemiologia das
mastites em bovinos na região estudada e sugerem a necessidade da capacitação
de profissionais para a realização do controle e profilaxia adequados das
mastites contagiosas.
PALAVRAS
CHAVES: epidemiologia; glândula mamária; mastites; microbiologia.
PARTICIPATION OF Staphylococcus
spp IN THE ETIOLOGY OF MASTITIS IN DAIRY COWS IN THE STATE OF PERNAMBUCO
(BRAZIL)
ABSTRACT
The purpose of this study
was to quantify the occurrence of the bacteria Staphylococcus in the etiology of bovine mastitis in the state of
Pernambuco (Brazil). A total of 1,080 samples were collected from 15 farms
located in Zona de Mata, Agreste, and Metropolitan Recife Regions of the State
of Pernambuco. Milk samples were spread
on an agar base enriched with 5% sheep’s blood and incubated at 37ºC, with
readings at 24, 48 and 72 hours. The morphological characteristics of the
colonies were used to identify the bacteria, as well as the morphostaining
chacteristics, using the Gram technique. Biochemical tests were carried out, such as
production of free coagulase, DNase, catalysis, acetonin production test,
glucose (anaerobiose) and manitol (aerobiose and anaerobiose) fermentation. Of the 1,080 samples analyzed, 740 (68.5%)
were positive upon microbiological examination and 340 (31.5%) negative. The Staphylococcus
bacteria were isolated in 291 (39.3%) of the samples. Of these, 170 (58.4%) were classified as
coagulase-negative Staphylococcus
(SCN), 84 (28.9%) as Staphylococcus
aureus (S.aureus) and 37(12.7%)
as coagulase-positive Staphylococcus
(SCP). The results of the present study indicated that Staphylococcus spp has a high participation in the epidemiology of
bovine mastitis in the region selected and suggests that medium and long-term training
take place to prepare specialists to control and prevent contagious mastitis.
KEYWORDS: epidemiological; mammary gland; mastitis; microbiology.
INTRODUÇÃO
Entre os processos infecciosos da glândula mamária
que interferem na qualidade do leite, destaca-se a mastite que é considerada
uma das principais enfermidades que causam prejuízos à indústria leiteira,
apesar dos inúmeros esforços voltados para o seu controle (PEDRINI &
MARGATHO, 2003; FREITAS et al., 2005). Trata-se de uma enfermidade
plurietiológica e multifatorial que acomete a maior parte do rebanho leiteiro e
causa problemas em toda a cadeia produtiva, inclusive ao consumidor que poderá
ter um produto final de qualidade inferior (COSTA et al., 1999).
Estudos epidemiológicos sobre a
etiologia da mastite bovina revelam que os microrganismos de origem contagiosa
são os mais prevalentes e, entre esses, o gênero Staphylococcus destaca-se por possuir maior frequência em casos
clínicos e subclínicos da doença, sendo o Staphylococcus
aureus a espécie de maior relevância para a indústria leiteira (ZSCHÖCK et
al., 2000).
De acordo com Pinheiro
DE Sá et al. (2004), os estafilococos são importantes agentes causadores
de mastites, sendo o Staphylococcus
aureus, responsável por mastites clínicas e subclínicas, destacando-se como
o agente de maior ocorrência nos diversos rebanhos mundiais (FAGUNDES &
OLIVEIRA, 2004). O índice de isolamento do Staphylococcus
aureus pode ser diferente de acordo com a literatura consultada, variando
entre 9,1 e 85% (NADER FILHO et al., 1985; LANGENEGGER et al., 1986; DE FREITAS
& MAGALHÃES, 1990; BELOTI et al., 1997).
As espécies coagulase negativas comumente isoladas
no leite bovino são consideradas como patógenos secundários e podem causar
reações inflamatórias moderadas na glândula mamária (BRAMLEY et al., 1996). Em
pesquisa realizada por OLIVEIRA et al. (2011), o percentual de isolamento de Staphylococcus coagulase negativo foi de
25,0% nos casos de mastite clínica e
32,3% nos casos de mastite subclínica.
A mastite é considerada como uma doença que causa
um grande impacto nas áreas econômica, social e de saúde pública (CONTRERAS
& RODRÍGUEZ, 2011). Diversos estudos foram realizados no Brasil
demonstrando a importância dos Staphylococcus
produtores de enterotoxinas responsáveis por
toxinfecções alimentares (DE FREITAS & MAGALHÃES, 1990; BRABES et al.,
1999; CARDOSO et al., 2000; FAGUNDES & OLIVEIRA, 2004; PINHEIRO DE SÁ et
al., 2004; ZSCHÖCK et al., 2004; SILVA et al., 2005).
Considerando a importância dessa enfermidade e a
carência de dados epidemiológicos na região estudada, objetivou-se com este
trabalho estudar a participação dos Staphylococcus
spp na etiologia infecciosa de
casos de mastite bovina em propriedades leiteiras no estado de Pernambuco,
contribuindo, dessa forma, com informações epidemiológicas que poderão auxiliar
no diagnóstico da situação e no controle da doença.
MATERIAL E MÉTODOS
As amostras foram coletadas após prévia lavagem do
teto com água e sabão, secagem com papel toalha e anti-sepsia do óstio com
álcool a 70ºGL. Para realização da colheita do leite, os três primeiros jatos
foram desprezados em caneca telada e em seguida realizou-se o California Mastitis Test (CMT), de
acordo com metodologia preconizada por Schalm
& Noorlander (1957). Após
esses procedimentos, as amostras de leite foram coletadas dos quartos mamários
com mastite clínica e daqueles negativos e positivos ao CMT, independente da
reação, num volume de 5 mL em frascos com tampa rosqueável, esterilizados e
previamente identificados com o nome ou número do animal e quarto mamário,
sendo devidamente enviadas ao laboratório em caixas isotérmicas contendo gelo
reciclável para o processamento.
Alíquotas de leite foram semeadas em ágar base
enriquecido com 5% de sangue ovino e incubadas em estufa bacteriológica a 37ºC,
realizando-se leituras após 24, 48 e 72 horas, observando-se as características
morfológicas das colônias como tamanho, tipo, coloração e presença de hemólise.
Ao microscópio, foram observadas a disposição das células e as características
morfotintorias à técnica do Gram (CARTER, 1998).
Para a identificação dos isolados de Staphylococcus spp., foram realizadas
provas bioquímicas como produção de catalase, coagulase livre e DNase, segundo Silva et al. (1997), e as provas de
produção de acetoína, fermentação da glicose (anaerobiose) e do manitol
(aerobiose e anaerobiose) (MAC FADDIN, 1980).
Após a realização das provas, os isolados foram
classificados em: Staphylococcus aureus
(S. aureus), quando positivo em todos
os testes; Staphylococcus coagulase
positiva (SCP), quando positivo para a produção da coagulase, fermentação da
glicose em anaerobiose e catalase, mas negativo em algum dos outros testes; Staphylococcus coagulase negativa (SCN)
quando a bactéria não coagulava o plasma de coelho, apresentava características
de estafilococos na técnica de coloração de Gram, fermentava a glicose em
anaerobiose e produzia a catalase (BAIRD-PARKER, 1990).
A análise estatística utilizada foi do tipo
descritiva, calculando-se as frequências absoluta e relativa dos isolados de
acordo com Sampaio (1998).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Das 1080 amostras analisadas, 740 (68,5%) foram
positivas ao exame microbiológico, enquanto que 340 (31,5%) foram negativas.
Das amostras positivas, isolaram-se bactérias do gênero Staphylococcus em 291 (39,3%). Costa
et al. (2000), em levantamento realizado sobre a etiologia das mastites bovinas
nas sete principais bacias leiteiras do Estado de São Paulo, verificaram que
microrganismos do gênero Staphylococcus
apresentaram alto índice de ocorrência em todas as regiões estudadas. BARBALHO
& MOTA (2001) avaliaram 104 amostras de leite provenientes de 43 animais e
demonstraram que as bactérias do gênero Staphylococcus
spp foram isoladas em 50 amostras, correspondendo a 38,8%, percentual
similar ao encontrado neste estudo. Os mesmos autores relataram que esses patógenos
continuam sendo os mais frequentemente isolados nesse tipo de infecção,
representando grande importância epidemiológica e clínica nas mastites bovinas.
De acordo com CONTRERAS & RODRIGUES (2011), Staphylococcus aureus pode ocasionar mastite crônica em animais
leiteiros. A gravidade da infecção por esse agente é bastante variável podendo
ocorrer desde uma mastite subclínica até um caso mais severo de evolução
gangrenosa (LE MARÉCHAL et al., 2011).
Segundo revisão realizada por FREITAS et al. (2005),
bactérias desse gênero possuem vários fatores de virulência contribuindo, assim,
para sua persistência no tecido mamário e, embora medidas preventivas que visam
ao controle das mastites sejam amplamente praticadas, as mastites causadas por
esse patógeno ainda são bastante frequentes.
Dos 291 isolados, 170 (58,4%) foram classificadas
como Staphylococcus coagulase
negativa (SCN), 84 (28,9%) como Staphylococcus
aureus (S.aureus) e 37 (12,7%)
como Staphylococcus coagulase
positiva (SCP). PITAKÄLÄ et al. (2004) observaram que o agente etiológico mais
prevalente nos casos de mastite bovina na Finlândia foi o SCN com percentual
(49,6%) que se aproxima do encontrado neste estudo para os SCN. Os
estafilococos coagulase negativa tornaram-se os isolados mais comuns nos casos
de mastite bovina em muitos países e, portanto, poderiam ser considerados como
patógenos emergentes. Ainda segundo esses autores, a prevalência de mastite
causada por esses agentes é maior em vacas primíparas e os SCN não são tão
patogênicos e as infecções causadas são geralmente subclínicas (PYÖRÄLA &
TAPONEN, 2009).
Com relação aos Staphylococcus
coagulase negativos, diversos estudos foram realizados quanto à prevalência
desses agentes em rebanhos leiteiros. Nos EUA, a variação das infecções por SCN
no pré e pós-parto foi de 11,0 a 57,8% (MATTHEWS et al., 1992). No Brasil, PARDO
et al. (1998) e LAFFRANCHI (2001) encontraram 35,3% e 68,0% de SCN,
respectivamente.
Em pesquisa realizada por BENITES et al. (2001)
sobre o aspecto microbiológico do parênquima mamário de vacas leiteiras
submetidas ao abate, das 140 amostras analisadas, 54,29% pertenciam ao grupo
dos Staphylococcus coagulase
negativo. BELOTI et al. (1997) estudaram 503 vacas no estado do Paraná e
encontraram uma positividade para a mastite em 29,8% do total de 295 quartos
mamários. O Staphylococcus aureus
esteve presente em 18,0% das amostras e os coagulase negativos em 12,5%.
A importância do gênero Staphylococcus spp ficou também evidente para LANGONI et al. (1991),
que trabalharam com 7902 e 850 amostras de leite e isolaram S.aureus em 22,5% dos casos clínicos e
em 11,4% dos subclínicos.
BRABES et al.
(1999) relataram que, em levantamentos epidemiológicos nacionais e
internacionais, o Staphylococcus aureus está
presente em cerca de 50% das infecções da glândula mamária dos bovinos
leiteiros.
Segundo BRITO et al. (1999), bactérias do gênero Staphylococcus ocupam um papel de
destaque na etiologia das infecções intramamárias do gado leiteiro, sendo a
espécie S. aureus considerada um
patógeno primário que tem sido o agente mais frequentemente isolado tanto de
infecções clínicas como subclínicas. Embora existam diferenças, às vezes
marcantes, entre os resultados obtidos em diferentes estudos, esse agente pode
ser considerado como o de maior prevalência na etiologia das mastites,
atribuindo a essas diferenças aspectos referentes à raça, idade, fatores
ambientais e os de manejo na criação, além de muitos casos que tratam de
estudos retrospectivos com números de amostras diferentes.
Considerando que as principais vias de transmissão
dessa bactéria são as mãos dos ordenhadores e os equipamentos de ordenha
(SANTOS & FONSECA, 2006), as medidas de controle e profilaxia para reduzir
o índice de isolamento do Staphylococcus
devem ser direcionadas para atuar no ponto crítico da disseminação desse agente
que está relacionado ao processo de ordenha.
Algumas variáveis apontadas como fatores de risco
associados às mastites contagiosas foram identificadas em todas as propriedades
visitadas neste estudo, como a falta de informação dos ordenhadores sobre a
doença, deficiências na realização do pré e pós-dipping, falta de lavagem e desinfecção das mãos, falta de controle
de moscas e inexistência da linha de ordenha. Em 13,3% das propriedades, os
animais com mastite clínica eram ordenhados no mesmo lote dos animais
clinicamente sadios, constituindo como importante fonte de infecção. OLIVEIRA
et al. (2009), ao analisarem dois rebanhos leiteiros no Estado do Sergipe,
durante dezoito meses, identificaram que nenhuma das propriedade utilizava a
adoção de pré e pós-dipping e
relataram que isso contribui para uma elevada prevalência de mastite.
A despeito da participação de bactérias do gênero Staphylococcus isolada das mãos de
ordenhadores e equipamentos de ordenha, no processo inflamatório da glândula
mamária de bovinos, SILVEIRA FILHO et al. (2005) relataram a importância dessa
bactéria quando encontraram um mesmo perfil genotípico entre um isolado de Staphylococcus aureus procedente do equipamento de ordenha e de animais com
infecção subclínica em um mesmo rebanho no estado de Pernambuco. Considerando
os resultados obtidos neste estudo quanto à alta frequência de isolamento de S.
aureus (39,3%), acredita-se que o controle das mastites só poderá obter
sucesso com a implantação de medidas que instruam os ordenhadores por meio da
educação continuada, além da adoção de outras medidas.
SANTOS & FONSECA (2006) destacam que, do ponto
de vista epidemiológico, a maior incidência de casos de mastite causada por
agentes contagiosos no rebanho indica falhas no sistema de ordenha, período em
que geralmente ocorre a transmissão desses agentes durante a ordenha manual ou
mecânica. Ainda de acordo com esses autores, os principais métodos indicados
para o controle da doença seriam a diminuição da exposição dos animais aos
agentes (manejo de ordenha, treinamento dos ordenhadores, desinfecção das
teteiras, desinfecção da superfície dos tetos), aumento da resistência
imunológica da vaca e antibioticoterapia.
Outro aspecto importante observado neste estudo foi
a utilização de antimicrobianos e desinfetantes de forma inadequada e por
longos períodos sem a realização de testes laboratoriais que comprovem a
eficácia do antibiótico utilizado no tratamento das mastites clínica e
subclínica e também dos desinfetantes utilizados no pré e pós-dipping. Esse fato pode comprometer o
controle e a profilaxia das mastites causadas por Staphylococcus spp., pois eles podem tornar-se resistentes em
consequência do uso indiscriminado dos produtos. Em 20% das propriedades também
foi observada a presença de mastite crônica, fato que pode estar associado ao
tratamento inadequado dos casos clínicos e subclínicos com o emprego de drogas às
quais as bactérias são resistentes.
Os resultados obtidos neste estudo demonstram a
elevada ocorrência do gênero Staphylococcus
nos casos das mastites bovina na região estudada e sugerem a necessidade de
treinamentos a médio e longo prazo para capacitar os profissionais para a
realização do controle e profilaxia adequados das mastites contagiosas.
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