MEDICINA VETERINÁRIA
SEPTICEMIA EM GIRINOS DE
CRIAÇÃO NA FASE PRÉ-METAMÓRFICA
Rolando Alfredo Mazzoni1, Albenones José
de Mesquita2, Luiz Fernando Fleury3, Sandra Porto de Mesquita4
RESUMO
SEPTICEMIA
IN PRE-METAMORPHIC FARMED TADPOLES
ABSTRACT
INTRODUÇÃO
Com o melhoramento nos
conhecimentos sobre manejo e alimentação, a ranicultura transformou-se em uma
atividade superintensiva, com altas densidades de população e com estrita
dependência dos alimentos balanceados. Entretanto, os métodos intensivos de
cultivo favoreceram o aparecimento de doenças que constituem uma ameaça para a
viabilidade técnica e econômica dos criatórios de organismos aquáticos (ROTTMAN
et al., 1992; BONDAD-REANTASO et al., 2005).
Doenças com alta mortalidade
caracterizadas clinicamente por edemas e ascite têm sido observadas
reiteradamente em girinos. Esses quadros podem estar ou não acompanhados de
sintomatologia nervosa e, às vezes, as mortes ocorrem de forma súbita. É fato
comum que, em um mesmo surto, ocorram os diversos quadros clínicos que compõem
a síndrome.
As septicemias têm sido
reportadas como a causa mais importante de mortalidade em anfíbios, sendo frequente
animais serem encontrados mortos sem sintomas premonitórios. Septicemias por
estreptococos ocorrem de forma esporádica ou epizoótica em populações selvagens
ou de criação em grande número de espécies aquáticas (ROMALDE et al., 2000;
TORANZO et al., 2005). Diversos estudos realizados em rãs de criação têm
relatado a presença de estreptococos associados a septicemias e surtos de
mortalidade (GLORIOSO et al., 1974; AMBORSKI
et al., 1983). A estreptococose
tem sido identificada também em peixes como uma síndrome produzida por cocos
Gram-positivos dos gêneros Streptococcus,
Lactococcus, Enterococcus e
Vagococcus (BERCOVIER et al., 1997; ELDAR et al., 1997). Particularmente, S. iniae tem sido indicado como o agente
primário de doenças em diversas espécies de peixes e, ocasionalmente, de
infecções em humanos, sendo considerada uma doença emergente (CDC, 1996; WEINSTEIN et al.. 1997; GREENLEES et al., 1998; DURBOROW, 1999;
LEHANE & RAWLIN, 2000; FULLER et al., 2001; LAU et al., 2003).
Existe, contudo, grande
incerteza em relação às características dessas patologias em anfíbios devido
aos seguintes fatores: 1) sinais clínicos inespecíficos (CRAWSHAW, 1994); 2)
etiologia pouco clara revelando a presença de diversos agentes oportunistas que
atuam de forma conjunta, sendo que, na maioria das vezes, habitam o ambiente
dos animais afetados; 3) condições particulares de manejo e alimentação
artificial que, muito provavelmente, constituem causas predisponentes para
transformação de um eventual agente comensal em um patógeno; e 4) falta de
pesquisas sobre o tema dando continuidade aos estudos de casos (HIPÓLITO &
BACH, 2002).
No entanto, diversas
pesquisas têm indicado os vírus pertencentes à família Iridoviridae, gênero Ranavirus
como produtores de doenças severas em anfíbios. Os iridovírus que infectam
animais aquáticos possuem uma distribuição mundial e estão associados a doenças
severas. Os girinos têm maior suscetibilidade podendo sofrer mortalidade de até
100% da população. Em ranários da China, ZHANG et al. (2001) isolaram agentes
do gênero Ranavirus de girinos da
espécie Rana grylio, as quais
apresentavam sinais de doença e mortalidade de até 90%. WENG et al. (2002) relataram a
“doença da distensão abdominal” em girinos de criação da espécie Rana tigrina rugulosa, também na China. Os autores observaram quadros clínicos com mortalidade
de 95%, os quais apresentavam abdome aumentado de tamanho, ataxia e redução da
atividade. GREEN et al. (2002), estudando 44 surtos de doenças em anfíbios dos
Estados Unidos, incriminaram os iridovírus em 25 casos, sendo 20 deles em
girinos e cinco na espécie rã touro.
MAZZONI (2000) no Uruguai,
suspeitou da participação de um agente viral pertencente à Família Iridoviridae, gênero Ranavirus, baseados em quadro clínico semelhante ao descrito por WOLF et al.
(1968) para o vírus do edema do girino (TEV). O agente foi detectado em girinos
de criação pela técnica de reação em cadeia da polimerase (GALLI et al., 2006)
e confirmado como agente etiológico em surtos de alta mortalidade de girinos de
até quatro semanas de idade (MAZZONI et al., 2009). Esses resultados corroboram
a hipótese da possível etiologia viral para a doença aqui estudada.
Apesar desses achados, os
ranavírus foram detectados também em anfíbios sadios (WOLF et al., 1968;
ZUPANOVIC et al., 1998; ZHANG et al., 2001; GANTRESS et al., 2003, GREER et al.,
2005), sendo que o poder patogênico desses agentes na fase pré-metamórfica da
rã touro não está confirmado por enquanto.
Objetivou-se com o presente
trabalho descrever um quadro infeccioso em girinos de criação na fase
pré-metamórfica e verificar a participação de ranavírus como agente etiológico.
Para tanto, foram realizadas pesquisas de agentes etiológicos, epizootiologia
das doenças, sintomatologia clínica, anatomia patológica macroscópica,
histopatologia, bacteriologia convencional e virologia, sendo esta por meio do
emprego de técnicas moleculares, e a microscopia eletrônica de transmissão.
MATERIAL E MÉTODOS
Os girinos eram alimentados
com rações fareladas contendo 45% de proteína bruta.
Toda vez que um tanque de
criação era esvaziado, drenava-se a água e realizava-se a limpeza e desinfecção
final com hipoclorito de sódio em concentração de 10 ppm.
Dados referentes à morbidade
e mortalidade foram levantados pelos ranicultores mediante planilhas
específicas.
Utilizaram-se 300 girinos de
rã touro (Rana [Lithobates] catesbeiana) com sinais aparentes da doença
e 50 girinos aparentemente sadios. Todos os espécimes foram transportados em
sacos plásticos contendo água e analisados imediatamente no laboratório do
Centro de Pesquisa em Alimentos da Escola de Veterinária da Universidade
Federal de Goiás.
Selecionaram-se
preferencialmente girinos nos estágios iniciais da síndrome, não tendo sido
utilizados animais mortos para evitar erros induzidos pelas alterações post-mortem (NACE, 1974).
Uma vez sacrificados por
concussão craniana e corte da medula cervical (AVMA, 1993), os exemplares foram
submersos em solução de ácido peracético a 0,2%. Após a abertura da pele e
cavidade celômica, fígado, rins, baço e líquido ascítico foram retirados
utilizando-se utensílios esterilizados para cada corte. As amostras foram
processadas imediatamente segundo BARON et al., (1996), sendo inoculadas em
caldos BHI (Brain Heart Infussion Broth),
Casoy, (Tripticase Soy Broth),
Glicose Azida e Selenito-Cistina. Todas as amostras foram incubadas a 30°C por
24-72 h. O período de incubação de 72 h deveu-se à multiplicação lenta de
alguns estreptococos, procurando-se, dessa forma, dar tempo suficiente para seu
desenvolvimento e, ao mesmo tempo, evitar a ocorrência de falsos negativos.
Assim que foi observado o crescimento bacteriano, alíquotas foram semeadas em
placas de ágar sangue contendo 5% de sangue desfibrinado de carneiro e
incubadas a 30°C por um período máximo de 72 h, observando-se as
características hemolíticas e morfológicas das unidades formadoras de colônias
(UFC). As UFC isoladas e diferentes morfologicamente foram selecionadas para
coloração de Gram e observação em microscópio de contraste de fase.
Os cocos Gram-positivos foram
estudados mediante provas bioquímicas complementares. As UFC, identificadas
primariamente pela bioquímica como estreptococos, foram enviadas para
determinação da espécie no Aquatic Animal
Health Research Laboratory em Auburn - Alabama, nos Estados Unidos. As
culturas foram processadas pelo método de identificação de ácidos graxos da
membrana, FAME (Fatty Acid Methyl Ester).
Os bastonetes Gram-negativos
foram incubados em placas de ágar McConkey e as UFC selecionadas, inoculadas em
tubos de TSI (Triple Sugar Iron Agar)
e submetidas à bateria de testes bioquímicos para identificação da espécie.
Amostras de água e da ração
foram analisadas periodicamente por técnicas bacteriológicas convencionais para
determinação de contaminação fecal e presença de cocos Gram-positivos (BRASIL,
2003).
Fígado, rins e baço de
girinos foram extraídos e preservados em formol tamponado a 10% (vol-vol) e
processados segundo a rotina no Laboratório de Histopatologia do Hospital das
Clínicas da Universidade Federal de Goiás pelos métodos de LUNA (1968). Os
blocos parafinados foram seccionados em cortes de 4-5 µ e corados com
hematoxilina-eosina (H&E) para as avaliações primárias das lesões.
Adicionalmente, os cortes selecionados foram também corados pelo método de
MacCallum-Goodpasture para visualização de bactérias em geral, pelo método de
Fite para detecção de micobactérias e coloração de PAS para visualização de
fungos.
Fígados, rins, baços e
músculo de 50 girinos na pré-metamorfose foram processados. As amostras foram
preservadas em etanol a 95% ou congeladas a menos 20°C até processamento no
Laboratório de Biologia Molecular do Centro de Pesquisa em Alimentos da Escola
de Veterinária da Universidade Federal de Goiás. A extração do DNA foi
realizada a partir de porções de 50 mg utilizando-se o método do
fenol/clorofórmio (SAMBROOK et al., 1989).
Foram utilizados iniciadores
direcionados a regiões conservadas no genoma dos iridovírus (Tabela 1). Para o
gene que codifica a proteína imediata precoce (IE) ICP-18, utilizaram-se
iniciadores propostos por GALLI et al. (2006) e, para o gene que codifica a
proteína MCP, foram utilizados iniciadores localizados na extremidade 5´ da sequência
(MAO et al., 1997), conforme apresentado na Tabela 1.
Foram também
utilizados iniciadores direcionados à identificação da bactéria Streptococcus iniae, aplicando-se a
metodologia de PCR proposta por BERRIDGE et al. (1998). Os cocos Gram-positivos,
independentemente do gênero, foram purificados, sendo o DNA extraído pela
metodologia do fenol/clorofórmio (SAMBROOK et al., 1989).
As amostras para
Microscopia Eletrônica de Transmissão foram processadas no laboratório de
Microscopia Eletrônica do Instituto Biológico de São Paulo. O material
analisado foi selecionado a partir de lesões identificadas nas lâminas da
histopatologia. Uma vez delimitada a região suspeita, a mesma foi localizada no
bloco parafinado e realizado o corte de aproximadamente 1 mm de diâmetro. O
fragmento extraído foi desparafinado, rehidratado e finalmente processado pela técnica
de inclusão em resina, seguida de contrastação positiva de cortes ultrafinos de
acordo com os procedimentos usuais de inclusão em resina, baseando-se nos
métodos de LUFT, (1961) e GONZALES-SANTANDER, (1969). Os fragmentos de órgãos
foram fixados em glutaraldeído a 2,5% em tampão fosfato 0,1M e pH 7,0,
pós-fixados em tetróxido de ósmio a 2% em tampão fosfato 0,2M, pH 7,0, corados
por acetato de uranila a 0,5%, desidratados em série cetônica crescente (50 a
100%) e incluídos em resina Spurr. Após ultra seccionamento dos blocos, os
cortes foram corados positivamente pelo tratamento sequencial de acetato de
uranila (WATSON, 1958) e citrato de chumbo (REINOLDS, 1963), antes de serem
observados ao microscópio eletrônico de transmissão Philips EM 208.
Estudos da pele e das brânquias foram
realizados a fresco, em microscópio ótico, mediante raspagens com lâmina de
bisturi esterilizada (REICHENBACH-KLINKE & ELKAN, 1965).
Os dados do presente estudo evidenciaram a existência de uma
estreptococose septicêmica que acomete girinos na pré-metamorfose. Observou-se
uma síndrome caracterizada por morbidade baixa com alta letalidade, afetando 2
a 3% da população por dia. A doença apresentou-se com maior severidade durante
o período de primavera-verão. A prevalência e incidência dos casos foram sempre
maiores no ranário de ciclo completo onde o número de animais era também maior.
A doença caracterizou-se por apresentar sinais inespecíficos, como
letargia e edemas nas patas na fase inicial, e ascite e úlceras na pele nas
etapas mais avançadas (Figura 1). Às vezes foram observados sinais nervosos como
ataxia, natação errática ou em círculos, ou os girinos ficavam flutuando em
posição invertida.
À necropsia,
os girinos doentes mostraram diversos graus de lesões nos órgãos internos, mas
sem padrão definido. As de maior frequência foram aumento do volume e coloração
anormal do fígado, geralmente de cor cinzenta ou amarelada, baço aumentado de
volume e com coloração pardo-escura e rins hemorrágicos.
Na histopatologia,
girinos sem sinais aparentes de doença apresentaram rins com infiltração
mononuclear abundante e fígado com diversos graus de esteatose e quantidade
variável de granulomas em fases iniciais, com necrose central (Figura 2). O
número de focos de melanomacrófagos distribuídos no fígado foi muito reduzido
e, às vezes, ausente. A coloração de MacCallum-Goodpasture aplicada aos cortes
histológicos dos dois órgãos revelou a presença de cocos Gram-positivos.
Os girinos doentes apresentavam lesões por sepse, caracterizadas
por resposta inflamatória múltipla e granulomas bacterianos distribuídos no
parênquima dos diversos órgãos, além de áreas de necrose associadas à presença
de macrófagos e grande infiltração linfocitária. As lesões no fígado foram mais
intensas na região centrolobular do que na região periportal. Observou-se
esteatose hepatocitária, com perda da estrutura normal do tecido, associada,
por vezes, à necrose. Macrófagos com cocos fagocitados constituíram um achado
comum, sendo observada forte relação entre essa resposta e o aparecimento dos
granulomas. Estes evidenciaram regiões necróticas circundadas por macrófagos e
fibroblastos. Foi evidente a ausência de melanomacrófagos no parênquima do
órgão.
Os rins
apresentavam infiltração mononuclear às vezes focal e, outras, difusa, necrose glomerular
e tubular, congestão e granulomas. Foram observados glomérulos com espessamento
da membrana basal, aumento da celularidade, desaparecimento das alças,
retração, atrofia e esclerose (Figura 3). Foi possível observar o depósito de
material hialino nos glomérulos e abundantes cilindros hialinos nos túbulos.
Esse tipo de lesão pode ser classificada como glomerulonefrite membranoproliferativa,
evoluindo à esclerose, o que determina síndrome nefrótica seguida por
insuficiência renal.
O estudo das secções pela coloração de
MacCallum-Goodpasture revelou a presença de cocos Gram-positivos em grau
variável associados às lesões observadas previamente na coloração H&E.
Observaram-se cocos Gram-positivos nos glomérulos e no interstício,
demonstrando que os microrganismos são carregados pelo sangue, produzindo
lesões e granulomas. O quadro histopatológico é característico das infecções
crônicas associadas a bactérias que sobrevivem dentro dos macrófagos após a
fagocitose (AGIUS & ROBERTS, 2003).
As colorações de PAS e Fite foram negativas para a presença de fungos e
micobactérias, respectivamente. Não foram identificados nos tecidos estudados
corpúsculos de inclusão viral. Não foram observadas partículas virais nem
lesões compatíveis com infecção por esses agentes no material analisado pela
microscopia eletrônica.
As análises
bacteriológicas apresentaram resultados inespecíficos. Não foi detectada a
presença de uma única espécie bacteriana que pudesse ser incriminada como
agente causal, mas os achados sempre corresponderam a cultivos mistos. As
amostras de água e da ração não evidenciaram contaminação fecal ou presença de
cocos Gram-positivos.
Todos os girinos estudados foram positivos para os
cocos Gram-positivos dos gêneros Streptococcus,
Enterococcus, Aerococcus e Leuconostoc,
associados a bastonetes Gram-negativos de diversos gêneros, sendo que 60%
deles foram positivos para Aeromonas
hydrophila e Citrobacter spp. e 35% para Pseudomonas spp. e Proteus spp. Dentre os cocos Gram-positivos, foram identificados
principalmente Streptococcus uberis, S.
agalactie, S. faecalis, S. dysgalactiae, e Enterococcus spp. Em todos os casos, os órgãos afetados com maior
frequência foram o fígado, seguido pelo rim.
Unidades formadoras de colônias não tipificadas no
laboratório foram identificadas pelo FAME como Enterococcus gallinarium, E. columbae, E. casseliflavus, Leuconostoc
spp. e Aerococcus viridians.
Apesar do
isolamento nas análises bacteriológicas de um variado tipo de microrganismos,
foi constante a presença de cocos Gram-positivos. À histopatologia, as quantidades
elevadas dessas bactérias dentro do parênquima dos órgãos indicaram o papel
fundamental das mesmas no quadro. É importante ressaltar que esses
microrganismos foram observados nos estágios prévios da doença, em amostras
obtidas de girinos sem sinais evidentes, indicando que não pertencem aos
invasores oportunistas. Os estreptococos
potencialmente patogênicos podem ser albergados de forma assintomática
por animais e humanos sadios, sendo controlados usualmente pelas defesas não
específicas. A ação de fatores desencadeantes, a
queda na imunidade, ou mudanças na virulência determinam o aparecimento dos
sinais clínicos (MITCHELL, 2003; IICAB,
2005).
Esses
achados sugerem que a patogênese do quadro é de uma lesão estreptocócica, não
sendo possível, nas condições deste estudo, determinar a causa primária que
antecedeu a invasão dos tecidos pelos estreptococos. Do equilíbrio entre a
resposta imune, a quantidade e características dos microrganismos presentes e o
grau de lesão pré-existente nos diversos tecidos, surge a severidade da doença
nesse período específico.
Analises microbiológicas realizados em rãs de criação
obtiveram resultados semelhantes aos do presente trabalho (GLORIOSO et al.,
1974; AMBORSKI et al., 1983), indicando que esse tipo de infecções múltiplas é
comum nesses animais. Da mesma forma, septicemias por estreptococos ocorrem de
forma esporádica ou epizoótica em populações selvagens ou de criação em grande
número de espécies aquáticas, constituindo um problema severo (ROMALDE et al.,
2000; TORANZO et al., 2005).
As
septicemias têm sido reportadas como a causa mais importante de mortalidade em
anfíbios, sendo frequente o achado de animais mortos sem sintomas
premonitórios. Os microrganismos do meio ambiente podem tornar-se patogênicos
quando os anfíbios são submetidos a condições de estresse, sendo que a
sintomatologia observada não depende do tipo de microrganismo envolvido
(CRAWSHAW, 1994; GREEN et al., 2002; MAUEL et al.,
2002; PASTERIS et al., 2006). Os resultados desta pesquisa corroboram com
essas observações. A metamorfose constitui um período de acentuado estresse,
portanto, parece lógico pensar que girinos debilitados podem adoecer ao longo
do processo. A qualidade das rações oferecidas aos girinos, com elevado
conteúdo em carboidratos e proteínas, pode, sem dúvidas, constituir-se na
origem de alterações que levam à degeneração gordurosa do fígado, impedimento
ou diminuição de suas funções metabólicas e sobrecarga dos rins que acabam
sendo lesados. Esse tipo de síndrome hepato-renal é descrita, detalhadamente,
na bibliografia científica em outras espécies, fundamentalmente em humanos
(ROBBINS et al., 1996; GUINÉS, 2001). A sintomatologia predominante de edemas e
ascites associada à presença de lesões importantes nos rins e fígado estão em
concordância com essa doença. De igual forma, os sintomas nervosos observados
na fase aguda da doença podem ter origem no quadro de encefalopatia hepática
(COTRAN et al., 1994), no qual as toxinas não eliminadas pelo fígado chegam ao
sistema nervoso central.
Girinos evidenciando edema e ascite foram negativos
em 90% dos casos para os iniciadores direcionados a sequências conservadas dos
ranavírus. As amostras positivas foram obtidas a partir de girinos
sobreviventes de lotes afetados previamente pela virose nas primeiras semanas
de vida. Não foi detectado S. iniae com os iniciadores utilizados.
Os estudos
parasitológicos revelaram a presença de parasitas da pele cujas lesões recebem
o nome genérico de “opacidade contagiosa da pele”, cujo protozoário mais frequentemente
encontrado foi o Oodinum sp. A
presença desses agentes pode ser considerada uma consequência do estado geral
dos anfíbios, sendo secundária às infecções descritas acima.
Foi observada a existência de uma
estreptococose septicêmica secundária que acomete girinos na pré-metamorfose. A
pesar do caráter secundário da infecção, o papel dos cocos Gram-positivos não
pode ficar sem estimativa nas doenças dos girinos na fase pré-metamórfica e,
portanto, devem ser levados em conta nos planos de controle sanitário dos
ranários comerciais.
O papel dos
ranavírus nesses girinos não foi demonstrado, sugerindo uma menor
susceptibilidade nesse período de desenvolvimento dos girinos de Rana
[Lithobates] catesbeiana.
AGRADECIMENTOS
Os autores
agradecem ao Dr. Phil Klesius pelo processamento e identificação de amostras
bacterianas. O trabalho foi realizado com apoio da CAPES.
AGIUS, C.; ROBERTS, R.
Melano-macrophage centres and their role in fish pathology. Journal of Fish Diseases. Oxford, n.
26, p. 499-509, 2003.
AMBORSKI, R. L.; SNIDER, T. G.;
THUNE, R. L.; CULLEY, D. D. A non- hemolytic, group B Streptococcus infection of cultured bullfrogs, Rana catesbiana, in
Brazil. Journal of Wildlife Diseases.
Ames-IO, v.19, n. 3, p. 180-184, 1983.
BARON, E. J.; PETERSON, L.R.; FINEGOLD, S. M. Bailey
and Scott’s Diagnostic Microbiology, 9th Ed. Mosby-Year Book Inc. St. Louis,
1996.
BERCOVIER, H., GHITTINO C.;
ELDAR A. Immunization with bacterial antigens: infections with streptococci and
related organisms. Developments in
Biological Standardizations,
Switzerland, v. 90, p. 153-160, 1997.
BERRIDGE, B. R.; FULLER, J. D.;
DE AZAVEDO, J.; LOW, D. E.; BERCOVIER, H.; FRELIER, P. F. Development of
specific nested oligonucleotide PCR primers for the Streptococcus iniae 16S-23S
ribosomal DNA intergenic spacer. Journal
of Clinical Microbiology. Washington-VA, v. 36, n. 9, p. 2778-2781,
1998.
BONDAD-REANTASO, M. G.;
SUBASINGHE, R. P.; ARTHUR J. R.; OGAWA, K.; CHINABUT, S.; ADLARD, R.; TAN, Z.;
SHARIFF, M. Disease and health management in Asian aquaculture. Veterinary
Parasitology. v. 132, p. 249–272, 2005.
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Métodos
analíticos oficiais para análises microbiológicas para o controle de produtos
de origem animal e água. Instrução Normativa 62, de 26 de agosto de 2003. Diário Oficial [da] Republica Federativa do
Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 18 set., 2003. Seção I, p.14-50.
CDC. Invasive infection with Streptococcus iniae –
Ontario, 1995-1996. Morbitity and
Mortality Weekly Report. Atlanta-GA, v. 45, n. 30, p. 650-652, 1996.
COTRAN, R.; KUMAR, V.; ROBBINS. S. Robbins -
Pathologic basis of disease. 5 ed. Philadefphia, Saunders Company, 1994. 1400p.
CRAWSHAW, G. Medicina de anfibios.
In: Terapéutica veterinaria de pequeños animles. KIRK, R. W. & BONAGURA, J.D. Eds. Interamericana-Mc Graw Hill.
México, 1994, p. 1355-1369.
DURBOROW, R. M. Health and
safety concerns in fisheries and aquaculture. Occupational medicine. Philadelphia-PA, v. 14, n. 2, p. 373-406,
1999.
ELDAR,
A.; HOROVITCZ, A.; BERCOVIER, H. Development and
efficacy of a vaccine against Streptococcus
iniae infection in farmed rainbow trout. Veterinay Immunology and Immunopathology. Amsterdam, v. 56,
p. 175-183, 1997.
FULLER, J. D.; BAST, D. J.; NIZET, V.; LOW, D. E. ; DE
AZAVEDO, J. C. Streptococcus iniae
virulence is associated with a distinct genetic profile. Infection and immunity.
Bethesda-MD, v. 69, n. 4, p. 1994-2000, 2001.
GALLI, L.; PEREIRA. A. ; MARQUEZ, A.; MAZZONI, R.
Ranavirus detection by PCR in cultured tadpoles (Rana catesbeiana Shaw 1802) from South America. Aquaculture, Amsterdam, v., 257, n.
1-4, p. 78-82, 2006.
GANTRESS, J.; MANIERO, G.; COHEN, N.; ROBERT, J.
Development and characterization of a model system to study amphibian immune
responses to iridoviruses. Virology, New
York-NY, v. 311, n. 2, p. 254-262, 2003.
GLORIOSO, J. C.; AMBORSKI, R. L.; AMBORSKI, G. F.;
CULLEY, D. D. Microbiological studies on septicaemic bullfrogs (Rana catesbeiana). American Journal of Veterinary Research. Chicago-IL, v. 35, n. 9,
p. 1241-1245, 1974.
GONZALES-SANTANDER, R. Técnicas de microscopia
eletrônica en biología. Madrid, Aguilar, 1969, 666 p.
GOSNER, K. A simplified table for staging anuran
embryos and larva with notes on identification. Herpetologica, Austin-TX, v. 16, p. 183-190, 1960.
GREEN. D.;
CONVERSE, K.; SCHRADER, A. Epizootiology of sixty-four amphibian morbidity and
mortality events in the USA, 1996-2001. Annals
of the New York Academy of Science, New York, v. 969, p. 323-339, 2002.
GREENLEES, K. J.;
MACHADO, J.; BELL, T.; SUNDLOF, S. F. Food borne microbial pathogens of
cultured aquatic species. The Veterinary
clinics of North America. Food animal practice. Philadelphia-PA, v. 14, n.
1, p. 101-112, 1998.
GREER, A.;
BERRILL, M.; WILSON, P. Five amphibian mortality events associated with
ranavirus infection in south central Ontario, Canada. Diseases of Aquatic Organisms, Amelinghausen, v. 67, p. 9-14, 2005.
GUINÉS, P. Síndrome hepato-renal [on line]. In:
ASOCIACION ESPAÑOLA PARA EL ESTUDIO DEL HIGADO. 2001 p. 129-138 Disponível em: http://www.aeeh.org/trat_enf_hepaticas/C-13.pdf Acesso em: 29 mar 2006.
HIPÓLITO, M.; BACH, E.E. Patologias em rã
touro (Rana catesbeiana Shaw 1802).
Primeira revisão da bibliografia brasileira. Arquivos do Instituto Biológico de São Paulo. São Paulo, v. 69, n.
2, p. 113-120, 2002.
IICAB .
Desenvolvida pela Iowa State University-
AOIEC Center - Institute for International Cooperation in Animal Biologics. An OIE Collaborating Center, 2005.
Apresenta textos sobre doenças infecciosas nos animais e riscos na saúde
pública. Disponível em: http://www.cfsph.iastate.edu Acesso em 23 nov. 2005.
LAU, S. K.; WOO,
P. C.; TSE, H.; LEUNG, K. W.; WONG, S. S.; YUEN, K. Y. Invasive Streptococcus
iniae infections outside North America. Journal
of Clinical Microbiology. Washington-VA, v. 41, n. 3, p. 1004-1009,
2003.
LEHANE, L.;
RAWLIN, G. T. Topically acquired bacterial zoonoses from fish: a review. The Medical Journal of Australia. Sydney,
v. 173, n. 5, p. 256-259, 2000.
LUFT, J. A. Improvements in an
epoxy resin embedding methods. Journal of
Biophysics, Biochemistry and Cytology, v. 9, p. 409-414, 1961.
LUNA, L.G. Manual of histology staining methods of
the Armed Forces Institute of Pathology. 3.ed. New York : McGraw-Hill,
1968. 258p.
MAO, J.;
HEDRICK, R.; CHINCAR, V. Molecular characterization, sequence analysis and
taxonimic position of newly isolated fish iridoviruses. Virology, New York-NY, n. 229, p. 212-220, 1997
MATHIAS, M.;
SCOTT, P. Potencial produtivo de criação
de rãs no Estado do Rio de Janeiro. Série Agronegócios, SEBRAE/RJ, 100p.,
2004.
MAUEL, M.; MILLER, K; FRAZIER, K; HINES, M. Bacterial pathogens
isolated from cultured bullfrogs (Rana
catesbeiana). Journal
of Veterinary Diagnostic and Investigations. Columbia-MO, v.
14, n. 5, p. 431-433, 2002.
MAZZONI, R. Diseases in farmed American bull frog (Rana catesbeiana Shaw, 1802) in Uruguay. In: GETTING THE JUMP! ON
AMPHIBIAN DISEASE, 2000, Cairns, Austrália.
http://www.jcu.edu.au/school/phtm/PHTM/frogs/mazzoni.ppt, 2000
MAZZONI, R.; MESQUITA, A.; FLEURY, L.F.; BRITO, W.M.D.; NUNES, I.A.;
ROBERT, J.; MORALES, J.; BARTHASSON, D.; GALLI, L.; CATROXO, M. H.B. Mass
mortality associated with Ranavirus infection in farmed tadpoles (Rana
catesbeiana Shaw, 1802) from Brazil. Diseases
of Aquatic Organisms, Amelinghausen, v. 86, n. 3, p.
181-191, 2009.
MITCHELL, T. The pathogenesis of streptococcal infections:
From tooth decay to meningitis. Nature
Reviews. Microbiology. London,
v. 1., p. 219-230, 2003.
NACE, G. (ed.): Amphibians:
Guidelines for the breeding, care and management of laboratory animals. Washington D.C., NRC/NAS, 1974, 153p.
Disponível em: http://www.nap.edu/catalog/661.html#toc , Acesso em: 15 fev 2004.
PASTERIS, S.; BUHLER, M.; NADER-MACIAS, M.
Microbiological and histological studies of farmed-bullfrog (Rana catesbeiana) tissues displaying
red-leg syndrome. Aquaculture. Amsterdam,
v. 251, n. 1, p. 11-18, 2006.
REICHENBACH-KLINKE, H.; ELKAN, E. The principal diseases of lower vertebrates,
New York, Academic Press, 600 pp., 1965.
REINOLDS, E.S. The use of lead
citrate at high pH as an electron-opaque stain in electron microscopy. Journal of Cell Biology, v. 17, p. 208-212, 1963.
ROBBINS, S.;
COTRAN, R.; KUMAR, V. Fundamentos de
Robbins: patologia estrutural e funcional. 5 ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 1996, p. 605.
ROMALDE, J.; LORES, F.; MAGARIÑOS, B.; BARJA, J.;
TORANZO, A. Study of cell surface associated virulence factors of Streptococcus parauberis strains
pathogenic for turbot. Bulletin of the
European Association of Fish Pathologists. The Netherlands, v. 20, n. 6, p.
244-251, 2000.
ROTTMANN, R.; FRANCIS-FLOYD, R.; DURBOROW, R. The role
of stress in fish disease. South Regional Aquaculture Center
Publication [online] n.
474, 1992. Disponível em: http://aquanic.org/publicat/usda_rac/efs/srac/474fs.pdf
Acesso em: 15 mar. 2005.
SAMBROOK, J.; FRITCSH,
E.; MANIATIS, T. Molecular cloning: A
laboratory manual. 2. ed. New York: Cold Spring Harbor Laboratory, 1989.
3v. 3104p.
TORANZO A.E., MAGARIÑOS B.; ROMALDE J.L. A review of
the main bacterial fish diseases in mariculture systems. Aquaculture,
Amsterdam, v. 246, p. 37-61, 2005.
WATSON, M. L.
Staining of tissue sections for electron microscopy with heavy metals. Journal
of Biophysics, Biochemestry and Cytology, v. 4, p. 75-478, 1958.
WEINSTEIN, M. R.; LITT, M.;
KERTESZ, D. A.; WYPER, P.; ROSE, D.; COULTER, M.; MCGEER, A.; FACKLAM, R.;
OSTACH, C.; WILLEY, B. M.; BORCZYK, A.; LOW, D. E. nvasive infections due to a
fish pathogen, Streptococcus iniae. S. iniae Study Group. The New England Journal of Medicine. Boston-MS,
v. 337, n. 9, p. 589-594, 1997.
WENG, S.; WANG, Y.; HE, J.; DENG, M.; LU, L.; GUAN,
H.; LIU, Y.; CHAN, S. Outbreaks of na iridovirus in red drum, Scianenops ocellata (L.), cultured in
southern China. Journal of Fish
Diseases. Oxford, v. 25, n. 11, p.
681-685, 2002.
WOLF, K.; BULLOCK, G.; DUNBAR, C.; QUIMBY, M. Tadpole
edema virus: a viscerotropic pathogen for anuran amphibians. Journal of Infectious Diseases,
Chicago-IL, v. 118, n. 3, p.253-262,1968.
ZHANG, Q.;
XIAO, F.; LI, Z.; GUI, J.; MAO, J.; CHINCHAR, V. Characterization of an
iridovirus from the cultured pig frog Rana
grylio with lethal syndrome. Diseases
of Aquatic Organisms, Amelinghausen, v. 48, n. 1, p. 27-36, 2001.
ZUPANOVIC, Z.; LOPEZ, G.; HYATT, A.; GREEN, B.; BARTRAN, G.; PARKES, H.; WHITTINGTON, R.; SPEARE, R. Giant toads Bufo marinus in Australia and Venezuela have antibodies against "ranaviruses. Diseases of Aquatic Organisms, Amelinghausen, v. 33, p. 1-8,1998.