Com o objetivo de determinar a
prevalência da brucelose animal na região do sul de Minas Gerais,
testaram-se 1.391 vacas, 15 equinos e 13 cães adultos provenientes de
41 fazendas positivas pelo teste de anel do leite, mediante a
utilização do teste do antígeno acidificado tamponada (AAT) e do teste
de soroaglutinação lenta e 2- mercaptoetanol. A prevalência da
brucelose foi de 4,65% nas vacas, 13,33 % em equinos e 0% nos cães.
Espera-se que os dados obtidos sejam de grande valia para a
consolidação da implantação do Programa Nacional de Controle e
Erradicação da Brucelose, conforme recomendações oficiais, na região
sul de Minas Gerais.
PALAVRAS-CHAVES: Bovino, brucelose, equino, cão, PNCEBT.
Aiming to determining brucellosis
prevalence in the south region of Minas Gerais, Brazil, 1396 cows, 15
horses and 13 dogs from 41 farms positive to the ring test were tested.
The serological buffered acidified antigen (BAA), slow tube serum
agglutination (STSA), and 2-mercapto ethanol (2-ME) tests were used.
The brucellosis prevalence was 4.66%% in cows, 33.3% in horses and 0%
in dogs. It is expected that the obtained data obtained are valuable to
consolidate the deployment of the National Program for Control and
Eradication of Brucellosis, according to official recommendations, in
the southern region of Minas Gerais.
Keywords: brucellosis, cattle, dog, horse, PNCEBT.
NTRODUÇÃO
Considerando que a sanidade dos rebanhos é fator fundamental para a
produtividade, o controle e a erradicação da brucelose bovina
constituem aspectos importantes pelo impacto que podem ter na
produtividade dos rebanhos (RIBEIRO
et al., 2003).
As perdas econômicas causadas pela brucelose são decorrentes dos
sucessivos abortamentos e períodos de esterilidade temporária,
responsáveis pela redução do desempenho reprodutivo dos rebanhos e
baixa produção de leite (PAULIN & FERREIRA NETO, 2003). No Brasil,
os prejuízos econômicos ocasionados pela brucelose bovina foram
estimados, em 1971, pelo Ministério da Agricultura Pecuária e
Abastecimento, em US$ 32 milhões de perdas anuais, considerando somente
os abortos e a queda na produção leiteira (OIE, 1987; POESTER
et al., 2002).
O fato de haver poucos dados epidemiológicos divulgados em meios
científicos na atualidade dificulta a realização de uma análise da
situação do país. Além disso, eles não estão disponíveis para a região
Sul de Minas Gerais. Segundo diagnóstico da pecuária leiteira em Minas
Gerais, a mesorregião sul de Minas Gerais continua com uma participação
intensa na produção de leite no Estado, assim como no país
(DIAGNÓSTICO, 2006), justificando, portanto, a avaliação da ocorrência
de brucelose animal na região sul de Minas Gerais.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi realizado em 41 rebanhos positivos ao teste do anel do
leite (TAL), fornecedores de leite para três cooperativas nos
municípios de Alfenas, Machado e Muzambinho, Região Sul de Minas
Gerais, e em equinos e cães co-habitantes nas propriedades.
Realizou-se coleta de sangue de bovinos em amostragem conduzida
conforme recomendação do Ministério da Agricultura e Abastecimento
(BRASIL, 2001). Coletaram-se amostras de sangue de fêmeas com idade
igual ou superior a 24 meses, vacinadas entre três e oito meses de
idade, e fêmeas não vacinadas e machos com idade superior a oito meses,
correspondendo a um total de 1.396 amostras. Amostras de soro sanguíneo
foram submetidas ao teste do antígeno acidificado tamponado (AAT),
seguido de confirmação pela soroaglutinação lenta associada ao
2-Mercaptoetanol (SAL e 2ME), e interpretado conforme recomendações
oficiais (BRASIL, 2001).
Amostras de sangue de quinze equinos e treze cães também foram
coletadas nas propriedades referentes. O soro sanguíneo de equinos foi
submetido ao teste do antígeno acidificado tamponado (AAT), seguido de
confirmação pela soroaglutinação lenta associada ao 2-Mercaptoetanol
(SAL e 2ME), e interpretado de acordo com LANGONI & SILVA (1997). O
soro sanguíneo de cães foi submetido ao teste AAT. Desenvolveram-se as
técnicas de realização do diagnóstico como recomendado por OLASCOAGA
(1976).
Coletaram-se informações referentes aos dados de composição do rebanho,
à vacinação dos bovinos, às medidas adotadas para abortos e no momento
do parto, à frequência de realização de diagnósticos, a à exigência de
sorologia de animais utilizados para repor o rebanho visando para
determinar os fatores predisponentes para enfermidade na região.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nos 41 rebanhos que eram positivos ao TAL, em 29 ( 70,70%)
detectaram-se animais brucélicos pela prova sorológica AAT. SILVA
JÚNIOR
et al. (2007) também
encontraram altos índices de positividade de leite em amostras de
latões, correspondendo a 35,2% dos latões examinados, o que equivale a
75% de rebanhos em que se detectaram animais brucélicos na sorologia,
corroborando com a afirmativa de que o TAL poderá ser utilizado para
vigilância epidemiológica de rebanhos
brucélicos.
Entre as amostras de soros de bovinos analisadas, 99,64% (1391/1396)
eram de fêmeas e 0,35% (5/1396) de machos. Em relação à raça, 70,12%
(979/1396) eram holandeses preto e branco e 29,88%(417/1396) mestiços
de holândes. A literatura não descreve a influência da raça na
ocorrência da doença. Entretanto, animais de raças puras normalmente
são mantidos em sistemas de maior confinamento e submetidos a estresse
mais intenso, o que se deve à maior produtividade, facilitando a
disseminação da doença (ACHA & SZYFRES, 2001). A maior prevalência
de fêmeas pode estar relacionada ao fato de 75,61% (31/41) das
propriedades serem de exploração leiteira e apenas 24,39% (10/41) de
exploração mista. A inseminação artificial era utilizada em 78% (32/41)
das propriedades.
Dessas amostras, 138 (9,88%) foram positivas ao teste AAT, com
percentual de 9,92% (138/1391) de fêmeas positivas, não tendo
incidência de machos positivos (0/5).
Os soros positivos ao AAT foram submetidos ao teste de SAL e 2- ME para titulação de anticorpos anti-
Brucella abortus,
sendo 47,10% positivos (65/138), 42,02% (58/138) inconclusivos e 10,87%
negativos (15/138). Trabalhos mais recentes publicados em diversas
regiões do país (MEGID
et al., 2000; RIBEIRO
et al., 2003; KURODA
et al., 2004; MONTEIRO
et al., 2006; SILVA JÚNIOR
et al.,
2007) mostram que as provas de AAT e 2- ME apresentam alto percentual
de resultados concordantes. Neste trabalho, 92,1% dos animais com
títulos 1:50 no 2-ME também reagiram no AAT.
Em relação ao total de amostras analisadas, 4,65% foram positivas para
brucelose, com confirmação pelo SAL e 2-ME. A comparação de dados de
prevalência de brucelose bovina na região Sul de Minas Gerais torna-se
dificultada pela falta de dados científicos publicados. Publicações
recentes de trabalhos com rebanhos leiteiros, em áreas isoladas do país
e com utilização dos mesmos testes, apresentam índices mais baixos,
como a de RIBEIRO
et al. (2003), que encontraram 1,9% de animais positivos em Ilhéus, BA, e POLETO
et al.
(2004), que informaram haver 1,22% de animais positivos em Passo Fundo,
Rio Grande do Sul. Entretanto, nenhum destes trabalhos foram realizados
com animais provenientes de rebanhos positivos ao teste de triagem com
o TAL.
O último diagnóstico nacional de situação da brucelose bovina foi
realizado em 1975, tendo estimado a porcentagem de animais
soropositivos em 4% na região Sul, 7,5% na Sudeste, 6,8% na
Centro-Oeste, 2,5% na Nordeste e 4,1% na Norte (POESTER
et al., 2002; BRASIL, 2003).
Conforme boletins oficiais do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), estudos realizados entre
1988 e 1998 indicaram que a prevalência de animais soropositivos para
brucelose no Brasil variava entre 4% e 5%, sugerindo esta doença como
uma das principais causas de aborto em bovinos (POESTER
et al., 2002; BRASIL, 2003). Em Minas Gerais, a prevalência caiu de 7,6% em 1977 para 6,7% em 1980 (POESTER
et al.,
2002). Estes dados de 1980 foram obtidos com exame de 25.010 animais
(0,4% da sua população bovina) e 4.096 propriedades (1,9% do total de
suas propriedades). Esta pesquisa revelou que 6,7% dos animais eram
soropositivos e em 20,5% das propriedades havia pelo menos um animal
positivo. Em consequência disso, em 1981 criou-se um programa de
vacinação voluntária para bezerras de três a oito meses, que se tornou
obrigatório em 1994 (PAULIN & FERREIRA NETO, 2002).
Em relação aos dados de manejo sanitário dos rebanhos, 12,19% (5/41)
declararam não vacinar contra brucelose; 26,83% (11/41) compravam
animais para reposição do rebanho, 78,04% (32/41) não exigiam atestados
negativos para doença no ato da compra de animais e 78,04% (32/41)
declararam não adotar medidas de destino adequado aos restos de aborto
e parto na propriedade. Em todas as propriedades que apresentavam estas
falhas em relação às práticas de manejo sanitário preventivo para
brucelose, foram detectados animais sorologicamente positivos, tanto
bovinos quanto equinos.
Estas práticas interferem diretamente na prevalência da doença, como é
citado por PAULIN & FERREIRA NETO (2002), em uma revisão da
brucelose bovina no Brasil, concluindo que as atividades de vacinação e
sorodiagnóstico tiveram grande importância em rebanhos com programas de
controle implantado. MONTEIRO
et al.
(2006) encontraram associação entre a ocorrência de brucelose e
práticas de manejo inadequadas em rebanhos do Estado do Mato Grosso do
Sul. O PNCEBT tem como objetivo implantar medidas preventivas,
incluindo as anteriormente citadas, visando à redução de índices da
doença no País, visto que elas têm papel crucial na disseminação e
manutenção da enfermidade nos rebanhos (BRASIL, 2003).
Entre os equinos, 33,33% foram positivos ao AAT, sendo três fêmeas
(60%) e dois machos (40%). Quando submetidos à confirmação pelos teste
SAL e 2-ME, apenas dois animais, uma fêmea e um macho, foram positivos,
correspondendo a 13,33%. Os animais positivos eram provenientes de duas
propriedades que também foram positivas para brucelose bovina. Os dados
de prevalência da enfermidade no Brasil variavam conforme a região,
amostragem e teste empregado. Nos últimos levantamentos sorológicos
realizados na espécie, os dados de prevalência de positivos variam de
0,82% (LANGONI & SILVA, 1997) a 16,76% (FEITOSA
et al.,
1991). A convivência com bovinos contaminados está associada à
transmissão da doença, principalmente em criatórios com falhas de
manejo sanitário (ACHA & SYFRES, 2001), tal como encontrado nesta
pesquisa.
Todos os cães foram negativos. Baixos índices de soropositivos para
Brucella abortus são descritos, na literatura, em cães de zona urbana, como citado por ALMEIDA
et al.
(2004). Esses autores encontraram prevalência de 2,8%, em pesquisas
realizadas nesta região, utilizando os mesmos testes, assim como outras
pesquisas que utilizaram técnicas diferentes em outras regiões do país.
AGUIAR
et al. (2005), em
avaliação de cães de zona rural, provenientes de propriedades do norte
do Brasil que criavam bovinos, e utilizando as mesmas técnicas
deste trabalho, encontraram uma prevalênciade 0,3%. Entretanto, sabe-se
que a
B. abortus poderá
infectar cães que convivem com bovinos infectados e criados em sistemas
de manejo inadequados (ACHA & SZYFRES, 2001).
Conclui-se que a ocorrência da enfermidade nos rebanhos bovinos
analisados é alta, principalmente em rebanhos com manejo sanitário
inadequado, enfatizando-se a importância da doença em uma das regiões
de grande produção de leite em Minas Gerais no Brasil. A ocorrência da
enfermidade em equinos está associada à ocorrência em bovinos.
Espera-se que os dados objetivos sejam de grande valia para a
consolidação da implantação do Programa Nacional de Controle e
Erradicação da Brucelose e Tuberculose, conforme recomendações
oficiais, na região sul de Minas Gerais.
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