SEROPREVALENCE OF ANTIBODIES
ANTI-Neospora caninum AND ANTI-Leptospira interrogans IN TWO PROPERTIES
OF DAIRY COWS WITH REPORTS OF REPRODUCTIVE LOSSES IN GOIANDIRA, GOIÁS
STATE, BRAZIL
The aim of this study was to determine the seroprevalence of antibodies anti-
Neospora caninum and anti-
Leptospira interrogans in dairy cows from Goiandira, Goiás State, Brazil. Serum samples of 53 dairy cows from two herds were assayed for anti-
N. caninum antibodies using an indirect immunofluorescent antibody test (IFAT) and microscopic-agglutination technique (MAT) for
L. interrogans agglutinins. Sera reacting at dilutions ≥ 1:50 and ≥ 1:100 were considered positive for
N. caninum and
L. interrogans
antibodies respectively. It was found that 35.9% (14 cows) of the
samples from Farm 1 and 64.3% (9 cows) from Farm 2 were positive for
N. caninum. For
L. interrogans, 87.2% (34 cows) from Farm 1 and 64.3% (9 cows) from Farm 2 were positive. The serovars founded were:
wolffi (21.74%);
hardjo (18.11%);
bratislava (14.49%);
australis (12.32%);
tarassovi (12.32%);
icterohaemorrhagiae (7.25%);
sentot (5.80%),
grippotyphosa (5.07%);
patoc (2.17%);
cynoptero
(0.72%). According to the results, it was possible to conclude that
neosporosis and leptospirosis are endemic in dairy cows and may also be
a significant animal and human health problem in Goiandira, GO, Brazil.
KEYWORDS: Abortion, bovine, leptospirosis, neosporosis, prevalence.
INTRODUÇÃO
Neospora caninum e
Leptospira interrogans são considerados importantes agentes infecciosos que afetam a reprodução de bovinos (COSTA
et al., 2001; HOMEM
et al., 2001), podendo resultar em aborto ou nascimento de bezerros fracos (BIELSA
et al., 2004).
Neosporose bovina é causada por um parasito coccídeo, formador de cistos denominado
Neospora caninum (DUBEY
et al.,
1998). O coiote e o cão são os hospedeiros definitivos, que eliminam
oocistos após ingestão de tecido ou órgão de hospedeiros
intermediários, com os cistos do agente, representados pelos bovinos
(ALMEIDA, 2004).
A infecção por
N. caninum não
produz sinais clínicos em vacas, exceto pelos abortos encontrados.
Animais de qualquer idade e a qualquer momento da gestação podem
abortar, tanto gado de leite quanto gado de corte (PATITUCCI
et al.,
1999). Pesquisas realizadas no Brasil, pelo diagnóstico do agente
por imunohistoquímica e reação em cadeia por polimerase (PCR),
demonstraram tal fato. O diagnóstico para este coccídeo deve ser
incluído em rotina como mais um dos possíveis causadores de aborto
(GENNARI, 2004), já que neosporose é considerada a principal causa de
perdas reprodutivas em países onde a brucelose foi controlada
(PATITUCCI
et al., 2000).
Outra doença que também causa abortos em vacas é a leptospirose, provocada por bactérias do gênero
Leptospira. Esse gênero compreende as espécies
L. interrogans e
L. biflexa, que são divididas em vários sorovares. Os sorovares de
L. biflexa são de vida livre, não patogênicos. Já os de
L. interrogans abrangem todos os que infectam humanos e animais (SCHIMIDT
et al., 2002).
Trata-se de uma zoonose e seu agente etiológico compreende mais de 180 sorovares (SCHIMIDT
et al.,
2002). Apresenta alta prevalência em países tropicais, o que é
explicado pelas altas precipitações pluviométricas e solo neutro a
alcalino (ALMEIDA, 1999). A presença e a sobrevivência do agente no
ambiente são favorecidas, sobretudo, pela umidade e pH neutro (HOMEM
et al., 2001).
Em bovinos a leptospirose provoca aborto, infertilidade, anorexia,
pirexia, apatia, icterícia, anemia hemolítica, hemoglobinúria, mastite
e até morte, na dependência do sorotipo envolvido e da idade do
indivíduo acometido (HOMEM
et al.,
2001). Quando presente nos rebanhos, difunde-se rapidamente, alcançando
altos índices de morbidade com casos mais graves em animais mais jovens
(ALMEIDA, 1999). MINEIRO
et al. (2007) constataram a associação entre infecção e ocorrência de transtornos reprodutivos, sendo
Hardjo o sorovar que apresentou maior associação.
FAVERO
et al. (2001), em
levantamento sorológico para leptospirose em vários estados do Brasil,
alcançaram as seguintes faixas percentuais de animais reativos a pelo
menos uma variante sorológica: SC, CE, PR, DF, SP e PA (25,2 a 38,3%);
PB, TO, RJ, MG, GO, RO, RN, PI, MA e AL (40,7 a 58,4%); BA, ES, MS e MT
(superior a 61,0%).
Mesmo não havendo dados científicos sobre a epidemiologia de doenças
reprodutivas no município de Goiandira, GO, relatos de abortos e
repetição de cio sugerem a ocorrência de doenças relacionadas com essas
alterações. Dadas as altas prevalências de leptospirose em
rebanhos bovinos e pelo fato de neosporose ser pouco conhecida na
região, optou-se pelo levantamento da soroprevalência dessas doenças em
duas propriedades com relatos de perdas reprodutivas no dado município.
MATERIAL E MÉTODOS
Localizado na região sudeste do estado de Goiás, o município de
Goiandira possui aproximadamente 5.000 habitantes e apresenta a maioria
de suas propriedades rurais de pequeno porte com baixo nível
tecnológico. Distanciado 260 km da capital do seu estado, Goiânia, tem
a agropecuária como sua atividade econômica principal. Este município é
abrangido pelo clima tropical, apresentando vegetação típica de
cerrado, com uma estação seca com temperaturas mais amenas e outra
quente e chuvosa.
Para a escolha das fazendas foi utilizada a amostragem não
probabilística por julgamento especializado, conforme GRESSLER (2004).
Dentre os proprietários que se dispuseram a participar desta pesquisa,
intencionalmente escolheram-se os rebanhos que apresentavam histórico
recente de problemas reprodutivos. As fazendas se localizavam a 20 km
de distância entre elas e eram pertencentes ao mesmo município.
Utilizaram-se todos os bovinos de cada uma das duas propriedades neste
estudo. Amostras de sangue de 53 bovinos foram colhidas de fêmeas,
adultas, em fase de pré-parto, secas e em lactação, das raças Gir e
Mestiças Gir/Holandês sem grau de sangue definido, pertencentes ao
município de Goiandira, Goiás. Trinta e nove animais da Fazenda 1 e
quatorze animais da Fazenda 2, que se encaixavam nas categorias
descritas anteriormente, foram utilizados para colheita. Histórico de
vacinação para
L. interrogans e
N. caninum era inexistente nas duas propriedades.
Colheram-se as amostras de sangue por meio de punção de veia jugular,
sendo armazenadas em tubos de ensaio identificados e sem
anticoagulante. O material coletado foi transportado sob refrigeração
até o laboratório de Patologia Clínica do Hospital Veterinário da
Universidade Federal de Uberlândia, onde se extraiu o soro sanguíneo de
cada amostra, dividindo-as em duas frações. Foram feitas as devidas
identificações e posterior armazenamento a uma temperatura de -20ºC.
Enviou-se uma fração do material coletado para o Instituto de Patologia
Tropical e Saúde Pública (IPTSP) da Universidade Federal de Goiás, onde
foi efetuado o exame sorológico para
N. caninum
através da técnica de Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI),
padronizando-se como positivos os títulos maiores ou iguais a 1:50,
conforme SARTOR
et al.
(2003). A outra fração foi enviada para o Laboratório de Doenças
Infectocontagiosas da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade
Federal de Uberlândia, para a detecção de anticorpos anti-
L. interrogans para onze sorovares (
wolffi, hardjo, bratislava, australis, tarassovi, icterohaemorrhagiae, sentot, grippotyphosa, patoc, cynoptero e
copenhage),
pelo método de Soroaglutinação Microscópica (SAM), padronizando-se como
positivos os títulos maiores ou iguais a 50% de aglutinação de
antígenos por campo a uma diluição de 1:100 do soro sanguíneo, conforme
BRASIL (1995).
Aplicou-se o teste de Qui-quadrado (SIEGEL, 1975) aos dados conjuntos
com nível de significância de 0,05 em uma prova bilateral. O objetivo
era verificar a existência ou não de diferenças estatisticamente
significantes entre as frequências relativas à presença de
N. caninum, L. interrogan e seus sorovares, encontradas nos animais das duas fazendas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Fazenda 1, dos 39 animais examinados, quatorze (35,9%) reagiram sorologicamente à Imunofluorescencia Indireta para
N. caninum e em 34 (35,9%) detectaram-se anticorpos anti-
L. interrogans. Na Fazenda 2, das quatorze fêmeas examinadas, nove (64,3%) reagiram sorologicamente à reação Imunofluorescencia Indireta para
N. caninum, e o mesmo número de observações foi encontrado para sororreagentes à
L. interrogans (64,3%). Em uma análise global, dos 53 animais, encontrou-se a prevalência de 43,4% para neosporose e 81,1% para leptospirose (
Tabela 1).
Dentre os 34 animais sororreagentes para
L. interrogans
na Fazenda 1, dez também eram positivos para neosporose. Em relação à
Fazenda 2, dos nove que reagiram ao SAM, cinco também apresentaram
anticorpos anti-
N. caninum.
Referindo-se especificamente a animais sororreagentes a
N. caninum,
pode-se observar uma superioridade da prevalência encontrada neste
trabalho (43%), se comparada à citada por GENNARI (2004), que
identificou frequências de 8,7% no estado de Rondônia e 21,55% no
estado do Paraná. A presença de cães em convívio comum com os bovinos
nas duas propriedades pode justificar esses altos índices de
soropositividade para
N. caninum (ROMANELLI
et al., 2007).
A soroprevalência para
L. interrogans também excedeu aos relatos encontrados na literatura, determinando-se uma média de 81,1% de sororreagentes a
L. interrogans. FAVERO
et al. (2001), em estudo no estado de Goiás, encontraram médias de 40,7% a 58,4% de animais soropositivos. CAMPOS JUNIOR
et al.
(2006), também em levantamento sorológico em machos reprodutores no
mencionado estado, obtiveram a prevalência de 78,28% de animais
positivos.
Essas elevadas taxas podem ser relacionadas à presença de fatores que
predispõem um ambiente contaminado (hospedeiro disseminador,
contaminação do meio com Leptospiras vivas, sobrevivência destas no
ambiente, contato com indivíduos susceptíveis) e as condições de manejo
do rebanho (TOMICH
et al., 2007).
Na Fazenda 1, a infecção por
L. interrogans se mostrou maior que a infecção por
N. caninum.
Já na Fazenda 2 não houve diferenças estatisticamente significantes
entre as doenças. Segundo resultados determinados pelos exames
sorológicos executados em animais do município de Goiandira e por não
haver diferenças significantes entre os resultados de sorologia de cada
propriedade, é possível comprovar a disseminação dos agentes causadores
tanto de leptospirose quanto de neosporose, na região estudada, com
frequências altas.
Dada a aplicação do Programa Nacional de Erradicação de Brucelose e
Tuberculose Animal, instituído em 2001 pelo Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento brasileiro, pode-se considerar que brucelose é
uma doença já controlada nos rebanhos estudados, não representando a
principal causa de problemas reprodutivos neles encontrados. ESCAMILLA
et al.
(2007), buscando uma correlação entre os resultados sorológicos e os
achados de necropsia de fetos abortados em um rebanho, sugerem que tais
lesões foram provocadas em sua maioria por agentes bacterianos, mais
especificamente
Leptospira spp. e
Brucella spp., seguidos do cocídeo
N. caninum.
GROOMS (2006) afirmou que é necessário fazer um diagnóstico diferencial
entre doenças que provocam perdas reprodutivas, para um melhor controle
delas. No entanto, é importante salientar que foram encontrados animais
reagentes para ambos os testes, demonstrando-se, dessa forma, a
ocorrência concomitante de duas doenças reprodutivas, o que
provavelmente dificulta o diagnóstico e tratamento a campo.
Na Fazenda 1 encontraram-se, em quantidade decrescente de prevalência, os seguintes sorovares:
wolffi, hardjo, bratislava, australis, tarassovi, icterohaemorrhagiae, sentot, grippotyphosa e
patoc. Na Fazenda 2 foram encontrados: t
arassovi, wolffi, bratislava, grippotyphosa e
cynoptero, (
Tabela 2). Numa análise global, obtiveram-se também em ordem decrescente:
wolffi, hardjo, bratislava, australis, tarassovi, icterohaemorrhagiae, sentot, grippotyphosa, patoc e
cynoptero (
Tabela 3).
Sorovares comuns aos bovinos, como
hardjo e
wolffi,
são de transmissão direta, ou seja, a transmissão ocorre de um
indivíduo para o outro e está diretamente ligada às condições de
manejo. Sorovares acidentais como
tarassovi e
sejroe
infectam os bovinos que habitam um ambiente favorável ao
desenvolvimento desses sorovares. Fatores que podem favorecer a
manutenção desses agentes no meio são: condições climáticas favoráveis,
como alta temperatura e umidade, e pH dos solos, de neutro a alcalino
(TOMICH
et al., 2007).
Foi estatisticamente maior, em um nível de significância de 0,05, a frequência dos sorovares
tarassovi e
wolffi na Fazenda 2. O sorovar
bratislava
não apresentou diferença estatisticamente significante entre as
duas propriedades, e os demais tiveram frequências baixas ou não
identificação pela sorologia, não sendo possível a comparação entre
eles. Com isso, levanta-se a hipótese de que, nos rebanhos estudados,
tanto fatores de ambiente quanto de manejo favoreceram o contato entre
hospedeiro e os parasitos, resultando na identificação de
anticorpos anti-
Neospora e anti-
Leptospira.
Segundo ALMEIDA (1999), os sorovares mais frequentemente encontrados na América são:
pomona, hardjo, wolffi e
grippotyphosa. O presente estudo identificou a importância de outros sorovares, além dos citados anteriormente. São eles:
bratislava, tarassovi e
australis.
Wolffi e
hardjo foram os mais encontrados numa análise global dos animais estudados.
Grippotyphosa foi encontrado apenas na Fazenda 2 e o sorovar pomona não foi estudado.
Em análise prospectiva, visando a prevenção, aventa-se a necessidade de
adotar a vacinação. Porém em todas as bacterinas encontradas no mercado
estão presentes os sorovares
hardjo, icterohaemorrhagiae e
pomona. Duas delas apresentam o sorovar
bratislava, sendo que dessas somente uma está associada a
wolffi.
Uma vacina possui em sua composição o sorovar
tarassovi, estando associado à
bratislava, hardjo e
pomona, porém não se encontra o sorovar
wolffi
em sua composição. Tais observações permitem considerar que as vacinas
encontradas no mercado não abrangem todos os sorovares identificados
por este estudo. Isso significa que, mesmo sendo feita vacinação nos
rebanhos avaliados, eles não estariam devidamente protegidos e os
prejuízos causados pela leptospirose provavelmente continuariam.
Os resultados deste estudo demonstram a relevância de levantamentos de soroprevalências de anticorpos anti-
L. interrogans
nas diversas regiões do Brasil, buscando reconhecer os principais
sorovares em cada rebanho. Isso se deve ao fato de que os
anticorpos produzidos são específicos para a variedade sorológica que
induziu a sua produção, ou seja, não há imunidade cruzada (FAINE
et al.,
1999). Descute-se ainda a possibilidade do uso de vacinas autógenas,
aprovadas pelo MAPA (BRASIL, 2002), em propriedades onde se detecta a
presença de sorovares não comuns à maioria das vacinas comerciais.
CONCLUSÕES
Após estudo sorológico em dois rebanhos bovinos leiteiros com relatos
de perdas reprodutivas no município de Goiandira, Goiás,
identificaram-se fêmeas reagentes para
L. interrogans e
N. caninum com frequências elevadas, 81,1% e 43,4% respectivamente, apresentando o sorovar
wolffi como o de maior prevalência.
AGRADECIMENTOS
Aos funcionários do Laboratório de Doenças Infectocontagiosas e de
Patologia Clínica da Universidade Federal de Uberlândia e ao Instituto
de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) da Universidade Federal
de Goiás, pela colaboração nas análises laboratoriais.
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