DOI: 10.1590/1089-6891v17i131267


MEDICINA VETERINÁRIA


COMPARAÇÃO DA EFICIÊNCIA DAS COLORAÇÕES DE ZIEHL- NEELSEN MODIFICADO E SAFRANINA MODIFICADA NA DETECÇÃO

DE OOCISTOS DE Cryptosporidium spp. (EUCOCCIDIORIDA, CRYPTOSPORIDIIDAE) A PARTIR DE AMOSTRAS FECAIS DE BEZERROS DE 0 A 3 MESES


COMPARISON OF EFFICIENCY OF STAINING WITH ZIEHL-NEELSEN MODIFIED AND SAFRANIN MODIFIED IN DETECTION OF Cryptosporidium spp. (EUCOCCIDIORIDA, CRYPTOSPORIDIIDAE) FROM FECAL SAMPLES OF CALVES FROM 0 AND 3 MONTHS


Renata Dias Rodrigues1*

Lara Reis Gomes1

Rafael Rocha de Souza1

Fernando Cristino Barbosa1


1 Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil.

* Autora para correspondência - renatavetufu@gmail.com


Resumo

A criptosporidiose bovina é causada principalmente por quatro espécies distintas: Cryptosporidium parvum, Cryptosporidium bovis, Cryptosporidium ryanae e Cryptosporidium andersoni. A espécie Cryptosporidium parvum (Ordem: Eucoccidiorida, Família: Cryptosporidiidae) é considerada de alto potencial zoonótico, podendo infectar humanos por intermédio da eliminação de oocistos tanto pelos bovinos quanto pelo próprio humano. O objetivo desta pesquisa foi verificar a ocorrência de oocistos de Cryptosporidium spp. em amostras fecais de bezerros (75 machos e 77 fêmeas), tendo sido coletadas 152 amostras de fezes de animais do nascimento até os três meses de idade. O material foi submetido às técnicas de coloração de Ziehl-Neelsen modificado e S afranina m odificada, as lâminas foram observadas em toda sua extensão ao microscópio óptico para a verificação da presença de oocistos desta enteroparasitose. Os resultados demonstraram 17,1% (26/152) de positividade no total das amostras examinadas e a análise estatística revelou não haver diferença entre o sexo e as técnicas de coloração utilizadas neste estudo. Conclui-se que a infecção por Cryptosporidium spp. esta presente nas propriedades avaliadas, porém são necessários mais estudos para que o risco de infecção seja mensurado adequadamente e medidas profiláticas implementadas.

Palavras-chave: enteroparasitose; ruminante; zoonose.


Abstract

Bovine cryptosporidiosis is caused by four differents s pecies: C ryptosporidium parvum, Cryptosporidium bovis, Cryptosporidium andersoni and Cryptosporidium ryanae. The species Cryptosporidium parvum (Order: Eucoccidiorida, Family: Cryptosporidiidae) is considered of high zoonotic potential and it can infect humans through the elimination of oocysts by both cattle and by humans. The objective of this research was to detect oocysts of the genus Cryptosporidium spp. in fecal contents of calves (75 males and 77 females). We collected 152 stool samples from animals aged between 0 day and 3 months. The material was subjected to modified Ziehl-Neelsen and modified Safranin techniques, the slides were observed in its entire length by optical microscopy to verify the presence of oocysts of this parasitic infections. The results showed 17.1% (26/152) positivity in the samples examined, and the statistical analysis showed no difference between sex and the staining techniques used in this study. We concluded the infection by Cryptosporidium spp. is present in the evaluated properties, but more studies are needed, so that the risk of infection is measured properly and prophylactic measures are implemented.

Keywords: enteroparasitosis; ruminant; zoonosis.


Enviado em: 28 julho 2014

Aceito em: 19 novembro 2015


Introdução


A Criptosporidiose é uma doença causada por coccídeos da família Cryptosporidiidae; o gênero Cryptosporidium compreende 25 espécies e mais de 40 genótipos, sua ocorrência geográfica é mundial e afeta, principalmente, o trato gastrointestinal de mamíferos (incluindo o ser humano), aves, répteis, anfíbios e peixes. Atualmente, já são cerca de 150 espécies de animais que podem ser infectados (1,2). A transmissão da criptosporidiose ocorre devido à ingestão de oocistos de Cryptosporidium spp.

(Ordem: Eucoccidiorida, Família: Cryptosporidiidae) em água e/ou alimentos contaminados e por meio do contato direto com material fecal de indivíduos infectados que estejam eliminando a forma infectante (3-9).

OsbovinospodemserinfectadoscompelomenosquatroespéciesdeCryptosporidium: Cryptosporidium parvum, Cryptosporidium bovis, Cryptosporidium ryanae (anteriormente identificado com Cryptosporidium genótipo deer-like) e Cryptosporidium andersoni (10-12). Cryptosporidium parvum é considerado a maior causa de diarreia em bezerros recém-nascidos (13). Este genótipo também pode infectar outros mamíferos incluindo o ser humano, adquirindo potencial zoonótico. Em bovinos, a duração dos sintomas da criptosporidiose depende de inúmeros fatores, incluindo os níveis de contaminação ambiental, a virulência e a infectividade da amostra, a suscetibilidade do hospedeiro e, por fim, a idade à primeira infecção (14).

O objetivo desta pesquisa foi verificar a ocorrência de oocistos de Cryptosporidium spp. em amostras fecais de bezerros (machos e fêmeas) do nascimento até 3 meses de idade, por meio das técnicas de coloração Ziehl-Neelsen modificado e Safranina modificada.


Material e Métodos


O estudo foi conduzido em cinco pequenas propriedades de criação de bovinos, com aptidão leiteira, localizadas no Município de Uberlândia–Minas Gerais. A escolha foi aleatória, não importando o tamanho e padrão tecnificado. As propriedades apresentavam condições de manejo semelhante, incluindo o sistema de duas ordenhas diárias. Os bezerros eram mantidos em piquetes coletivos, ou seja, sem divisão por faixa etária e bebedouros de uso comum. O período das coletas foi do mês de abril a julho de 2013.

As amostras de fezes foram obtidas de 152 bezerros do nascimento até 3 meses de idade, a coleta foi realizada diretamente da ampola retal, utilizando-se sacos plásticos descartáveis. Estes foram identificados individualmente e transportados em caixa de isopor com gelo reciclável até a Universidade Federal de Uberlândia - Laboratório de Patologia Clínica Veterinária onde as amostras foram processadas no mesmo dia.

Foram separadas aproximadamente 3 g de cada amostra fecal, as quais foram diluídas em10 mL de água deionizada. Esta solução foi homogeneizada com auxílio do bastão de vidro, em seguida, verteu- se em tubo Falcon com capacidade de 15 mL, o material foi centrifugado a 3600 g por 10 minutos. O sobrenadante foi descartado e a partir do sedimento foram feitos dois esfregaços finos em lâminas de vidro. Uma lâmina foi corada pela técnica de Ziehl-Neelsen modificado (15) e a outra pela técnica da Safranina modificada (16) . As lâminas foram observadas ao microscópio óptico em toda sua extensão com aumento 1000x em objetiva de imersão. Para a comparação das técnicas de coloração e o sexo, utilizou-se teste não paramétrico (binomial para duas proporções), com nível de significância de 5% (Programa Bioestat – versão 5.3).

O protocolo foi aprovado pela Comissão de Ética na Utilização de Animais (CEUA/UFU) – registro n° 116/12.


Resultados


Das 152 amostras fecais analisadas, 12,5% (19/152) foram positivas na técnica Ziehl-Neelsen modificado e 7,8% (12/152) na técnica da Safranina modificada, sendo que cinco amostras (3,2%) foram positivas em ambas as técnicas de coloração (Tabela 1).

A prevalência geral de Cryptosporidium spp. neste estudo foi de 17,1% (26/152), independente de a amostra ter sido positiva em uma ou em ambas as técnicas. Quanto ao sexo, não foi verificado diferença estatística (Tabela 2).


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Na Figura 1, observam-se oocistos de Cryptosporidium spp. apresentando a coloração púrpura intenso e o fundo da preparação corado em azul pela técnica de Zhiehl-Neelsen modificado. Na Figura 2, o oocisto de Cryptosporidium spp. aparece corado em vermelho-alaranjado sobre um fundo uniforme corado em verde pela técnica da Safranina modificada.

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Discussão


No primeiro trabalho sobre a infecção de Cryptosporidium spp. em bovinos, no Brasil, Modolo et al. (17), na região de Botucatu (SP), encontraram 26% de bezerros menores que 30 dias positivos para esta coccidiose; já nos animais com mais de 30 dias o índice de positividade foi de 23%. A prevalência de Cryptosporidium spp. em bovinos é bastante variada, os índices de positividade encontrados na literatura variam de 0,6 a 82,54%, existindo relato de até 100,0% de acometimento dos animais (18-20). No presente estudo, a ocorrência de Cryptosporidium spp. em bezerros encontra-se entre os valores observados em estudos conduzidos no Brasil, EUA, Hungria, Alemanha, Irlanda, Irã e Espanha, com a prevalência de 14,0% a 57,8% (11,21-25).

Essa variação na prevalência deve-se a inúmeros fatores, dentre eles: delineamento do estudo, idade dos animais, número de amostras por propriedade e metodologia de diagnóstico empregada. Outro fator a ser considerado também é a dificuldade em se identificarem animais assintomáticos ou em período subclínico da infecção, por não eliminarem quantidade detectáveis de oocistos nas fezes (26,27). Quanto às técnicas de coloração utilizadas neste estudo, estas apresentam vantagens e desvantagens e não há um consenso entre os autores. Segundo Rigo et al. (28), a técnica de Ziehl-Neelsen modificado é uma preparação que proporciona uma melhor visualização dos oocistos, sendo também indicada para o diagnóstico das infecções leves, quando o número de oocistos presentes nas fezes é baixo. Segundo Baxby et al. (16), a técnica da Safranina modificada é mais simples e mais rápida que a de Ziehl-Neelsen modificado e apresenta um bom contraste.

Quanto à faixa etária mais acometida, segundo Pohjola et al. (29), ela se situa dentro da primeira semana de vida. Henriksen e Krough (30) e Bhat et al. (31) afirmaram que a criptosporidiose é mais prevalente em bezerros de 4 a 30 dias. Entretanto, em estudo conduzido por Mtambo et al. (32), a prevalência maior situou-se em bezerros com até três meses. Neste estudo, os animais estão compreendidos nesta faixa etária.

De acordo com Silva Júnior et al. (33), o fornecimento de colostro após as seis primeiras horas de nascimento do bezerro aumenta por volta de quatro vezes o risco de infecção por Cryptosporidium spp., em relação aos animais que receberam o colostro nas primeiras seis horas de vida. Climeni et al. (34) ressaltaram em seu estudo que a qualidade do colostro declina rapidamente após o nascimento do bezerro, bem como a própria capacidade deste animal de absorver as imunoglobulinas que irão conferir imunidade.

Segundo Almeida et al. (35), a presença de reservatório artificial de água disponível para os animais (bebedouro) também é um fator de risco significativo para a presença de Cryptosporidium spp. em fezes de bezerros, pois este pode ser um reservatório de oocistos, que permanecem, por sua vez, viáveis por longos períodos, além de resistirem a processos de filtração e cloração da água. Nas cinco propriedades estudas, os bebedouros eram de uso comum de animais jovens e adultos, sendo um fator importante na contaminação e disseminação da doença entre os animais.

Nas propriedades deste estudo, foi observado que os animais eram mantidos em instalações coletivas e próximos aos currais, o que foi indicado por Silva Júnior et al. (33) como um fator de maior risco para os bezerros, podendo estar expostos a uma maior carga de parasitos no ambiente. Sendo assim, pode-se inferir que o local onde os animais estão alocados são uma importante fonte de disseminação; portanto, a adoção de boas práticas de higiene na criação de bezerros pode reduzir o risco de infecção por Cryptosporidium spp. (36, 37).

Quanto ao sexo, este não exerceu influência sobre o índice de infecção por protozoários deste gênero, estando de acordo com Tarazona et al. (38) que afirmaram que a infecção por Cryptosporidium spp. ocorre em indivíduos independentemente do sexo.


Conclusão


Conclui-se que a infecção por Cryptosporidium spp. está presente nas propriedades avaliadas, porém são necessários mais estudos, para que o risco de infecção seja mensurado adequadamente e medidas profiláticas sejam implementadas.


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